♤ DOIS ♤
Porque, a felicidade, era a única coisa que ela procurava.
— Jade, não quero que atrapalhe sua irmã nessa nova jornada. Sei que seu sonho nunca foi ser uma promessa, mas não temos escolha, somos herdeiros de nossos pais e eles nos educaram assim. Sua irmã cresceu para ser uma, desde pequena ela sonha em ser princesa, só não imaginava que seria tão jovem. Tenho certeza que ela conseguirá realizar seu sonho, ela é doce, ingênua e amável. Todos a amam e caso você não seja escolhida, como não fui em outrora, sabe que poderá voltar para casa e permanecer junto ao seu pai. — diz minha mãe com sua “doçura”. Ouço tudo quieta. Não negarei que as palavras “amáveis” de minha mãe ferem meu cerne. Ela nunca me disse um encorajamento ou uma palavra de afeto, é como se eu apenas estivesse aqui para ouvir suas lamúrias.
— Não atrapalharei seus planos, minha mãe. Só desejo que um dia a senhora não se afogue em suas palavras ácidas. — respondo, deixando fugir um suspiro sôfrego. A vejo semicerrar os olhos e também suspirar, pausadamente, como sinal de indignação.
— Já está pronta, Jade? — questiona meu pai. Noto a sua cabeleira castanha com alguns fios grisalhos, seus olhos acinzentados como os meus e seu sorriso que diminui o olhar.
— Sim, meu pai. Só estava recebendo as ordens de sua amável esposa. — respondo ao voltar a atenção para ele.
Seguro a pequena mala que fiz e a arrasto em direção a porta. Papai a pega de minha mão e aguarda mamãe sair do cômodo para trancar a porta. Cefeida fizera uma trança em seu cabelo e colocou uma tiara entre a franja e a parte maior de seus fios sempre alinhados. Seu vestido parece ser feito para uma boneca: completamente rosa e brilhante, com direito a camadas bufantes e de tule. Ela ajeita o vestido enquanto desce as escadas, imagino que agora poderia ser o pronunciamento das novas princesas e ela estaria dessa mesma maneira, impecável e repleta de modos. Passo as mãos sobre meu vestido simples e de tom creme, de mangas finas e coberto em renda. Ouço a campainha tocar e ajudo papai a pegar as malas, o motorista nos vê e se apressa para nos ajudar. Adentro o automóvel e me despeço com um leve aceno, não é como se eu fosse embora de vez, Ulyere é tão próximo quanto o templo central.
Nosso mundo é dividido em cinco reinos que são classificados por colocação e categorias. Em primeiro lugar está Limbell que possui a maior produção de minério diversificado e boa parte dos moradores são de alta classe: inquisidores, doutores, engenheiros, políticos reais e a monarquia com maior número de Príncipes de Sangue. Na posição secundária está Ulyere, onde vivo, este possui a maior produção de ouro negro, temos em nosso meio os interventores, diretores reais, advogados e cientistas que buscam a modernização de nosso modo de vida unidos com pesquisadores de Abeiron. Em terceiro lugar está os conservadores de Abeiron, produtores da prata e bronze utilizados em produtos que utilizamos no dia a dia. Os moradores são professores, instrutores, pesquisadores, jornalistas e transportadores. Os últimos dois reinos, Dorinlea e Haffínit, dividem suas produções em agricultura e arte, seus moradores trabalham nos outros reinos, uns têm a sorte de trabalhar no meio artístico, em espaços de festas e teatros, outros ficam na organização e limpeza das províncias. As rainhas pensam em unir os reinos um dia, no entanto, são impedidos pela rainha Stella Maris que com sua fortuna poderia sustentar todos os outros quatro reinos e continentes vizinhos. Por conta disso, a união dos reinos seria desfavorável para os seus interesses, dessa maneira, eles tomariam a sua posição.
Quando dou por mim já estamos atravessando a rodovia do reino de Ulyere e a imensa escultura de calla lilies passa por minha visão. Fico intrigada quando não paramos nas imediações e volto minha atenção para Cefeida que permanece absorta em seus pensamentos.
— Senhor, creio que confundiu o caminho. Ulyere está há duas estradas. — digo, imaginado que o motorista está mais distraído que nós duas. Ao ouvir a dúvida, ele me observa e sorri com minha possível confusão.
— Senhorita Haas, houve uma mudança de planos. Sua Majestade Serena Stella Maris fará a avaliação dessa temporada e iremos para Prylea, o Palácio Central. Esse ano as avaliações serão rígidas, todas as rainhas estarão presentes e os príncipes da coroa poderão escolher promessas de outro reino. — responde o motorista e volta a atenção para a direção. Minha irmã olha para mim assustada, o nosso último contato no Palácio Central não foi tão agradável para ambas, principalmente para mim.
— E agora, o que faremos? — questiona minha irmã aflita, com certo brilho, proveniente do receio, em seus olhos verdes.
— Iremos fingir que o incidente não foi conosco, se esbarrar com Ângelo não quero que se aproxime, a menos que ele te corteje como sua promessa. Fique ciente de que não será tão fácil. — ao ouvir minhas próprias palavras, sinto meu peito ganhar uma nova batida, vejo minha irmã corar e miro minha visão para a janela, pressentindo a urgência de um novo plano para sair dessa.
O Palácio de Prylea é o mais elegante de todos os reinos. Qualquer um pode adentrar o local, se hospedar por alguns dias e usufruir das maravilhas que estão disponíveis. Os estofados são de coloração escarlate e tecidos com as melhores linhas.
O espaço é decorado com cada característica dos reinos, algumas peças comuns de cada rainha como os diamantes de Stella; o ouro negro de Mallory; os livros espalhados por todos os cômodos vindos de Abeiron; as diversas plantações, flores e cultivos de Dorinlea; as pinturas e os artistas que circulam as pequenas vilas sediadas nas redondezas vindos de Haffínit.
Assim que chegamos no palácio, adentro o espaço sentindo o aroma das tortas de framboesa e minha boca saliva com desejo, pois, essas são as minhas favoritas. Avisto o quadro de proibição de visitas e logo me admira que o castelo nessa temporada não esteja repleto de pessoas da corte. Aqui tudo é plano, feito galerias, não existem quartos no andar de cima, são vários corredores com centenas de cômodos e janelas por todo lugar, o palácio está cercado por um imenso jardim e hectares de um lindíssimo parque. Conheço esse palácio com a palma da minha mão, pois papai costumava me trazer no inverno para me ensinar algumas técnicas de seu ofício que mamãe me proibia de aprender. Lembro-me que ele dizia que se fosse meu desejo, eu poderia voar além das nuvens cinzas, traçar meu próprio arco-íris em busca de um tesouro perdido. Eu poderia voar, além das montanhas, e buscar um caminho no qual não seria obrigada a ser uma simples promessa, poderia ser a dona do meu próprio destino. Nessa época mamãe importava-se apenas com Cefeida, não era de me importunar com isso e só me dei conta de seu desprezo quando meu nome não era citado entre o seu círculo de colegas, apenas Cefeida era sua filha e eu somente herdeira de meu pai. Não compreendo os seus motivos, nunca procurei saber, é mais fácil viver no escuro criando milhares de hipóteses mais justificáveis que a sua real explicação.
— Vocês são promessas, aquelas que seus pais fizeram à Sua Majestade Serena no nascimento. São as promessas de que a linhagem real não será extinta, que serão produtoras como as rainhas. — explica Sue, a instrutora, nos comprando a espécies bovinas.
Vivemos em um mundo confuso. Quando completei seis anos minha mãe me obrigou a entender que eu seria feliz se tivesse um filho, porém, seria imensamente afortunada se tivesse mais de um, principalmente se fosse menina. Geralmente as rainhas geram herdeiros, as princesas são raras em todos os reinos. Em primeiro lugar, na distribuição de herdeiros, temos a rainha Stella Maris que tem cinco filhos, quatro deles príncipes de sangue e apenas uma princesa. Suas irmãs tiveram tantos herdeiros da coroa que nunca imaginei que uma mulher fosse capaz de gerar um número tão elevado de filhos. Nós, as promessas, filhas dos mais distantes de Limbell, somos designadas aos filhos da coroa, enquanto as nobres pertencentes ao primeiro reino, são destinadas aos príncipes de sangue.
Me perco nas instruções e quando me afasto da minha nuvem de pensamentos vejo que Sue, a instrutora, está com sua atenção voltada em minha direção.
— A jovem promessa irá receber mensalmente do seu príncipe uma caixa de resposta. Dentro dela pode haver uma flor, como pedido de desculpas pela rejeição, ou um pequeno anel em forma de coroa, informando que foi escolhida para permanecer até a próxima avaliação, que será mensalmente. Claro que um príncipe pode resgatar uma promessa rejeitada, caso goste mais dela do que a sua. Lembrem-se, os príncipes têm todos os direitos e regalias para escolher sua futura esposa. No final do ano já teremos as escolhidas e a preparação para a celebração real de anunciação. Aqui devem se portar com mais perfeição que em suas residências, aqui devem ser melhores que as princesas e damas que jazem na corte de Hainã.— Sue enfatiza suas palavras e sinto seu olhar em mim, tento passar a ideia de que não me recordo do assunto que paira por sua mente. Ela passa a andar sobre o tapete imaculadamente branco e fitar todas as damas que estão separadas por ordem alfabética. — Senhoritas Haas, é uma satisfação revê-las. Aguardo a mais velha há um ano, creio que seus pais não tiveram a pretensão de entrega-lhe a rainha tão cedo! — ironiza a instrutora.
— Provavelmente não havia príncipes suficientes para me suportar por tanto tempo. — respondo com mesma ironia. Permito que ela note meu olhar de desdém, porém, acredito que ela não facilitará minha vida durante o tempo que estarei aqui.
— Ou talvez sua mãe estivesse aguardando o príncipe certo estar pronto para o matrimônio. Isso não é conveniente, senhorita Haas? — acusa erroneamente. Tenho vontade de me afundar no assento, no entanto, apenas continuo rígida no meu lugar enquanto ela se aproxima de mim para fazer mais uma de suas ameaças. — Sinto em dizer que ele não é para sua classe ou para uma rebelde feito a senhorita. — sua voz é um sussurro que apenas eu ouço. Minha respiração acelera assim como as batidas do meu coração, principalmente por recordar daquele fatídico dia em que tudo dera errado, e sei que se ela soubesse dos detalhes verdadeiros sobre o que ocorreu, talvez, mudasse de ideia ao meu respeito.
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