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♤ OITO ♤

Os dias passaram tão rapidamente que não percebi alguns acontecimentos, como a aproximação do dia do revezamento, no qual as outras sete meninas tentarão ganhar o coração do seu destinado. Isso significa que terei quinze dias sem meu amigo, a menos que ele queira deixar irritada a sua outra promessa para encontrar-se comigo.

Agora estamos no jardim, sentados no banco, degustando uma torta, como sempre. Meus dedos estão sujos, já que tivemos que fugir da cozinha às pressas ao realizar esse pequeno assalto e não tive como pegar pratos e talheres.

— Qual sua cor favorita?— questiona e sua curiosidade me alegra. Sorrio com a pergunta enquanto pego mais uma “pequena fatia” da torta.

— Azul e a sua?— respondo replicando o questionamento. O seu sorriso de canto é encantador e deixo o meu olhar sobre a torta para não o encarar tanto.

— A cor dos seus olhos. Quero dizer, de um tom acinzentado.— diz sem jeito. Fico em silêncio, por não ter o que dizer e sinto minhas bochechas coragem.— Já tomei minha decisão. — ouço Valentin dizer com a boca cheia.

— Que falta de modos... Qual decisão?— pergunto enquanto passo minha língua sobre os dedos sujos e ouço um “porca” sair da boca do inquilino a minha frente.

— Então, no fim desse mês te darei a coroa, mesmo que depois tenha que procurar outra pessoa. Você tem sido a minha primeira e única escolha.— responde ignorando o que tínhamos conversado. Fico imóvel ao ouvir sua decisão e penso em mil maneiras de pedir que decline. — E não diga nada, não perderei minha única amiga.

— Valentin! E o nosso trato?— indago, pois deixei claro a minha escolha. Entretanto, ele faz que não meneando a cabeça em negativa.

Nana, nina, não. Nem pense em me abandonar com todas essas dondocas. Imagine que terei que revezar diversas vezes para dar chance a todas. São tantos cruzamentos que até fico enjoado. Você terá tantos rapazes para conhecer… Há certa possibilidade de se interessar por algum deles. — pondera, porém sua feição sofre mudanças ao proferir as últimas palavras. Encosto minha cabeça na parte superior do banco e faço beicinho, meus olhos vão de encontro aos seus e o vejo sorrir. — Isso não dá certo comigo, aprendi a reconhecer esse seu joguinho, mocinha. Esses dias foram suficientes para aprender às suas artimanhas. Apesar que está irresistível assim. — conclui me deixando sem graça.

Há poucos dias senti que de certa forma Valentin tem estado flertando comigo e, para não romper com a nossa amizade, apenas finjo que o fato não é conhecido por mim.

— Você também fica irresistível com a face coberta por torta, sabe que amo tortas.— brinco e sua mão se torna um punhal que vai em direção ao seu coração.

— Acertou em cheio! Estou vendo a luz. Pode me levar para o meu túmulo.— dramatiza e reviro os olhos o vendo fechar os seus como se estivesse em seu último suspiro.

— Que drama! Não é atoa que faz parte do universo artístico.— alego e ele faz que sim com a cabeça.

— Não é atoa que é uma boa lutadora.— replica e sorrio ao lembrar que esses dias, na aula de luta, ganhei diversas partidas contra ele e outros que decidiram me enfrentar.

— Frase da mamãe: somos filhos de nossos pais. O sangue não nega.

— Sem dúvida.— diz. Verificamos às horas e levantamos de nosso canto oficial. Voltamos para o castelo, um burburinho se torna crescente e adentro alguns grupos para saber o que está acontecendo.

— O que há?— questiono preocupada.

— A nova promessa chegou e todas querem saber de onde ela é.— responde Melissa. Observo a expressão confusa de Valentin e dou de ombros. Avisto a moça, alta e com a pele negra. Linda, seus olhos em um tom de castanho-claro e os longos fios enegrecidos. Traços finos e precisos, graciosa ao caminhar em nossa direção.

Decido que a presença dela não faz diferença na minha vida, não a considero como concorrente já que nem ao menos me importo com a avaliação e, assim, retornou para o meu quarto a fim de me limpar.

— Dara, irei ao aposento de minha irmã. Preciso vê-la.— aviso. Depois de limpa e, com os pensamentos em ordem, decido colocar as coisas em seu devido lugar.

— Só não discuta com ela, para o bem das duas.— aconselha Zedara preocupada. Sorrio gentilmente para ela e levanto a mão, similar a uma bandeira, em sinal de paz.

Saio do meu quarto e atravesso o corredor, mas antes de chegar ao quarto de Cefeida avisto algo peculiar, a rainha Stella Maris conversado estranhamente com Valentin. Tento ouvir a conversa, porém eles falam baixo o suficiente para que somente eles ouçam. São longos minutos até ela o deixar e ele seguir na direção que estou.

— Valentin!— digo, o assustando.

— Olá, Jade.— responde, porém a sua face preocupada me deixa aflita, imaginando que há algum problema com ele.

— O que a rainha queria?— sondo por compreender que não se trata de algo bom. O príncipe passa a mão por seus cabelos negros, um sinal de nervosismo, e tenta, em vão, suavizar o semblante.

— Nada de mais, bobagem.— alega enquanto mudo o peso de uma perna para outra.

— Então, me conta.— continuo e seu suspiro sôfrego já me dá indícios de sua resposta.

— Eu não posso, Jade.— respondo e observo o seu olhar ir de encontro ao porcelanato do chão.

— Ei, está tudo bem.— asseguro. Sinto que mesmo sem poder dizer ele queria partilhar comigo. Vou ao seu encontro e diminuo a distância entre nós o abraçando, em uma tentativa de confortá-lo.

— Me perdoa?— diz depois de um tempo.

— Perdoar pelo que?— questiono, pois nada de ruim tem feito. Volto o meu olhar para seus belos olhos e sinto que a melancolia está presente. Recordo da primeira vez que os vi e consegui decifrá-los de imediato.

— Só diz que me perdoa, por favor!— replica o pedido de modo doloroso. Valentin pega minha mão direita e passa por sua face, uma sensação engraçada por conta da barba que inicia seu crescimento.

— Só perdoo se me trouxer todos os dias torta de framboesa.— digo para que seu sofrimento seja diminuído. Seu sorriso chega aos olhos e ele cruza nossas mãos, assim sei que minha tentativa deu certo.

— Todos os dias.— garante. Apertamos as mãos e decido que preciso animá-lo.

— Hoje a noite, no parque.

O jantar será servido mais cedo, por haver um pronunciamento da rainha. Ultimamente considero que ela está se sentindo a portadora de todo o universo e acredito que alguém precisa diminuir a sua pompa. Não vejo a rainha Mallory há alguns dias e estou preocupada com seu sumiço, no entanto tenho certeza que papai mandaria um telegrama caso algo estivesse errado. Falando em papai, ele me visitou na última semana e conheceu Valentin, fez diversas perguntas sobre ele e ri em todas elas. Sua preocupação só deixou de ser presente quando os dois tiveram uma conversa às sós.

— Nossa, que vestido lindo!— elogia Cathina que está na porta do meu quarto e a vejo dar pulinhos.

Meu vestido é longo e de um tom verde-claro, a parte de baixo é de tule e a superior rendado com alguns botões de rosas, a manga é caída nos ombros e no centro tem um laço preto. Deixei meu cabelo preso em uma trança, que no final é presa em grampos e em formato de flores.

— O camareiro deixou hoje a noite. Disse que a rainha solicitou que eu usasse.— respondo e a vejo franzir o cenho.

— Então foi a única, todas nós vestimos apenas o que foi dado no início.— garante e dou de ombros.

— Eles devem ter esquecido de entregar no dia, só isso.

— Precisamos ir, pediram que viesse lhe apressar.— avisa com pressa. Dou uma olhada, mais uma vez, no espelho e saio do quarto fechando a porta.

Chegando ao salão vejo as Promessas em fileira e todas as rainhas presentes. Observo que a majestade Stella Maris vê que as últimas faltantes chegaram e sorri para todos.

— Boa noite, meus queridos príncipes e queridas promessas. Venho hoje com uma novidade para vocês.— inicia e, apesar do desejo das meninas de começarem um falatório, elas se controlam por estar na presença da rainha.

— Bom, concordamos em antecipar a primeira avaliação. Vimos que muitas se comportam bem e estão de acordo com os requisitos de uma promessa ideal. Outras passarão por uma observação maior, mas de qualquer maneira queremos saber a opinião dos nossos filhos da coroa.— Mallory diz gentilmente, no entanto seu incômodo com essa situação é aparente. — Por isso, ao invés da troca, já mandaremos as não aprovadas para casa.— conclui para espanto de todos. Olho para Valentin do outro lado e ele desvia o olhar, sinto um arrepio passar por minha espinha como se fosse um mau presságio.

— Isso acontecerá hoje a noite.— completa Stella Maris com um sorriso que não chega aos olhos. Engulo em seco e respiro profundamente, pelo visto será essa a minha oportunidade de voltar para casa.

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