Lia
Lia não pensava que aos dezesseis anos, ficaria tão amarradona como estava num garoto. Antes de Gael — vocalista da banda Corvos Famintos — entrar em sua vida, ela defendia aos quatro cantos que meninas da idade dela tinham mais era que aproveitar as curtições da vida, beijar o maior número de bocas possíveis, experimentar novas sensações, se arriscar, enfim, não se prender a ninguém. Nunca. Contudo, depois que ela conheceu Gael, durante um show de talentos no ano passado, todo esse empoderamento feminino caiu como folha de árvore em dias de outono.
— Manda a ver, Gael! — Lia gritou. — Mostra pra essa gente o que é música de verdade!
No palco, o rock paulera assustador dos Corvos Famintos embalou o baile de Halloween. E Lia, claro, reuniu suas amigas, Sabrina e Gina, e junto delas ficou bem próxima ao palco, prestigiando os integrantes da banda, curtindo cada música. E olhando ameaçadoramente para cada garota da plateia que ousasse jogar charme para o seu amado, que naquele instante arrancava suspiros sem camisa no palco.
Decerto, o público deveria estar tão envolvido pelo som das guitarras e da bateria, que poucos foram aqueles que notaram que o chão estremeceu de verdade por um momento. No entanto, se o tremor passou despercebido por muitos, a inesperada queda de energia fez com que todo o público presente ficasse apreensivo.
Muitos palavrões foram proferidos, mas quando o povo percebeu que a energia tinha caído pra valer, o que se seguiu foi um silêncio de morte. Silêncio que logo foi cortado por um urro externo horripilante.
— O que será que foi isso? — Gina indagou.
— Gente, relaxa — Sabrina disse, chapadíssima. — Deve fazer parte do show.
Aqueles com ouvido mais apurado, também puderam ouvir grunhidos animalescos e passos sobre o teto do ginásio. Sendo Lia uma dessas pessoas, ela imediatamente sacou que algo não estava certo.
— Não! — ela disse. — Isso com certeza não faz parte do show.
— Que? — Sabrina indagou, aérea.
— Isso não faz parte do show. Temos que sair daqui. Agora!
Mas não havia mais tempo para fugas, pois o teto do ginásio cedeu parcialmente naquele segundo, o que fez chover na cabeça do público centenas e centenas de corpos em decomposição. Corpos mortos. Corpos Vivos. Mortos e Vivos. Mortos-Vivos. Se banqueteando da carne das pessoas aglomeradas diante daquele grande palco, um verdadeiro de show de horrores.
Lia não tinha seus poderes telecinéticos tão aprimorados quanto os do irmão mais velho, mas deu o seu melhor para proteger o maior número de pessoas, derrubando paredes e movendo todo o tipo de parafernalha com a mente para manter longe o maior número possível de mortos-vivos, que parecia aumentar cada vez mais, muito rapidamente.
Infelizmente, Lia não conseguiu salvar sua amiga bêbada de um destino trágico, mas salvou Gina e também seu namorado, Gael. "Salvou" entre aspas. Afinal, o trio acabou ficando preso em uns dos banheiros. Como eles sairiam vivos dali, com tantos mortos à espreita lá fora? Diante da gravidade da situação, Lia não viu alternativa a não ser engolir o orgulho e fazer a conexão com o irmão.
— O que você está fazendo? — Gael perguntou a Lia quando ele a viu fazendo movimentos circulares sobre o anel que estava no polegar dela, silenciosamente.
Ela respondeu impaciente, quase sem forças.
— Salvando as nossas vidas. É isso que estou fazendo.
***
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro