Eduardo saiu do tribunal e dispensou o motorista. Ele tinha ganhado mais uma causa, mais uma para a W&F advocacia, e mais uma para o seu currículo. Ele era um dos mais conceituados advogados da firma e tinha consciência disso, afinal esse sempre tinha sido seu objetivo. Foram anos de preparo até esse momento que ele estava vivendo. O pacato estudante residente da PUC de São Paulo, taxado na época como nerd e cdf, subira na vida e alcançara seus sonhos. Ele era um maldito vencedor, passara por cima do racismo e da intolerância, que na época pareciam uma barreira invencível para ele, e provara ao mundo que ele podia ir além.

Na época acadêmica o que ele mais ouvia eram coisas como: um negro não pode ser advogado ou isso é um absurdo. E hoje ele era um dos melhores advogados do país, trabalhando em uma das melhores firmas do mundo, era um homem rico, dono de uma pequena fortuna no banco, dois carros importados, e uma mansão em um bairro nobre de São Paulo.

Ele, um negro, taxado como inferior pela maioria, ganhou o mundo. Ele se recusou a usar os rótulos que a sociedade racista queria que ele usasse e provou a essa mesma sociedade que ele podia fazer o que quisesse e ser o melhor.

Mas a vida tinha mudado em alguns aspectos, principalmente depois da morte de Jessica.

Uma das coisas que Eduardo mais almejava na vida era conhecer uma mulher, se casar e formar uma família. Aquele era o sonho de qualquer homem, o ser humano não  tinha sido feito para viver em solidão.

Na faculdade  ele conheceu Renata, uma linda loira de olhos verdes que o encantou de uma maneira inusitada e diferente, um tipo de atração  que ele ainda não  tinha experimentado  até  então. Nas férias do verão  de 1990 seus pais esperavam que ele aparecesse em casa com uma negra (ele tinha avisado os pais sobre o namoro) mas ele apareceu com uma loira, uma branca. A coisa causou um certo choque, não  era comum a miscigenação na família, mas depois tudo ficou bem e eles conseguiram passar um bom natal e um ano novo ainda melhor.

Eduardo e Renata se amavam e faziam planos de se casar e construir uma família, planos esses que levaram adiante pois no final do primeiro semestre de 1991 eles deixaram a republica em que moravam e se mudaram para um pequeno apartamento que alugaram.

Renata trabalhava em uma padaria para complementar o dinheiro que seu par lhe enviava para pagar a faculdade, e Eduardo começou a fazer estágio na firma onde viria a se tornar sócio  alguns anos mais tarde.

A ascensão  de Eduardo aconteceu de maneira muito rápida. Naquele mesmo ano ele se formou advogado, prestou o concurso da OAB e passou na primeira, e se efetivou na W&L advocacia.

Em 1993 Eduardo já pertencia ao quadro de advogados da firma e experimentou sua primeira vitória em um caso importante. Eduardo foi advogado de um banqueiro acusado de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha e sua impecável atuação no tribunal, garantiu a absolvição do acusado, e uma promoção para Eduardo.

No ano seguinte, Eduardo conseguiu comprar um apartamento de quase 500 mil em um prédio de classe média alta, e eles se mudaram.

As famílias de ambos os apertava para que se casassem, Eduardo não via necessidade alguma, mas sua mãe dizia que era importante e ele acabou cedendo para agradar a família.

Renata e Eduardo se casaram em 24 de abril de 1994, e Renata já estava grávida de Jéssica nessa época.

A cerimônia do casamento aconteceu em um clube luxuoso cedido pelo chefe de Eduardo, um casamento digno de pessoas da classe alta, inclusive com alguns convidados que eles nunca tinham visto na vida.

Mas o importante era que ele estava feliz, e Renata também. Eles eram um casal perfeito e tinham uma vida perfeita. Nada parecia poder quebrar aquele ciclo de felicidade que estava em volta dos dois. Era o que Eduardo acreditava. Ele tinha sido moldado para acreditar naquilo.

Em janeiro de 1995 a vida lhes deu mais um presente, um presente chamado Jéssica, a luz dos olhos de Eduardo, o ápice de todas as realizações de sua vida. A coisa que todo homem precisava para se sentir totalmente realizado na vida e poder dizer que era um vencedor.

Em junho daquele mesmo ano ele foi convidado a ser sócio da firma onde trabalhava e seu salário praticamente triplicou. Ele vendeu o apartamento em que moravam e comprou um maior e mais luxuoso, em um condomínio de luxo. Eduardo também vendeu o carro e comprou uma Mercedes 0 quilômetro.

Ele era o cara, ele se achava imbatível. Ele era capaz de vencer todas as causas que pegava e recebia rios de dinheiros por isso, e, acima de tudo ele amava sua família, sua mulher e sua linda filha, ele fazia tudo aquilo por causa delas, elas eram o sentido de sua luta, o motivo dele trabalhar exaustivas horas por semana, participar de reuniões, fazer viagens internacionais, dar palestras. Tudo porque amava sua mulher e filha e queria que elas tivessem o melhor.

Eduardo era feliz e achava que nada podia quebrar sua felicidade, achava que ela estava blindada por um escudo intransponível.

Ele descobriu que não da pior maneira que existia.