Capítulo 8.5° - Se morrer eu enterro
Stephanie Fearblood, vampira
O punho de Sam encontrou o antebraço de Stephanie sobre a esquerda da cabeça dela e o tronco da vampira mais nova pendeu na direção do movimento, os dentes cerrando e uma veia pulsando na têmpora. Não tenho a vantagem da força. Stephanie chutou no instante seguinte, perna esquerda rumo a barriga da tia. Sam aparou o golpe e com o braço defendeu-se do que veio em sequência contra sua têmpora sem que voltasse ao chão. A vampira sênior não moveu um centímetro sob os impactos. E o pé encontrou o centro do peitoral de Stephanie, pesado, rápido, pondo ar a sair violentamente por entre os lábios. A outra perna de Sam subira e começava a descer diagonal e velozmente.
Stephanie agachou, o movimento da tia raspou o topo da nuca, avançou, agarrou o pulso da vampira sênior, puxou-a para o lado e enterrou o joelho entre a costela e quadril de Sam. O estalo de impacto em carne soou alto, saliva e um grunhido escaparam a boca. E o joelho da vampira sênior voou contra Stephanie que o bloqueou com o próprio. A mais jovem engoliu um xingamento, a vibração do encontro percorreu-a o esqueleto.
O punho da tia foi a face da sobrinha que ergueu os braços. A porrada mandou a cabeça dela para trás, amassando o nariz atrás dos antebraços. O odor do próprio sangue chegou a Stephanie e o calor escorreu cavidades nasais abaixo, então os braços foram puxados para os lados e a testa encontrou testa violentamente.
Merda. O tronco da mais nova pendeu para trás, face foi para cima, coxas e panturrilhas tremeram. Tensionou mais os músculos, voltou a fitar adiante e socou. Punho atingiu a boca da tia e testa foi atinginda pelo dela.
— ... não acha melhor pará-las? - Antony.
— Samantha não vai matar Step - Will. Stephanie acertou um chute na bochecha da tia. - ...e se Samantha morrer eu enterro.
— Ouvi isso, seu esquisito desgraçado - Sam.
Os sequestrados estavam sentados à esquerda do vampiro e o mercador à direita. Era meio dia, estavam comendo sob o espetáculo.
— Acho que a menor leva - um dos resgatados.
— Ná, a maior acertou mais porrada - outro.
— Esse pão tá com um gosto estranho - um terceiro.
Samantha Fearblood havia concordado em não matar Antony, mas Stephanie teria que lutar decentemente para proteger a vida de seu... amigo? A vampira mais nova teria dito ''companhia de viagem'', mas minha tia talvez mudasse de ideia se a estima por ele soasse fraca.
Sam removeu os pedaços de armadura que tinha e a arma. Concordaram em um combate sem magia ou aço, só usando mana para reforço físico.
Fazia uma hora. Manchas vermelhas e roxas marcavam a pele de ambas, a respiração soava audivelmente, a altura dos braços baixara tenuamente e a dobra das pernas diminuira, golpes eram acertados com maior frequência e as roupas estavam encharcadas de suor.
Acerte mais rápido e então com força quando aparecer uma abertura. Stephanie chutou a perna dianteira da tia e socou uma e duas vezes rumo a cabeça dela, acertando a guarda erguida, então esquivou de um soco e foi arrastada para esquerda pelo impacto da canela de Sam no braço que pôs entre o golpe súbito e as costelas.
— Perdemos tempo demais - Will, duas horas mais tarde, pondo um raio a cruzar o espaço entre as duas. - Tem dois banhos prontos, depois vou checar seus ferimentos.
Elas pararam, arfando ruidosamente, a um braço uma da outra. O olho esquerdo de Stephanie sumira sob inchaço e sangue deslizava por cortes na face. A boca de Sam estava roxa e marcada por líquido rubro escuro, ambas as íris brilhando atrás de calombos.
Tia e sobrinha fitaram Will.
— Eu estava prestes a pôr essa moleca pra dormir - a vampira sênior.
Eu estava para terminar de reformar a cara dessa velha na porrada.
— ⚔ —
— Ela não vai esquecer que mataram Juventino, Sakamoto e a privaram dessas pessoas na carruagem - o mercador, o veículo em movimento e os dois cavalos sem cavaleiros seguindo aos lados.
— Ela apareceu na propriedade da minha família e saiu viva - William Fearblood, escova na mão e friccionada contra o cabelo de Stephanie. - A escória deve se contentar com isso.
O rosto da vampira ardia sob pasta curativa. O odor era café, menta e uma mescla floral doce e azeda. Mercador, Will e os cavalos tinham o cheiro atenuado pela substância. E o fedor do resto do mundo não chega, como se tudo além do bem próximo houvesse deixado de existir.
— Sim, claro, mas acredito que seja bom ficarem alert...
— Você só saiu vivo porque minha sobrinha intercedeu - Will, o medo surgiu na corrente sanguínea do mercador. As mãos de Stephanie fecharam sobre as coxas e uma gota de suor frio formou-se na têmpora. Consigo reagir se tentarem o matar agora? - Não gosto do seu tipo.
Antony engoliu em seco.
— Mommy é... - o licantropo.
— A líder de uma gangue de ladrões e ralé. Se esperta ficará em seu beco sujo - o vampiro, abrupto, o tom austero ligeiramente mais hostil.
Silêncio por dez e vinte e então trinta segundos. Stephanie suspirou. Espero que esse mercador idiota fique calado daqui para frente.
— ⚔ — ⚔
Quente. No terceiro dia, desde que encontraram os tios de Stephanie, avistaram a silhueta dos edifícios, uma linha de construções que seguia para a esquerda e direita até escapar da vista. Semiramis não tinha muralhas, aquilo são suas fronteiras e se estendem do mar oeste ao leste.
A vampira viera quietamente sentada no banco da carruagem. Mas estou suando e cada sopro de ar é melhor do que jamais foi.
— Rocinante traz um quilo e meio de pasta A7, três litros de sangue congelado e setenta moedas de ouro élficas. Arnaldo é um cavalo puro sangue, tem duzentos e trinta ex de prata, dez de ouro, duas espadas curtas, três adagas de bom aço e mudas de roupa - William, íris rubras fitando as de Antony. - Escolha.
O mercador piscou e de novo. A boca abriu, fechou, as pálpebras semicerram e subiram ao limite.
— Ah - ele soltou. - Arnaldo.
— Não - Samantha, montada no garanhão preto. - Arnaldo está comigo e as coisas aqui são minhas. Se resolva com quem tá oferecendo pagamento.
O rosto de traços suaves da vampira estava despido de sinais da luta com a sobrinha, assim como o da própria. Quando a boca de Samantha sarou ela elogiou a parente e disse que provavelmente a garota se sairia bem mesmo nas arenas de luta na Bélica. Stephanie corou e deixou de lado os pensamentos amargos que começara a nutrir pela recém descoberta tia.
— Ele ajudou Step, duvido que sem intenções de recompensa, mas não importa.
Stephanie ficou rígida. Estava na borda do assento do condutor, William a direita e Antony na outra ponta. A mochila com livro pairava no colo, leve, com os dedos da vampira enterrando-se em seu couro e a brisa fria raspando-lhe. Os olhos rubros penderam a esquerda, Rocinante trotava no ritmo da carruagem sobre terra, pedras e vegetação. E daí? Não é como se ele acabasse de trazer à tona uma ideia inédita. E-eu não... não ligo.
— Por mim um criminoso como ele estaria morto. A vida é toda recompensa que ganha por ter se aproveitado da inocência de uma garota - Sam, e soltou um curto riso. - Ele provavelmente se fez parecer um bom samaritano e quando chegassem a segurança falaria sobre compensação de tal modo que a pobre menina não só não veria mal em dar como ainda o teria gratidão.
Stephanie ruborizou tenuamente. Não é como se não houvesse pensado nisso no primeiro momento em que viu o mercador. Parar seu caminho para ajudar uma estranha? Continuar com isso sob o risco de virar inimigo do exército de uma das cidades mais poderosas do continente? Ir atrás dela quando foi arrastada para o covil de um necromante? E se fizesse não seria porque eu sou uma pessoa agradável. Ouro, recompensas. Talvez ele tenha um tanto de consciência ou algo contra os elfos para preferir não receber deles. Uma ardência súbita tocou o nariz da vampira, ela fungou e virou o rosto para o lado. O solo estendia-se longo e chapiscado de verde, pedras e pontos de flores até uma cratera há quinhentos passos do veículo. Topos de árvores ultrapassavam a borda do buraco e pela extremidade norte o brilho do sol refletia em água que seguia para dentro do desnível na terra.
''' Peee, Piii, Paa, o pequenino vou esfolar' entoara o trovão que era a voz do gigante. Virgulino correra de volta ao pé de cana, o desceu, reuniu um grupo de aventureiros para enfrentar o monstro e um deles soltou 'se pá é melhor derrubar isso enquanto o bundão tá no alto'. Foi o que fizeram.'' Um cantor entoara próximo às muralhas do castelo de Jaime Fearblood num dia fresco de verão e, agora, diante do marco explicado no livro de campo ''Dez Histórias Sobre o Lado Norte de Semiramis'', capítulo ́ ́Pé de Cana'', a melodia dele voltava antes que o texto do conto. A cratera era chamada de Cana por causa da história, mas sete outros livros mencionavam sua existência de cem a trezentos anos mais cedo do que os eventos da queda do gigante supostamente ocorreram.
Uma miríade de feras morava no local, herbívoros nos primeiros quilômetros, carnívoros na área média e monstros de rank três e dois próximos ao centro. Irei lá um dia... escolas de esgrima e magia testam seus alunos em Cana, se eu... se eu não tiver um papel em salvar o mundo, passar por aqui vai ser um bom passo para me tornar uma heroína reconhecida. Apertou a mochila um tanto mais e mordeu o canto do lábio inferior. Não é só isso que tem para considerar sobre o futuro caso lidar com a profecia não esteja nele.
Sangue Branco... o elfo, ou elfos, que mataram seu pai... consegue esquecer? Um fio de sangue a escorreu boca abaixo, uma brisa fresca ardeu contra o talho e os punhos cerraram. Como eu esqueceria?
Uma patrulha os interceptou.
— Identificação e finalidade da visita - o licantropo, vestia uma placa de peito com o brasão, uma cabeça de lobo sobre corrente partida, de Semiramis. E montava um réptil de dois metros de altura. Um familiar... eu queria ter um, mas as tentativas com as criaturas que meu pai trazia falhavam. Os olhos verdes do lagarto encontraram o rubro da vampira. É uma sequência de círculos mágicos razoavelmente longa, mas a taxa de sucesso está em torno de uma a cada dez mil pessoas... no livro escrito por Morgana era mencionado a necessidade de aptidão especial, afinidade com a fera e domínio das incrições mágicas.
— Lembro de quando o título ́ ́cidade da liberdade'' significava alguma coisa - Samantha, o cavalo entre a carruagem e o trio de guardas. O fedor de raiva e ansiedade subia lentamente. E o suor dos três licantropos mestiços que vieram nos receber. O montado no réptil e o na égua à esquerda tinham o odor de vampiro no sangue, o outro de elfo. Em termos de quantidade de mana têm bem menos que nós e devem saber disso.
Semiramis estava a cinco minutos a trote lento.
— Também precisamos que os vampiros nos acompanhem até a delegacia para responderem algumas perguntas - o do meio, sobre o lagarto e com os punhos fechados vigorosamente na alça dianteira da sela. - Identificação e finalidade da vinda.
— Tá querendo começar uma briga, seu merdinha? - Sam. - Viemos de Semiramis, só saímos pra resgatar umas pessoas raptadas.
A vampira sênior gesticulou ao vagão de carga da carruagem.
— Salvei as pessoas ali, lamba minhas botas e então, até gentilmente, entregarei nossos cartões - a mão dela desceu sobre o cabo da foice. - Ou vocês podem morrer aqui e a polícia de Semiramis irá ganhar vagas para soldados melhores.
Os dois sobre cavalos fitaram um ao outro. O do centro semicerrou os olhos. Não podem vencer, o lagarto daria trabalho para mim ou Samantha, mas para as duas juntas ou com apoio de um mago como William seria rapidamente abatido.
— Tá vendo aquela cidade? - apontou com o queixo os edifícios atrás de si. - Estendendo-se de oeste a leste até desaparecer aos olhos?
— Fedendo a um sem fim de mestiços e cães? Sim, vejo bem.
O canto direito dos lábios do licantropo foi acima.
— ''Sem fim'' é bem a palavra. Pode tirar três desse poço de cachorros e meio sangues, mas terá que tirar sete a seguir, então trinta e três, sessenta e seis e depois mais, mais e... vai ser morta antes que tenha fugido, matado ou subornado por uma semana - as íris castanhas encontraram as rubras de Sam. - Identificação e finalidade da visita.
O sol pairava próximo a borda do horizonte, a luz tomando contornos alaranjados e o ar esfriando. O punho esquerdo de Samantha estava fechado na empunhadura da arma. Will observava silenciosamente da esquerda de Stephanie.
— Vinte dracmas de ouro - a vampira sênior, austera. - E não teremos que ir responder perguntas em lugar algum.
O guarda suspirou e baixou as pálpebras por três segundos.
— Acha que sou um corrupto? - a palma encontrou o brasão de Semiramis na placa de peito, a altura do coração. - Uma guerra aconteceu lá em cima, um vampiro qualquer roubou algo de Sangue Branco e eu não quero que essa porra venha pra cá. Então vou cumprir minhas ordens, se forem inocentes o chefe Peçanha vai liberar vocês.
''Roubou''? As presas de Stephanie dilataram, os dedos do pé pressionaram a sola das botas e o polegar dos punhos enfiaram-se contra a lateral de seus indicadores. É isso que estão dizendo? Essa merda, essa porra, essa mentira, essa...!? A respiração tornava-se mais alta e rápida. Will sussurrou algo com olhos indo de soslaio à sobrinha. Vou matá-los... todos eles... vou beber suas vidas, estraçalhar seus corpos e depredar suas covas... ladrão? Meu pai? Como se atreve....! Stephanie pôs-se de pé, suando, arfando. Os dedos de Will fecharam em seu pulso.
— Não - o tio, austero, o toque morno e rígido.
— Garota - Antony.
Vocês não entendem, vocês não se importam...! Ainda consigo ouvir aquelas drogas de pedidos de ajuda, aquelas merdas de som de carne sendo cortada, queimada, esmagada...! Eu fugi! E fugi! Abandonei meu pai, não sei quem o matou ou como! Olhou para William, um, dois e três segundos, vento fresco pondo fios loiros a balançarem. Abandonei meu pai duas vezes... em casa e quando desisti de pegar o livro do garoto necromante. Baixou de volta ao assento, lágrimas subiam às íris e a pele ruborizara. Eu deveria morrer. Tronco pendeu a frente, braços foram cruzados sobre as pernas e a cabeça apoiada sobre eles. A mão do tio pousou sobre suas costas e algumas palavras foram ditas. Ou não, eu não ligo, não importa... eu odeio esse lugar, quero ir embora. Água desceu bochechas à queixo. Quero ir pra casa. Fungou.
Samantha Fearblood entregou os cartões de identificação, respondeu a pergunta sobre motivo e a pequena comitiva seguiu com um guarda de Semiramis a cada lado e um adiante. Na borda da cidade um homem parou ao lado de uma moça, outro chegou, duas mulheres saíram do edifício à esquerda, um retângulo amarelado com uma larga viseira dotado de um letreiro que dizia ''Casa de Cunha'', e outras duas das ruas no cruzamento na esquina. Mais um, três e...
Na roupa de uma parte da multidão estava estampado um rato com chapéu de cozinheiro, na de outros um par de luvas sob o mesmo tipo de boné.
Merda.
— Merda - Samantha, Antony e Will murmuraram simultaneamente.
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