O Acidente - Parte 7
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A morte de minha vó foi um divisor de águas para mim. Antes eu não pensava em morte como algo ruim. Antes, vivi como uma criança nada de diferente das demais. Antes, nunca havia tido qualquer problema médico ou conhecido uma psicóloga. Depois, tudo mudou. Quando presenciei sua morte, vi algo que demorei a contar para alguém. Após exalar o último sopro de vida, notei uma sombra rubra pairando sobre vovó. Possuía a silhueta de um homenzarrão, com mãos compridas e tronco grosso, quase o vi com nitidez. Ele ria, ria para as próprias mãos na presença da morte da minha vó. Então, reparei no pescoço dela, havia duas marcas em formato de mãos como sangue ali. Ele havia esganado ela até a morte.
O laudo médico veio com a causa mortis: edema agudo de pulmão. Bem, isso explicaria em termos científicos a morte, mas não para mim. Aquilo estava incompleto. Cada dia tinha mais certeza disso. Pois, aquele vulto continuava ali, rodou pessoa por pessoa durante o funeral. Algumas vezes, o enxerguei parado frente ao caixão por horas como se contemplando o próprio feito.
Após o enterro, sua presença se dissipou. Entretanto, outras apareceram. Comecei a ver vultos quando andava de carro; ao passear pelo parque, e até na escola. Uma vez me apareceram durante a noite. Eu acabara de acordar de um pesadelo aos gritos, quando acendi o abajur na cabeceira para afastar um pouco o medo e dei de cara com outras duas criaturas. Um casal permanecia deitado ao meu lado, possuíam a mesma aparência rubra e faces mortas. Tentaram de agarrar com seus braços berrando algo inaudível, porém, não o conseguiram porque saí correndo dali o mais depressa até o quarto de meus pais.
Dias depois fui parar num consultório de psiquiatria e logo mais, num de psicologia. Uma angustia tomara meu peito e me consumia todos os dias, me tirando as forças, o apetite e os prazeres da tenra idade. No início, as medicações surtiram efeito, mas depois vieram as crises, poderosas e assustadoras como um raio.
...
— Que espíritos. Eu nunca vi espirito nenhum! — Menti, ainda assombrada com a pergunta de Yosaka.
— Sinto medo e desconfiança em você. — disse ele — Também sinto uma amargura profunda. Acho que não devia ter começado tão direto assim. Me desculpe, Ayla. Me chamo Yosaka Tanaka, sou psiquiatra e também, médium. Assim como acredito que você seja.
Ele falava como se fosse óbvio, porém, de maneira educada. Não era a primeira vez que havia escutado sobre médiuns, mas sempre evitei procurar saber sobre esses assuntos envolvendo espíritos ou qualquer coisa relacionada à morte. Pensei que dessa maneira, poderia evitar novas crises, e até que funcionou... Bem, funcionou até eu testemunhar uma dezena de mortes na minha frente.
— Já te disseram isso alguma vez? — Continuou ele como se fosse uma conversa normal.
— Não... — Foi o que eu disse por um tempo. Então, continuei. — Mas eu não acho que seja médium, sempre tive crises de ansiedade e algumas visões na infância. O senhor deve tá confundindo. Alias, sou muito católica, e é melhor não falar isso na frente da minha mãe. Teve sorte de pedir pra ela sair.
Soltou uma gargalhada que até encheu um dos olhos de lágrimas. Yosaka era um cara bem alegre, tivera diversas experiências na vida, aquela conversa para ele não tinha nada de intimidante ou trivial. Ele falava sério, compreendi isso em sua próxima fala.
— Se não é médium, como viu aquele espírito ontem sobre sua colega de quarto? Quase o chamou se eu não tivesse impedido. Ou será que não se recorda do meu concelho? Eu disse: não olhe para aquilo. Mas você olhou, então, o espírito partiu contra você e causou a crise. Por sorte, não causou mais que isso.
Fiquei boquiaberta, fiz cara de sapo morto e não consegui dizer mais nada por um tempo. Quando tinhas minhas crises, sempre me esforcei para esquecer os pensamentos e visões do momento. Ignorava-os completamente. Só ousava a falar daquilo com a psicóloga quando insistia.
— Você foi tratada como eu, não é mesmo? Um louco que precisava de remédios para não ver coisas. Ninguém nunca experimentou falar conosco de espiritualidade. Eu sou sua chance, Ayla Talvez a única. Posso te esclarecer muitas coisas, responder suas perguntas... Só precisa responder as minhas...
Ele era mesmo um médico? Pensei. De qualquerforma, dizia coisas bem interessantes, até bizarras, mas interessantes.
— Não entendo do que o senhor está falando. Também não sei se pode me ajudar com isso. Eu não via espíritos, só tinha alucinações. Se fossem espíritos, os remédios não iriam fazer desaparecer. — Tentei argumentar contra ele, mas querendo mesmo fugir do assunto que me assustara.
— Se você separar os fenômenos físicos dos espirituais, pode se confundi. Medicações que alteram circuitos cerebrais, alteram também ondas e suas vibrações. Por isso, medicações podem sim, atrapalhar a mediunidade e retirar suas visões de espíritos...
Mantive-me em silêncio. Passeei o olhar de um lado para o outro tentando fingir demência, porém, não tinha funcionado com ele.
— Vamos fazer o seguinte, eu te permito me fazer três perguntas que responderei. Então, faço três perguntas que você responderá. Se depois disso, não quiser mais falar comigo, eu vou embora e fingimos que nunca falamos de espíritos. Tudo bem?
Uma parte de mim queria dizer: não, não quero falar de espíritos. Você não tem ideia do que passei ontem, vá embora! Entretanto, a outra parte parecia estar vislumbrada com aquele oriental curioso que falava de coisas bizarras na maior naturalidade.
— O que é um médium? Por que o senhor é um? E por que eu sou?
— Essas são suas três perguntas, tem certeza? — Pensei melhor depois da devolutiva dele.
— Eu queria saber como é isso de ser médium?
— Agora você elevou a outra dimensão. — sorriu — Médiuns são pessoas dotadas com habilidades de se intercomunicar com o mundo espiritual. Todos possuímos mediunidade, porém, poucos desenvolvem a tal ponto de ver ou se comunicar com espíritos. A maioria nasce já com algumas habilidades, outros desenvolvem após algum trauma, como eu. Basicamente isso, eu poderia devagar por horas, mas não quero gastar seu tempo... Minha vez — disse sorrindo, apoiando o indicador no queixo —, desde de quando vê espíritos?
Ainda estava insatisfeita, mas tinha feito um acordo com aquele senhor. Então, decidi responder, mesmo não acreditando muito naquilo.
— Acho que desde os sete anos. Foi quando minha vó faleceu, achei ter visto algo por cima dela, como uma sombra de um homem, ou sei lá..
— Entendi. — Cruzou os braços e fez um gesto de satisfeito. — Faz sentido, situações de morte assim podem precipitar a mediunidade. Como ainda estava muito imatura, o espírito te pareceu apenas uma sombra. Acredito que hoje conseguiria vê-lo com perfeição. Sua vez!
— Como o senhor sabe que vi um espírito ontem à noite se não estava aqui? Disse que eu ouvi sua voz, não faz sentido. — Isso só o fez alargar o sorriso, eu parecia uma aluna lhe fazendo as perguntas certas.
— Eu estava, mas você não pôde me ver porque seu espírito estava fixado naquele outro. Se eu não tivesse intercedido, ele poderia ter partido contra você. Um dos atributos da mediunidade é a projeção astral, divagar o espírito para longe do corpo físico e adentrar no mundo espiritual. Eu estava em espírito, não em corpo. Isso me leva a próxima pergunta. Alguma vez, um espírito chegou a te ferir de verdade? Como um corte, ou algo parecido.
— Que eu saiba, não.
A resposta foi simples, mas nada fácil de dá-la. Aquilo me fez lembrar das garras da criatura de ontem perfurando meu abdome, dos sonhos de infância com pessoas parecidas com zumbis me agarrando e me fazendo ter diversos pesadelos. Contudo, aquilo nunca resultou em achados físicos, eram apenas ferimentos psíquicos.
— Isso é bom. — disse ele — Espíritos não podem nos ferir fisicamente, isso seria ultrapassar a barreira vibratória que nos separa. Por isso, perguntei. O espírito de ontem, mesmo parecendo estar ferindo mesmo a paciente, na verdade, ele apenas a estava influenciando em sua energia espiritual, causando perturbações psíquicas. No entanto... — Seu semblante ficou sinistro, o sorriso desapareceu instantaneamente. — Aquilo não deveria ter causado as convulsões. É preciso muita energia para isso, algo extremamente raro. Ou pelo menos, assim o era. Infelizmente, não cheguei a tempo de ajuda-la, mas consegui impedi que o espírito pulasse contra ti e ficasse obcecado. Bem... Sua última pergunta agora.
— O que você quer de mim, mesmo?
Lancei a pergunta com fúria. Aquilo já estava me desagradando muito. Cansada, com dor de cabeça e ainda ouvindo bobagens sobre espíritos e médiuns. Quem ele pensa que é para ficar fazendo isso com uma pessoa logo após sobreviver a uma catástrofe como a que passei?
— Sua pergunta casa perfeitamente com a minha próxima. Ayla — Encarou-me com destreza. —, queria que se tornasse uma médium comigo. Por isso, te pergunto: quer se tornar uma médium de verdade?
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