Capítulo 20: Vigilantes da Internet
Saint Luna, 04 de setembro de 2021
Sábado - 08:12 A.M.
O prédio da Artificial Paradise era imenso. Devia ter pelo menos vinte andares, as paredes eram de vidro e em um formato totalmente retangular.
Eu estava nervoso, não sabia o que esperar quando entrasse. A única coisa que eu tinha noção era que, a partir de agora, minha vida não será a mesma. É claro, se Adrian não tivesse avisado sobre a influência de Nolen Black no mundo sobrenatural, eu não precisaria me infiltrar na empresa.
Respiro fundo e guardo a chave do carro no bolso, dando passos largos na direção da entrada. Pego o meu celular e mando uma mensagem no grupo de whatsapp “Clube das Winx”, em que Claire, Kaylee, Dener, Maya, Lexie (por incrível que pareça) e eu estávamos. Ele foi criado no intuito de marcarmos reuniões e conversarmos sobre nossas aventuras no mundo mágico, mas acabavámos usando também para compartilhar memes e situações particulares do nosso dia a dia.
Vince
Estou entrando no prédio. Me desejem sorte. 😵💫
...
Por algum motivo, a mensagem não chegou para ninguém. Ou todos eles estavam sem internet ou eles planejaram algo juntos sem mim. A última opção me deixou um pouco chateado, mas sei que não fariam isso.
— Bom dia, sou o Vincent George Whitmore Price. Sou o novo estagiário da área de desenvolvimento web. — Cumprimento a recepcionista, que nem sequer me olha, apenas digita alguma coisa no computador à sua frente.
— Identidade. — Ela pede, e eu desastrosamente pego a minha identidade do bolso externo da minha mochila e coloco em cima da bancada.
Após a recepcionista digitar mais algumas coisas, ela me entrega um crachá com meu nome, uma xerox embaçada da foto da minha identidade e a minha função escrita.
— Andar doze, sala 510. Por favor, peço para desligar o celular quando entrar. — Agradeço com a cabeça e sigo na direção do elevador.
Aperto o botão e espero ele chegar. Eu quase não notei quando um rapaz se aproximou e aguardou o elevador em silêncio. Minha respiração estava pesada e minhas mãos tentavam controlar a tremedeira, mas cada detalhe daquele prédio me fazia lembrar de Noah. Ele provavelmente passou pelo o mesmo procedimento, entrou nesse elevador, caminhou por esses corredores.
Quando o elevador chega, entro junto com o garoto que esperava junto e aguardo até chegar no meu andar. Checo o celular pela última vez e vejo que minha mensagem ainda não chegou para nenhum dos participantes, então estranho e o guardo.
Noah, onde quer que você esteja, preciso que você me dê forças agora. Preciso que me ajude a concluir o que te fez pagar com a vida, para que isso nunca aconteça com mais ninguém.
Era difícil alguém tão fraco quanto eu ser corajoso. Esse era o papel da Kaylee, da Maya, até mesmo da Claire e do Dener. Querendo ou não, eles tinham o sangue. A magia corria solta pelas suas veias, são treinados desde que nasceram. Sei que minha mãe, apesar de ser adotada, também é uma bruxa muito poderosa, mas ela foi escolhida por Hécate. A tríade divina foi determinada desde antes dos seus nascimentos, fora uma profecia revelada pelos oráculos a ser cumprida, um destino a ser traçado.
Eu sou apenas o Vincent. Não sei lutar tão bem quanto a Maya, não prevejo o futuro como o Dener, não tenho conhecimento sobre os deuses como a Kaylee, não posso curar ninguém como a Claire. Talvez eu seja o personagem secundário que apoia os amigos em suas missões nos livros de história. Se eu for em uma, certamente morrerei.
As portas do elevador se abrem e eu finalmente dou de cara com o andar doze. Caminho no extenso e largo corredor enquanto vejo pessoas entrando e saindo, dezenas de salas computadorizadas, tecnologia por todo canto.
— Sala 510. — Repito comigo mesmo até chegar na sala.
As portas automáticas se abrem, revelando um ambiente amplo, basicamente composto apenas de cadeiras e computadores. Aquele era o "cérebro" de toda essa inteligência, onde os sistemas de desenvolvimento eram produzidos, a área dos programadores em potencial.
— Perdido? — Ouço uma voz ao meu lado e rapidamente direciono a atenção para a pessoa.
— Um pouco. É meu primeiro dia. — Observo um homem com características asiáticas que aparentava ser alguns anos mais velho que eu.
Ele usava uma camisa social preta e uma calça jeans clara. Era bem simples, e ele tinha os olhos puxados e usava um óculos com lente retangular e pequeno, como os idosos costumam usar. Reparei também uma barba rala e mal feita.
— Meu nome é Frank Hayashi, sou programador. Costumam me chamar só de Hayashi. — Hayashi estende a mão e eu aperto. — Você é o estagiário novato, certo?
— Sou Vincent. Sim, sou estagiário. — Aviso, me sentindo um pouco desconfortável em um ambiente novo, totalmente fora do meu cotidiano.
— Bom, novato. Suas tarefas por enquanto são as mais fáceis. Você senta em um dos computadores e testa os sistemas que os desenvolvedores web irão enviar para a sua central. Varia em sites, aplicativos, programações. Enfim, você vai fazer um relatório e uma avaliação geral sobre cada sistema e enviar organizadamente para os analistas de dados. — Hayashi diz bem rápido, mas eu consigo captar cada função perfeitamente.
Apesar de ter características de descendência japonesa, Hayashi tinha o sotaque totalmente inglês. Me fez pensar se ele nasceu em algum lugar do Japão ou que apenas seus pais ou avós são japoneses. Pude identificar a sua origem devido ao seu sobrenome, Hayashi, comum no Japão. É como o Smith dos Estados Unidos ou o Silva do Brasil.
— Certo. Fácil. — Ironizo baixinho só para mim e logo caminho até um dos computadores. Coloco minha mochila em um canto do chão e logo ligo a tela.
Os outros pareciam ignorar totalmente a minha presença. Estavam focados em suas telas, como pessoas hipnotizadas e cansadas. O ar condicionado deixava a sala bem fria, mas por outro lado, era extremamente silenciosa. Apenas ouvia-se os sons de teclas que não se aquietavam por um segundo sequer.
— Ah, você pode pegar um café para mim? A sala de serviços fica no final do corredor. — Hayashi pede, sentando-se na mesa ao meu lado e voltando às suas funções no computador.
Eu sabia exatamente o que ele estava fazendo. O típico jogo de soberania, onde os veteranos querem mostrar aos novatos quem tem o poder. Eu sabia que se me opusesse, meu trabalho ficaria mais pesado e provavelmente iriam puxar no meu pé, então apenas concordei e fui. Eu ainda não tinha tanta moral lá, não até algum outro novato me substituir.
Os corredores pareciam de aço. As cores eram frias, variando em tons cinza claro e escuros. No final do corredor, não encontrei nenhuma sala de serviços. Olhei atentamente cada placa, mas nenhuma delas indicava o lugar certo. Por ser horário de serviço, estava tudo vazio e silencioso. Hora ou outra alguém passava apressadamente ao meu lado, nem sequer se davam o esforço de me olhar. Todos eram frios e focados.
Será que eu ficaria assim também?
Ou isso, ou acabaria enlouquecendo como o Noah...
No final, havia dois corredores. Eu me sentia prestes a entrar em um labirinto, mas mesmo assim, decidi continuar. Caminhei por alguns lugares, admirando a estrutura daquele lugar. A maioria das salas tinham portas pequenas e de vidro, outras eram maiores e opacas. Um corredor me chamou a atenção.
Ele era mais curto e tinha apenas uma sala. Uma enorme porta de ferro, trancada por senha ocular. Isso significava que apenas pessoas específicas tinham acesso.
Aquela sala despertou uma enorme curiosidade em mim, e apesar das câmeras que me cercavam, não temi quando cheguei mais perto. Na lateral do corredor, haviam fotos de honraria para alguns dos cientistas e criadores fundamentais da Artificial Paradise, isso incluía Nolen Black.
— Oliver LaRue. — Sussurro ao observar a foto antiga do homem, com as cores desbotadas e uma feição familiar.
Lembro-me vagamente das histórias da tríade. Como cada uma matou uma pessoa antes de descobrirem ser bruxas, pessoas importantes para elas, todos partidos de algum tipo de traição.
Oliver LaRue foi morto por Alice LaRue em 1989. Apesar de ser um cientista famoso na época, dizem que suas loucuras sobre o "futuro da humanidade" subiram à cabeça, usando a própria filha como parte de um show de experimentos humanos. Foi então, prestes a morrer pelo próprio pai, Alice ouviu a voz da deusa, que lhe abençoou com a sabedoria feminina e o poder sagrado, o que a salvou e a fez assassinar o próprio pai.
O avô de Claire. Qual era sua conexão com Nolen Black?
— O que você faz aqui?
Levo um susto ao dar de cara com Nolen Black. O que ele faz ali?
— Eu... senhor.... eu... estou perdido. Fui procurar a sala de serviços e... e acabei me perdendo, me confundindo. — Digo gaguejando, mas Nolen Black não parece muito surpreso.
— A sala de serviços fica do outro lado, filho. Venha, irei te mostrar. — Nolen então se vira e começa a caminhar, e eu, sob expontânea pressão, o sigo. — Notei sua curiosidade naquele corredor. Quer saber o que tem lá?
— Er... eu...
— O futuro. O mundo não espera, talvez fiquem surpresos, mas lá esta o futuro que os aguardam. Uma tecnologia de alta qualidade, um mundo perfeito, sem falhas humanas, sem doenças, sem catástrofes. — Nolen diz com o ar sonhador, mas pensativo. — Estamos trabalhando duro, rapaz.
Não respondo nada, apenas fico calado até chegarmos à sala de serviços.
— Obrigado.
Antes que eu pudesse entrar e buscar o tão esperado café do Hayashi, uma sirene dispara. De repente, as portas das salas são abertas e as pessoas correm desesperadas de um lado para o outro. Inicialmente imaginei ser algum incêndio ou algo do tipo, mas os olhares estavam focados nas telas.
Nolen corre para a sala mais próxima e observa um enorme monitor. Me aproximo lentamente por trás, e finalmente vejo o que causava tanto desespero no olhar de Nolen.
— A Artificial Paradise é como um jogo de xadrez. Vocês são apenas peças que o rei mata quando se tornam desafiadores. Manipulados como bonecos de ventrículo, cegos pela exaustão de trabalho, motivados pela remuneração. Não conseguem ver o que estão fazendo... querem criar um novo mundo metafísico destruindo o mundo real e tudo o que os cercam, acabando com os recursos naturais lhes dado de graça. Tudo isso por quê? Para encher o bolso e elevar o ego estúpido de um velho ambicioso que só pensa em si mesmo? — A voz do homem, coberto por uma roupa completamente preta e uma máscara, ecoa vai por todo o canto do prédio. Tudo estava dando interferência, e os funcionários rapidamente digitavam e tentavam tirar os Shadgels de campo, mas não havia sucesso. Mais uma vez os Shadgels hackeavam os sistemas de Nolen Black para exporem a sujeira debaixo do tapete, com sua alta inteligência e seus discursos rebeldes. — Alguns de nós já fomos como vocês, e uma vez que entram, só podem sair mortos. Conhecemos bem Nolen Black, e seja lá o que ele tenha prometido, não confiem nele. Somos como anjos das sombras, ficamos à espreita da escuridão, observando cada passo de cada um de vocês. Não somos apenas Vigilantes da Internet. Estamos por todo lugar, todo canto, prontos para contra-atacar a qualquer momento.
Saio ao lado de Nolen e me sento no painel de controle, vendo que, enquanto os outros funcionários observavam atentamente, chocados, cochichando informações um com os outros, os técnicos de sistema tentavam retirar a interferência dos Shadgels.
O sistema da Artificial Paradise não era tão difícil quanto aparentava. Por mais que eu fosse o novato, o menos experiente ali, eu estudei isso por anos. Meu hobbie na infância era mexer com fios, descobrir e mergulhar na internet, navegar por cada canto e código que era fornecido. Era como se eu tivesse nascido dentro disso, como se a internet fosse parte de mim.
Era o que eu era.
Meus dedos tocavam levemente as teclas, e quase como se eu estivesse em casa, penetrei a segurança do sistema da Artificial Paradise com facilidade. Apesar de ser uma grande empresa tecnológica de inteligência artificial, a segurança era pobre e desprotegida. Fraca e facilmente acessada por qualquer adolescente desocupado de Nova Iorque.
Antes de sumirem da nossa frente por completo, o olhar atrás da máscara de um dos vigilantes me chamou a atenção. Era como se eu o reconhecesse, uma absurda familiaridade que eu não soube explicar de onde vinha.
Eu o conheço de algum lugar. Só não lembro de onde.
— Bom trabalho, garoto. — Nolen se aproxima de mim, enquanto os outros aplaudem o sucesso. — Você é bem inteligente. Ou o time de segurança é fraco demais. Mas, que seja. Bem-vindo à Artificial Paradise.
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