Cada um por si
Sue
Após explicar à minha irmã meu incrível plano, retornamos às águas frias e agitadas do lago. Envolvo nós duas no redemoinho de água, que começa a nos mover em direção aos garotos, passando em meio a pessoas que lutavam para sobreviver e contra as criaturas que despencaram juntas com os mesmos. Abaixo da água eu não tinha muita visão, mas podia sentir muito bem os movimentos à nossa volta, devido ao meu elemento.
O bom de ter um elemento como o meu é que você sente todas as suas propriedades, é como se você fosse o próprio ele- mento. Eu não sabia exatamente as proporções de meu poder, mas estava louca para descobrir.
Já estávamos próximas dos carros que caíram ponte abaixo. Alguns andarilhos notam nossa presença e vêm em nossa direção. Eu não poderia manipular outra coisa, já que minha concentração estava no redemoinho que nos protegia e movimentava, viro para minha irmã, dando as coordenadas do que ela poderia fazer.
Snow era muito inteligente e esperta, porém algumas situações a deixavam travada e esse era meu medo naquele momento.
— Snow, lance bolas de fogo na direção deles, isso vai dificultar a aproximação — digo, normalmente e sorrindo, doida para ver o quanto de poder necessário seria para destruir eles.
Na verdade, eu estava doida para dizer "explode eles, maninha", mas controlei meus desejos malucos de gritar isso.
— Pode deixar comigo.
Snow logo ergue suas duas mãos na altura de seu rosto, fazendo surgir mediante suas palmas chamas que cobrem suas mãos, junto à luz do luar, e fica evidente na expressão de seu rosto o quanto ela quer extravasar seu poder.
Vejo um sorriso maldoso surgir em seu semblante, era bom ver ela extravasar um pouco, tais momentos eram difíceis de se ver.
Ela inclina sua mão para trás, arremessando sobre o rosto de um dos andarilhos, que grita ao sentir a bola de fogo e o calor consumir seu rosto; a criatura se debate contra a água enquanto as chamas se alastram na parte de seu corpo que estava na superfície da água. Não demora muito para ele afundar por completo na água.
— Não pare, irmã. Mandou muito bem — Digo, sorrindo, empolgada ao ver que ataques elementais funcionavam mais rápido do que tiros e ataque corpo a corpo.
— Não precisa dizer duas vezes, Sue.
Vejo ela estender os dois braços à frente do seu corpo, ela respirava calmamente e fechava seus olhos. Olho intrigada para ela, perguntando, de modo curioso, o que diabos ela estava por fazer:
— Isso lá é hora de meditar, Snow? – Eu disse – Apenas exploda eles e não se medita com Ex-Humanos.
Ela abre seus olhos no mesmo instante e vejo uma pequena esfera de chamas surgir em meio às suas mãos, que estavam uma sobre a outra.
Nosso corpo já havia se acostumado com a temperatura fria da água, mas naquele instante sentia o corpo de minha irmã aquecer levemente, assim como as chamas as quais ela conjurava.
— Sue, vá mais rápido — Snow fala, em um tom mais firme, sem virar para mim.
Não retruco e apenas faço isso, vamos de frente em direção a três andarilhos. Vejo um sorriso maldoso no rosto dela, logo um clarão surge diante de nós. Ela havia conjurado algumas labaredas de chamas, atingindo os três de uma só vez.
Fiquei boquiaberta com a forma que ela estava dominando as chamas, as criaturas nem tiveram tempo de gritar como a outra que fora atingida pela bola de fogo minutos atrás. Eles foram consumidos por completo de forma rápida e eficaz.
Passamos em meio às criaturas já mortas e afundando no lago abaixo de nós. Chegando na localização dos carros atingidos, todos estavam abertos, amassados e sendo tomados pelas águas do lago, ficando submersos; olho um por um, buscando os dois garotos.
— Encontrei, Sue. — Snow aponta para um carro preto, que estava com a parte do porta-malas empinado, a frente estava sendo puxada à medida que a água se alastrava para dentro do carro.
— Merda! — exclamo, vendo que nosso tempo era apertado. Acelero enquanto passamos carro por carro. Ergo minha cabeça, ouvindo todo o caos que estava entre população e governo, sem contar as criaturas que não perdiam tempo devido à situação; ambos os lados viam que, ao invés de juntarem forças, estavam lutando por desejos egoístas e ajudando o que estava acabando com nossa raça.
Toco com a palma das minhas mãos sobre a água, direcionando fortes correntezas aos dois andarilhos que se aproximavam do garoto avoado, as criaturas são lançadas para longe da localização dele e da nossa.
— Ponto para a Sue, figurantes do "Plants vs Zombies" — brinco, enquanto bato com uma mão na outra e cruzo os braços, ficando com uma expressão de completa satisfação no rosto.
— Sue, estou indo ajudar Dan, ele está debaixo da água e se- quer notou que chegou ajuda — Snow fala sério comigo, e, com um acenar de minhas mãos, tiro-a do redemoinho. Antes de ela ir, alerta-me: — Se cuida. Não se distraia, por favor.
— Tenho cara do seu crush, maninha? — brinco, enquanto falo em tom provocativo.
— ...Muito engraçado. — Ela revira os olhos e me dá as costas antes de mergulhar água abaixo. Vejo-me sozinha, o local agora estava vazio, gritos ecoavam, barulhos de tiros e grunhidos eram minha única companhia, sentia um pouco do medo percorrendo em mim, porém tentava a todo momento deixar o meu otimismo virar minha coragem. Para onde olhava, apenas via o cenário do caos instalado.
"Quanto tempo será que eles vão levar? Não pensei que fosse levar mais que cinco minutos" — penso, olhando em volta. Os minutos pareciam não passar e eu não conseguia enxergar nada abaixo de mim. Não poderia fechar meus olhos, ou estaria encrencada. As coisas acima de mim só pioravam: conseguia sentir fortes tremores devido às vibrações que a ponte causava no lago, o conflito só piorara e tudo estava fora de controle. Logo sou surpreendida pela voz ofegante de minha irmã:
— É complicado Sue.
— Não duvide. O tempo aqui passou mais devagar do que pensa — falo, suspirando, olhando para os dois. O garoto estava desacordado e o outro olhava preocupado para o rosto dele. Sou surpreendida com a voz calma dele diante de tudo aquilo:
— Obrigado. — Ele intercala olhares entre mim e minha irmã enquanto completa. — A vocês duas. É meio difícil alguém ceder ajuda diante de tudo isso. — Ele demonstra um sorriso amigável.
— Precisamos estar dispostos a ser a mudança. — Retribuo o sorriso do garoto. Viro-me, junto a meu redemoinho, e, com o acenar de minhas mãos, envolvo-os. Agora, todos junto a mim, sigo em direção à orla da floresta.
"Ainda bem que tudo ocorreu como planejado, estou me sentindo fraca já" — penso, preocupada com as variáveis que aquelas circunstâncias poderiam oferecer.
Assim que eles chegam à superfície, olho para o garoto e Snow, que retomavam o fôlego, comentando, rapidamente:
— Precisamos sair daqui o quanto antes. As coisas lá em cima parecem só piorar. — Alerta-os olhando na direção da ponte.
Eles olham, assim como eu, na direção da ponte. Snow dá alguns passos, não crendo no que seus olhos viam: pessoas eram lançadas lago abaixo, criaturas lançavam suas vítimas contra o chão, carro ou mureta enquanto se preparavam para mordê-las e arranhar suas peles; o governo atirando em civis e criaturas sem sequer poupar as vidas que a todo custo ali tentavam de alguma forma sobreviver.
— Chega a ser doloroso ver o que nosso povo se tornou, Sue.
— Ela se vira, olhando para mim com um olhar de descrença.
— Em momentos de pânico as pessoas mostram seu pior lado — Dan solta, olhando para ela. — Mas ainda há poucos como vocês, que mostram que ainda há esperança.
Levanto meus braços finos, mostrando força onde não tinha, falando, de modo confiante, da minha força, com um olhar de- terminado:
— Esse é o nosso Girl Power, não é mesmo, maninha?
— Minha irmã dá uma risada, levando sua mão à boca, falando, logo em seguida:
— Sim, somos fortes mesmo. Nem ouse se meter conosco, Sr. Hawks. — E todos rimos com nosso momento bobo.
O garoto então reconhece nossos rostos naquele momento, ele parecia surpreso por não notar antes, chegava a ser engraçado ver as expressões de confusão em seu rosto.
— Ei, vocês são aquelas duas irmãs que vi hoje mais cedo no estacionamento?
Minha irmã dá uma risada com a forma que ele falara e pela expressão em seu rosto; parecia estar feliz com a companhia. Noto ela se virando, olhando para mim, e parecia querer sacanear a memória do garoto confuso.
— Que garotas? Sue, você o reconhece?
Balanço com a cabeça, afirmando que não, enquanto falo:
— Quem é você, garoto?
Dan leva sua mão no rosto, escondendo sua vergonha. Suas bochechas ganham um tom rubro e ele fala, com sua voz abafada entre os dedos:
— Isso acontece com mais frequência do que imaginam...
Caminho até ele, dando um tapa em seu ombro, enquanto dou risada.
— Para com isso. — Olho para Snow. — Isso é maldade de- mais, maninha, brincar com a memória de alguém que falha...
— Mas você gostou, vai. — Dan olhava confuso para nós duas. — Sim, somos nós, seu avoado. Mas você mereceu essa brincadeira.
— E como, esquecer esses belos rostos? — Caminho, ficando ao lado de Snow. — Chega a ser um insulto, meu caro.
— Foi mal, sou péssimo com nomes e rostos. Nem é porque eu quero... — Dan afirma.
A gritaria e tensão na ponte só estava por aumentar e aquilo me preocupava demais; mesmo eu tentando não dar atenção para aquilo, minha mente ainda estava assombrada com os últimos acontecimentos.
— Jura que agora que caiu sua ficha? Eu só não sei o seu nome porque você não se apresentou, e se você se apresentou, não lembro o nome. – Comento forçando um risinho sem graça. Ele passa a mão sobre seus cabelos molhados e faz uma breve apresentação:
— Me chamo Dan Hawks, esse desmaiado é meu irmão, Dan- te. Estávamos saindo da cidade em direção à Nova Iorque, onde meu pai disse estar na última vez que tivemos contato com ele, segundo a mensagem que meu irmão recebeu dele.
Estava prestes a falar quando minha irmã fala antes de mim; ela demonstrava curiosidade no garoto. Ela fala, de modo atencioso, encarando-o:
— Por que estão indo apenas os dois? Onde está sua mãe, Dan?
Ao menos vi ela no estacionamento junto a vocês mais cedo.
O garoto morde os lábios e vemos uma expressão cabisbaixa surgir em seu rosto. Ele fala, com a voz baixa e pausadamente, enquanto fita o chão, negando-se a nos encarar enquanto dá sua resposta, curta e sem rodeios:
— Ela não sobreviveu a isso, sabe...
Snow leva as mãos à boca e vê que fora indelicada, desculpando-se logo em seguida:
— Me desculpe, não era minha intenção ser indelicada ou enxerida...
Ele faz gestos com a mão, dando um sorriso sem graça e falando, de modo descontraído:
— Não precisa se desculpar, que isso. É só chato falar, sabe?
Foi tudo muito recente e...
Vendo que os dois estava em uma situação chata, intervenho na conversa:
— Então, Dan, me chamo Sue Flubell, irmã mais nova de Snow. Ela te conhece, sabia?
Ele fica surpreso ao saber isso, logo a questionando sobre:
— É sério? — Ele a encara, aproximando-se, sem se dar conta da timidez dela. — De onde, Snow?
Minha irmã fica levemente corada e olha para mim com um olhar do tipo "vou te matar, Sue"; respondo com um olhar e cutucão do tipo "um dia você me agradece", lançando uma piscadela.
— Somos da mesma escola, Dan. Fazemos química e física com os mesmos professores. Você não deve me conhecer muito, já que sou mais reservada. Porém, sou atenta aos meus amigos de classe — ela diz, de modo atencioso, esperando lá no fundo que ele ao menos tivesse a notado uma única vez.
Ele logo reage de modo que a surpreende e a mim também. Na verdade, eu quis dar na cara dele um tapa por tirar uma conosco.
— Ah, sim. Me lembrei! Eu já cheguei a fazer trabalho contigo em dupla na sala. Você é muito inteligente, teve a maior paciência comigo, sempre achei você mais bonita do que as demais garotas da sala. Eu tenho problemas em gravar rostos e nomes, como já disse, mas o seu não me era estranho, Snow — Dan fala, de modo descontraído, parecendo uma metralhadora disparando palavras, porém era notável sinceridade em cada palavra e gesto.
Ela parecia estar se divertindo como não fazia há muito tempo com o jeito idiota do garoto, eu estava feliz e achava legal o modo como ele era espontâneo. Ela dá risada e fala, sem nem pensar:
— Eu notei isso, afinal, sou boa em ler o jeito das pessoas.
— Eu que o diga — disparo.
Somos tirados de nossa conversa quando o irmão dele retoma a consciência, cuspindo água e acordando assustado. Dan segura ele de modo firme e fala, sorrindo, ao ver que o irmão estava bem:
— Ei, mano, está tudo bem! Estamos a salvo. — Dante olha confuso para o irmão e fala, com a voz saindo falha:
— Como assim? — O garoto o encara assustado, enquanto segura firme os braços de seu irmão. — Onde estamos?
Falo, de modo descontraído e com um sorriso travesso no rosto:
— Ora, ora, finalmente a bela adormecida acordou. Perdeu a vista única que o expresso Sue oferece.
Dan e Snow dão uma breve risada. Dante, ainda com a cara fechada, dá uma olhada para mim e minha irmã, logo olha a sua volta; parecia com a mente a mil e bem atordoado, porém nada fala. O garoto tenta se colocar de pé de imediato, porém cai com o joelho esquerdo no chão.
— Calma aí, Dante. Você bateu feio com a cabeça no volante, deve estar tonto.
— Não posso discordar de você — ele fala, brevemente. Caminho lentamente, agachando-me próxima à beira do lago, tocando com minhas mãos sobre a água fria, enquanto deixava os
dois conversarem a sós. Minha irmã fica atrás de mim, ouvindo tudo o que acontecia na ponte. Logo sinto minha mão brilhando levemente ao entrar em contato com meu elemento, sinto uma energia percorrendo por todo meu corpo, preenchendo certos pontos. Olho rapidamente para Snow e vejo que ela não percebera, era uma sensação boa e que não havia sentido até então.
"Será isso o que comentaram? Energia elementar? Tudo indica que sim, a própria fonte do elemento o carrega com suas energias." — Lembro das pessoas comentando na internet. — "Meio que faz sentido, estou na água, meu elemento é água, então a água está carregando minha energia elementar. Depois comento com eles. Ao menos não me sinto mais fraca."
Dante então começa a olhar em volta, ele parecia está retomando suas lembranças antes do ocorrido. Comenta conosco:
— Vocês são as garotas do estacionamento, não? Como consegui sair do carro? Eu só lembro de...
Antes de Dante terminar de falar, escutamos um grande barulho vindo da ponte. Nossos olhares são direcionados para ela, que abandonamos uma hora atrás; não estávamos muito longe dali. Os que se encontravam na ponte lutavam contra os andarilhos a fim de se manterem vivos e cruzar a fronteira da cidade. Os policiais e a guarda tentavam manter controle enquanto o caos se assolava junto ao desespero da população.
"Mantenham a calma, façam assim como ordenado e retor- nem às suas casas. Não é só em Atlanta que está ocorrendo isso. O desespero de vocês não irá adiantar de nada."
Eles veem que de nada adiantaria falar e abrem fogo contra a população que ali se encontrava. Escutávamos o barulho de pneus cantando sobre o asfalto, os carros arrancando dali em retirada, os guardas atirando contra a pequena horda de andarilhos que ali se encontrava.
Os poucos que permaneciam ali tentaram lutar contra a guar- da, tentando passar pela fronteira a todo custo. Logo somos pegos de surpresa por aviões do governo, que lançam mísseis contra a ponte.
Naquele momento, fiquei boquiaberta com tamanha frieza do governo contra sua população, pouco se importando com as vi- das que ali lutavam por sobreviver contra os andarilhos.
Todos ali estavam tentando escapar com vida junto a seus entes queridos. O governo simplesmente estava pensando em si mesmo. Destruíram-nos sem pensar duas vezes ou sequer pensaram em outro método para conter a população.
Em menos de três minutos, a ponte que ligava a fronteira de Atlanta estava destruída e os destroços caem rio abaixo, junto com os corpos e tudo o que ali antes estava. O forte barulho dos destroços colidindo com o rio abaixo é estrondoso, a água se levanta com o peso de tudo que cai sobre ela e uma pequena onda chega até nós na margem.
— A humanidade é a única culpada de sua extinção. São nesses momentos que vemos que é cada um por si e que poucos demonstram compaixão pelo próximo. Abomino esse tipo de pessoa — digo, de forma que transparece raiva com o que eu acabara de presenciar.
Escutamos helicópteros não muito distantes dali chegando e uma luz forte cortava o céu em direção à terra; pareciam ser de busca e com mais guardas. Notamos que pessoas que sobreviveram àquela explosão da ponte nadavam em direção às terras firmes mais próximas de si, assim como as criaturas. Viro-me, olhando para eles e para a entrada da floresta atrás deles.
— Como vai ser, rapazes? Estamos seguindo caminho para fora da cidade. Como devem ter visto, deixei a gente do lado oposto. Creio eu que basta atravessarmos essa floresta e teremos visão da via expressa.
Dan e Dante se olham. Dan fala primeiramente, de modo calmo e amigável, dando de ombros:
— Acho que não tem problemas, já que seguiremos a mesma via, pegando caminho até NY. Não vejo por que me separar de vocês nesse momento.
Dante já é mais sério e mantém tal aparência mediante a nós. Eu não sabia ao exato se ele era assim mesmo ou era alguma medida de segurança quando não conhecia alguém.
— Sou grato pelo que fizeram, mas não sei até quando segui- remos viagem juntos. Qual é o destino de vocês?
Snow toma a frente, de modo frio, encarando o garoto nos olhos — ela parecia não ir muito com a cara dele, eu como irmã dela já sabia seu modo e jeito de agir com pequenos gestos —, falando antes de mim:
— Estamos indo para Washington. Espero que não nos atrase ou se meta em confusões novamente, Dante. Não temos tanto tempo assim para lhe salvar toda vez.
Ela diz aquilo em tom irônico, provocando-o e seguindo caminho à frente, adentrando a floresta. Joga os cabelos negros e grandes sobre o rosto dele e vou logo em seguida, falando de modo que tirasse uma com eles:
— Vocês ouviram minha irmã: nada de nos atrapalhar.
— Vamos indo, o caminho é longo — Snow fala alto, mais à frente.
Escuto Dan tirar uma com a cara do irmão, dando um soco em seu ombro.
— Levando chamada da Snow... — Ele dá uma risada e pros- segue falando: —A viagem já começou boa.
Dante morde os lábios, fazendo um rosto do tipo "você não tem medo da morte", falando com o irmão, em tom baixo:
— Ela vai ver o atraso. Quero ver até onde a garota em chamas queima.
Snow retruca lá na frente, olhando de canto de olho, enquanto andava em meio às árvores; eu estava atrás dela e os garotos seguindo atrás de mim. A pouca iluminação da lua nos dava uma imagem do caminho em meio à floresta. Não arriscaríamos ligar as lanternas em nossas bolsas de viagem, isso daria a localização exata aos guardas e andarilhos. Creio eu que eles estariam pouco se lixando se éramos adolescentes tentando sobreviver ou não. Depois do que presenciei sobre a ponte, eu só tinha uma coisa em mente: não confie em ninguém além de si mesmo.
— Disse algo, senhor Hawks? — minha irmã pergunta, em seu tom educado, mas carregado de ironia.
O garoto responde à altura dela, com um sorriso despojado em seu rosto. Ele caminhava ao lado de Dan, com as mãos nos bolsos e rosto levantado para cima, atento à nossa volta. Ele fala, em um tom mediano para que nós todos escutássemos:
— Que isso, Senhorita Flubell, estou apenas conversando com meu irmão. Pode ficar tranquila, quando se tratar de você, falarei olhando em seus olhos.
Minha irmã dá uma risada abafada e morde os lábios para não retrucar e render a conversa com ele. Dou uma breve corridinha, ficando ao seu lado, e falo, conversando com ela amigavelmente:
— Você está agindo diferente do normal.
— Que isso, maninha. Ele foi arrogante conosco. Você sabe que eu não levo desaforo.
— Concordo, isso temos em comum mesmo.
Logo Dan corre à nossa frente, parando nós duas e fazendo sinal de silêncio, puxando-nos para trás de uma grande árvore.
Meu coração começa a bater forte, sinto que algo estava perto e não percebemos. Eu estava com as costas contra a árvore, minha respiração ficou levemente acelerada, mas foco e fico atenta ao que ele fala a seguir. Ele sussurra, próximo de nós:
— Tem algo se aproximando de nós, não muito distante, precisamos desviar do curso principal.
Logo vejo Dante se abaixar sobre o chão e pegar com as mãos algumas folhas junto a terra, e ele faz um sinal para seu irmão, que confirma sua tese.
— Estava certo, pessoas passaram por aqui. Precisamos nos afastar de quem esteve nesse mesmo trajeto que nós.
Dante se levanta e se aproxima de nós, falando, de modo sério, e olhando à nossa volta:
— Não é apenas um, Dan, é um grupo de pessoas, ou pior, andarilhos.
Dante sai na frente da árvore a qual estávamos e é surpreendi- do por um dos guardas da ponte, que lhe acerta com as costas da arma no nariz. Eu consegui ouvir o barulho de seu nariz sendo quebrado. Ele recua alguns passos devido ao impacto do golpe.
Dante junta as mãos assim que o guarda aponta com a arma elétrica para ele, a fim de imobilizá-lo, e lança uma esfera de ar em sua direção.
O homem é jogado contra uma das árvores, batendo com a cabeça e ficando desacordado. Mas Dante não parou por aí, ergueu-o ao alto e o jogou contra o lado oposto.
Logo caminho até sua frente antes dele atacar o guarda nova- mente e falo, de modo firme:
— Chega! Ele já está desmaiado. — Olho para o corpo do guarda e torno a falar: — Ao menos aparenta ainda estar vivo.
Dou de ombros e coloco a mão em seu rosto, olhando atentamente para seu nariz; o sangue escorria em direção aos seus lábios e queixo. Ele me olha com raiva, mas não retruca. Fito seu olhar tenso e com raiva, não sabia se era devido à dor ou ao acontecimento que o pegou de surpresa. Os olhos do garoto eram, assim como ele, um verdadeiro mistério.
— Isso vai doer só um pouco, ok? É só colocar o osso no lugar, rapazinho.
Com um movimento rápido, coloco o osso de seu nariz no lugar. Noto que ele fechou o rosto devido à dor ao sentir o estalar, porém não emitiu nenhum som. Noto que seu irmão fez uma careta ao tomar as dores de seu irmão para si; um sorriso preenche meu rosto com tal cena. Snow, assim como eu, parecia achar aquilo normal. Retiro de minha bolsa, molhada, porém não encharcada, um pequeno lenço umedecido, ou molhado de água mesmo, dando para ele limpar o sangue. Sigo andando na frente, na direção oposta, e falo, de modo bobo:
— De nada, ok?
Ele vem caminhando junto com o irmão, atrás de mim e Snow, seguimos pelo caminho inverso ao qual íamos, para não termos mais encontros indesejados em nosso pequeno longo trajeto.
Era estranho andar com eles. Na verdade, era algo novo e que não estava nos nossos planos. Mas, quem diria que tudo isso iria acontecer? Às vezes, alguns imprevistos assim acontecem para um bem maior; ao menos era assim que eu pensava.
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