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Talvez seja o inferno

 Amanda e Felipe estão na aula de Atendimento Prático e Agatha será a paciente para que eles pratiquem. Os alunos conversam entre si e trocam instrumentos. Agatha já aguarda na cadeira e observa Amanda conversar com o colega que ela reconhece do Karaokê, Felipe, o outro que não é o boneco de neve.

- Só um segundo. - Amanda pede para a amiga.

- Sem problemas. - Agatha sorri, e Amanda retorna a conversar algo que parece importante com Felipe. A jovem dentista pega uma ferramenta e vai junto com o colega até Agatha.

- Abra sua boca, por favor. - pede Felipe.

Amanda se inclina para ver o que ele está fazendo, e pode notar que as mãos de Agatha agarram os braços da cadeira até os meios dos dedos ficarem brancos.

- Você está bem? - ela pergunta com preocupação.

- Estou. - responde a outra, mas a dentista não sente confiança na resposta.

Mais tarde, Amanda e Agatha caminham juntas pela faculdade.

- Obrigada por aceitar ser o nosso "experimento". - diz Amanda com um riso.

- É. - Agatha mantém os olhos no chão.

- Tem certeza que está bem?

- Sim, é idiota.

Amanda para de andar e impede que a amiga continue.

- Vai, você não é idiota. O que aconteceu?

- Você não se lembra? Eu tenho medo de dentistas. - Agatha sente o rosto corar de constrangimento e não tem coragem de olhar nos olhos da amiga. Ela desvia de Amanda e continua seu caminho, mas a outra a segue.

- Ai meu Deus, é verdade! Faz tempo tento que eu esqueci, me desculpe.

- Tudo bem, eu te disse que é idiota. Foi por isso que você esqueceu.

- É claro que não! Eu prometo que nunca mais vou pedir para você ser nossa paciente de laboratório.

- Não, você pode pedir. Eu só não posso prometer que virei.

As duas riem e Amanda envolve o braço de Agatha enquanto continuam caminhando.

Iris chega da escola e escuta seus pais discutindo no piso superior.

- Não custaria nada nós irmos! - briga Cátia.

- Custaria tempo!

No quarto do casal Medeiros, eles se encaram com raiva e gritam sem escrúpulos.

- Que tempo, Roberto? Você pretendia inventar uma reunião para não ter que ir?

- Não seja sarcástica.

- Eu não sou o Ulisses, você não pode falar comigo assim.

- Por que está fazendo esse escândalo por causa disso?

- Porque eu me importo! Ela trabalha para nós faz tantos anos. Eu só queria dar um presente ao filho dela. E você? Por que o escândalo?

- Porque eu não me importo! Não poderia me importar menos. Nós damos dinheiro a ela por seu trabalho, não é o bastante?

Cátia fita o marido incrédula por suas palavras.

- Deus...

Ela deixa o quarto e se depara com Iris na beira da escada.

- Que merda foi essa? - diz a menina.

Cátia termina de descer as escadas e passa reto pela filha.

- Eu não sabia que você estava aqui.

Ulisses surge de repente da cozinha.

- Eu também estou. Pode explicar?

Cátia olha para os filhos com cansaço.

- Ah, que ótimo! É claro, Ulisses. Eu adoraria ouvir sua brilhante opinião sobre o assunto, assim como tive de ouvir a de seu pai. Nós fomos a uma reunião do Conselho e no caminho para casa eu propus a seu pai que passássemos na casa de Vanda pois hoje é o aniversário do filho dela e eu simplesmente queria dar um presente ao menino. Seu pai perdeu a cabeça e aqui estamos.

Ulisses e Iris dizem ao mesmo tempo:

- Um presente?

- Perdeu a cabeça?

Os irmãos se encaram.

- Por que você queria dar um presente? - questiona Ulisses.

- Porque sim, preciso de uma razão?

- Mas mãe, nós não confraternizamos com esse tipo de gente.

- Que tipo de gente? - Cátia coloca as mãos na cintura e olha para o filho de cima para baixo.

Ulisses se retrai perante a autoridade da mãe.

- Você sabe... pessoas inferiores.

- Você é igualzinho ao seu pai. - Cátia sacode a cabeça em indignação e deixa o recinto.

- Inferiores? - pergunta Iris.

- E eles não são?

- Você sabia que me chamam de "aberração" na escola? Para eles, eu sou inferior. E minha conta bancária não me tira dessa.

- O que? - exclama o irmão em choque. - Quem está fazendo isso? Eu não vou aceitar! Eu irei até sua escola.

- Não, não vai. Eu posso me cuidar sozinha.

Iris deixa o irmão com sua prepotência.

Cláudio chega na banquinha para seu primeiro dia de trabalho.

- Oi, você veio! - diz Jefferson com empolgação.

- Por que eu não viria? - Cláudio ri.

- Bem, você é estudante de Odontologia e a maioria deles são todos chiques e da alta sociedade, eu pensei que talvez você acabasse mudando de ideia quanto a trabalhar nessa pobre banquinha.

Cláudio percebe o tom de humor por trás das palavras de Jefferson e resolve quebrar o gelo:

- Bem, situações desesperadoras pedem por medidas desesperadas. - os dois riem.

- Entra aqui, então.

O rapaz vai para detrás do balcão.

- O seu trabalho será muito simples. Você ficará aqui quando eu não estiver, e a maioria dos clientes vem para comprar salgadinhos. Jornais são das antigas então quase ninguém os quer. - Jefferson olha ao redor e pensa o que mais precisa orientar. - E eu acho que é isso.

- Está bem, você vai ficar aqui comigo hoje para se certificar de que não quebrarei ou roubarei nada?

- Eu não acho que você precise roubar nada mas sim, vou ficar para te ajudar.

À tarde, quando Cláudio já passou algumas horas de seu primeiro dia e atendeu alguns clientes, Amanda aparece na banca.

- O que está fazendo aqui? - pergunta Cláudio com alegria por vê-la.

- Eu vim checar como está sendo seu primeiro dia. - diz ela com os dentes a mostra. - Oi, Jefferson.

O garoto apenas acena e Cláudio retribui o sorriso.

- Como foi o laboratório?

- Ah, foi bom, eu acho. Ainda estou tendo problemas com endodontia.

- Você foi incrível o ano inteiro. As melhores notas da turma. É normal ficar um pouco nervosa no final.

- Você sabe que eu não tive as melhores notas, você teve e só não quer admitir.

Jefferson presta atenção na conversa e observa de soslaio.

Cláudio abre um sorriso tímido.

- De qualquer forma, periodontia foi tudo bem? Você não furou a gengiva da sua amiga?

- Não, eu não furei! - Amanda ri. - Ela está bem. Eu pensei em ir no Karaokê hoje a noite, quer vir?

- De novo?

- Eu gosto da comida.

- Eu vou ver se consigo e te aviso.

- Está bem. Você também devia ir, Jefferson.

- Eu não posso hoje. - ele se vira para eles. - Preciso ir para casa. Ainda tem muitas coisas para organizar, está uma bagunça. Mas obrigado pelo convite.

- Bem, está sempre convidado. - ela sorri. Um sorriso que tanto Jefferson quanto Cláudio já adoram por sua eterna gentileza. - Preciso ir, rapazes. Até depois.

Ambos os meninos dizem tchau ao mesmo tempo, e Amanda deixa a banca com um aceno.

Julie está limpando uma mesa quando sua mãe sai da cozinha, e a garota aproveita a oportunidade para ir até o balcão.

- Mãe, estava pensando se posso sair mais cedo hoje?

Clarice permanece de costas e limpa a pia de metal, o que irrita Julie pois ela já havia feito isso a pouco tempo atrás.

- Posso saber por quê? - diz Clarice sem se virar.

- Tem um jogo hoje na quadra da praça.

Clarice torna para a filha e tem os olhos cerrados por um tempo, mas depois sorri.

- Claro. Apenas termine de limpar as mesas e está liberada.

Julie quase salta de alegria e corre para terminar de uma vez o trabalho.

Mais tarde, quando tudo já está devidamente organizado, ela se despede da mãe e de Rita, e deixa o bar, mas resolve fazer uma pequena parada antes de ir.

- Oi, Jeff. - diz ela quando entra na banquinha, mas ele não responde e vira-se indiferente. - Você deve ser o Cláudio. - Julie tenta manter a voz neutra e não demonstrar a irritação ou mágoa por Jefferson tratá-la daquela forma.

- Oi. - Cláudio responde e sorri.

- Está gostando do primeiro dia?

- Está ótimo.

- Jeff, eu vou jogar na praça hoje se você quiser vir.

- Não posso. - ele permanece de costas para ela e Julie sente a raiva preencher seu peito como lava que a queima e sufoca.

- Beleza! - fala com indignação. - Prazer em conhecê-lo, Cláudio.

- Tchau. - ele acena para a garota raivosa e percebe que há algo muito errado entre ela e Jefferson, mas não ousa perguntar.

Quando Julie chega em casa, seu pai está assistindo televisão e ela apenas corre para o quarto.

- Ei, já em casa? - grita Mário.

- É, a mamãe me liberou mais cedo. Vou na praça. - ela responde também aos gritos do quarto.

- Fazer o que?

- A única coisa que eu faço na praça, pai. Tem um jogo hoje. A Larissa me avisou por mensagem. - Julie retorna para a sala com uma mochila.

- Quem é Larissa?

- Tchau, pai. - ela sai e o ignora.

Julie resolve correr até lá, mas não muito rápido, apenas o bastante para chegar já um pouco mais aquecida, portanto chega relativamente cedo. Ela passa pelo parquinho e pelo campo onde pessoas passeiam com seus cachorros, e entra no pavilhão da quadra. Só o cheiro do lugar já é o bastante para seu coração inflar. Ela pode sentir a histeria, a felicidade que nada mais lhe causa.

Ela vai até a entrada do vestiário e desce as escadas. Logo no final delas, já estão os armários e Julie vai até o seu. Algumas medalhas de prata e ouro estão penduradas do lado de dentro da porta e ela não pode evitar, nem mesmo negar, o orgulho que sente cada vez que se depara com tal visão.

- E aí, então...? - Larissa aparece e se apoia no armário ao lado, com os olhos cheios de expectativa sobre Julie.

- O que?

- Me conta, você passou? - a garota se anima.

- Ah, sim, passei. Mas o financiamento não foi aceito.

- Ah, meu amor, não acredito. Eu sinto muito. - a expressão de Larissa se modifica bruscamente. Julie aprecia o jeito carinho da garota, mas se retrai um pouco quando recebe um súbito abraço e logo se solta.

As outras garotas chegam todas juntas no vestiário e fazem muito barulho com conversas e risadas. Miguel, o treinador também aparece.

- Como estão, galera? Faz um tempo desde o último jogo, mas tenho certeza que vocês estão em perfeita forma.

As meninas gritam em concordância.

- Então chega de conversa e vamos jogar! Vai, vai, Squares!

O time passa pelo técnico que mantém a mão no ar e todas batem conforme vão. No entanto, Julie não está tão empolgada quanto as outras e apenas caminha.

- Você está bem? - Miguel a para na porta quando estão somente os dois.

- Bem.

- Você conseguiu?

- Não. O financiamento não foi aceito.

- O que? Por que você não me ligou?

- Eu não queria te incomodar com isso. - Julie dá um passo a frente mas Miguel delicadamente segura seu braço e eles se encaram.

- Eu gostaria que tivesse ligado.

- Eu sei, mas não seria correto. - ela se solta.

- Se tiver algo que eu possa fazer para ajudar...

- Não tem.

A garota desvia do homem e sobe as escadas. O time está em formação e Julie toma sua posição para fazer o saque. Ela bate forte na bola, e esta sobe alto no ar.

Já no começo da noite, Cláudio termina seu expediente e se apronta para ir embora.

- Obrigado, Cláudio. Então, amanhã você não poderá estar aqui porque tem laboratório, certo?

- Isso.

- Bem, contanto que não se esqueça de tudo o que te ensinei hoje, eu te vejo sexta-feira. Você sempre será pago no final da semana.

- Está bem, muito obrigado pela oportunidade. Te vejo na sexta! - eles batem as mãos como se fossem grandes parceiros de longa data e Cláudio deixa o local.

No Karaokê, para onde Cláudio está indo, Aníbal se acomoda em uma mesa e acena para Agatha.

- O mesmo de sempre, querida.

- Aqui está. - assim que a jovem viu o conhecido cliente chegar, já preparou a bebida e a levou até ele mesmo antes que pedisse. Ela, então, coloca o drink na frente dele.

- Uau, você já sabia.

- Faz tempo que você não vem mas eu ainda me lembro.

- Bom, bom. Como você está?

- Melhor do que nunca.

- Bom. - Aníbal toma um grande gole da bebida alcoólica e Agatha não esconde a expressão de enjoo por vê-lo beber tão rápido. Porém, sua atenção é tomada quando vê Amanda passar pela porta.

Aníbal percebe a fixação da moça e intercala olhares entre as duas.

- Então ela é a razão de você estar melhor do que nunca?

- Por que todo mundo pensa isso? - Agatha bufa.

- Hum... não sei, talvez pelo jeito que você olha para ela. - o homem fala com sarcasmo.

- Dá um tempo. - ela se retira para continuar seu trabalho longe daquela conversa sem sentido.

Amanda senta junto a Cláudio.

- O Felipe vem? - pergunta ele.

- Eu não sei, ele disse que tentaria.

- Acho que podemos pedir algo enquanto esperamos. - Cláudio ergue a mão e um garçom de pele morena e sotaque carioca cantado vem até eles.

- Uma Coca, por favor.

- Uma porção de batatas fritas para mim. - pede Amanda.

- Mais alguma coisa?

- Só isso, por enquanto, Fernando. - ela sorri.

- Você conhece todo mundo aqui? - questiona Cláudio, mas Fernando traz sua Coca muito brevemente. Amanda responde apenas com uma risada enquanto Cláudio coloca o refrigerante no copo, mas perde o equilíbrio e derrama uma grande quantia quando é tomado por uma dor excruciante que o faz se curvar e prender um grito.

Quando estava internado, Cláudio se lembra de assistir as pessoas pela janela, vivendo suas vidas completamente alheias àqueles que como ele, perecem em um leito entre a vida e a morte. Ele pode ver a luz alaranjada do pôr do sol refletir o seu reflexo, sua careca branca e suas olheiras, dentre outros sinais do estrago da quimioterapia.

Cláudio fez um pedido ao seu médico e ao hospital: que todos os dias em certo horário levassem as crianças com câncer para seu quarto, para que ele pudesse diverti-las e se divertir com elas. As crianças o adoravam, riam de tudo o que ele dizia e se admiravam com as histórias que ele contava, sendo reais ou não.

As visitas de seus pais também eram algo que fazia com que tudo aquilo ficasse um pouco mais fácil. Quando estava na presença deles, se sentia mais forte, um pouco mais vivo e muito mais esperançoso. Eles o faziam querer lutar e viver.

- Cláudio, é a segunda vez que você sente isso. Se me disser que é dor de barriga de novo... - Amanda o segura com extrema preocupação.

- Eu estou bem, Amanda. Prometo. - ele endireita o corpo e respira fundo.

Agatha os encara de longe e Aníbal a observa. Ele ergue a mão e ela vai até lá com claro descontentamento.

- Você não é discreta.

- Me deixa em paz. - ela se vira.

- A conta, por favor. - pede Aníbal, e a faz tornar de volta.

- Estou indo embora, meu turno acabou. Chame o Fernando. - ela não espera que ele diga nada mais para segurá-la, e desaparece pela porta da cozinha.

Ulisses chega em casa e corre para seu quarto mas seu pai o chama antes que ele chegue lá.

- Ulisses, venha cá. - chama Roberto de seu escritório.

O garoto obedece impaciente e se surpreende ao abrir a porta e se deparar com o Dr. Cândido Lopes sentado em frente a seu pai.

- Boa noite, Doutor! - Ulisses cumprimenta com um sorriso. - Como foi o congresso em Madrid?

O Dr. Cândido vai até o rapaz e desfere um violento soco em seu rosto.

- Que porra? - Ulisses grita com o corpo torto e a mão nos lábios. Roberto precisa conter o outro médico para que mais violências não ocorram.

- Cândido! Essa é minha casa. - repreende Roberto.

- E a garota é minha filha! Isso é pra você aprender a ser homem. - ele se direciona a Ulisses. - Homens fazem isso, não o que você faz com as mulheres. Você deve se desculpar com a minha filha, moleque.

- M-me perdoe, Dr. Cândido.

- Saia daqui. - ordena Roberto para Ulisses.

Ele prontamente obedece e corre até seu quarto que fica na outra extremidade do apartamento. Ao chegar, bate e tranca a porta, e chuta uma cômoda até a gaveta de baixo entortar. Ele demora a sentir a dor que aquilo causa, mas quando sente, comprime os lábios e o ódio aumenta. Ulisses manca pelo quarto e vê a si mesmo no espelho do guarda-roupa. Seu lábio está inchado e sangra.

- Velho maluco.

Ele alcança suas chaves do carro e esbraveja para fora de casa.

As ruas estão desertas no meio da noite e Ulisses espera no sinal vermelho. Uma grande moto para ao seu lado e o motorista usa um capacete que esconde seu rosto.

- Tem um cigarro? - pergunta o motoqueiro.

Ulisses o encara sem acreditar.

- Não! - ele fecha as janelas.

- Valeu, doutorzinho! - o outro grita bem próximo ao carro antes que o sinal abra e Ulisses vá para longe em alta velocidade.

Ele dá uma olhada no retrovisor e testemunha a motocicleta se distanciando e desaparecendo em outra rua.

O céu está limpo e cheio de estrelas quando Julie deixa a quadra e caminha pela praça.

- Julie, espere. - ela ouve aquela voz conhecida a chamar, e somente fecha os olhos e continua andando.

- Espere, por favor. - Miguel a alcança. - Podemos só conversar?

- Não tem mais nada pra gente conversar.

- É claro que tem. Eu... nunca te dei uma explicação.

Julie solta uma risada sarcástica.

- E agora quer dar? Eu acho que percebi tudo sozinha.

Miguel caminha ao seu lado por mais que ela tente apressar o passo.

- Eu não podia... te prender na nossa relação.

- Nunca houve uma relação.

- Havia, sim. Mas eu estou lidando com algumas coisas agora e eu não sei como minha vida vai estar dentro de alguns anos. Eu não posso te prender em algo tão incerto.

- Você podia pensar no presente, mas se você diz que não sabe como será seu futuro, é porque não tem certeza de que eu estarei nele. Então, sim, você tem razão, eu não quero estar em uma relação assim.

Miguel para, mas Julie não. Ela se afasta sem a menor intenção de olhar para trás. Ao invés disso, pega o celular a digita uma mensagem para Jefferson:

- Eu pensei que você viria, mas tudo bem. Estou acostumada com a rejeição.

Ela lê a mensagem algumas vezes, e a deleta ao invés de enviar.

O choro de Allan parece sem fim para seus próprios ouvidos. Ele não aguenta mais sentir tanta dor. Não aguenta mais o cheiro daquele lugar, daquele homem, nem o dele mesmo. O cheiro de seu sangue seco, o cheiro podre, e o frio.

O garoto está encolhido como uma criança, sem roupas com o corpo sujo e violado. Pode sentir sua pele grudar contra o solo e até seus ossos tremem. Ele ouve o policial monstruoso tirar algo de uma caixa de metal, uma caixa a qual ele já se familiarizou com o conteúdo em tão pouco tempo e de maneiras tão terríveis que ele preferia estar morto.

O homem se aproxima com o objeto, e Allan não sabe se o que sente é alívio ou ainda mais terror, pois o que ele carrega não é pontiagudo, enorme ou de formato fálico, mas Allan não consegue identificar do que se trata.

Ele caminha na direção oposta e Allan ergue minimamente a cabeça para acompanhar, perdê-lo de vista é ainda pior do que saber cada movimento que ele faz. O lugar é iluminado subitamente pela maior luz que viu nas últimas horas. Allan pode ver que mais a frente, há uma escada e a luminosidade vem de uma parede ao lado dela. Somente após muito se esforçar é que ele percebe que se trata de uma lareira. Ele aperta os olhos e tenta memorizar o policial, mas mesmo diante da luz do fogo, é como se ele continuasse sendo um fantasma, imaterial, uma sombra.

Allan percebe que ele está com a mão esticada, e aquilo que ele carregava está sendo esquentado pelo fogo. Não, isso já ultrapassaria qualquer horror que Allan poderia imaginar. Muito pior do que o pior dos horrores que já havia feito durante seu cativeiro. Seu corpo foi violado das piores formas, com as mais dolorosas ferramentas, e machucado com as mais diversas armas de tortura. Mas aquilo... não é possível que um ser humano seja capaz de uma coisa dessas. Allan tem certeza de duas coisas: primeiro que se este monstro introduzir aquele objeto fervente, acabado de sair do fogo, dentro dele, seria o fim. O seu corpo não aguentará. E segundo, que esse policial, seja lá o que for, não pode jamais ser um humano.

Como se já sentisse o doce beijo da morte, ele abraça os joelhos contra o peito e fecha os olhos com força. Apenas escuta os passos vindo e aguarda que o vire de costas para fazer o que ele já sabe.

Mas nada acontece como ele previu. O homem o empurra pelo ombro de forma que ele fica de barriga para cima, e seus olhos não conseguem se manter fechados, não importa o tamanho da força que ele faça para tal. O brilho alaranjado da marca é clara e nítida como nada jamais foi para seus olhos. É um símbolo.

O rosto do homem não é mais uma sombra negra, e sim uma sombra daquela cor alaranjada da marca. Seus olhos castanhos refletem o objeto, e Allan não entende como uma criatura como aquela pode ter olhos tão brilhantes. Talvez ele seja o próprio Diabo que veio para a Terra punir os pecadores, e ele está sendo punido por uma vida de drogas e libertinagem. Está sendo punido por ser quem é, até mesmo por amar quem ama. Talvez estejam certos e o destino de pessoas como ele é o inferno. Ele pensa que talvez, quem sabe, esteja no inferno.

Em meio aos seus pensamentos, ele  é veloz demais para que Allan possa desviar e crava o ferro quente um pouco abaixo de sua clavícula. O garoto grita, berra até sentir que suas cordas vocais vão arrebentar, até perder a voz. Até a dor passar e tudo desaparecer.

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