Prólogo
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Prólogo:
NASCIDA NO INVERNO
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TUDO COMEÇOU COM UM NASCIMENTO, quando o jovem reino nomeado Astana estava coberto de neve.
Era noite, mas o céu se encontrava iluminado pelas estrelas, sem uma nuvem que as ocultassem. As folhas e a terra estavam congeladas, assim como os rios, riachos e lagos; o mundo parecia imóvel e silencioso, como se houvesse sido completamente abandonado, como se todas as criaturas vivas estivessem segurando a respiração. Gelo cobria as ameias de Stormvirki, a Fortaleza da Tempestade, onde os reis haviam se instalado para que seu herdeiro pudesse nascer. O inverno dera trégua para a guerra que Astana travava com Carmago, reino que erguera exércitos em ofensa primeiro.
E, no quarto, rainha Anna Vinter de Gralana gritava.
Rainha Anna gritava cada vez mais alto, e seus gritos ecoavam por toda fortaleza. Rei Henrik se erguia em um pulo de seu assento perto do fogo, com o coração acelerado, esperando que a qualquer momento fosse receber a notícia de que seu herdeiro havia nascido. Quando percebia que tal notícia ainda não viria, voltava a sentar na poltrona, com o cobertor de peles sobre os joelhos e o queixo apoiado na mão, encarando as chamas da fogueira acesa no salão.
Os homens que ali se encontravam respeitavam o silêncio do rei. Valdi Falkásson, Jarl de Sjóleið e senhor daquela fortaleza, dividia sua atenção entre o fogo, os gritos, e seu filho de seis anos que estava quietinho sentado no chão, com alguns brinquedos de madeira. Desviando os olhos do menino, trocou um olhar preocupado com Snorri Jonsson, um padre que tinha por volta de quarenta anos e estava ali por insistência da rainha, já que ele a vira crescer; ambos sabiam o quão importante era que a criança nascesse e vivesse: em um período de guerra, um filho era o tesouro mais precioso que o rei poderia conseguir, pois garantiria sua linhagem caso viesse a morrer em batalha.
Foi Dan Bjornsson — um cavaleiro de cabelos e olhos escuros, amigo de infância do rei — que se aproximou e externou, em um murmúrio para que Henrik não ouvisse, o que ambos os homens estavam pensando.
— O trabalho de parto está durando horas... Espero que tudo esteja bem.
— E está, — Valdi murmurou de volta — caso contrário teríamos sido notificados. Anna é forte.
— Porém, tem sangue francês - o cavaleiro continuou — Que Deus tenha piedade, mas o sangue francês é fraco.
— Sim, mas a rainha é forte — o Jarl voltou a repetir, apertando os lábios.
Padre Snorri começou a rezar em sussurro, torcendo o crucifixo nas mãos, de olhos fechados; Valdi quase se juntou a ele em sua prece, mas quando os gritos recomeçaram, apertou a ponte do nariz, sentindo-se tenso. No fundo, temia que Dan Bjornsson estivesse certo ao mesmo tempo em que recriminava-se por sua falta de fé. Observou novamente seu filho, que mantinha a cabeça baixa enquanto fazia um cavalo de madeira avançar contra o outro.
— Pelos céus, para onde Henrik foi? — Dan exclamou, fazendo o padre parar de rezar e Valdi ter um sobressalto.
A poltrona perto do fogo, onde Henrik estivera sentado e quieto, agora estava vazia como se nunca tivesse sido ocupada.
Não havia sinal do rei.
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Em um dos quartos, Anna ofegava pela dor e medo; os olhos chorosos mal se abriam e os cabelos loiros colavam em seu rosto e pescoço, ambos molhados de suor, gemidos escapavam por seus lábios. Senhora Inga Talvi, mãe de Henrik, enxugava o rosto da rainha, enquanto Margrethe jogava um punhado de artemísia no fogo; a erva não possuía cheiro doce, entretanto, seu efeito purificador não poderia ser questionado.
Margrethe era uma mulher de rosto bonito e severo, com grandes olhos azuis e cabelos castanhos sempre presos na altura da nuca; era esposa de Dan Bjornsson e uma excelente curandeira.
— Anna! — a voz de Inga estava firme, forçando a mulher sobre o leito a olhá-la — Seu filho quer nascer, e ele deve nascer vivo. Eu imploro, Anna, seja forte agora como é no trono!
E a rainha foi.
O urro dado por Anna naquele momento foi mais alto do que todos os anteriores, como um grito para que todos os mortos se erguessem. A criança veio, e Margrethe a entregou enrolada em uma manta para Inga, enquanto cortava o cordão umbilical.
Inga ergueu as sobrancelhas, vendo que o primogênito de rei Henrik e rainha Anna era uma menina. Uma linda princesinha, que agora parava de chorar e a encarava com os grandes olhos cinza azulados.
— Segure sua filha — o tom de senhora Inga agora estava gentil, e entregou a criança aos braços de Anna — Uma linda princesa real.
— Ela tem os olhos de Henrik — a rainha falou, deixando um breve riso passar por seus lábios, apesar das lágrimas.
— Qual será o nome? — Margrethe perguntou, sorridente, ainda com as mãos ensaguentadas.
Anna hesitou por um momento; talvez não houvesse cogitado a possibilidade de ter uma filha no lugar de um filho.
— Artemisia — sussurrou, encarando a recém nascida com um leve sorriso.
— Artemisia? — Inga riu — Como a erva?
— Não. Como a rainha que lutou em Salamina — seu sorriso aumentou — E seu segundo nome será Demetria, em homenagem ao pai de Henrik. Artemisia Demetria.
— Dois nomes gregos para uma princesa nórdica? Artemisia Demetria... — repetiu Inga em um tom de aprovação — Um nome forte para uma criança forte. Essa menina realizará grandes feitos, mesmo que não venha a herdar o trono. Veja como seus olhos são ferozes mesmo tendo acabado de nascer!
Anna respirou fundo, sentindo um calor agradável no coração; Margrethe agora jogava alecrim ao fogo, fazendo um aroma agradável tomar conta do ambiente. Sentia-se calma agora.
Nenhuma dor era maior do que a alegria que sentia ao finalmente segurar a filha.
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O vento não estava forte, apenas gélido o suficiente para fazer cada inspiração ser incômoda. Henrik exalou o ar pela boca, observando a forma com que seu hálito virava névoa e era soprado para longe; remexeu os dedos e em seguida esfregou as mãos, tentando aquecê-las, embora estivesse com luvas de peles que também forravam o interior de suas vestes e seu manto. Parecia-lhe que aquele estava sendo o inverno mais frio que já havia visto, e sabia que o sol demoraria algumas semanas para se erguer com toda sua luz e calor acolhedor.
Invernos no norte eram sempre escuros, devastadores e tão frios quanto a morte; os nórdicos sabiam sobreviver a eles.
— O senhor não deveria estar nas muralhas, meu rei — disse padre Snorri Jonsson, parando à alguns passos de distância, em sinal de respeito.
Henrik balançou a mão enluvada como se mandasse Snorri se retirar e franziu os lábios; os reis em Stór Eyja eram cristãos e batizados desde que o cristianismo chegara na Grande Ilha faziam séculos, mas o rei não via com bons olhos os membros do clero, não havia muita simpatia por eles em seu coração. Porém, estava aprendendo a ser cada dia mais tolerante com a presença de Snorri, visto que Anna tinha grande apreço pelo padre.
Disfarçadamente, colocou a mão sobre o peito onde, por baixo das vestes, tinha o colar do qual pendiam o Mjolnir e a Cruz, que pertencera ao seu pai; não sabia no que acreditar, então optou por honrar a ambos e não acreditar em nenhum, ao menos por enquanto.
Um vento frio e forte soprou subitamente, e lobos uivaram ao longe, como se conversassem entre si. Henrik ergueu o olhar, observando a forma como o céu havia se tornado nebuloso; seria possível que Odin estivesse liderando sua caçada selvagem e naquele momento passando por ali? Estreitou os olhos e balançou levemente a cabeça, não era mais criança para pensar em contos fantásticos.
— Henrik! Henrik! — Dan Bjornsson surgiu nas muralhas, gritando, com um grande sorriso no rosto — Nasceu! Anna deu à luz!
Padre Snorri ergueu as mãos, proclamando uma benção, enquanto o rei respirava fundo e sorria.
- Agora sim temos os Reinos de Asteria e Gralana unidos oficialmente - falou - Finalmente temos o Reino de Astana.
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