Capítulo 52: Espíritos da floresta
Daren
Descia o monte de manhã cedo, precisava encontrar um velho conhecido que podia ajudar a aprisionar a escuridão, quando Valentina surge na minha frente.
— Que isso, menina? Tá querendo me matar do coração? — Sua aparição repentina quase me derruba no chão, coloquei a mão no peito, ela deu de ombros.
— Queria te mostrar que aprendi o teletransporte. — Sorriu. Eu cruzei os braços.
— E pra isso tem que me matar? Não podia ter falado? — Falei como se fosse óbvio, ela ergue a sobrancelha.
— Assim não teria graça nenhuma. — Diz, eu reviro os olhos e voltei ao meu caminho. — Por que não me chamou pra ir junto? — Perguntou, eu parei.
— Como sabe para onde estou indo? — Questionou, desta vez, ela revirou os olhos.
— Ouvi você conversando com o Andras, sei que vai até o tal conhecido que pode ajudar com a escuridão, então, mago Wilker, eu vou com você. — A garota passa por mim e segue pelo caminho de pedras. A fiz parar, entrando na sua frente.
— Não. É melhor você ficar aqui e... — Tentei, porém, ela me encara séria e levanta a mão para me fazer parar de falar.
— Nada do que você dizer vai me impedir de ir com você. — Explica, delicadamente, arruma o colarinho da minha roupa. — Até avisei o Nate que estávamos indo.
— E por que avisou zo Nate? — Perguntei, Valentina se afasta e continua o caminho.
— Ora, alguém tinha que saber, certo? Não podemos deixar a equipe sem dar satisfação. — Deu de ombros, concordei com a cabeça.
— Ah, entendo. É bom que alguém pode ir atrás da gente depois. — Pulei de pedra em pedra, ela desviou o caminho.
— É uma missão perigosa? — Perguntou, senti que estava ao meu lado novamente.
— Nem tanto, docinho. Mas é sempre bom reforço. — Sorri, ela fez uma careta.
— Nossa, eu não gosto quando você fala assim. — Cruzou os braços.
— Assim como? — Franzi as sobrancelhas.
— Como acabou de falar. Nossa relação é maior que apelidos melosos. Não tem que falar assim comigo. — Explicou, ela tinha razão, já tem tantos anos que temos um ao outro.
— Desculpe. Mas sabe como eu tenho um apreço por você, sempre tive. — Parei de andar, ela também. Dou alguns passos em sua direção.
— Eu sei, Daren. Também tenho muito apreço por você. — Valentina dá de ombros, desviando o olhar para o chão.
— O que você tem? Está tão estranha. — Me aproximei ainda mais, Valentina permaneceu imóvel, coloquei seu cabelo para trás.
— Ultimamente, eu estou pensando em como as coisas vão mudar quando a missão acabar. — Abaixou a cabeça. — E se... — Levantou o olhar novamente, encarei seu rosto.
— Não vamos nos afastar quando a missão acabar, é isso que te preocupa? — Segurei seus ombros, ela concorda com a cabeça. — Não pense isso, sempre vai ter a mim.
— Eu sei que nem sempre demonstro, mas você é muito importante para mim. Pra minha vida. — Ela me abraça, a última vez que fez isso foi quando me contou que seu pai tinha morrido. Retribui seu gesto. — Só não desiste de mim.
— Jamais. — Praticamente sussurrei.
Seguimos por entre a neblina de Tier. Não falamos muito, mas o que dizíamos era o suficiente, nós nunca fomos de ficar falando horas, porém, sempre nos entendíamos muito bem.
Eu tinha que fazer algo que não contei a ela. Na verdade, iria procurar algumas pistas sobre Nereu, meu amigo que seria o mestre da sabedoria, mas ele sumiu. Talvez estivesse vivo. É o que eu espero.
— Tem certeza que quer ir por esse caminho? — Paramos diante de um bosque que era assustador enquanto ela perguntava e me olhava impaciente.
— Passando por aqui a gente chega mais rápido. — Dou o primeiro passo, ela me segue cautelosa. Conforme adentrávamos, as árvores começaram a ficar mais próximas, ao ponto de ter que passar no meio delas, devido o grande volume de folhas na copa nas árvores, estava muito escuro, essa neblina toda também não ajudava, senti que estávamos sendo observados. Ao longe, vi um veado branco brilhante, ele estava de costas, parei de andar e impedi que ela fizesse o mesmo.
— É melhor a gente ficar parado esperando ele ir embora. — Falei bem baixo, ela concorda com a cabeça.
— E se a gente tentasse voltar... — Valentina sugere, concordo. Tentávamos dar alguns passos para trás, porém, o veado nos vê. — Corre!
Corremos por entre as árvores, os galhos retorcidos eram difíceis de atravessar, sentia minha pele sendo cortada pelas pontas quebradas. Parei quando o vi novamente, parado na mesma direção para qual estávamos indo. Droga.
Seus olhos ficaram vermelhos como sangue, seu corpo começou a flutuar em nossa direção. Segurei a mão de Valentina, não podíamos nos separar, entretanto, sinto os galhos das árvores se levantando, puxaram nossos corpos, os jogando para o outro lado. O veado havia sumido, mas eu sentia que estava por perto.
— Daren, coitado! — Ela grita, tentando desviar dos galhos e raízes. Sinto um dos cipós prendendo minha perna e me puxando para cima. Consigo cortar usando meus poderes e antes de cair no chão, levito.
Vejo Valentina cortar o meio os galhos e raízes que tentavam se aproximar dela, ela fazia isso usando seus poderes com muita agilidade.
Olhei em volta, o veado estava nos encarando. Não íamos sair com vida se tentássemos lutar contra ele. O jeito era mostrar que não somos uma ameaça para a floresta.
— Valentina, para. — Gritei, ela ergueu as mãos em sinal de rendição. — Esse é Anhagá, o espírito protetor, ele quer ver se somos dignos. — Expliquei. Subitamente, os galhos e raízes pararam, Valentina permanece imóvel, eu me viro lentamente para o espírito que estava se aproximando pouco a pouco. Vi pequenas borboletas voando em sua volta. Conforme sua energia mística nos cobria, a floresta se revela mais aberta, e iluminada, podia se ouvir novamente os sons dos animais, o barulho do rio e luz em nossos rostos.
— O que mortais fazem em minhas terras? — Seu corpo se transformou em um homem com traços marcantes e pinturas indígenas por seu corpo inteiro. Ele brilhava como o sol.
— Nós pedimos desculpas, mas estamos em busca de um amigo. — Indago de cabeça baixa. Ele se aproxima ainda mais.
— Seu amigo não está aqui. — Respondeu. — Vão embora. — Começou a sumir lentamente.
— Preciso saber se ele está vivo! — Falo, o espírito se aproxima de mim e segura meu queixo. Encaro seus olhos que estão vermelho, mas não tão assustadores como antes.
— Consigo ver ele em seus olhos... — Ele segura meu rosto com as duas mãos. — Costumamos levar quem amamos em nosso olhar. Sempre os vemos, não importa se estão longe de nós.
— Eu tenho que saber se ele está bem... — Sinto que lágrimas começam a escorrer pelo meu rosto, deixei Nereu sozinho e agora nem sei onde ele pode estar. — Por favor.
— Não chore, homem. Ele está vivo, mas não está perto. Também sente a sua falta. — O espírito se afastou um pouco. — Vai encontrá-lo quando concluir a sua missão, seu propósito de muitos anos. Daren, use tudo o que você tem agora. — Luzes cintilantes cercaram seu corpo e como uma pequena explosão, ele sumiu.
— Daren? — Ouço a voz de Valentina, mas é como se eu estivesse em outro lugar. Ela entende, já que ouviu tudo o que o espírito disse, sinto que segura a minha mão e, aos poucos, me guia para o fim da floresta. — Não se preocupe, você vai encontrar ele.
— Ainda temos que ir em um lugar. — Falei, ela concorda.
Alguns minutos depois, enquanto andávamos em silêncio total, percebo como ela parecia inquieta, apreensiva. Acho que já tinha voltado a realidade quando notei isso.
— O que você tem? E não vem dizer que está bem porque eu te conheço há quase dez anos e sei quando mente. — Encarei seus olhos, ela solta o ar e ri fraco.
— Estamos ocupados agora para conversar sobre isso. — Deu de ombros. A fiz parar, entrando na sua frente.
— Temos um tempo. Diga. — Insisto.
— É ruim me expor, não gosto de parecer tola, melosa, carente... — Ela diz, parecia que listava em uma ordem para explicar. — Tenho medo de ser ridícula.
— Você não é ridícula, nunca foi e nem nunca vai ser. — A encaro, ela ri. — Agora conta.
— Recebi uma carta de alguém importante. — Valentina sentou-se no chão, fiz o mesmo, ficando ao seu lado. — Quando comecei a missão, prometemos uma para a outra que sempre manteríamos contato, e que nada mudaria o que sentíamos. A vida não funciona assim e as cartas pararam com o tempo. Até pensei que talvez, em uma das vezes que fui parar Urs, podia visitá-la, mas não tive coragem. E o tempo passou.
— Você respondeu a carta? — Perguntei, ela negou com a cabeça. — E gostaria de responder?
— Eu quero. Não sei como, mas eu gostaria de responder do jeito certo, se passou anos, porém, por alguma razão, eu não desisti de nós. — Admitiu, vejo seu rosto ficar corado, desviou o olhar para o chão rapidamente.
— Você nunca fala de alguém que amou ou que deixou de amar, estou surpreso por falar nesse assunto comigo. — Falei, ela deu de ombros.
— E com quem mais poderia falar? Se tem alguém que me conhece é você. — Respondeu, sorri.
— Sendo assim, se você ainda sente algo deveria tentar. Pede mais tempo, a missão está quase no fim. — Aconselhei, ela concorda com a cabeça.
— Verdade. Todos nós vamos ter que viver depois da missão, nossas vidas não são só isso e nem poderia, certo? Aguardo por isso. — Encostei as costas na árvore enquanto falava, ela também. A sombra da copa cobria nossos corpos.
— Você se imagina daqui uns anos? Como vai ser sua vida anos depois da missão? — Perguntou, neguei com a cabeça, ela riu. — Eu te imagino tão livre.
— Você também vai ser livre. Te vejo sendo alguém que vai me orgulhar, se bem que já tenho muito orgulho da mulher que se tornou. — Insinuei, ela abaixa a cabeça, tímida.
— Vai me fazer chorar mesmo? — A vejo levantar a cabeça novamente, os olhos úmidos. — Eu só quero ter certeza que estou fazendo as coisas certas.
— E quando você não fez? Garota, você é incrível. — Elogiei, ela riu.
— Daren, você pode contar comigo para qualquer coisa, mas me dói quando tenta lidar com tudo sozinho. Podia ter me contado sobre Nereu, eu vinha com você sem perguntar nada, teria aceitado na hora. — Entrelaçou nossos dedos. Eu respirei fundo. — Você não está sozinho. —Segurou meu ombro. Sorri.
— Não é um assunto fácil. — Me levantei, começando a seguir novamente pela floresta. — Só vamos continuar, tá bom? — Não falamos nada enquanto entrávamos ainda mais na floresta.
O som de sinos junto com o barulho das folhas me fez parar, pequenos fragmentos de luzes surgiram pelo ar. Valentina sorri, animada.
O que ela tem?
Pequenas criaturas semelhantes a flores voavam em nossa direção.
— O que são...? — Tentei, mas ela entrou na minha frente, fazendo reverência as pequenas criaturas, me encarou e a segui no que fazia.
— Grande Yuri, espírito protetora dos aprendizes, diante de ti se encontra uma seguidora fiel. — A loira falava, encarei as criaturas que, aos poucos, foram se misturando e tornaram-se uma bela mulher, pele branca e longos cabelos escuros como a noite, seu vestido era repleto de flores cor-de-rosa. Ela pousa no chão e encara a garota, que permaneceu ajoelhada e imóvel.
— Aquela que vai honrar o nome de seu clã como seu avô fizera há muito tempo, Valentina Orcus, se levante. — Sua mão se ergueu na direção da garota, que a segurou ainda um tanto tímida, levantou o olhar para o espírito, que sorria gentilmente para ela.
— Ouvi todas às vezes que me pediu orientação, superou muitos obstáculos e ainda assim, continuou forte. Você me alegra. Você brilha e vai brilhar muito mais. Siga seu instinto, é melhor do que pensa. — Suas mãos seguram o rosto de Valentina, o espírito beija sua testa e, aos poucos, se vai.
***
— E quem é ele mesmo? — Ouço a voz de Valentina. Nós voltamos ao mosteiro algumas horas depois. Me preparava para fazer um portal, tendo em mente encontrar alguém que podia ajudar com nosso maior problema, a escuridão.
— O nome dele é Laurid. — Explico, o portal precisava ser exato onde ele estava. — Ele pode ensinar a Sofia como prender a escuridão.
— E se ele não aceitar? — A garota parou atrás de mim, a encaro.
— Ele vai. — Voltei a olhar para frente, posiciono minhas mãos na direção da parede, um círculo começa a brilhar intensamente. Aos poucos, consigo identificar uma casa rústica, uma forte corrente de ar gelada faz meus cabelos voarem. Entrei no círculo, Valentina me segue.
Com cuidado, nos afastamos para encontrar alguém que pudesse estar na casa.
A porta de fora se abre, vemos um homem alto, branco, com cabelos loiros e trançados entrar na casa. Ele parou por alguns instantes quando se deparou com duas pessoas em sua casa.
— Daren? — Perguntou, devido o frio gritante, ele usava um casaco de pele. Acho que de urso. Ainda parado ,segurando a porta, vejo que sorri fraco.
— Laurid, quanto tempo. Você continua o mesmo. — Digo, tentando não tremer de frio, ele percebe e fecha a porta. — Essa é Valentina, desculpe por invadir. — O viking parou o olhar sob a loira, ambos fizeram sutis reverências.
— Não se preocupe, temo que algo ruim aconteceu, estou certo? Para me procurar.. — Laurid adentrou a casa, tirando o casaco. Aqui dentro era mais quente.
— Já está acontecendo. Se lembra da garota que sou guardião? Pois bem, ela precisa que você seja seu professor. Se bem sei, você possui certos conhecimentos sobre entidades malignas antigas. — Expliquei, dando de ombros. O viking concorda com a cabeça. — O mundo está ficando sem tempo, a escuridão anda sugando a vitalidade do planeta. Além do mais, a magia não está em seus melhores anos.
— Realmente, é um grande problema. — Laurid cruzou os braços. — Entretanto, já que veio até meu encontro, não poderia negar ajuda.
— É sempre bom contar com você. — Sorri. Ele acena levemente com a cabeça.
Laurid nos acompanhou de volta para o mosteiro.
Seria melhor ter ele por perto desde o começo, só falta apresentar Sofia ao seu novo mentor.
Olá, leitores.
Laurid é um personagem de um dos melhores livros dessa plataforma, O Príncipe da Noite, disponível no perfil AGalMendes
Obrigada, meninas, por aceitar essa ideia. Fiquei muito feliz com isso.
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