Capítulo 23
Milena narrando :
Depois de um tempo distraída com a presença de um dos colegas de Gabriel , volto a realidade e sou puxada para treinar.
Corro atrás de uma luva e me viro para colocá-las como se eu estivesse me despindo.
Necessitando de privacidade , movimento as luvas apertadas rapidamente para tampar os pulsos.
— Não precisa se virar para colocar as luvas. Venha aqui, deixe-me te ajudar — Gabriel diz com as palavras meio amarguradas.
Algo estava o incomodando e eu não tenho idéia do que se trata.
Sinto meus pulsos pressionados , não estava conseguindo ajustar com muita eficácia.
Relutante, caminho em direção à Gabriel, aceitando sua ajuda.
Ele se posiciona atrás de mim, como se me abraçasse por trás e termina de ajeitá-las em minhas mãos, puxando-as com força para ficar bem encaixada.
--- Punho sempre fechado e posicione bem o braço, porque é aí que está o segredo. Não levante demais o cotovelo
Ele diz , afastando-se apenas para me observar. Franzo o cenho enquanto tentava fazer o que Gabriel instruiu e procuro seus olhos para saber se estava fazendo certo.
Gabriel faz uma careta diante de minha tentativa e volta se aproximar devagar. Com as mãos surpreendentemente leves, ele desliza os dedos por meu braço, me guiando para posicionar-me corretamente.
— Isso, assim. Fica firme — Ele diz e então afasta-se.
Os outros meninos da academia soltam risadinhas , e me forço a pensar que não significa necessariamente que estão rindo de mim.
Entretanto, ouço meu nome baixinho entre os coxinhas e solto uma lufada de ar, irritada.
Firmo os braços e os pés conforme Gabriel me ensinou e então afundo o punho com força no saco.
--- Que isso , princesa. Está tentando me impressionar?— Gabriel diz baixinho, com intenção de que apenas eu escutasse.
Não sou capa de abrir um sorriso pela gracinha, pois me sentia inquieta.
Uma dor juntamente com uma sensação de formigamento tomava conta de meus pulsos e minhas mãos.
Felizmente não há o que eu possa fazer, uma vez que eu fiz tudo isso.
Convenci Gabriel a me treinar
Cedi aos pensamentos absurdos.
Topei treinar mesmo sabendo de minha condição.
Agora o que me resta é aguentar isso.
Dou mais uns socos, os meninos aos poucos pararam de rir e passaram a apenas me ignorar , vez ou outra eu volto a me distrair com o colega de Gabriel.
Eu estava absurdamente desconfortável, sentia meu sangue esquentar em função do exercícios e minhas mãos latejavam.
Angustiada e com dor, encaro o teto a fim de tentar evitar meus olhos marejarem.
---Está tudo bem Milena ?-- Gabriel pergunta, segurando meu ombro com firmeza como sinal de apoio. Segurança.
Com a voz embargada digo:
---Sim, vou beber água e já volto--Ele tira a mão do ombro e vai conversar os amigos da academia. Vou até a mala e tiro uma garrafa , mas não de água.
Vodka.
Senhor, o que estou fazendo da minha vida?
Hesito antes de dar uma golada.
Será que meu pai começou assim? Ou será que ele já teve essa fase.
Beber como analgésico.
Me pego pensando como a situação é embaraçosa. O que eu diria se me vissem com isso?
Provavelmente diriam que sou viciada.
O líquido desce queimando e eu até sento no chão por um momento, pensando.
Eu sou viciada?
Preciso o tempo inteiro questionar meus métodos e meus resultados. O que tudo isso indica?
Uma pequena voz em minha cabeça tenta me convencer de que não há muito para questionar.
Trouxe porque álcool é o melhor analgésico, e sabia que eu iria precisar. Bebo um enorme gole , suficiente para doer menos e não me deixar bêbada.
Bebo água depois para tentar abafar o cheiro e tento esperar um pouco, mesmo que eu tenha certeza que Gabriel perceberia. Quando volto, encontro todos sorrindo.
--- Ei ,Milena, não é? -- O garoto que eu estava olhando desde que eu cheguei diz.
--- Sim -- digo tentando analisar o que poderia estar acontecendo.
Passo os olhos pelo local. Cadê o Gabriel?
--- Sou o Pedro, prazer. Vamos dar uma praticada nesse aqui, estou aqui para te ajudar também -- Ele diz me empurrando para outro saco de pancadas e segurando minha cintura como se eu fosse uma boneca que ele estava ajustando a postura.
Meus olhos voltam a procurar por Gabriel no automático e quando o encontro, tento me comunicar com ele.
É estranho, mas Gabriel consegue me entender apenas observando.
Ele se aproxima cauteloso e cruza os braços.
Ignorando minhas tentativas de comunicação silenciosa.
Gabriel parecia estar puto.
O garoto, que se chama Pedro, se afastou por um minuto para conversar com seu amigo. Lançando olhares curiosos para nós dois.
--- Não vai me auxiliar? -- Questiono.
Gabriel parece dizer que eu já estava indo bem sem ele. Com a cabeça erguida e o nariz empinado, ele permanece de braços cruzando e ignora minha pergunta.
O que deu nele?
Reviro os olhos. Não consigo lidar com as oscilações de humor de Gabriel dessa forma.
As risadas voltam a recuar pelo ambiente e isso me deixa muito desconfiada.
Estou sentindo que está rolando alguma coisa.
Me posiciono para dar o soco, mas a dor pulsante me invade. Minha mente reforçando o local exato em que eu tinha guardado minha garrafinha , como se estivesse me incentivando a acabar com tudo isso.
Todo esse sofrimento e tomar só um golinho.
Minha garganta arranha como lixa e eu já estava me sentindo exausta. Ignorando a sensação de mal estar, continuando tentando alguma coisa com o saco de pancadas.
--- Boa, Milena, está socando pior que minha mãe -- Ele diz provocando e os meninos riem mais. Isso me irrita muito e concentro minha força no soco. Funciona. O golpe saí mais centrado.
--- Se concentre , você falou que queria se defender, tem que se esforçar -- Ele grita. Me deixando meio frustrada.
--- Lembra do que você passou, lembra do que ele fez com você-- Gabriel diz, aí não dá, ele está falando demais. Volto minha atenção para ele.
--- Ah você também já sofreu muito , né, Gabriel, pode me ensinar como usa isso? Com certeza você passou por mais coisa que eu -- digo ofegante.
--- Língua afiada a dela, hein -- uns dos maravilhosos meninos diz. Reviro os olhos e encaro Gabriel , o mesmo cerra os olhos e diz
--- Cale boca e volte ao seu trabalho- Pelo menos ele entendeu , não gosto de quem fala demais. Volto a socar e era como se o saco nem mexesse. Concentração. Concentração. Mantenho a posição que Gabriel me ensinou e uso o conselho que ele me deu, eu quero me defender, me defender dele. Meu pai vai vir atrás de mim, não posso esperar ser salva, porque ninguém vai me salvar.
Só eu posso lidar com ele.
Não vou arrastar ninguém pra esse buraco.
Lembranças surgem com força em minha cabeça e concentro a raiva nos socos.
Era como se ele estivesse do meu lado gritando comigo : EU VOU ACABAR COM VOCÊ! NÃO PODE SE TRANCAR! VOCÊ MATOU QUEM EU AMAVA, AGORA VAI MORRER NAS MÃOS DE QUEM AMA TAMBÉM. arrepio ao lembrar dessas palavras e continuo a socar agora com mais força, já não sinto mais dor na mão.
Por um momento, tudo fica em silêncio e era como se estivesse eu e meu pai, sozinhos.
---MILENA!!VAI SERVIR MEUS AMIGOS!
---MILENA, NÃO SEJA ARREDIA , DEIXA ELES PASSAREM A MÃO EM VOCÊ!
---SABE QUAL É O PIOR? QUE VOCÊ É LINDA COMO ELA , TOLA COMO ELA!!
Lembranças e mais lembranças dele. Já estou arrepiada, soco cada vez mais , agora eu preciso socar e bater para me livrar dessa raiva, desse ódio. Soco cada vez mais e quando já estou prestar a desabar em choro o saco estoura voando ovo e farinha em mim. Fico grata por isso ter acontecido , senão eu ia chorar ali mesmo e por outro fico com muita raiva dessa idéia infantil. Olho para trás e Gabriel está chorando de rir , os outros meninos incluindo Pedro riem e batem palma também.
--- Vai tomar banho , tem ovo em você, vai ficar fedendo!!--Gabriel diz em meio a crise de risos.
--- Você é muito idiota né , Gabriel, sabe de uma coisa, está rindo igual um viado bêbado -- digo para provocar. O mesmo para de rir e me encara.
E aí é minha vez de rir.
--- Não vou discutir com você, se eu falar qualquer coisa você chora e fica com raiva de mim -- Ele diz.
--- Gabriel?! O que aconteceu com você? Sua mãe falou que você era carinhoso ,sensível, amoroso. Que mudança -- Eu digo usando as informações que descobri hoje.
Ele tenta se aproximar de mim, mas uns dos meninos o seguram . Quando estou a caminho do chuveiro ele grita :
--- Vai contar seus hematomas , filha da puta!! --
Gabriel fala demais! Que merda , a raiva toma conta e dessa vez eu vou para cima já em mente os golpes que usar, mas uma mão me puxa pela barriga. Solto um grunhido de dor e me solto de sei lá quem tenha me agarrado. Saio batendo os pés forte no chão.
Sem conseguir prestar atenção, apenas saio de perto irritada.
Debaixo do chuveiro eu não aguento e desabo a chorar. Por que ele é assim? Me lembra tanto meu pai. Posso até irritá-lo, mas só faço isso para me defender. Fico um tempo deixando a água cair em meu corpo e torço para minha cara não estar inchada. Saio do banheiro e visto um short e uma blusa azul. Penteio rapidamente meu cabelo e saio.
Gabriel narrando :
Chegando lá na academia ensino a Milena uma posição para socar e quando ela dá alguns socos percebo seu rosto se contorcer em dor. Tento descobrir o que houve, mas Milena fala que vai beber água.
--- Perigosa essa daí -- Rafael diz.
--- Deve dar trabalho -- Pedro diz.
--- Vocês não fazem idéia -- digo olhando Milena distanciar.
--- Uai, Gabriel, parece que está apaixonado.-- Leonardo diz batendo nas minhas costas.
--- Me respeita , Leo! --Digo e os meninos riem.
--- Mas e aí ? Vai ter trote? -- pergunto
--- Claro né --
--- Esse vai estar pesado. Vai ser o seguinte, sua mina tem que socar um saco de pancadas que recheamos com algo dentro. --- Leo explica.
--- O saco de pancadas não é muito resistente, mas ela tem que se esforçar. Se ela conseguir estourar vai ter nosso respeito. -- Pedro termina de explicar.
--- Se ela não conseguir? -- pergunto
---Vai precisar lidar com nossa hostilidade - Pedro diz e os meninos soltam risadinhas, me junto a eles até Milena aparecer desconfiada.
Pedro leva Milena até o saco de pancadas recheado e ela começa muito mal, parece que sente dor.
Com o tempo ela fica socando e depois parece que se solta, como se só estivesse ela na academia. Seu rosto se contorce em raiva e dor e eu já sei no que ela está pensando. Pensando nele , no pai. Os socos dela vão melhorando e começam a fazer um grande barulho .
Quando ela parecia que ia gritar e arrancar os cabelos a qualquer momento, com os olhos brilhando mais que o normal, Milena se assusta quando , de repente, o saco estoura e seu rosto é coberto por ovo e farinha.
Ela estava uma pilha de nervos, podia ver e quase sentir.
Tudo indicando de que agora não era o melhor momento para rir , mas os olhinhos piscando sem entender nada.
Completamente suja e sem reação, a situação de Milena me arranca uma risada sincera.
Os meninos batiam palmas e riam junto comigo e embora todos estivessem rindo, a raiva de Milena transborda e ela vem pra cima de mim.
Sedenta por uma discussão.
E eu não tenho nenhum envolvimento. Os meninos que planejaram isso.
Cruzo os braços e travo os dentes, sentindo meu sangue ferver também.
Por que essa garota tem que esperar o pior de mim?
Rafael e Leonardo precisam me segurar quando também me aproximo dela, passando uma mensagem silenciosa de que eu topava a discussão.
A briguinha.
— Poxa, você escolheu bem o saco premiado-
Resmungo.
Meu comentário servindo como a gota d'água para Milena.
Ela avança pra cima de mim cheia de determinação, mas Pedro a agarra na barriga. Como ela vive machucada, a garota solta um grunhido de dor e afasta-se imediatamente dos braços de Pedro.
— Milena , vá para o vestiário tomar um banho. Gabriel, venha aqui ‐ Rafael diz, autoritário.
Milena bufa e recua, buscando manter sua postura enquanto dirigia-se para o vestiário.
Mas eu conseguia perceber algo nela.
Passo a mão em meus cabelos e me viro de costas, tentando tirá-la de minha cabeça.
Ela devia demandar tanto de meu tempo, minha atenção e meus pensamentos.
Quando ouvimos o som da água cair os meninos me soltam.
--- Cara ,que menina esquentada - Leonardo diz.
--- Ela tem que controlar a raiva. E a língua. Ainda bem que você a trouxe para treinar, pode trazer um propósito para ela. Algo para centralizar e direcionar.--- Rafael diz.
---Ei , essa convivência de vocês é meio estranha. Parece que passam muito tempo juntos, entretanto, muito tempo juntos para brigando.
--- Como fogo e gasolina. Um é combustível para a raiva do outro. -- Pedro fala.
--- E então... Parece que vocês se conhecem bem. Qual é a dela?- Leonardo diz, com todos eles me cercando para arrancar alguma informação.
--- Pois é velho , que papo de hematomas era aquele?--
--- Eu toquei na barriga dela e ela já saiu chorando -- Pedro completa, instigando a curiosidade de todos eles.
Fecho o punho irritado e me afasto deles.
— Por que estão perguntando isso para mim?
Os garotos trocam olhares, tentando entender o que estava acontecendo.
Eu não os julgo, também não sabia o que está rolando.
Estava claro para eles que Milena e eu não éramos melhores amigos, então talvez eles esperassem que eu contasse algo sobre ela.
— Qual o problema de falar, cara? Vocês dois não...- Pedro diz, curioso.
Tentando insinuar algo a nosso respeito e eu rapidamente o interrompo:
— Vocês viram que não damos certo. Mas não entendo o que os fazem pensar que diria algo sobre a vida dela. Se querem saber, Milena estará de volta daqui a pouco...
Eles levantam as mãos como se estivessem se rendendo e brincam entre si.
Fazendo comentários baixinhos sobre Milena. Sobre mim.
E nós dois.
— Essa garota é confusão , hein. Impossível ficar entediado com ela... - Ouço um deles comentar.
********obrigada por lerem , comentem e votem bastante!! Amo de coração ler os comentários e juro que leio todosss! Beijos e se cuidem!!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro