♤ CINCO ♤
Lar, de alguma maneira sempre estamos dispostos a voltar para casa.
Acordo com leves batidas contra à porta. Como as persianas estão fechadas não despertei ao nascer do dia como era costume. Procurei por Dara e não encontrei, solicitei que quem estivesse batendo aguardasse, enquanto colocava o robe de seda. Ao abrir vejo o camareiro com várias araras e capas de vestidos.
— Vossa Majestade solicitou que enviasse as peças que as Promessas vestirão durante a estadia no palácio.— avisa e concordo, meneando a cabeça em positiva. Verifico a primeira peça e dou um riso de deboche. Estamos no verão, entretanto seremos obrigados a usar vestido com anáguas e mangas longas.
— Tudo bem, pode deixar ali.— digo indicando um local próximo do guarda-roupa. Assim que ele sai e me deixa sozinha, checo algumas peças e as jogo sobre a cama.
— Tem seu primeiro bilhete.
Dara me assusta ao chegar, me entrega o bilhete e vejo o símbolo da árvore carimbado em seu centro. Sei que é de Valentin, ele é o único príncipe de Dorinlea, além do Herdeiro Lian que tem outra destinada. Ao abrir o papel, de textura agradável e de coloração amarelada, leio o pequeno bilhete que contém apenas um local, data e horário marcado para um encontro.
— É de Valentin, quer me encontrar à tarde.— confidencio com incerteza. Olhamos para o relógio verificando que passa das 9:00h da manhã e muitos já terminaram o desjejum.
— Kendrick também marcou com sua irmã, ela está radiante, diferente da você.— provoca uma Zedara incompreendida. Sento-me na cama e sinto o colchão ceder com o peso do meu corpo franzino.
— Não temos as mesmas vontades, sinto que ninguém deveria ser obrigado a se submeter a isso como se fosse algo normal. As outras pessoas não precisam fazer isso, as outras pessoas escolhem como viver e o que fazer da vida.— desabafo, pois desejava ser como os plebeus. Vejo Zedara suspirar e passar a mão por seus fios revoltos que saem de seu penteado, hoje, malfeito.
— Só lhe digo que se fosse eu a ter essa oportunidade a agarraria com todas as minhas forças. É a chance de mudar de vida sem precisar fazer nada de errado, porém, compreendo que o meu mundo é completamente diferente do seu.
Me apresso em me preparar para a aula. Como promessa, tenho horários a cumprir e até o momento não fiz nada do que foi programado pelas rainhas. Mesmo estando presas aqui, teremos que estudar e praticar algumas de nossas habilidades como: dança, música, pintura ou qualquer outra arte que nos agrade. Chego na sala com cinco minutos de antecedência usando o uniforme que foi deixado hoje em meu quarto. O vestido que uso é similar as fardas que minha mãe veste, porém, no caso dela, a parte de baixo é uma calça e não uma saia. Todas as insígnias do meu reino estão incrustadas na vestimenta e estou me sentindo incomodada pela quantidade a mais de pingentes e botões.
— Pensei que não se juntaria a nós.— observa a minha irmã ao adentrar na sala. Cefeida veste um uniforme idêntico ao meu, no entanto seus cabelos estão soltos enquanto os meus deixei presos em uma poupa frouxa.
— Estava indisposta ontem a noite.— respondo, ao mesmo tempo que me sento em um assento próximo de minha irmã e vejo que ela trouxe alguns materiais de estudo.
— Só o seu lugar ficou vazio, todos me questionaram sobre você. Ela foi muito dura?— indaga e franzo o cenho, porém depois de alguns minutos me recordo do pequeno teatro que eu e Dara planejamos.
— Depois te explico. Não se preocupe, hoje não será necessário dar explicações ao meu respeito.— garanto, porém Cefeida parece estar com dúvida, ansiando por uma resposta que provavelmente já sei.
— Como foi a conversa com Ângelo?— sonda e sorrio ao ver a bobinha da minha irmã querendo notícias de seu antigo namorico.
— O tempo todo sobre você.
A minha resposta a deixou corada e com uma nova animação no olhar, no entanto temo que as expectativas dela não sejam alcançadas. Antes que lhe diga algo a professora entra na classe e inicia as apresentações. Procuro ficar em silêncio a todo o momento, porém a minha mente não consegue obedecer às minhas ordens.
Com o fim da aula fico livre para andar pelas imediações. Não tenho um destino certo, apenas ponho meus pés para andar caminho afora. É incrível como este lugar não deixa de ser novo, todos os anos os jardineiros podam as árvores com modelos diferentes retratando a arte antiga, quando outra civilização vivia em nosso mundo. O altíssimo tentou diversas vezes fazer com que a humanidade atendesse as suas expectativas, mas até agora todas foram um fracasso com os seus meios podres de tentar dominar o mundo. Buscam poder ao invés da comunhão, buscam guerra ao invés da paz. Sei que estou envolvida em tudo isso, mas como minha mãe sempre diz: somos herdeiros de nossos pais e eles nos educam assim. Caminhando, ainda pensando na vida, vejo uma cabeleira loira, um jovem dedicado em caçar uma pequena raposa.
— Assim será difícil conseguir o que quer.— digo assustando tanto o rapaz quanto o animal que foge pelos arvoredos do parque.
— Joia rara, quanto tempo!— cumprimenta o herdeiro, sem incomodar-se com o fato de ter espantado a sua caça. Lucas corre para me abraçar, sinto meu corpo ser erguido e rodopiado várias vezes.
— Como está o príncipe mais incrível de todo o reino?— questiono no mesmo instante que ele me põe no chão e ajeita sua roupa, agora, amarrotada.
— Que meu irmão não ouça isso. Estou bem e a senhorita?— replica a indagação e faço uma careta com a menção de Derek.
— Do mesmo modo.
— Pensei que não a veria nessa temporada ou em qualquer outra.— supõe com um sorriso faceiro sobre os lábios. Sento-me na grama e o puxo para que fique ao meu lado.
— Gosto de surpreender as pessoas.
— A melhor surpresa. Minha amiga em nosso meio! Passará muito tempo conosco desta vez?— quer saber, embora não tenha uma resposta exata. Sinto seu abraço e começo a arrancar algumas gramas do chão, fitando-as para que meu corpo relaxe.
— Não vamos colocar tanta expectativa.— aviso. Lucas sorri e começa a me contar sobre o tempo que passamos longe um do outro.
Passamos algum tempo conversando e relembrando as velhas travessuras, as aventuras que fazíamos em grupo. Quando dou por mim já está próximo do horário de ir ao encontro e me despeço do herdeiro, imaginando quando será a vez de encontrar o seu irmão.
— Como está magnífica!— elogia Dará e me inspeciono através do espelho, reclamando em seguida por conta da arrumação exacerbada.
— Não é necessário tudo isso.— digo no momento que tenho o meu cabelo sendo repuxado para encerrar um penteado.
— Por favor, Jade, para de reclamar!— ralha uma Zedara furiosa e Cefeida ri ao assistir à cena. Faço uma careta para minha irmã e ela choraminga, suplicando a Dara para que a minha governanta a maquie.
Nossos encontros foram marcados para o mesmo horário, no entanto em locais diferentes. Como é algo comum, nossos encontros serão fora dos muros do palácio, porém teremos vigilantes nos observando todo o tempo.
— Seu vestido é maravilhoso, os meus vieram todos, praticamente, estilo princesinha.— reclama Cefeida e reviro os olhos ao ouvir a mesma reclamação várias vezes.
Meu vestido é realmente bonito, de um tom azul-marinho e tecido de camurça. Seu cumprimento vai até pouco acima do joelho e vem acompanhado por um sobretudo de mesma cor, com oito botões de cada lado da peça e uma gola inteira da cor branca. Ponho um salto preto e deixo que façam uma maquiagem leve, depois de muito protesto é claro. Ouço uma batida na porta e Dara vai verificar para saber se é o automóvel que solicitamos mais cedo. Com sinal positivo de Cefeida, dizendo que estávamos prontas, vamos para o veículo e partimos para nosso encontro.
Depois de deixar Cefeida em um parque aquático, vou para uma cafeteria que abriu a pouco tempo e ainda não conheço. Chegando ao meu destino sou fisgada pelo aroma do café e dos doces, algo que muito me agrada. Ao adentrar o local, avisto Valentin sentado em uma das mesas próximo de uma persiana, distraído enquanto admira o que há através do vão. Ao notar a minha presença ele sorri serenamente e retribuo o sorriso. Valentin é um príncipe com boa aparência, ele tem olhos amendoados e cabelos negros, sua pele morena ressalta seus belos olhos. Não posso garantir qual o formato de seu corpo, por conta do traje comum entre os príncipes que não facilita inspeções.
— Espero que não tenha o deixado aguardando por tanto tempo.— digo ao vê-lo levantar e puxar um assento para que eu sente.
— Cheguei a pouco, não tive tempo para pedir nada.— assegura. Faço que sim e agradeço pela gentileza.
— Então, o que deseja saber sobre mim?— questiono facilitando nosso primeiro momento. Os olhos de Valentin encontram os meus e me pergunto se o julguei mal todo o tempo.
— Quero saber o que pretende e quais os seus interesses como prometida a um príncipe.— responde e me surpreendo com sua resposta, sua diretiva é bem apreciada. Não sou alguém que gosta de rodeios.
— Não gosto de falsas palavras, sou sempre direta e, por isso, vou lhes dizer a verdade sobre o que penso. Nunca desejei ser uma promessa, estou aqui para satisfazer as vontades de meu reino como uma boa filha faria. Não desejo um casamento por interesse, mas, se é o meu destino, não tenho nada a fazer para mudá-lo.— despejo sobre ele o que penso e percebo o seu suspiro de alívio. Valentin põe as mãos sobre a mesa e chama o atendente para fazer os nossos pedidos.
— Uma torta de cassis e um chá de limão.— digo e o vejo voltar a sua atenção para o príncipe.
— O mesmo para mim.
O atendente anota os nossos pedidos e nos deixa a sós novamente. Valentin me avalia por um tempo e ajeita o guardanapo em seu colo.
— Sei que não sabem muito sobre mim, me acham estranho, indiferente a tudo, mas, na verdade, todos só estão preocupados com o Herdeiro Liam. Sou apenas alguém para tapar o buraco do reino caso o príncipe de sangue venha faltar e não sirvo para nada além disso. Não desejo casar com alguém que não conheço, no entanto tento por minha mãe que sofrerá as consequências caso eu venha a calhar.— confessa e reconheço o seu desconforto aparente.
Vislumbro, através do vidro, as pessoas despreocupadas, sorrindo e vivendo enquanto comem pipoca doce. Elas não possuem as mesmas preocupações que nós, na verdade, eles tiveram sorte em nascer sem os privilégios reais.
— Peço que não me descarte, assim como todo o resto. Não solicito que case comigo, ainda temos um mês para nos conhecermos e talvez mudarmos a nossa atual realidade. Agora, só rogo que seja minha amiga durante esse tempo, que possamos ajudar um ao outro sem um interesse matrimonial e sem as regras reais.— propõe.
Em meio a tantos motivos para dizer não, não consegui finalizar o ato. Valentin tem os olhos mais sofridos que já vi e ninguém deve negar amizade a uma pessoa, mesmo que saia da vida dele depois de um certo prazo.
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