♤ SETE ♤
Não dormi bem durante a noite, pois todo o meu pensamento ia em direção à minha irmã. Compreendo que nos últimos dois dias me distanciei um pouco, deixei que ficasse livre para fazer novas amizades e divertir-se com as moças de sua idade. Pelo que vejo, ela ainda não tem maturidade para realizar escolhas assertivas e que não prejudiquem a sua vida.
Faço questão de me adiantar para o desjejum, ponho a farda escolar semelhante a uma infantaria real e saio do quarto para ir ao refeitório. Sento-me no local indicado e percebo que poucas foram as moças que acordaram cedo. Enquanto estou sozinha, me sirvo de folhados e suco enquanto aguardo por Cefeida.
Fico intrigada ao perceber a sua demora em chegar e decido ir ao seu aposento verificar o que houve. Suspiro pausadamente antes de bater em sua porta, mil coisas vem em minha cabeça tentando explicar o porquê de seu inesperado atraso.
Quando abre a porta, com a outra mão friccionando o olho, compreendo que despertou com as batidas.
— Bom dia!— diz com a voz molenga e abrindo ainda mais a porta para que eu entre.
— Não sei se será um bom dia depois de nossa conversa.— aviso e vejo seus olhos abrirem ao tempo dos pelos de seu braço se arrepiarem.
— O que aconteceu?— questiona como se não houvesse nada contra ela. Reconheço seu olhar confuso e isso me deixa nervosa.
— Você é quem deveria me contar! Zedara a viu ontem, aos beijos com Ângelo.— vocifero. A vejo fitar o chão e mover os pés para frente e para trás, feito uma criança que não suporta encarar a face ao ouvir a reclamação de seus pais.
— Desculpe-me, fomos conversar e no final ele me beijou.— revela e a vejo corar.
— Não darei minha face para ser batida novamente. Sei que é romântica e julga que o amor é perfeito, mas ele também nos cega. Essa cegueira é o que destrói tudo, se quer realizar seu sonho pare com esses encontros na calada da noite!— ralho e me aproximo da janela para receber um pouco de ar fresco, enquanto ela permanece em silêncio.
— Você fez o mesmo ontem a noite, acha que não sei? Saiu com o príncipe Valentin.— acusa e um vinco se forma em minhas sobrancelhas. Irritada, fecho os olhos para tentar compreender a mentalidade da menina.
— Fiz, mas ninguém me pegou aos beijos com um príncipe que não é meu destinado. Eu ainda tinha a desculpa de dizer que estávamos em um encontro, mesmo depois do toque de recolher, no entanto o que você diria? Daria a desculpa que caiu nos lábios de Ângelo? Não estarei aqui sempre para guiá-la, talvez saia no mês da rejeição e se continuar assim pode trazer sérios problemas para si.— continuo com os sermões. A observo enquanto seus ombros caem em derrota e ela senta-se na peseira da cama.
— Ele prometeu que pediria a mim como sua promessa. Eu confio nele, Jade...— responde com seus olhos marejados e entendo que não importa o que fale, depois dessa aproximação com ele, ela não atenderá nenhum de meus pedidos.
— Entretanto, se estiver manchada, nenhuma rainha concederá a troca, não pode afirmar quem foi o homem que a tomou para si, voltará para casa com a cabeça entre as pernas e nosso sobrenome perderá o prestígio que tem há gerações. Sei que estou sendo dura, mas lembre-se que fui eu quem levei a culpa por algo que você fez e até hoje me olham atravessado. Não seja tola por causa de um par de olhos bonitos, eu tenho a vocação para seguir o caminho de nossos pais caso tudo aqui termine, entretanto você, minha irmã, nunca deixou que papai a ensinasse a arte de seu ofício. Se estou aqui, tendo essa conversa nada agradável, não é por nosso nome que pouco me importa, é porque me preocupo com seu futuro. O que sabe fazer além de bons penteados e maquiagens elaboradas? Não vou nem supor que se torne meretriz de um príncipe. — cuspo todas as palavras que estavam presas em minha garganta. Sua boca forma um “O”, pois jamais falei dessa maneira com ela.
— Nunca falou assim comigo, Jade. Sei que estou em uma posição difícil, mas quero que entenda...— tenta se defender, no entanto não permito que termine com suas desculpas esfarrapadas.
— Não irei entender nada, só estou avisando que não é mais uma criança e eu não serei sua babá para sempre.— sentencio e a vejo abaixar a cabeça. Sinto-me esgotada, não quero mais permanecer em seu quarto e saio batendo a porta com força.
— Calma, boneca!— diz Ângelo ao me ver. Fecho minha mão em punhos ao ver a face do principezinho canalha.
— Ângelo, só vou avisar dessa vez: fique longe da minha irmã. Se ainda me considera sua amiga, se quer preservar o fio de amizade que temos, por favor, fica longe da Cefeida.— peço em uma ameaça e o vejo engolir em seco.
— Jade, ficamos tanto tempo longe e agora quer que eu não me aproxime dela?
— Só estou avisando, não vou deixar que use a minha irmã. Está ciente do que acontecerá caso alguma regra seja violada.— volto a ameaçar e o deixo inerte na soleira da porta.
Sigo em direção a classe e vejo que a professora ainda não chegou. Com isso, fico mais aliviada e sento em meu assento, embora as palavras que disse para Cefeida não saiam da minha mente.
— Sério Dara, o que passa na cabeça dela?— questiono enquanto penteio meus cabelos.— Será que o primeiro acontecimento não foi suficiente para que ela aprendesse?
— Calma, Jade. Ela é jovem para entender e cabeças pensam diferente uma das outras.— responde enquanto retira a bagunça de minha cama.
— Eu sei, mas tenho certeza que se acontecer algo com ela irão me culpar. Sempre me culpam por coisas que não faço.— afirmo sentindo o meu próprio puxão no cabelo.
— Olha, não pensa assim. Lembre-se do seu encontro de ontem.— me recorda enquanto vem tomar a escova de minhas mãos, pois, por mim, todos os fios são arrancados. Discorro para ela todos os detalhes e como o príncipe foi um lorde comigo.
— Até esqueci do Valentin. Foi tão gentil comigo, ele merece uma promessa que atenda as suas expectativas. Com certeza encontrará.
— O jantar será servido em minutos, se apresse ou chegará atrasada. Aproveite e vá dar uma volta com ele, assim esfria sua cabeça.— aconselha e dou um sorriso para ela enquanto termino de me arrumar.
Ao chegar no salão de jantar vejo que novamente as ordens foram trocadas, dessa vez Lucas está ao meu lado e poderei conversar com alguém que não fale apenas sobre a avaliação. Sento-me no estofado e procuro a minha irmã, percebo que ela ainda chegou e vejo que Ângelo também não. Deixarei por sua conta e risco. Valentin está em uma distância considerável e minha visão não é privilegiada. A minha frente está Cindy e no local vago, ao lado, vejo o nome Lakisha. Me sirvo da refeição e o falatório se intensifica, até o momento nenhuma rainha veio jantar conosco, o que é atípico delas. Sinto o aroma da torta de framboesa e imagino que seria terrível se eu deixasse a comida já servida para abocanhar alguns bocados da torta. Sinto um par de olhos me observar e ao olhar avisto o sorriso de Valentin do outro lado. Meneio a cabeça em negativa, pois compreendo esse jogo de amizade está ficando sério de mais.
Após a refeição, vou para meu aposento. Hoje, as meninas estão cansadas e foram todas para seus respectivos quartos. Tiro minhas sandálias e roupas pesadas, ponho um vestido leve e deito na minha cama, aguardando o momento que Dara entrará para fofocarmos. Ouço batidas na porta e digo para que entre, como não vejo nenhum movimento vou eu mesma abrir a porta. Ao abrir, vejo Valentin com um embrulho nas mãos.
— Surpresa!— diz ele enquanto sinto o aroma da torna e dou pulinhos de alegria.
— Como conseguiu?— questiono exasperada. Não me importo com a roupa que estou, apenas abro a porta para que ele entre.
— A cozinheira trabalhou no castelo de Haffínit por muito tempo, conheço-a bem e quando disse que era para a senhorita ela não se opôs a fazer.— comenta e sorrio em cumplicidade. Valentin põe a torta no centro e observo que também trouxe pratos e talheres. — Quando vi seu olhar sobre a torta, fiquei tão maravilhado que prometi a mim que veria o novamente. Só queria que alguém olhasse para mim, como você olhou para a torta.— conclui com feição de desesperança.
— Tenha fé, alguém lhe amará tanto que as tortas ficarão com inveja.— brinco pondo minha mão sobre a sua e reconheço o brilho em seus olhos.
— Ah, Jade! O que seria da minha vida sem as tortas?— replica a brincadeira com um tom de voz esperançoso e não resisto ao cair no seu drama. Damos risadas e iniciamos a lambança.
Pouco tempo depois Dara nos faz companhia, passamos a noite em diversão e, pela primeira vez, fico feliz em ser uma promessa, fico feliz em estar aqui.
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