Capítulo 17 - O Corajoso
Olá lindes,
mais uma att procês. clique na estrelinha. deixe seu comentário.
hj não tem mídia. mas, quem tiver spotify é só procurar a playlist: A maldição da colina. e ouvir o que me inspira a escrever essa história incrível.
bjokas e até segunda.
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Capítulo 17 – O Corajoso.
Para Filipe e Damastor, o dia transformou-se em noite e a noite em dia, enquanto cuidavam de Isaac. Mantinham uma constante vigilância à cabeceira do leito dele, que raramente acordava e raramente era capaz de falar com eles. Ao alvorecer dos dias seguintes, Filipe se postava no parapeito acima dos portões da abadia, buscando algum sinal de Elazar. Às vezes o chamava aos gritos e anunciava às montanhas silenciosas mais além que Isaac estava quase curado. Entretanto não descobria o menor sinal de um garanhão negro ou de seu cavaleiro.
A princípio, preocupava-se secretamente, imaginando que Elazar poderia ter morrido por seus ferimentos, mas todas as noites o lobo estava de volta ao espinhaço da montanha e seus uivos lamentosos eram ouvidos até o alvorecer.
Quando não se encontrava à cabeceira de Isaac, o rapaz perambulava pelo labirinto de ruínas, pouco habituado a mover-se em tranquilidade. A abadia recordava-lhe um período, de muitos anos atrás, quando fora recebido em um mosteiro e vivera com os monges.
Naquela época alimentava-se regularmente e eles até lhe haviam ensinado alguma cultura, serviram-lhe doses maciças das escrituras. Entretanto, a rígida disciplina e as dolorosas chibatadas recebidas quando desobedecia acabaram convencendo-o de que não fora talhado para a vida religiosa. Chegada uma nova primavera, fugiu.
Desde então, nunca permanecera muito tempo em um só lugar, sempre em busca de algo que parecia encontrar apenas em sonhos. Filipe logo descobriu que a desilusão com a vida religiosa era a única coisa que tinha em comum com Damastor... além de Isaac. O velho monge, quando muito, tratava-o rudemente, e no restante do tempo era como se ele nem existisse, deixando entrever que se ressentia com a intrusão daquele estranho em sua vida solitária e em sua autopiedade.
Filipe devorou o estoque de pão e queijo do monge, deixando apenas migalhas, examinou seus livros em segredo e ignorou os destratos. Já ouvira coisas muito piores com muita frequência, e por motivos bem piores.
O rapaz entrou quietamente no quarto do monge e sentou-se junto à cabeceira de Isaac, assim que a noite caiu. Olhou para a lua crescente, pendurada como uma joia no céu negro além do peitoril da janela, quando o uivo do lobo ecoou lamuriosamente pelos campos além.
Tornou a olhar para Isaac, ao percebê-lo mover-se na cama, viu-o abrir os olhos, em torturada procura. Ele tentou sentar-se, a dor o fez fechar os olhos com força. – Não faça isso! – disse Filipe.
Isaac olhou para ele, sobressaltado e confuso. Seus olhos, contudo, estavam claros, a febre se fora. Damastor contara a ele que, como o ferimento não havia sido mortal, cicatrizaria com rapidez, devido a Isaac ser um shifter.
– O senhor pode começar a sangrar outra vez – concluiu ele, sentindo a voz enfraquecer, porque elo o encarava.
Isaac sorriu, àquela altura acostumado a vê-lo à sua cabeceira. – Diga-me seu nome – ele pediu.
– Filipe, meu senhor, Filipe Touret. A maioria me chama de... Filipe, o Rato – completou, baixando os olhos.
– Muito estranho – murmurou ele. – Para alguém com tal espírito. – Tocou-lhe a mão delicadamente. — Eu o chamarei de. . . Filipe, o Corajoso.
Filipe corou. Seu corpo foi percorrido por um arrepio de prazerosa surpresa. Ergueu para ele os olhos que brilhavam.
– Você viaja com ele, não é? – perguntou ele, docemente. Filipe assentiu, a mente cheia com o beijo que Elazar lhe dera na última vez que estavam juntos. Ele não conseguia esconder o brilho em seus olhos ao lembrar do grande guerreiro moreno...
Isaac virou o rosto melancólico para a parede. Seus braços brancos e esguios, que durante dez anos não haviam sentido o calor do sol, descansaram flácidos sobre as peles.
Subitamente Filipe compreendeu que algo tão comum como acordar pela manhã, tão natural para ele era impossível para Isaac, que jamais poderia cavalgar ao lado de Elazar, ver seu rosto, ouvi-lo falar. E, naquele momento, seu coração segredou-lhe como devia ser a vida que Isaac levava... nunca vendo o sol ou as cores do dia, jamais segurando e nem mesmo tocando o homem que amava com tanto desespero. Aquele homem, ali ferido, havia sido arrancado de seu mundo, de sua família para ser atirado na vida como um fugitivo caçado, forçado a viver com uma maldição que havia roubado metade de sua humanidade e da de Elazar; sem saber se sua existência amaldiçoada teria fim ou se eles de fato viveriam daquela maneira até a eternidade...
Engoliu em seco o caroço que se formara em sua garganta e o impedia de falar. Suas mãos entrelaçaram-se entre os joelhos, quando tornou a olhar para o homem deitado. Encontrando a voz, sussurrou – "Você deve salvar este falcão" – foi o que ele me disse. – "Porque ele é a minha vida, minha última e melhor razão para viver".
Isaac moveu-se, virando o rosto novamente para ele. Seus olhos verdes procurando os de Filipe, como um falcão. Ele sustentou o olhar. – E depois, disse – "Um dia, nós conheceremos essa felicidade sempre sonhada por duas pessoas, mas nunca alcançada".
– Ele disse isso? – sussurrou Isaac.
Filipe assentiu. Ele o fitou por mais um longo momento e finalmente sorriu, o rosto tornando-se radioso de esperança e determinação. Tornou a aconchegar-se entre as peles e fechou os olhos, de novo em paz. Filipe levantou-se e saiu silenciosamente do quarto.
No corredor, comprimiu as costas contra a porta fechada e suspirou. Tinha sido um mentiroso rápido e perito a vida inteira, mas esta era a primeira vez que se orgulhava disso. Sorriu, satisfeito consigo mesmo. – Filipe, o Corajoso – murmurou.
Então soube que seu coração e sua vida pertenciam a Isaac, daquele momento em diante, enquanto noite e dia existissem.
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Pouco antes do alvorecer, Giggio levou dois guardas ao cume de outra montanha, naquela cordilheira interminável. Após a última escapada de Elazar e do ladrão, o Bispo ordenara que continuassem a busca por todas as horas do dia e da noite. Giggio sabia que Elazar foi gravemente ferido e que não poderia ir para muito longe. Contudo, haviam vasculhado inutilmente cada metro dos arredores. O tentente olhou para o solo rochoso, estudando-o à luz de uma tocha, em busca de qualquer indício de trilha.
– Veja! Lá em cima! – Apontou um dos homens.
Giggio olhou. Na distância, sombreadas pelo luar, erguiam-se as ruínas de um mosteiro. E abaixo dela pontos tremeluzentes de luz, indicando uma fogueira. A boca de Giggio afinou-se em um sorriso.
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Filipe se juntou a Damastor ao lado da fogueira do jardim, com ar taciturno. A angústia de Isaac se tornara dele, como o seu coração se tornara dele. O velho monge sentava-se à mesa com sua caneca de vinho, bêbado como de costume, brincando com laranjas e maçãs. Filipe agachou-se no terraço em ruínas. O monge sorveu outro longo gole de vinho, enquanto o rapaz o fitava com ar sombrio.
– Ele sabe? – perguntou Filipe, afinal.
Damastor o fitou por sobre a borda da caneca. – O quê? – indagou, irritado.
– Que o senhor é o padre que os traiu?
Uma vez que Isaac conhecia bem Damastor, apesar de ser um shifter e ter crenças diferentes das dele nunca o tratou com nada além de respeito... O monge atirou a caneca ao chão e ela retiniu contra as lajes de pedra do calçamento. – O Deus Único declarou um fim para isto! – bradou o monge. – Ele me deu conhecimento para desfazer o que fiz!
Filipe franziu o cenho. – Seja mais claro – pediu. – Se puder.
Damastor Menjou lutou para ficar de pé, olhando sério para o rapaz. – Durante dez anos fiquei sentado aqui, espiando o céu, à espera de alguma indicação de que minha vida e serviço ao Deus Único não tinham sido em vão e destruídos. O sinal nunca chegou... – Ele contemplou a noite estrelada. – Mas eu comecei a perceber outras coisas.
– Certa vez, quando estava bêbado, – disse Filipe, em tom cético – acreditei que era um rei.
– Quieto, seu iletrado miserável! – vociferou Imperius. Virando-se para a mesa, arrumou as frutas cuidadosamente. – Existem objetos brilhantes no céu noturno, que parecem ser proeminentes – disse lentamente, procurando palavras para descrever algo que ninguém jamais descrevera antes, – Esta estrela aqui – e tocou uma laranja – e a lua... – Estendeu a mão e tornou a puxá-la, piscando como uma coruja. – Onde está a lua?
– Acho que comi a lua.
– Tolo – murmurou Damastor, amargo. Deixou-se cair pesadamente sobre um degrau do terraço e começou a desenhar arcos e círculos na terra, com um graveto, antes de voltar a encarar o rapaz. – Descobri um meio de quebrar a maldição. Um momento oportuno para Elazar enfrentar o Bispo e recuperar o que um dia foi dele.
– Ele pretende enfrentar o Bispo – disse Filipe. – Quer matá-lo com a espada de seus ancestrais. – Levantou-se, recordando aquela espada magnífica e a última posse de Elazar no mundo. Agora compreendia perfeitamente a busca dele. Contemplou a noite, perguntando-se se o shifter lobo sempre odiara o Bispo, mesmo do Reverendo chegar em Colina e mudar sua vida para sempre. Pelo que ele representava, o poder castrador do Governo Central que não tolerava a existência de metamorfose e outros seres. Devia ter sido um amargo, mesmo que por poucos dias, fingir ser o que não era e tratar aquela escória humana com deferência... Filipe começou a compreender a verdadeira profundidade do ódio de Elazar pelo homem que traiu a honra de sua família e lhe tirou sua matilha, seu companheiro, cuja maldade o condenou a uma eternidade sem paz, sem esperança... e sem Isaac.
– Ele não pode matar o Bispo! – exclamou Damastor, desesperado. – Se fizer isso, a maldição continuará para sempre!
Filipe abriu a boca para indagar que alternativa o monge achava que realmente haveria, mas então se assustou, quando surdas pancadas soaram às portas da abadia.
– Abram aqui! – bradou uma voz. – Abram, em nome de Sua Excelência Reverendíssima, o Bispo de Moldovan!
O rapaz olhou para o monge, tomado de terror. Damastor ficou em pé, olhando para a abadia na direção do quarto de Isaac, com o medo desenhado nas linhas de seu rosto. Então, virando-se, espiou devagar para baixo na colina, na direção dos portões. Filipe fez o mesmo, com o coração batendo na garganta.
Damastor ficou em seu lugar no parapeito, espiando para fora e para baixo, enquanto Filipe se agachava ao seu lado. Giggio e mais dois guardas esperavam embaixo. Os dois guardas carregavam um pesado tronco de árvore e o tenente brandia sua tocha.
– Vão embora! – gritou Damastor agressivamente, soando para todo mundo como um velho embriagado. – Aqui não é um bordel! É a casa do Deus Único!
– Abra para o Bispo! – disse Giggio.
– Eu já estive com o Bispo, seu blasfemo idiota! – trovejou o monge. — E você não se parece em nada com ele!
Giggio virou para seus homens. – Derrubem! – ordenou.
Damastor baixou os olhos para Filipe. – Cuide de Isaac – sussurrou. – Corra, seu tolo!
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