Capítulo 5.5° - Sangue e Dentes Voaram
Stephanie Fearblood, Vampira
As sombras engoliram-os e regurgitaram-os conforme passavam por entre as trevas de residências queimadas. Uma boneca de pano estava jogada na via, um cavalo de barro rachado rolava pelo chão e portas pairavam semi abertas. Haviam pedaços de móveis largados à frente de janelas, cacos brilhavam sob uma tênue luz matinal.
Fedia a poeira e gelo.
Os pés do cavaleiro pararam diante de uma igreja. A tinta branca tocada por negro e palidez descascava rumo a vista de tijolos. Duas torres subiam as laterais, a esquerda com metade sumida e a outra marcada por um buraco próximo ao topo cônico.
Arrepios atingiram um pico na pele da vampira. O cenário era visto por frestas dos dedos dele e do elmo e as tripas pediam para serem regurgitadas.
As portas abriram com uma lufada gélida de ar. E o cheiro veio. O nariz de Stephanie enrugou, os punhos e pálpebras tencionaram. Há alguém cercado por cadáveres aqui. Foi solta de pé após o batente. O cavaleiro ficou imóvel na entrada, esguio e alto sob o aço, a faixa pendendo do elmo balançando tenuamente.
Respirou fundo. E então? Baixou as pálpebras, ergueu. Se vai sair, não será pela porta da frente. Girou para dentro da igreja.
Um corredor formado por entre fileiras de bancos, sete de cada lado, tábuas longas de madeira alva deteriorada e tocadas por um manto de breu. Encarou o outro presente. No altar, no trono sobre este, com apoio para mãos feitos de crânios. Um humano sob quimono escuro.
As íris brilhavam amarelas na face dele.
Stephanie engoliu em seco. Haviam duas portas, uma na parede descascada a esquerda e outra tocada por preto e cinza a direita. As pessoas da vila, ao menos uma parte numerosa, haviam fedido a gelo e tentado pegá-la, os que machucou não sentiram dor até o odor voltar ao que era e começarem a berrar. Depois veio o homem atrás e a trouxe até aquele lugar. Também há cheiro de gelo nele.
Então, o que está acontecendo, Stephanie? Tremeu, uma gota de suor desceu têmpora abaixo.
Não faço ideia. Deu um passo adiante, a perna bambeou. Cerrou os dentes e enrijeceu os músculos. Se a quisessem morta, o sujeito as suas costas o teria feito. Respirou fundo, marchou. Rígida e com corpo ameaçando ceder ao chão. O cansaço de ontem ainda está aqui, encarou o humano. Magro, veias verdes marcando o rosto e os cabelos em um desgrenhado mar escuro. O traje era folgado e bordado com palavras na língua da magia. ''Death, live, come, go, chains, sleep, awake...'' e mais. O punho o apoiava a bochecha.
— Tire a armadura.
A voz era rápida, mas delineava claramente cada palavra. O fitar era fixo, o rosto tocado por restos de barba e olheiras.
Stephanie fechou os punhos. O que deveria fazer? O que deveria pensar daquilo? Como posso fazer alguma coisa quando não sei nem o quê está...?
— Quem é você e o que quer? - ela, com o tom austero de Jaime Fearblood, olhos forçados contra o negro do humano.
O rapaz baixou as pálpebras, suspirou e as ergueu.
— Eu sou o dono dessa região, minha intenção é contribuir com a paz e blá, blá, blá - a outra mão gesticulou ao vento conforme falava. - Feliz? Agora tira a armadura, menininha, quero despachar o assunto depressa e voltar aos meus problemas.
As paredes à esquerda, direita e frente poderiam ser quebradas. O odor de mana do garoto era quase tanto quanto o dela, mas o físico dele é fraco em comparação. Se corresse, quebrasse o concreto envelhecido e fugisse... não, mordeu o canto da boca, o cavaleiro na entrada é rápido o bastante para me alcançar.
E o fedor. O mesmo das bestas e dos cadáveres no lago. Estava nele também, mesclado ao do sangue e carne humano, diferente dos outros que tinham apenas gelo e odores conseguidos do ambiente. Um ligeiro choque espalhou-se peito de Stephanie a extremidades. Esse moleque está por trás dos lobos... não está? Matou Evarildo, quase matou Antony...
— Controla os lobos? - Stephanie, tom frio e semblante enrijecido. Mãos abrindo e fechando lentamente. Se tivesse que ter voltado deixando para trás também o cadáver de Antony , o que teria feito? Teria se levantado daquela lama pútrida de morte? Ou apenas ficado inerte, perdida em um esquecimento e falta de um forte desejo de voltar a lembrar?
Eu acabaria levantando. Levantei depois de algo pior. Estaria apenas com mais um fardo de dor e sozinha de novo. E o que isso diz de mim? Que não me importo com ninguém o suficiente e vou morrer sem ninguém ao meu lado.
Os lábios tremeram, eu odeio esse lugar. As íris rubras encontraram o rosto do humano. Diga que sim. Diga que são suas bestas. Stephanie expirou pela boca, respirou fundo, ativou o nível dois, os músculos expandiram, comprimiram e de novo e de novo e estabilizaram.
— Está testando minha paciência, garota. Se é alguma calamidade maligna, ótimo! Deixe-me olhar, confirmar e então podemos ir à garganta um do outro! Não? Bom para você, posso até te dar umas moedas como pedido de desculpas por eu ter dado ouvido a fantasmas idiotas!
Stephanie pôs um passo à frente. Botas pararam rentes ao primeiro degrau dos três que levavam ao estrado elevado.
— Não vou me repetir - Stephanie, tom rígido.
O garoto deixou uma breve risada escapar e pôs-se fora da cadeira com um salto.
— Muito bem, vou te arrancar essa lata pedaço a pedaço e usar para fazer um regador - os dedos dele fecharam em punho. Círculos mágicos ascenderam ao redor do garoto. - Não vou me importar de tirar um tanto de carne no processo, embora imagino que seu futuro cônjuge possa ter uma ou duas reclamações sobre o assunto.
Um passo, dois e três e ele estava na borda do estrado. Queixo erguido, ombros pra trás, peito estufado e pescoço inclinando a face repleta de veias adiante.
— Responda - ela, pondo-se sobre o primeiro degrau.
— E se sim? - com um sorrir usando o canto esquerdo da boca. - Pode derrotar o comedor de casada ali na entrada? - a torção do lábio morreu. - Eu sei quem é, Stephanie Fearblood. Não faça isso difícil se for realmente só o que é. Veio a minha vila, venceu meus lobos e irá...
O crânio dele foi arremessado para trás. Sangue e dentes voaram, os pés do humano bambearam em um recuo, o pescoço a trazer o rosto de volta a frente. E o outro punho da vampira esmagou-lhe o nariz. Não caiu. Braços e pernas dobraram e tremeram.
Teria sido um merda mais feliz se houvesse caído.
Os socos de mãos cobertas em aço da vampira seguiram. A cabeça do humano foi violentamente acima, abaixo e aos lados. Os pés o levando para trás em meio a uma nuvem de carne e rubro. As costas dele encontraram o altar, a traseira da nuca acertou o trono. E dedos ossudos fecharam no entorno dos braços de Stephanie. Três punhos esqueléticos em cada um, erguendo-se do trono de partes descarnadas de pessoas. O branco feito cinza pela baixa luminosidade e lascas na superfície por onde uma fumaça tênue e escura saia.
Um silvo escapou da boca do humano. O canto esquerdo de um fiapo de carne que fora-lhe os lábios pendendo para cima. O crânio dele estava visível abaixo de restos avermelhados e disformes, apenas os dentes perdidos marcando a presença de dano ao osso. Ele começou a levantar-se ereto, antebraços apoiando-se na pedra e empurrando-o acima.
E o punho o acertou, da direita à esquerda. O humano caiu e deslizou ruidosamente sob o assoalho. Pedaços dos ossos que seguraram a vampira quebrados e desabados no solo. Antes que ele parasse os dedos de Stephanie enrolavam seu pescoço e o erguiam.
E agora? Vai matá-lo? Fechou os olhos, depois daqueles socos? A hesitação veio um tanto tarde, não acha? Suspirou e o encarou. A carne no rosto dele se movia. Uhhh... estava inchando e voltando a cobrir o crânio.
O odor do cavaleiro do lago se aproximou e parou no piso inferior e de frente a eles. As trevas no elmo voltadas a Stephanie. Largou o garoto, o matar pararia Lancelot? É possível matar esse merda quando ele não está morto mesmo nesse estado?
Aqueles ossos não racharam sob os golpes. Poderia tentar queimá-lo ou... tirou a armadura. Antony não morreu e ele disse que queria conversar... me ver sem armadura, toques de rubor a marcaram a bochecha. Que seja... mordeu o canto da boca, o rosto de Evarildo velho e enrugado passou pela mente. Desculpa.
— QUE PORRA! - o humano, do chão e com rosto recomposto. O tronco ergueu-se. - Olha aqui sua merdinha, se acha que as coisas vão...!
Ele piscou e a boca pendeu semi aberta. O humano tinha a pele avermelhada. Stephanie estava de braços cruzados sobre a camisa grossa e rubra, íris encarando de soslaio o outro lado.
— B-bom! - as íris amareladas penderam pra esquerda por um segundo, foram ao chão, subiram ao teto e voltaram a vampira. O garoto respirou fundo, soltando o ar pela boca. - Era de se esperar que fosse ao menos um tanto feia pelo desagrado em desfazer-se do aço, eu suponho. Me enganou bastante bem. Não é nada má.
Stephanie fincou-se rígida. Nada má? Isso é bom? Ruim? Meio termo? Enterrou os dedos no tecido da camisa e desviou o rosto um centímetro mais a direção oposta a ele. Não importa...
O pé do cavaleiro bateu contra o chão.
— Sim, eu sei! Fora de hora e péssima aproximação! - o humano para o talvez Lancelot, então o fitar tornou a ela. Um formato retangular começou a se remexer na área peitoral do quimono do humano. Stephanie o encarou de canto, um livro? - É, isso é problemático.
As pálpebras do garoto baixaram. Silêncio e remexer do item sob o traje dele, uma veia engrossou na têmpora do sujeito.
— Quieto! Já disse que não vou mais te ouvir, seu arrombadinho maligno, então guarde seus desejos pra você! - abriu os olhos. - Ei, vampira, senta, a conversa vai ser desagradavel.
Fitou-o. Desviou o encarar. Não sentou.
— Muito bem, fique em pé então, quem liga. Primeiro como sei o que vou dizer - ele, e colocou a mão na abertura superior do quimono e tirou um livro. Branco, com uma mão negra irrompendo do meio. - Tomo da morte, Stephanie. Stephanie, tomo da morte. Em resumo esse pedaço amaldiçoado de bosta literária é repleto de meios para burlar os domínios da morte. Bati a cabeça com isso por um...
— Pode reviver pessoas? - a vampira, girando rumo ao garoto, se agachando e parando com rosto a centímetros do dele. Mãos cerradas ao lado das pernas humanas e olhos rubros completamente abertos.
— Por mais que eu não tenha nada contra seu rosto, agora não é o momento - ele comentou a face virando de lado e ruborizando tenuamente. Hã? Um, dois e três segundos. Ah, Stephanie pôs-se de pé e recuou um passo. Parou de fita-lo por meio momento e tornou a fazê-lo, mas e então? - E sim.
O coração da vampira bateu mais rápido, um fio de elétrica excitação a cruzou.
— Mas não vai ficando felizinha não, para trazer alguém em especifico, por inteiro e o mais próximo de vivo possivel... porra, ia precisar matar um sem fim de gente e ter sorte para o livro não te enlouquecer demais ou acabar tendo preso a si idiotas que insistem em opinar apesar de serem a porra de uma fração de alguém que já foi pra cova! É impossível.
O calor cessou, a esperança findou e o fitar rumou ao chão. Merda, os punhos puseram-se semi fechados e tensos, merda, droga, que merda! A respiração aumentou de intensidade.
— Tente - ordenou e foi um passo ao humano.
— Não. Agora se aquieta aí, tem coisa mais important...
Pisou no peito dele, as costas do garoto encontraram ruidosamente o solo. As presas da vampira escaparam boca a fora, o pé sob bota de cano curto lentamente indo mais fundo. As trevas davam ao carmim das íris um tom intenso.
— Tente, mate quantos...- fechou as pálpebras com força. Mate quantos forem preciso? O largou. Ele gemeu e massageou o peito e pôs reclamações sobre o ar. Stephanie virou de costas e marchou. Cinco passos pesados. Parou ao lado do primeiro degrau que unia estrado e piso inferior. Peito inflando e comprimindo, presas pondo fios de sangue a descer lábio a queixo. E daí? Por que eu deveria me importar com um monte de gente estranh...!?
Porque meu pai não veria nisso nada além de uma ação horrenda. Lágrimas subiram aos olhos, as esfregou para fora.
— Se serve de alguma coisa, também não pude trazer quem eu queria de volta... do jeito que queria... e ainda fiz umas coisas terríveis enquanto tentava. Só... não sei o que dizer, a sensação é uma porra. E agora o problema - o indicador humano apontou a mão dela. - Talvez seja melhor só te matar mesmo.
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