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Capítulo três


— Quem limpa lá em cima?

Minha voz ecoou pelo teto alto do andar principal da escola, mas pelo menos ninguém pareceu se importar. Ben deu de ombros do meu lado.

— Alguém que dorme no andar debaixo — ele respondeu.

— Tá aí a parte que eu menos entendo — falei, enquanto nós andávamos pelos corredores. — Para que fazer um andar que é praticamente da altura de dois e deixar vocês dormindo lá embaixo como se fosse um porão?

— Não é um porão. Eu tenho uma janela.

— Mas imagina o tamanho da janela que você podia ter com metade desse andar. Olha para aquilo — apontei para uma das janelas imensas que davam para o jardim. — Quem limpa isso, meu deus?

Ben riu. Ele andava com as mãos atrás das costas, parecendo desinteressado, mas eu sabia que prestava atenção aos detalhes ainda mais que eu. Quando chegou do treinamento mês passado, me contou que parte dele era conseguir absorver seu ambiente, ficar sempre atento ainda que não parecesse. Contar as pessoas em um cômodo, as saídas e entradas, possíveis esconderijos para uma emergência. Ele aprendeu tudo isso só para ser meu guarda.

Preferia não pensar muito no que isso significava.

Nós estávamos de volta na frente da entrada. Tínhamos começado no andar debaixo. Ele me mostrou a cozinha, a lavanderia, seu quarto e os outros dos funcionários. A porta da escada para lá ficava do lado da ala hospitalar e de uma cafeteria franqueada. Se eu já tinha pedido alguma prova de que a matrícula dessa escola era cara, não precisava mais.

Nós viemos andando de volta, enquanto eu analisava quão longe o teto estava e quantos quadros dos meus irmãos, do castelo, do meu pai e de qualquer parente meu eu encontrava.

Muitos. Cheguei a contar vinte e nem tinha ido metade do caminho direito.

De onde estávamos, de costas para as portas, podia ver o pátio do outro lado do mais largo dos corredores. À nossa esquerda, a secretaria e a sala das aulas às quais ambas as Casas participariam. Do outro lado, ficava o auditório e, depois dele e de frente para a escadaria e o elevador, ficava o refeitório. Já era quase o final da tarde, e eu ainda não o tinha visto. Tinha algumas mesas com café do lado de fora, mas o refeitório estava passando por uma decoração para a festa de inauguração.

Nós só fomos até a porta para o pátio. De lá, conseguimos ver o prédio da Casa das Artes à esquerda e o da Casa das Ciências à direita. Eram grandes, mas pareciam quase miniaturas perto da escola. Mais para a frente, pelo menos segundo o mapa que eu segurava, ficavam as piscinas, o ginásio, a academia, o campo de beisebol e até um campo para hipismo afastado.

— Pequeno aqui, né? — Ben comentou, olhando por cima do meu ombro para o mapa e depois na direção de todas as outras instalações que não conseguíamos ver dali.

— Minúsculo. Vamos ver o outro lado?

Nós voltamos e continuamos pelo corredor principal, passando pela sala de computação e banheiros, chegando finalmente à biblioteca.

— Ah, é por isso que o teto é tão alto — Ben falou, mas eu não estava prestando atenção e nem conseguiria responder.

A biblioteca era enorme e parecia ter saído da Bela e a Fera. Ela até tinha escadas para alcançar prateleiras mais altas! Eu achava que isso era um mito! Tinha dois andares e uma escadaria maravilhosa. Segundo meu mapa, a Casa das Artes e das Ciências tinham suas próprias bibliotecas das áreas, mas esta era histórica. Tinha até horário de visitação de turista durante a semana! Eu super entendia por quê.

— Você não precisava ter trazido Jovens de Elite — Ouvir Ben dizer e me virei para ele, que segurava uma edição do meu livro favorito em suas mãos.

— Não acredito! — Tive que ir ver com meus próprios olhos que eles tinham uma sessão especialmente para livros Young Adult e tinham feito a ótima escolha de comprar todos os livros da Marie Lu. — Sabe as joias da Coroa? Nem se comparam com isso aqui.

Para rir dessa vez, Ben até jogou a cabeça para trás.

— Você precisa ver a sua cara! — ele comentou.

— Como você pode estar olhando para a minha cara com tudo isso à nossa volta? — respondi, mas mal estava prestando atenção.

Eram livros demais! Andei por várias estantes, passando as mãos neles e fazendo carinho em alguns que já havia lido e amado. Tinha todos do universo dos Caçadores das Sombras! A pessoa que fazia as aquisições daqui era um gênio!

Depois de mais de meia hora ali, Ben voltou a aparecer do meu lado.

— Livros históricos e de não ficção ficam no andar de cima.

— An-hãm — murmurei, ocupada demais com uma capa dourada e brilhante para escutá-lo direito.

— Tem alguns sobre as famílias reais de Parforce, sabe? E você tem uns dez minutos se quiser ir à festa.

— Nossa — fechei o livro que segurava e o coloquei de volta na estante. — Vou lá.

Estava saindo do corredor de estantes e já virando com pressa para a escadaria quando me choquei com outra pessoa.

— Uou, olha por onde anda. — A voz me parecia familiar e o português misturado em um sotaque desajeitado era mais do que suficiente para eu adivinhar quem era. Só que estava ocupada demais com o cheiro de perfume para tentar reconhecê-lo.

Nem precisei. Assim que olhei para a cara dele, percebi que tinha acabado de esbarrar em Matthew Wickham, que ainda tinha uma mão em meu braço e a usava para me estabilizar. Ele era mais baixo do que parecia pela televisão, praticamente da minha altura. Seu cabelo parecia mais claro também, caindo sobre os olhos e sendo jogado para trás como um tique dele.

— Olá — ele disse. — E você é . . .

— As pessoas costumam se apresentar antes de sair perguntando o nome dos outros — me escutei falando, tão rápido que logo me preocupei com ele não conseguir entender. Será que eu deveria ter falado em inglês? Ou isso seria presunçoso demais da minha parte?

Ben passou por nós e desapareceu entre as estantes, mas eu prestava atenção a Matthew. Ele apertou os olhos, e fiquei sem saber se tinha entendido que era uma brincadeira ou se devia mesmo tentar me arriscar com uma língua que eu falava muito bem, mas que tinha poucas chances de praticar com um nativo.

— Me chamo Elisa — falei quando senti que o silêncio tinha chegado ao seu limite. Só então percebi que ele presumia que eu soubesse quem ele era, então fiz questão de perguntar: — E você se chama como?

Ele jogou o queixo para o lado, confuso e, tinha que admitir, charmoso como eu esperava que fosse.

— Matthew.

— Matt?

— Matthew.

— Claro.

Claro que eu nunca conseguiria pronunciar seu nome direito sob pressão.

Seus olhos desceram do meu rosto até minhas botas curtas, me analisando de um jeito que eu nunca admitiria ter me deixado desconfortável.

— Você tá planejando ficar segurando meu braço para sempre? — perguntei quando voltou a olhar meu rosto.

— Ah, não — ele me soltou.

— Valeu.

Eu lhe dei as costas e subi para o segundo andar.

Sim, foi um pouco mal educado da minha parte, o que provavelmente faria minha mãe ter um ataque nervoso e Lena dizer que colocariam a culpa nela, mas tinha uma coisa que eu precisava fazer. Não demorei para encontrar a coleção de livros sobre a história de Parforce, já estava bem familiarizada com suas capas duras douradas e vinho. Encontrei os dois últimos volumes e abri nas páginas que tinham a árvore genealógica de meu pai.

— Onde você foi parar? — perguntei quando Ben apareceu e me entregou uma caneta permanente preta.

— Fingindo ser guarda da escola — respondeu e me deu as costas, vendo se alguém estava para chegar.

Tirei a tampa e, tão rapidamente quanto conseguia, risquei o nome de tia Lena nas duas páginas.

*

O quarto que eu agora dividia com Chloe não era tão pequeno quanto parecia. Tinha duas camas e escrivaninhas e nosso próprio banheiro, além de um pequeno closet e uma prateleira em cima de cada cama. Como tudo isso conseguiu ficar coberto de glitter, maquiagem e opções de roupas para a festa em menos de meia hora, eu não saberia dizer.

Mas ficou.

— Você é viciada em botinhas, por algum acaso? — Chloe perguntou enquanto eu terminava de passar delineador.

— Por que você diz isso? — Fiz minha voz ficar bem aguda para ela perceber o sarcasmo sem nenhuma dúvida.

— Por que será, né? — Ela riu, tirando um par de seu caminho enquanto procurava seus sapatos. — Aliás, obrigada pelo casaco.

— Jaqueta — corrigi.

— Ficou perfeito — ela disse, parando para se olhar no espelho que eu tinha pendurado atrás da porta. — Nunca imaginaria que ficaria bom.

— Por que não? — Portia perguntou de onde estava sentada na cama de Chloe.

— Porque a Elisa é super magra, e eu sou gorda — Chloe respondeu como se fosse óbvio.

Era óbvio.

— Você não é gorda, você é linda — Portia rebateu.

— Eu sei que sou linda. Falei que sou gorda, não feia. — Chloe a olhava como se calculasse o que mais deveria falar, até onde poderia chegar. As duas tinham acabado de se conhecer, afinal.

Então resolvi a apoiar.

— Uma coisa não exclui a outra.

— Não, claro que não. Não foi o que eu falei — Portia disse, se levantando e pegando um rímel para ir passar no banheiro. Ela fechou a porta atrás de si.

— Desculpa por isso — falei para Chloe.

Portia era a minha melhor amiga, consequentemente era também a minha responsabilidade, ou pelo menos era como eu sentia.

— Não é culpa sua se alguém tem problema com o meu corpo — Chloe respondeu depois de dar de ombros e voltar a se admirar no espelho.

— A jaqueta fica enorme em mim mesmo, mas eu enrolo as mangas até os cotovelos e fica parecendo que eu tenho um namoro que anda de moto e é tatuado e precisei pegar a roupa dele emprestada depois de passar a noite na sua casa.

— Há! — Chloe riu alto. — Boa!

— Em você, parece que quem anda de moto e é tatuada é você. Bem melhor.

Para a festa de inauguração, decidi ir contra tudo que meus pais tinham me pedido para fazer. Passar despercebida. Ser discreta. Focar em meus estudos.

Tá, nem tudo.

Escolhi um vestido de frente única prata e tão metalizado que parecia um espelho. Dependendo do ângulo e da luz, ele ganhava um brilho rosa. Era tão curto que, mesmo com botas cor de rosa escuro acima do joelho, ainda deixava muita pele à mostra. Era uma das roupas que eu tinha comprado no último mês, aproveitando que poderia usá-las aqui sem ninguém para me criticar ou aprovar antes.

Chloe estava de saia florida e plissada, uma blusa branca comum e a jaqueta jeans que eu tinha comprado em um brechó. Já Portia vestia uma calça jeans escura e uma blusa com renda branca, sem graça e apropriada para uma princesa. Certeza que eu já tinha visto Arabella usar uma parecida.

Quando abri a porta do quarto, Ben não estava me esperando no final do corredor, como pouco antes. Só o encontrei de novo na entrada no refeitório, que tinha sido decorado nas cores das duas Casas. Para as Artes, o vinho arroxeado. Para as Ciências, o azul petróleo. Os guardas completavam as cores da bandeira de Parforce com seu uniforme dourado. Vi alguns alunos que já vestiam as cores de sua Casa, mas a maioria tinha feito como nós e se esquecido completamente disso.

Escolas preparatórias só serviam mesmo como um teste entre a escola comum e a faculdade. Era preciso estudar todas as matérias da sua área, depois escolher uma especialização no segundo semestre e então passar em todas as matérias específicas para ganhar a vaga em uma faculdade. Por isso, a não ser pelos herdeiros reais que o rei quisesse esconder por mais um ano como quase fora meu caso, os alunos sempre tinham dezessete anos. Para beber, só serviam então sucos, refrigerantes e cerveja, o que qualquer pessoa podia beber aqui depois dos dezesseis.

Eu fui direto a um dos barris que estavam usando para dispor a cerveja. Não reconheci a marca de primeira e tive que ler um pouco do rótulo para descobrir que era de uma cervejaria da cidade. Queria poder levar para Ben provar, pois ela era amarga e deliciosa, e a gente tinha o costume de experimentar uma cerveja de cada lugar que visitávamos.

Só percebi que ele não podia, porque estava trabalhando, quando já segurava duas garrafas e andava em sua direção. Ele balançou a cabeça discretamente, e eu parei onde estava, bem no meio do caminho. Depois voltei para onde tinha deixado Chloe e Portia e fingi que minha intenção sempre tinha sido pegar uma para Chloe. Ela estranhou, mas não falou nada. Portia já tomava seu suco de laranja e uma garota de cabelos azuis falava sem tomar fôlego:

— . . . Nunca entendi como colocaram direito e ciências em uma só Casa! Quer dizer, eu amo ciência, já dessequei várias rãs e dois camundongos na minha antiga escola, não quero ter que ficar lendo sobre leis e a constituição do país! O que que eu sei sobre leis? Nada! — Ela riu de nervoso, e eu fui de ter nojo do que dizia a entendê-la.

Eu estava nervosa também, apertando minha garrafa a ponto de ela escorregar e por um segundo me fazer pensar que ia derrubá-la.

— Vem comigo — Chloe disse quando a menina e Portia começaram a falar sobre cirurgias. Ela enrolou o braço no meu e nós saímos andando pela festa. — Alicia Freitas não sabe o que é conversa apropriada para uma festa.

— Você a conhece? — Olhei por cima do ombro em sua direção de novo. Ela tinha tamanho de doze anos, mas uma expressão séria que me faria pensar que já passava dos vinte.

Chloe tomou um gole da cerveja e desviou no último segundo de um cara que não parecia ter percebido que havia outros alunos ali.

— Quando você tem os pais que eu tenho, acaba encontrando as mesmas pessoas o tempo todo. Querendo ou não.

— Como assim?

Nós paramos, e ela olhou à nossa volta, até que encontrou o que procurava. Discretamente apontou para uma garota de vestido vermelho, cabelos cacheados e pele negra mais escura que a de Ben.

— Aquela é Luara Avis — ela explicou. — Seu pai inventou uma peça que facilita algum processo complicado na produção de carros anos atrás e desde então eles vivem fazendo caridade com o dinheiro que ele ganha da patente. Também dão as melhores festas de arrecadação! Ainda vou te levar a uma. Lori Mendes — ela apontou para uma loira que tinha metade do cabelo raspado e um vestido cromado que fazia o meu parecer opaco. — Seu nome verdadeiro é Lorena, mas não a deixe ouvir isso. Ela virou modelo pura e simplesmente por ter começado a namorar. . . — Chloe se virou e indicou com a cabeça o cara que andava na direção de Lori, alto e tão malhado que seu blazer parecia prestes a rasgar, — . . . Arthur Fonseca. O pai dele é o Barão de Genoa e dono das únicas revistas que ainda são publicadas nesse país. Eles namoram faz tipo um milhão de anos e todo mundo só está esperando eles terminarem. Esse casal é a definição de tanto faz para qualquer pessoa bi, acredite.

—Eu acredito.

Ela respirou fundo, momentaneamente distraída pelos dois, que finalmente tinham se encontrado e agora se beijavam como se estivessem sozinhos. Depois se virou de novo para mim.

— Magnólia de Vaz — disse, e eu virei para ver de quem ela falava. — A mãe dela é herdeira de uma companhia de hotéis que começou aqui, mas agora é mais conhecida no Oriente Médio. Ela é filha do Conde de Verena também, mas ele é a definição de pai ausente, é triste. — Chloe me pegou pelo braço de novo e nós voltamos a andar. — Alice Gomes, a do cabelo em arco-íris, é filha de Marie Gomes, a pintora que fez o quadro do rei dois anos atrás. Marie se casou com o Barão de Botelhos, apesar de não ter o sobrenome, mas eles tiveram um casamento conturbado até se separarem. Ninguém sabe dizer se Alice é realmente filha dele. Dizem as más línguas que é do irmão, mas o gene é da mesma família, então podia ser pior. Aquele é Oscar, a pior companhia em qualquer evento que não sirvam álcool.

Eu segui a discreta indicação que ela fez com a cabeça, mas ele deve ter ouvido, pois se virou para nós duas, e tivemos que disfarçar. Fui olhando de pessoa a pessoa que ela apontou, tentando distinguir cada uma, mas não era muito fácil. Todos ali pareciam mais velhos do que eu, se vestiam com roupas caras e encaravam o resto da festa como se fossem donos dela. Eram em sua maioria brancos, bonitos como qualquer pessoa consegue ser com dinheiro e recursos, mas muito parecidos um com os outros. Não pude evitar me comparar com eles e sentir que eu me encaixava ainda menos aqui, mesmo tendo um título mais alto do que todos eles.

Chloe acenou para um garoto bonito e que eu apostaria ser o filho do Ministro da Cultura e Preservação Indígena, pois tinha os mesmos olhos do pai. Ele não era o único descendente de um duque paraguassú que estava estudaria ali neste ano, mas era o único garoto. Então ela apontou para um cara que se inclinava em uma das portas para o pátio, de pele mais clara e um maxilar maravilhoso.

— Enzo Almeida é filho do Conde de Maldiva, um empresário de investimentos que só aparece em Vilareal para reclamar para o meu pai. As leis internacionais estão impedindo o crescimento do departamento de exportação de sua empresa — Chloe até fez uma voz esganiçada para imitá-lo, rindo em seguida. — A única coisa que realmente importa sobre Enzo é que ele joga beisebol como um deus grego e já está sendo cobiçado por universidades americanas. E, é claro, que ele é da nobreza, apesar de metade dos alunos daqui também ser.

— Deuses gregos jogam beisebol?

— Este joga.

—Você é como a Wikipédia — comentei quando a gente parou para pegar alguns dos docinhos que tinha nas mesas. O brigadeiro deles tinha um gosto um pouco amargo, mas o beijinho era uma delícia.

— Eu sou bem melhor do que isso. Quer ver? — Chloe colocou um bombom na boca e, enquanto mastigava, voltou a olhar para os outros alunos. — Tá vendo aquele cara de cabelo raspado que poderia estar em qualquer comédia romântica da Netflix? Lori teve um caso com ele ano passado e Arthur quase terminou com ela por isso. Mas aí ela conseguiu um contrato de publicidade para os dois com um estilista brasileiro, e eles continuaram juntos.

— Então eles não gostam mesmo um do outro? É por interesse?

Chloe deu de ombros, comendo outro bombom e me olhando estranho quando eu misturei chocolate com cerveja.

— Eu acho que gostam, mas tem tanta pressão em cima deles, que até eu enlouqueceria. — Nós voltamos a andar. — Dizem que Arthur se vingou da traição com Alice, mas eu duvido. Até onde sei, ela nem gosta de homem. Ela ficou durante um tempo com Vanessa Ramos — ela indicou uma garota de pele marrom claro e cabelo ondulado até sua cintura. — Seu pai é algum tipo de empresário no Brasil, e ela não mora com ele desde criança. Sua mãe é daqui, e elas têm um quarto de hotel em Vilareal que é sua casa. Só que Vanessa não se assumiu ainda, qualquer que seja sua orientação. Ela namora Thomas Borgonha! — Sua entonação mudou completamente quando ele veio cumprimentá-la. — Elisa, este é Thomas. Seu pai já trabalhou na NASA e hoje é Ministro da Ciência. Thomas, a Elisa é minha colega de quarto.

Ele esticou a mão para me cumprimentar. Era magro e tinha cara de quem faria o papel de nerd em um filme adolescente, mas seus olhos castanhos eram extremamente atraentes, e era bonito o suficiente para ser o ator principal.

— Thomas é ator — Chloe explicou, me fazendo pensar que talvez tivesse lido minha mente. — Mas ele tem que estudar na Casa das Ciências, porque não consegue ficar longe de mim.

Quase como uma prova do que ela dizia, ele mantinha seu braço em volta da cintura dela, próximo demais para quem tinha namorada, na minha opinião.

— E você, Elisa? Escolheu Artes por quê?

— Porque eu não sei fazer contas — foi a única coisa que me veio à cabeça. Pelo menos era verdade.

— Se fosse por isso, eu nem deveria estar nas Ciências — Chloe comentou.

Ele riu por educação, deu um beijo na bochecha dela e desapareceu pela festa.

— A mãe dele rouba dinheiro de seu pai e compra todas as amigas que têm — Chloe explicou. — Minha mãe acha que é porque ela foi praticamente abandonada quando criança e o único jeito que os pais dela marcavam presença em sua vida era por presentes. Ela sente medo de que, caso não acrescente algo material à vida da pessoa, se não precisarem dela, vai ser abandonada de novo.

Chloe olhava na direção de Thomas enquanto falava, então demorou para perceber minha expressão. Ela soltou uma risada rápida ao ver minha cara de confusão.

— Minha mãe é psicóloga.

— Está explicado — comentei.

Ela não respondeu, pois sorria para uma mulher que passou por nós.

— Dona Emília Dias. Ela pegou o marido, Duque de Lucéro, com outro cara na cama deles, mas um divórcio seria bem mais caro do que fingir que não é infeliz. É mãe de Lucas — ela indicou um cara de cabelo castanho e pele marrom. — Eles são muito apegados. Muito. Apegados. É uma relação complicada demais para eu analisar sem a minha mãe. Acho que é todo mundo que eu conheço. Quer dizer, todo mundo que importa e que está aqui.

Ela pegou um prato de papel e juntou alguns docinhos. Eu a copiei, mas meu prato virou foi uma montanha. Estava morrendo de fome!

— Sem contar com Nicholas — ela disse, apontando para um cara com cabelo preto e pontas verde-limão na altura dos ombros. Ele vestia uma camisa xadrez e uma saia preta na altura dos joelhos que eu queria para mim. — Mas eu não o conheço, só vi uns desenhos dele e comecei a seguir sua página no Instagram. Ele não vem de uma família da nobreza ou de algum cargo político.

— Você sabe que eu já não lembro o nome de ninguém, né? Muito menos quem são seus pais.

Não era exatamente verdade. Elena tinha passado as três semanas desde que me matriculei me fazendo relembrar as aulas sobre a corte parforcense e os descendentes dos condes, duques e barões importantes. Fez questão de focar nos ministros e políticos que eram parte da nobreza, como o pai de Chloe. O foco havia sido especialmente nos filhos que estudariam comigo, mas era bem diferente vê-los pessoalmente e bastante difícil relacionar a teoria com as pessoas reais.

Chloe deu de ombros.

— Logo você decora. Vai ser difícil não ouvir falar dessa gente enquanto estuda aqui. Mas e você? Eu ainda não sei a sua história. Já sei que você não é do mesmo círculo, mas não sei como veio estudar aqui ainda assim — ela indicou uma mesa que estava vazia e nós duas nos sentamos.

— Eu sou de Vilareal — comecei.

—Percebi pelo sotaque. — Matthew falou ao se aproximar de nós e se sentar em uma cadeira entre Chloe e eu. Ele não parecia ter percebido a ironia, já que, de nós três, quem tinha o sotaque mais pesado era ele.

— Este, Elisa, é Matthew Wickham — Chloe o apresentou de brincadeira. — Há mais ou menos um mês, ele vem tentando se intrometer no meio de famílias que não sabem confiar em estranhos, muito menos em estrangeiros, mas por algum acaso está tendo muito sucesso.

— É meu cabelo — ele comentou.

— É o cabelo — ela concordou. Claramente o conheceu bem antes de me conhecer. —Elisa estava prestes a me contar sua história de vida.

— Eu estava, é?

— Vá em frente. Também quero saber. — Matthew se virou direito para mim e ia apoiar a cabeça na sua mão, mas percebeu nossas cervejas vazias e fez questão de ir pegar novas antes. — Pronto — disse quando voltou. — Já pode contar.

— Nem tem o que contar. Sou de Vilareal, fui criada pela minha tia, ganhei uma bolsa e agora eu estudo aqui.

Eles conseguiam perceber que a temperatura tinha aumentado bem e que minhas pernas balançavam embaixo da mesa? Eu esperava que não. Tomei um gole longo da cerveja e me deixei fechar os olhos por alguns segundos para aproveitar o sabor.

— Bolsa para qual Casa? — Matthew perguntou.

— Artes — respondi.

Sua expressão mudou, mas foi tão pouco, tão mínimo, que não saberia dizer se fora real ou eu tinha imaginado. Podia jurar que tinha ficado surpreso, mas não falou nada para confirmar minhas suspeitas.

— E você? — Não consegui evitar perguntar, estava curiosa demais.

— Por que não procura no Direto de Belforte? Aposto que já está lá — ele se levantou sem explicar o que aquilo significava e se afastou.

— Muito interessante, ele — falei sem qualquer emoção em minha voz.

— Tem bastante gente interessada, sim — Chloe começou a dançar onde estava sentada, curtindo a música que tocava. — Mas ele realmente se acha mais do que é. Não faz nenhuma diferença para a gente se a família dele é histórica ou se ele pegou sei lá quantas meninas em um reality show. Tem gente famosa aqui já, famílias históricas também, não é novidade. Quer dizer, para alguns de nós.

— O que é Direto de Belforte?

Em vez de me responder, ela me pediu meu celular e me devolveu com ele aberto em uma página no Twitter.

— Quem assina é uma tal de Kira Giovanni, mas ninguém sabe quem ela é.

— Tipo em Gossip Girl?

Chloe levantou as sobrancelhas, logo as franzindo.

— É, meio que sim. Eu acho que sei quem é.

Pela minha expressão, ela já sabia que eu estava curiosa. Olhou por cima do ombro antes de responder:

— Olivia Alcântara, a garota ruiva atrás de mim. Ela é filha daquela atriz que ficou famosa quando divulgaram um vídeo dela com o namorado. Quando ela divulgou, aliás.

— Sério?

Chloe assentiu com a cabeça.

— Era vingança para o ex. Ou ela queria o ex de volta, estava só fazendo ciúmes. Não sei direito. De qualquer jeito, Liana Alcântara ficou famosa, e sua filha agora estuda aqui. Acho que ela pensou que era uma boa ideia criar uma espécie de blog da escola. Você já está nele, não viu?

Ela pegou o celular da minha mão de novo até entrar o tweet que queria.

— Matthew parece te conhecer muito bem aqui — ela comentou, virando a tela para eu ver e sorriso maliciosamente.

Era uma foto nossa na biblioteca, logo depois de termos esbarrado um no outro, e a mão dele continuava em meu braço.

A diretora subiu ao palco que tinham montado no final do refeitório bem nessa hora, a música baixou e nós fizemos o mais perto de silêncio que conseguíamos para ouvir toda a apresentação. Ela falou das regras, nos lembrou que há um manual para seguirmos e que dão por entendido que todos o lemos e o seguiremos. Seu discurso foi recheado de frases motivacionais, além de lembretes sobre a comemoração do aniversário de Rei George I, para a qual alguns alunos seriam sorteados. Terminou falando para nós nos divertirmos e qualquer coisa assim.

Eu não estava prestando muita atenção. Ainda estava com a página do Direto de Belforte aberta, preocupada demais com o que tinha acabado de perceber. Por causa de um esbarrão, Kira sabia quem eu era, ou pelo menos sabia que eu existia. Ficar perto de Matthew só poderia me trazer problemas.

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