02 | O acampamento
No outro dia, eu, Mike e meus pais estavam no carro indo para algum lugar que eles não nos disseram. Pegamos várias coisas minhas lá em casa, inclusive na casa de Mike junto com as coisas dele. Lydia e Peter ligaram para o Sr. Harris várias vezes até o mesmo atender e explicaram a loucura que havia acontecido. Se não fosse o suficiente, Mike dormiu na minha casa, fomos praticamente empurrados para dentro do carro e saímos às pressas.
Peter ligou o rádio e a música animada começou. Não combinou muito com a situação que eu estava. Apenas cruzei os braços e pensei quando tudo aquilo ia acabar. Minha barriga parecia um buraco negro e não sentia vontade de comer nada ou falar sobre o suposto monstro que quase matou meus pais.
— Olha, sei que do ponto de vista de vocês isso pode parecer seguro... — Mike diz delicadamente para os meus pais e respirando fundo. Junta as mãos e se reclina no banco do carro, como um psicólogo faria — ... Mas isso é LOUCURA! Já falaram com o meu pai? Tem certeza? Ele só deixou um recado falando para eu confiar em vocês, só que tá difícil, viu.
— Sim. Ele concordou.
Arrumei o casaco e olhei pela janela vendo os prédios do Brooklyn sumindo aos poucos. Era a direção para Long Island e me perguntei por quanto tempo ficaria sem ver minha casa.
Não queria ter saído, não queria que nada disso tivesse acontecido. Para mim, tudo era um sonho e demorava a acabar.
— Já estamos tão longe do Bronx... — respirei fundo ainda olhando a janela. — Mãe, porque vocês estão fazendo isso? Se a vovó soubesse ia...
— Daphne, eu vou tentar resumir — sempre que ela diz isso a história é longa. Lydia ficou de frente para nós. — Os deuses gregos e romanos existem. Eles têm filhos com mortais que são chamados de semideuses, e nunca estão seguros. Eu e seu pai somos semideuses.
Eu e Mike nos olhamos e começamos a rir. Meus pais estão loucos. Talvez eu também estivesse. Se a loucura continuasse eu abriria a porta e saía correndo.
— Por favor diga que isso é mentira. Deve ter outra desculpa mais esfarrapada que essa, mãe, essas coisas não existem. Sabem que eu adoro uma ficção mas isso é outra coisa.
— Mas é verdade! — meu pai diz sem olhar para trás. — Porque acha que nunca viu seus avôs, Daph? Eles não morreram. Eu sou filho de Hermes.
— SÉRIO? — Mike exclama e encosta-se ao banco da frente. — O mensageiro dos deuses? Que incrível! O que você pode fazer? Voar com aqueles sapatos com asas?
— Michael, você acredita neles? — questiono e mudo a posição no banco. Meu amigo assentiu com a cabeça e deu de ombros.
— Daph, depois de ver aquela coisa ontem, meu pai quase nunca falar sobre a família da minha mãe, acho que tudo mudou. Você não quer explorar isso? Porque eu sim. Eu quero saber o que está acontecendo.
Aproximei-me dele um pouco mais. Senti minha garganta vacilar na resposta, mas o medo na minha barriga falava mais alto.
— Não, eu não quero.
Por um tempo só ficou o silêncio. A música e o som externo eram tudo o que conseguia ouvir. Então percebi uma coisa: já tínhamos saído do Queens e passado por vários parques. Era o caminho para a costa.
— Para onde vamos, mãe? Essa história louca só piora — Lydia me encarou com semblante triste. — O que nós somos? Lá na escola você disse algo sobre Cronos e me deu essa coisa.
Tirei o relógio do bolso. Ela ficou quieta. Meu pai segurou sua mão e dirigiu com a outra. Lydia olhou para Mike, depois para mim e suspirou, como se não dissesse aquilo faz tempo.
— Sou filha de Cronos.
— O titã? — Mike perguntou com os olhos arregalados e arrumei os óculos. Mike sempre leu mais do que eu e adorava mitos. — Como isso é possível? Todos os filhos dele são deuses e a senhora não parece uma. Sem ofensas.
— Meu avô controla o tempo — sussurrei para eu mesma, como se fosse um segredo. Balancei a cabeça. Era muito para absorver. — Mãe, naquela hora você parou o tempo de verdade?
— Sim. Consigo parar, voltar e avançar. Posso fazer as pessoas envelhecerem ou ficarem mais jovens, além de ser ótima em localizações. É muito perigoso, e decidi parar com tudo isso assim que você nasceu.
— Tá beleza — não tava nada beleza. — Muito legal essa conversa e tal... Mas o que a gente tem a ver com isso? Vocês disseram que são semideuses e etc, mas eu não sou nada. O Mike nem é um semideus, ou é? Se não for, como ele viu tudo aquilo e cagou nas calças?
— Em minha defesa, eu quase caguei nas calças — ele levanta o dedo em oposição.
— Alguns mortais podem ver através da névoa, que é uma espécie de véu, onde separa os mortais do nosso mundo. Sobre o Mike, quando era pequeno, nós pensamos que você era um mortal — ela umedeceu os lábios e continuou. — Mas você é um semideus por parte de mãe.
— E sabiam disso desde sempre? — ela anuiu. Mike ficou em choque e esfregou as mãos.
— Por isso achamos melhor que você ficasse próximo de nós, caso algo acontecesse. Seu pai nos deixou encarregados da sua segurança desde pequeno.
Foi tudo um plano feito por eles. Eu e Mike fomos melhores amigos por anos, ele vivia na minha casa e eu na dele. Meus pais sempre estavam por perto só esperando até esse dia acontecer.
— Quem é a minha mãe? — ele perguntou calmo, prestando atenção em cada detalhe e arrumando os óculos. Mike nunca falou da mãe dele, nem mesmo comigo. Deve ser terrível saber que sua mãe está viva e ainda ter poderes.
— Não podemos te contar, não agora. É melhor você saber por outro jeito. O seu pai, Mike, queria que você tivesse uma vida normal. Ele nunca achou que um dia vocês fossem expostos à tudo — meu pai diz. — Respondendo sua pergunta, Daphne, nós achamos que você pode ter herdado nossos poderes, mas é só achar mesmo já que você nunca demonstrou nada até agora. Os Descendentes estão surgindo aos poucos, mas Quíron está preocupado.
— Quem? Descendentes? O que?
— Você vai descobrir — minha mãe completou e sorriu de canto. — Ele é meu meio-irmão, mais ou menos. Longa história... Enfim, não vamos poder ir até lá, mas tenho uma amiga que pode ajudar vocês em tudo.
— Quem disse que eu quero ir para esse lugar?
— É para a sua própria segurança. Depois de um Minotauro ter ido atrás de vocês isso pode ser mais perigoso. Daph, você pode ter os nossos poderes... — ela fala baixo, para si mesma. — Não quero nem imaginar os filhos de Percy. Sorte a deles que já moram em um lugar seguro, no Acampamento Júpiter.
Ok... Não sei quem é esse moço então deixa para lá. Depois de algumas coisas que eu não entendi, estava difícil assimilar tudo aquilo. Se um dia eu tivesse parado o tempo com certeza lembraria.
Mike não disse mais nada, só olhou pela janela. Devia ser horrível ter um pai ausente. Por mais que o Sr. Harris fosse um bom homem e pai, ele ainda era muito ocupado. Ser rico não compensa tudo. Ainda mais a mãe, que depois de anos, ela é alguma coisa com poderes e provavelmente, ele também tem alguma habilidade.
Depois de quarenta minutos, meu pai encostou o carro na beira da estrada e nos levou para a mata.
— Eu te amo, Daphne.
— Eu também — falei. Eu não queria ir de jeito nenhum, nem me distanciar deles. Mike agradece por tudo, mesmo com suas mãos tremendo. Peter apontou para a mata:
— Siga em frente...
— Olhe para o lado... — Mike começa a cantar e o repreendo com o olhar. Seu rosto ficou vermelho.
— No meio da colina? — ergo uma sobrancelha, falando para minha mãe. — Tipo na mata mesmo? Sério?
— Só vão e tomem cuidado. Estão te esperando na entrada do acampamento.
Seguimos adiante apenas com as mochilas nas costas. Minutos depois dos insetos quase engolirem Mike e andarmos até as pernas virarem macarrão, avistamos um arco enorme de pedra, escrito "Acampamento Meio-Sangue".
Uma mulher nos esperava e eu a conhecia muito bem. Ela tinha um sorriso lindo, pele escura, cabelo cacheado volumoso e olhos que pareciam mudar de cor.
— Helena? — pergunto e ela sorri, vindo correndo me dando um abraço. Ela usava uma blusa laranja e jaqueta jeans. Fiquei aliviada por encontrar alguém conhecido. — Por que você está aqui? Mas...
Helena é amiga da minha família desde sempre. De vez em quando ia lá em casa com a namorada dela quase toda semana enquanto eu era pequena. Mas um dia parou, ficou difícil vê-las. Ela é uma daquelas tias legais que sempre estão lá pra conversar e brincar.
— Eu sei que minha família é complicada, querida. Latinos, americanos e etc — ela contava nos dedos, é a pessoa mais alegre que eu conheço. — Só faltava uma deusa como mãe. A propósito, desculpe esconder tudo de você.
— Qual é sua mãe? — perguntei animada, mas ainda desconfiada. O que mais eu não sei? Esconderam a verdade de mim a vida inteira.
— Íris, deusa do arco-íris — Helena faz linhas coloridas surgirem das pontas dos dedos. Os cachos ficaram em um tom amarelado quando viu Mike feliz como uma criança de seis anos. Achei aquilo incrível. — Tenho que apresentar vocês à Quíron e tirar as dúvidas. Afinal, sou uma das monitoras. O acampamento virou minha casa.
— E a Beatriz? Vocês não estão mais juntas? — franzi as sobrancelhas. As duas são inseparáveis.
— Estamos, mas ela preferiu viajar para a Flórida e continuar a estudar plantas — dá de ombros. Seu cabelo começou a ficar rosado e arregalei os olhos. Andamos cada vez mais para dentro do acampamento — essas coisas. O pai ficou muito doente semana passada. Tive que ficar aqui e não sei quando vamos nos ver de novo... Mas a gente se fala todos os dias.
— Espera, você disse que é monitora? — Mike perguntou arrumando a mochila e ela sorriu.
— Me ofereci. Está cada vez mais difícil achar semideuses e descendentes. Além disso, quando Lydia disse que vocês viriam pra cá, não tive como recusar. Depois de tudo que ela fez por mim...
— Nunca me contaram essas histórias — falei pensando na mamãe. — Na verdade, nunca me contaram nada. É como se tivessem colocado uma venda no meu rosto esse tempo todo.
— Tem coisas que devem ser esquecidas — ela disse mais séria e apertando as mãos. — Faz muito tempo. Eu tinha só quinze anos, por aí...
Olhei para Mike com confidência e achamos melhor não perguntar mais nada. Entramos no acampamento de vez e ficamos surpresos. O lugar era enorme, cheio de construções, pessoas de todas as idades usando armas, fazendo coisas com poderes estranhos e correndo. Havia uma casa de cor azul muito desgastada (vamos para lá), uma plantação de morangos, um lago, estátua gigante... É demais para um dia só.
— Não sei se fico com medo ou feliz — Mike sussurrou, ele estava apavorado. Um garoto passou correndo rápido gritando "Por Ares!" E fez um high-five com Mike. Comecei a rir e entramos na Casa Grande, como Helena chamou.
Helena nos pede para esperar enquanto chama Quíron. Quando ele sai, eu e Mike ficamos sem falar nada, só de boca aberta.
— Minha nossa senhorinha.
— Você — Mike falou rouco e apontou. — Ele tem uma...?
— Cara, que bunda de cavalo incrível! — exclamo e Quíron riu enquanto coçava a barba branca. Mike caiu para trás, desmaiando na grama e o deixo lá. Fiz uma careta e peguei em meu próprio traseiro. — Espera, se você é meio-irmão da minha mãe... Ela não tem essa coisa não, né? Será que eu vou ter uma dessas também?
— Não, está tudo bem — ele diz e Helena se apoia na parede de madeira. Mike se levanta ainda pensando estar em um sonho. — Então você é a filha da Lydia e Peter. Que curioso. É a cara de Violet, tem até as mesmas sardas e o formato do rosto. Exceto os olhos.
— Obrigada. Puxei os olhos do papai.
— E você, qual o seu nome? — Quíron se dirige para Mike.
— Mike Harris. Ainda não sei quem é minha mãe.
— Ah, então temos uma descendente e um semideus. Já usaram os poderes alguma vez ou, no caso de Mike, sentiu atração por alguma deusa?
— Não — respondemos ao mesmo tempo. — Na verdade, meus pais e o dele já sabem quem é, mas não podem contar, então... — completei. — Olhe, eu nem sei se tenho mesmo esses poderes. É só olhar para mim e ver. Só estou aqui porque minha mãe obrigou. Ela até me deu isso — tirei o relógio do bolso da calça e o mostrei. Helena arregalou os olhos.
— Sério que ela entregou o relógio? — ela perguntou chegando mais perto — Ele está diferente.
— Não é o dela. Mamãe disse que é um novo só para mim. Era para minha proteção ou sei lá... Ela deve ter mudado alguma coisa para mim.
— Daphne, — Quíron prossegue — Você pode ficar aqui até, talvez, manifestar os poderes, o que eu acho fácil acontecer. Se não tivesse qualquer contato com o nosso mundo nem teria passado pela barreira ou visto o que viu.
— Barreira?
— Mas talvez seja só de sangue — Helena prossegue, falando com ele — Sangue Olimpiano. Temos uma barreira em volta do acampamento. Ela não deixa que monstros e mortais nos vejam. Então, se vocês passaram, ou são meio-sangues ou mortais que veem através da névoa.
Quíron diz:
— Fique aqui e não se meta em encrencas, como Peter... Não pegou isso dele, não é?
Helena riu e eu também. Não posso esquecer o fato de que estávamos na escola por minha culpa e já me meti em encrencas maiores. Quíron fez cara de "É hoje que dá merda" e se despediu com um aceno.
Helena nos levou para um chalé de Dionísio, onde podíamos ficar até manifestar os poderes ou sermos "reclamados". O chalé de Hermes estava cheio por enquanto, graças ao período de férias, apesar de pouca gente no lugar. Não é muito comum ficar nesse chalé, mas os outros sempre são muito lotados, e lá tinha cheiro de vinho (óbvio). Alguns caras mais velhos eram engraçados porque pareciam bêbados, mas ninguém aqui tem autorização para qualquer coisa alcoólica — tudo de acordo com a monitora.
Coloquei minha bolsa em cima da cama quando uma garota surgiu do nada, me olhando de cima a baixo. Ela tinha cabelo curto entre o queixo e ombros, ondulado, meio castanho claro com uma franja. Seus olhos eram muito claros e a pele era bastante rosada.
— Calma lá, não é todo dia que um campista novo chega! — ela parecia ter minha idade. Outro garoto parou de tomar um suco e todos fizeram o mesmo. — Precisamos saber com quem lidamos aqui.
— Pode perguntar — Mike se põe ao meu lado. Ele já havia se acostumado com pessoas arrumando confusão. Não precisava lembrar de uma vez quando ameacei três caras com um bastão de beisebol só para defendê-lo. Mike podia parecer um pouco intimidado, mas eu não. Até achei a garota legal.
— Own, que doces vocês dois. Parecem até namoradinhos — ela diz irônica e aponta para Mike. — Você: nome, idade, descendente ou semideus?
— Mike Harris. Quatorze anos. Semideus.
— Pai ou mãe?
— Mãe.
— Ótimo. — Ela tira a expressão de raiva e dá um sorriso sincero. Ela estendeu a mão e ele apertou. — Seja bem-vindo, Mike. E você, ruivinha?
— Daphne Kristall. Quatorze anos. Descendente.
A garota franziu a testa curiosa.
— Kristall. Já ouvi muito esse nome... Quem são seus pais e quais os pais deles?
— Peter, filho de Hermes... — suspirei, me retraindo. — E Lydia, filha de Cronos.
A garota não parecia surpresa. Os outros em volta arregalam os olhos e cochicharam baixo.
— Já ouvimos histórias de outros semideuses e descendentes sobre Percy Jackson, Jason Grace, guerras contra Gaia e Cronos... — deu vontade de falar "Minha jovem, eu sou nova nesse lance e não sei quem são essas pessoas". — Até sobre a filha dele. Pensei que fosse impossível e agora temos uma descendente. Vai se sair bem aqui. Seja bem-vinda, Daphne.
— Não sou a minha mãe. Agora é a minha vez aqui — digo decidida e com um sorriso de lado. Se fosse para ficar no acampamento, melhor que não colocassem pressão ou me comparassem com Lydia Kristall.
A garota estendeu a mão e apertei. Ela sorriu mais uma vez e todos do chalé ergueram suas caixinhas de Del Valle sabor uva, nos desejando uma ótima estadia.
— Meu nome é Aimee — a garota diz e se senta na "minha" cama — Filha de Dionísio, mas acho que já sabem. Daphne, você vai ficar aqui enquanto arranjam alguma cama para você no chalé de Hermes. Mike, vai ter que esperar.
— Eu mereço. Mudando de assunto, só por curiosidade, você já bebeu vinho alguma vez? — Mike perguntou e entregou um dos meus gorros de frio. Ele e Aimee ficaram frente a frente na cama, enquanto eu apenas observei o interesse repentino do garoto por ela. Aimee parecia uma menina agitada e irritada, mas depois que Mike puxou conversa percebi que aquilo era o começo de uma nova amizade.
— Óbvio que sim. — ela dá de ombros e olhamos surpresos. — Calma! Aqui não podemos, mas quem disse que os mais velhos obedecem? Bebidas alcoólicas só nos deixam mais atentos e fortes. Tem alguma atividade é só tomar um suquinho de uva. Melhor nem saberem o resultado depois.
...
Olá! Tudo bem? Espero que sim <3
Os primeiros capítulos são sempre longos, mas eu gosto assim mesmo. É que me empolguei e queria deixar o mais detalhado possível no que acontece na história.
O que estão achando dos personagens até agora? Ainda tem muitos que quero apresentar e vão aparecer em breve >-< ah, coloquei também essas cenas na mídia, ficou bom?
Vou tentar não demorar postar aqui! Tomara que dê certo kkk.
Obrigada a todos que estão votando e comentando! De verdade!
xx
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