Capítulo 07: Sob o Véu das Aparências
Alyssa estava aproveitando seu raro dia de folga cercada por seus amigos mais próximos. O apartamento dela, iluminado pela luz suave da tarde, era um refúgio acolhedor e estiloso, com móveis modernos e uma vista espetacular da cidade. As paredes verde musgo, adornadas com obras de arte contemporâneas, refletiam seu gosto eclético. A música suave tocava ao fundo, criando um ambiente descontraído, enquanto o aroma delicado de velas aromáticas de baunilha preenchia o ar, adicionando uma camada extra de serenidade. O sol lançava um brilho dourado pelos vidros amplos, banhando tudo em uma luz cálida e reconfortante, como um abraço invisível da própria natureza.
As cortinas de linho branco balançavam levemente com a brisa suave que entrava pela varanda entreaberta, trazendo consigo o sussurro distante da cidade dos anjos. Plantas verdes exuberantes em vasos de cerâmica adicionavam um toque de vida e frescor ao ambiente, contrastando perfeitamente com os tons neutros e elegantes da decoração. Cada detalhe do apartamento parecia escolhido a dedo para refletir a personalidade de Alyssa: sofisticada, porém acolhedora; moderna, mas com uma alma profundamente enraizada na simplicidade e na beleza natural.
Kiara, uma jovem designer de olhos amendoados brilhantes e uma personalidade vibrante, estava sentada no sofá com uma taça de vinho branco na mão, o reflexo do líquido dançando sob a luz ambiente. Ao seu lado, Finn, um aspirante a rapper com um estilo único e um sorriso contagiante, ria de uma piada que acabara de contar, sua energia exuberante enchendo o espaço com uma vibração positiva e envolvente. Alyssa se sentia grata por tê-los ali; seus amigos sempre sabiam como levantar seu ânimo e transformar até os dias mais nublados em momentos de pura alegria e conforto.
— Então, Aly, como você está sendo hoje? — Kiara perguntou, com um olhar preocupado, mas gentil.
Ela sabia que a última semana havia sido tumultuada para a amiga, especialmente depois do beijo inesperado com Aaron na noite anterior. Quando Alyssa mandou mensagem no grupo do trio essa manhã dizendo que precisava vê-los urgentemente, tanto Finn quanto Kiara desmarcaram seus compromissos para comparecer ali naquela tarde. Ambos moravam em Sacramento, mas alugaram um carro para ir visitá-la.
Alyssa suspirou, colocando sua taça de vinho na mesa de centro e se recostando no sofá.
— Ainda estou tentando processar tudo, Ki. Parte de mim está furiosa com Aaron por ter feito isso, mas outra parte... não consegue parar de pensar naquele maldito beijo. Foi intenso, sabe?
Finn, que estava sentado no chão mexendo em uma batida no laptop, levantou o olhar curioso.
— Intenso do tipo "eu quero mais" ou "nunca mais na vida"?
Alyssa riu, apreciando a leveza que Finn trazia para qualquer situação.
— Um pouco dos dois, eu acho. Foi inesperado, pensei que eu iria odiar já que odeio ele, mas eu acabei por sentir algo que não sinto há muito tempo.
Kiara deu um gole em seu vinho, pensativa.
— Aly, você tem todo o direito de estar confusa. Faz cinco anos que você não se envolve com ninguém e esse tipo de coisa mexe com a gente mesmo, nosso corpo sente falta de calor humano. Mas você também precisa pensar no que você quer. Aaron faz parte do seu passado conturbado e do seu presente agora. Talvez seja hora de descobrir como ele vai estar no seu futuro.
Finn assentiu vigorosamente.
— E não deixe ninguém te pressionar a decidir nada antes de você estar pronta. Tipo, se você quer beijar o cara de novo, faça isso por você e pela sua amiguinha solitária aí embaixo, e não por ele ou por qualquer outra pessoa.
Alyssa riu, sentindo-se aquecida pelos conselhos dos amigos.
— Vocês são os melhores, sério. Eu não sei o que faria sem vocês.
— Nada... provavelmente, — brincou Finn, arrancando risos de todos.
A conversa continuou fluindo naturalmente de um tópico para outro, falaram sobre a mixtape que Finn estava trabalhando, chegando a ouvir algumas das músicas, sobre alguns projetos em que Kiara estava trabalhando, incluindo nisso os seus ficantes, mas sempre voltando ao dilema de Alyssa. Eles sabiam que, independentemente do que ela decidisse fazer em relação a Aaron, estariam lá para apoiá-la.
— Honestamente? Eu só quero ser feliz. — Alyssa disse finalmente, olhando para seus amigos com sinceridade. — E eu quero tomar a decisão certa, mesmo que não seja a mais fácil. Estou cansada de me sentir perdida.
Kiara pegou a mão de amiga, apertando-a com carinho.
— Você vai encontrar o seu caminho, amiga. Nós estaremos aqui para garantir isso.
Alyssa respirou fundo, sentindo-se mais forte e mais confiante com o apoio dos seus melhores amigos. A tarde continuou com risos, histórias e promessas de amizade eterna, enquanto Alyssa lentamente começava a acreditar que, com amigos como esses ao seu lado, poderia enfrentar qualquer coisa que o futuro trouxesse.
— Vocês se lembram daquela vez que nos perdemos no deserto a caminho daquele festival? — Lembrou Kiara, rindo. — Achei que nunca íamos encontrar o caminho de volta, mas a Aly ficou tão calma. Ela nos manteve unidos.
— É verdade. — Finn concordou, com um sorriso nostálgico. — E foi você, Alyssa, que avistou aquele velho posto de gasolina. Nunca vou esquecer a sensação de alívio quando finalmente vimos aquelas luzes.
Alyssa riu, sentindo o calor das lembranças.
— Acho que isso só prova que juntos somos invencíveis. Não importa o que aconteça, sempre vamos encontrar uma maneira de sair das situações mais complicadas.
Eles continuaram a compartilhar memórias e a fortalecer os laços que os uniam, o som de suas risadas enchendo o apartamento em sincronia com o ritmo de bossa nova. A energia entre eles era tranquila e amorosa, uma corrente de apoio mútuo que os fazia sentir invencíveis. A amizade deles era uma rocha sólida em um mar de incertezas, algo que Alyssa apreciava mais do que nunca.
De repente, o som de batidas na porta interrompeu a tarde tranquila. As risadas cessaram instantaneamente, e todos se viraram, surpresos. Alyssa franziu a testa, sem esperar visitas. Kiara e Finn trocaram olhares curiosos, enquanto ela se levantava lentamente para atender. Parte deles esperando ver um certo ator gostosão e uma cena de filme de romance se desenvolver.
Alyssa caminhou até a porta com uma sensação estranha no peito, seu coração batendo um pouco mais rápido a cada passo. Quando finalmente abriu a porta, seu mundo pareceu parar. Na soleira, com uma expressão enigmática e um olhar que transparecia determinação, estava Sarah. O choque tomou conta de Alyssa, deixando-a paralisada, incapaz de processar imediatamente a presença inesperada.
— Sarah...? — A voz de Alyssa saiu como um sussurro surpreso e confuso. Ela piscou algumas vezes, como se estivesse tentando se certificar de que não era uma ilusão.
Sarah, por outro lado, parecia completamente no controle, os olhos azuis fixos em Alyssa com uma intensidade que fez o ambiente parecer mais frio. Finn e Kiara se entreolharam ao sentir a tensão no ar.
Sarah entrou no apartamento de Alyssa sem pedir permissão, postura reta, queixo erguido, seus olhos varrendo o ambiente com uma mistura de desdém e determinação. A atmosfera mudou instantaneamente, e Alyssa sentiu que iria vomitar a qualquer momento. Percebendo a gravidade da situação, Kiara e Finn levantaram do chão e sentaram no sofá em silêncio, mas prontos para intervir se necessário.
Alyssa fechou a porta atrás de si, sentindo-se exposta e vulnerável diante da presença imponente de Sarah. Era a primeira vez que Sarah se dirigia a ela assim tão diretamente. Mesmo depois da controversa entrevista de cinco anos atrás, Sarah nunca se preocupou em falar com ela de forma privada para esclarecer as coisas. Essa visita inesperada era uma prova clara de que algo muito sério estava acontecendo.
— Eu vou direto ao ponto, Alyssa... — Sarah começou, a voz gelada e firme. — O que aconteceu entre você e o meu marido?
Alyssa hesitou, sua mente correndo para encontrar uma forma de evitar a verdade, mas a rispidez no olhar da loira a fez perceber que mentir seria inútil.
— Sarah, olha, eu não queria que nada acontecesse. Foi um momento de fraqueza, uma coisa inesperada, a gente bebeu... — começou ela, tentando encontrar as palavras certas.
— Não me venha com essa, Alyssa. Eu quero a verdade. Agora.
Sarah deu um passo à frente, estreitando os olhos.
Alyssa sentiu um nó na garganta.
— Sarah, eu não...
— Corta essa, garota! Aaron murmurou seu nome várias vezes enquanto estava bêbado. Não tente me enganar! — Sarah interrompeu, sua voz subindo de tom. — Quero ouvir da sua boca o que realmente aconteceu ontem.
Alyssa piscou, sendo bombardeada por novas informações. Aaron fez o que? Não teve tempo de processar isso, pois Sarah deu um passo em sua direção. Ela olhou para Kiara e Finn, procurando apoio, mas sabia que essa era uma situação que precisava enfrentar sozinha.
— Nós... nós nos beijamos. — Ela admitiu, a voz baixa e trêmula. — Apenas isso. Um beijo que não planejado. Eu juro.
Sarah sorriu, mas sua expressão se endureceu ainda mais.
— Só um beijo? Espera que acredite que só houve um beijo?
— Sim, pois é a verdade. — Alyssa abaixou a cabeça, envergonhada.
— Mesmo se de fato tiver sido só isso, você acha que um simples "não foi planejado" vai justificar algo?
— Foi um momento de confusão, estávamos bêbados, eu não sei o que deu em mim... nem nele. — A atriz se desesperou. — Não tem nada acontecendo entre a gente, foi apenas isso, eu juro!
Sarah deu mais um passo à frente, aproximando-se perigosamente de Alyssa.
— Você é uma intrusa, Alyssa McKay. Sempre foi. — Ela disse, a voz carregada de desprezo. — Acha que pode entrar na vida dele e destruir o que temos? Acha mesmo que pode tomar o que é meu de mim?
— Sarah, eu não estou tentando destruir nada. Eu nunca quis tomar ning... — Alyssa tentou se defender, mas o tapa que Sarah deu em seu rosto em seguida a deixou sem chão.
Kiara e Finn pularam do sofá e correram até ela, um de cada lado, protegendo-a de outros possíveis ataques e oferecendo conforto e apoio, mas Alyssa mal podia processar o que acabara de acontecer.
— Você acha mesmo que eu vou ficar parada enquanto você tenta roubar meu marido, vagabunda? — Sarah continuou, sua voz agora baixa e ameaçadora.
— Vamos manter a calma, senhora? — Finn falou, sendo ignorado pela loira.
— A calma acabou. Eu vou fazer você e o Aaron se arrependerem profundamente por esse beijo. Ele principalmente, por um dia ter ousado olhar dessa forma para alguém como você. Você me enoja, Alyssa. E ele vai enxergar isso. Eu vou garantir que ele veja e que rasteje de volta para mim.
Sem esperar uma resposta, Sarah se virou e saiu do apartamento, batendo a porta no caminho e deixando uma Alyssa atordoada e trêmula para trás.
— Você está bem? — Kiara perguntou, tentando ajudar a amiga.
— Eu não... eu não... sei.
Alyssa permaneceu imóvel por um momento, como se o impacto das palavras de Sarah fosse mais doloroso do que o tapa em si. As lágrimas começaram a cair silenciosamente, quentes e cheias de uma culpa que ela nem sabia ser capaz de carregar. Era como se uma tempestade tivesse explodido dentro dela, fazendo-a se afogar em pensamentos contraditórios.
Kiara a segurou pelos ombros, tentando firmá-la.
— Alyssa, escuta, você não fez nada errado. Quem devia qualquer coisa para ela era ele, não você. Sarah não tinha o direito de te tratar assim.
Mas Alyssa balançou a cabeça lentamente, olhando para o chão como se procurasse respostas.
— E se ela tiver razão? — Sua voz saiu cortada entre os soluços.
Finn se ajoelhou ao lado dela, sua expressão suave e reconfortante.
— Ei, escuta, Aly. Não se responsabilize pelas escolhas de outras pessoas. Você não pediu para ficar balançada. E Aaron... bom, ele não é exatamente uma vítima, certo? Foi ele quem te beijou.
— Mas eu poderia ter evitado isso. — Alyssa insistiu, sua voz agora cheia de emoção. — Eu sabia que ele era casado e mesmo assim... eu deixei acontecer. Eu deixei esse beijo acontecer. — Sua voz quebrou no final, e mais lágrimas escorreram por seu rosto.
Kiara trocou um olhar rápido com Finn antes de puxar Alyssa para um abraço apertado.
— Você é humana, amiga. Comete erros, sente coisas. Isso não te faz uma pessoa má. Não deixa o que a Sarah falou te definir. Você tem o direito de ser feliz, de viver sua vida.
Alyssa afundou no abraço de Kiara, sentindo-se segura, mas ainda com o peso esmagador da culpa sobre seus ombros. Era como se estivesse presa em um labirinto de escolhas ruins e consequências piores. Deveria ter empurrado ele, sabia disso antes e tinha certeza disso agora, aquele beijo tinha sido um erro terrível.
Enquanto tentava controlar o choro, uma nova determinação começou a crescer dentro dela.
— Eu preciso arrumar isso, — murmurou, mais para si mesma do que para os outros. — De alguma forma, eu preciso fazer o que é certo.
Kiara e Finn apenas se entreolharam, tentando entender o que exatamente a atriz queria dizer com aquilo.
Enquanto isso, Sarah entrava em seu carro e acelerava pelas ruas de Los Angeles, a raiva fervendo dentro dela. Ela gritou alto, estremecendo e batendo suas mãos contra o volante do carro. Cada pensamento era uma punhalada, lembrar de Aaron sussurrando o nome daquela mulherzinha inconscientemente a enchia de ódio. Ela prometeu a si mesma que Aaron se arrependeria, que ele pagaria caro por sua traição. Mas se separar não era uma opção. Agora, ou nunca. Ela estava determinada a recuperá-lo e ter novamente o controle sobre ele como sempre teve, desde que o conheceu.
Dirigindo com fúria no coração e mente, Sarah tomou uma decisão drástica. Sem hesitar, ela virou o volante e jogou o carro contra um poste de luz na estrada, o impacto ressoando como um trovão na noite silenciosa. A dor imediata era intensa, mas a sensação de controle, de estar arquitetando sua vingança, era ainda mais forte. Ela sabia que isso faria Aaron voltar para ela, e estava disposta a fazer qualquer coisa para que isso acontecesse.
No momento em que Sarah se viu sentada no carro, o peito ainda arfando com a mistura de adrenalina e dor, e sangue escorrendo de sua testa, um turbilhão de lembranças a envolveu, levando-a de volta a um tempo distante, há dezessete anos atrás.
Era uma manhã de verão quente e abafada em Los Angeles. O sol brilhava forte no horizonte enquanto Sarah caminhava pelas ruas movimentadas, o coração cheio de expectativa e ansiedade. Ela acabara de se mudar do interior de Ohio para a Califórnia, determinada a conquistar seus sonhos e deixar para trás o passado difícil que a assombrava.
Distraída, olhando as vitrines das lojas de marca famosas na rua, ela esbarrou contra o corpo de alguém e derrubou os livros que segurava contra o corpo. Foi então que ela o viu. O lindo jovem com seu sorriso cativante e olhos brilhantes em quem havia esbarrado. Ela mal podia acreditar na coincidência quando seus olhares se encontraram, e algo mudou dentro dela no mesmo instante.
O coração de Sarah começou a bater mais rápido enquanto ela observava o rapaz se abaixar para ajudá-la a pegar os livros. Seu sorriso caloroso e o olhar inocente transmitiam uma sensação de conforto e familiaridade que a deixava sem fôlego. Ela mal conseguia acreditar na coincidência do encontro, como se o destino estivesse tecendo seus fios invisíveis para uni-los naquele momento.
Enquanto recolhiam os livros, suas mãos se tocaram brevemente, enviando uma corrente elétrica através de Sarah. Ela se viu perdida em seus olhos verdes por um instante, sentindo-se hipnotizada pela intensidade do seu olhar. Em um instante fugaz, ela soube que esse encontro mudaria sua vida para sempre.
Aquele jovem rapaz era mais do que apenas um estranho gentil; ele era uma promessa de algo mais, uma oportunidade de escapar do passado e abraçar um futuro cheio de possibilidades. Sarah sentiu uma sensação de destino iminente, como se estivesse sendo guiada por uma força maior em direção a ele.
À medida que os livros foram recuperados e devolvidos às mãos de Sarah, ela se viu relutante em se separar dele. Ela queria prolongar aquele momento precioso, afundar-se na aura reconfortante do jovem que futuramente ela descobriria se chamar 'Aaron'. Mas o tempo era implacável, e com um simples e educado aceno de cabeça, ele se despediu dela e continuou o próprio caminho.
— Me desculpe, senhora, estava distraído.
Sarah suspirou, observando-o ir até uma roda de amigos do outro lado da rua e entrar em um prédio logo à frente. Ela olhou para cima, encarando o nome do lugar. "Escola Privada Golden Crest". Ela piscou, percebendo que o destino a havia ajudado, mas não tanto assim.
Enquanto Sarah continuava sua jornada pelas ruas movimentadas de Los Angeles, ela não conseguia tirar o rapaz de sua mente. Era como se ele tivesse deixado uma marca em brasa em seu coração, uma promessa de esperança e renovação que ela não podia ignorar. Teria que voltar mais vezes àquele bairro. Descobrir sua rotina, seu nome, sua família, o que fosse. Só sabia que faria qualquer coisa para mantê-lo em sua vida, custasse o que for.
Nos dias que se seguiram, Sarah encontrou desculpas para visitar a mesma rua. Passava horas olhando vitrines, esperando vê-lo novamente. Eventualmente, memorizou o horário em que a escola abria e fechava e passou a ajustar seu horário para sempre estar lá. Seu coração batia mais rápido toda vez que via alguém parecido com ele. Mas nunca o via chegar ou sair do prédio. Desconfiava de que ele estava dentro de um dos vários carros luxuosos que iam e viam pela entrada de veículos, mas não tinha como ter certeza. Apenas torcia para que novamente, os seus esforços fossem recompensados.
Até que semanas depois, finalmente sua persistência deu frutos. Ela o viu entrando em uma livraria pequena e aconchegante daquele bairro. Sarah não perdeu tempo e entrou logo em seguida, fingindo interesse nos livros enquanto o observava de longe. O cabelo perfeitamente bagunçado, o uniforme da escola escondido debaixo de vários casacos, os olhos curiosos. Sarah sorriu sozinha ao acha-lo adorável.
Ele parecia à vontade ali, conversando com o livreiro como se fossem velhos amigos, apesar da clara diferença de idade. Isso a agradou. Sarah se aproximou lentamente, pegando um livro aleatório da prateleira. Seu coração disparou quando ele se virou e a viu.
— Ei, você de novo, — disse ele, surpreso. — A gente se esbarrou outro dia, a senhora lembra?
— Sim, lembro, — Sarah respondeu, tentando manter a calma. — É uma coincidência engraçada.
— Sim. Você gosta de livros? — Ele perguntou, genuinamente interessado.
— Adoro, — afirmou ela sem hesitar. — Seja Joseph Conrad, Faulkner ou Nabokov, eu estou sempre procurando algo novo para ler.
O garoto parecia impressionado. Sarah pensou em como as meninas da turma dele poderiam estar mais interessadas em redes sociais e likes do que em literatura. E por isso, ela se destacaria.
— Que ótimo! Tem alguma preferência? Romance, ficção científica, mistério? — Perguntou ele, sem reconhecer os autores citados.
— Romance, definitivamente, — ela sorriu, esperando que a resposta fosse o suficiente para manter a conversa.
— Eu também curto um bom romance, tipo A culpa é das estrelas, — ele disse, pegando um livro da prateleira. — Mas ultimamente me vejo obcecado por histórias de zumbis, — ele riu de si mesmo. — Minha mãe diz que isso vai passar e que eventualmente eu irei me apaixonar por biologia como ela, mas por enquanto, estou nessa. Esse é um dos meus preferidos.
Sarah pegou o livro que ele ofereceu, sentindo a eletricidade de seus dedos quando tocaram brevemente.
— Obrigada. Vou dar uma olhada com certeza.
A conversa continuou por mais alguns minutos, até que Aaron mencionou que precisava ir.
— Foi bom te ver de novo, senhora. Nos vemos por aí.
— Tenho certeza que sim, — respondeu ela, tentando conter a animação dentro de si. — Eu me chamo Sarah, aliás.
— Aaron.
Quando ele saiu, ela sentiu uma onda de determinação. Já não era apenas uma atração passageira; ela estava decidida a fazer parte da vida dele.
Nos meses seguintes, Sarah se dedicou a estar nos lugares que Aaron frequentava, aproximando-se dele de forma calculada e intencional. Ela fez amizade com pessoas do círculo social dele: o simpático livreiro da loja que ele frequentava, atendentes de padarias próximas, professores da escola, até finalmente, um ano após o encontro acidental na rua, ela conseguir fazer amizade com a mãe dele ao ingressar em uma exclusiva classe de yoga que a mulher frequentava. Gradualmente, Sarah ganhou a confiança das pessoas ao redor de Aaron, tornando-se uma presença constante e familiar em sua vida.
Seu esforço meticuloso e persistente valeu a pena. Em pouco tempo, Sarah e Aaron se tornaram inseparáveis. Sarah sabia que queria Aaron ao seu lado para sempre. Mas seu desejo ia além da mera companhia; ela estava determinada a mantê-lo em sua vida a qualquer custo. Manipular situações e pessoas tornou-se uma segunda natureza para ela, desde que garantisse que Aaron nunca a deixasse.
Aaron, inocente quanto as intenções meticulosas dela, foi se apaixonando cada vez mais por ela. Seu charme, inteligência e aparente empatia o atraíram profundamente. Ela era sempre uma constante em sua vida, enquanto seus pais, ambos médicos renomados, pareciam estar sempre ocupados demais para ele.
Eles compartilharam momentos especiais como piqueniques no parque, noites de filmes e conversas longas sobre sonhos e aspirações. Sarah era a companheira perfeita, sempre presente, sempre compreensiva, muito mais madura do que qualquer outra garota do nono ano, e o mais importante: sempre ali para ele.
Enquanto Sarah se infiltrava cada vez mais na vida de Aaron, ela também monitorava qualquer ameaça potencial ao seu relacionamento. Amigas antigas dele foram gradualmente afastadas, sempre de forma sutil, sem que Aaron percebesse. Ela estava determinada a ser a única mulher na vida dele, e nada, nem ninguém, a impediria.
Com o tempo, a relação deles se solidificou. E ao completar dezoito anos e se formar da escola, três anos após esbarrar com Sarah naquela rua, Aaron a pediu em casamento após descobrir que ela estava grávida. E Sarah, triunfante, aceitou com um sorriso radiante no rosto. Eles se casaram em uma cerimônia discreta e sozinhos, já que os amigos e familiares de Aaron repreendiam duramente o relacionamento. Para Aaron, era um conto de fadas se tornando realidade; para Sarah, era o resultado de um plano cuidadosamente executado.
A vida de casados continuou com a mesma intensidade com a qual haviam namorado. Sarah investiu dinheiro para garantir que Aaron frequentasse cursos de atuação e continuasse a ser bem-sucedido em sua carreira, e sempre permaneceu ao seu lado, apoiando-o e controlando cada aspecto de sua vida pessoal e profissional. Chegando até mesmo a escolher quais papéis de filmes ele aceitaria.
Mas, à medida que os anos passaram, a verdadeira natureza de Sarah começou a emergir. O medo de perdê-lo unindo-se com a sua necessidade de controle se intensificou, e Aaron, cada vez mais maduro e seguro de si, começou a sentir o peso da manipulação constante.
Apesar de tudo, ela sabia que ele ainda a amava e queria acreditar que poderiam superar qualquer obstáculo juntos. Ela só precisava lembrá-lo disso. Com sorte, esse acidente cuidadosamente orquestrado poderia ser a chave para renovar o medo e a dependência emocional de Aaron em relação a ela.
Ela acelerou o carro, a adrenalina e o desespero nublando seu julgamento. O impacto foi violento, e o mundo de Sarah se apagou momentaneamente. Mas ao acordar na ambulância, seu plano começava a tomar forma. Ela sabia que Aaron correria para o hospital assim que soubesse do acidente. E lá, vulnerável e ferida, ela o teria exatamente aonde queria: preocupado, culpado, e, acima de tudo, aos seus pés.
As luzes da ambulância piscavam ao longe, como estrelas artificiais em um céu de asfalto, refletindo a complexa dança de poder que permeava as ruas da cidade. E no interior daquele frio veículo, enquanto a dor pulsava em cada fibra de seu corpo, Sarah sorriu, sabendo que às vezes era preciso destruir tudo para se manter no controle.
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