Capítulo 2: A criança da profecia
— Nós vamos ter que voltar, irmã. — Kali pronunciou, entrou na tenda que as duas fizeram no meio da floresta para realizar o velório do irmão mais velho. Estavam sem acreditar no que aconteceu.
— As vezes acho que ainda o verei. — Daeva se virou e revelou seus olhos pesados de tantas lágrimas já derramadas. — Como se ele fosse aparecer na minha frente.
— Haures era o homem mais honrado que conheci. — Kali abraçou seu próprio corpo. — Sentirei falta dele enquanto eu viver. — As duas se olharam e se abraçaram apertado. Isso parecia o mais terrível pesadelo, porém, dessa vez, não tinha como acordar.
— Eu nem pude me despedir. — Daeva sussurrou e afundou seu rosto no ombro de sua irmã.
— Está tudo bem, querida. — Kali acariciava os longos cabelos ruivos de Daeva. — Não tínhamos como saber que Zagan seria capaz de tal ato. — Ela podia demonstrar estar calma, mas seu coração se enchia de raiva e decepção.
— O que aconteceu com nosso irmão? — Daeva se soltou de sua irmã e deu um passo para trás.
— Zagan nunca foi fácil de lidar, mas um assassino? O meu irmão? Minha cabeça não aceita isso!
— Nunca vou entender isso. Nunca vou superar isso. — Kali deixou sua voz falhar por um momento. — Nossa família...
As duas voltaram para seus reinos mágicos para anunciar a guerra contra seu próprio irmão, todos não puderam acreditar que algo tão terrível aconteceria em uma família como a deles.
Para ajudar na guerra, o Reino de Vultor (comandado por Kali) e Reino de Urs (comandado por Daeva) se uniram. Todos os recursos, guerreiros e tecnologia foram divididos entre as duas rainhas que tentavam manter as pessoas seguras.
Enquanto o Reino de Lup (comandado por Haures) se mantinha relutante em se juntar aos outros dois reinos, eles possuíam uma magia muito avançada e acreditavam que poderiam resistir ao avanço da guerra travada por Zagan que se aproximava cada vez mais das fronteiras.
— Não sei o que espera que eu faça, Evie. — Zagan falava em frente ao espelho, era a única maneira de se comunicar com a escuridão. A imagem da mulher aparecia lentamente no vidro, um frio congelante saía do objeto. — A guerra já está acontecendo. Minhas irmãs já juntaram seus reinos...
— Meu querido Zagan, este é apenas o começo. — O reflexo soltava fumaça preta pelo lugar, a mulher sorria. — Nossa jornada será longa... Tenho que saber se está disposto a fazer isso por mim.
— Estou, Evie. — Ele falou de maneira apressada. — Somos almas gêmeas!
— Você precisa conquistar o Reino de Lup. — Ela avisou seriamente e cruzou os braços. — Eles podem fazer de tudo para nos derrubar. — Sua expressão é de sofrimento.
— Farei de tudo para que todos eles caíam! — Zagan tocou no reflexo de sua amante. — Vou nos proteger. — Ela sorriu convicta.
***
— Posso ver claramente ele se aproximando com seu exército da magia corrompida... Ele vai chegar e destruir tudo! — Kali olhava para a janela e ao longe via as luzes verdes e pretas se aproximando comandados por Zagan.
— Nós vamos lutar. — Daeva colocou a mão no ombro de sua irmã. — É o nosso dever, Kali! É também o que nosso pai e Haures fariam.
— Tem razão, irmã. — Ela olhou para Daeva e mostrou um sorriso motivador. — Nós vamos lutar.
***
O campo de batalha se encontrava os exércitos dos três reinos, eles estavam frente a frente e prontos para derramar sangue.
Zagan estava montado em um cavalo com pelo preto e olhos vermelhos, sua roupa era de um metal escuro, seu olhar estava sombrio.
Em sua volta, milhares de soldados que não eram adeptos a magia, porém, como ela foi corrompida, qualquer um totalmente despreparado podia usar de maneira imprudente.
— Irmãs, renda-se a mim! — Zagan gritou para elas possam escutar do outro lado do campo de batalha. — Posso poupar a vida de vocês!
— Isso não vai acontecer! — Daeva berrou de volta montada em um urso, o símbolo de seu reino, sua armadura era marrom avermelhada.
— É melhor você se render a nós, Zagan! — Kali vozeou, montada em uma águia gigante, o símbolo de seu reino, sua armadura era verde-claro e branca.
— Vocês não me deram outra opção! — Ele deu o sinal, apontando para o exército rival e seus soldados atacaram fazendo com que suas irmãs também liberam seus soldados.
A batalha foi violenta e sangrenta.
Pelo céu, Kali lançava seu poder nos que estavam lutando no chão, sua águia voava entre os soldados os derrubando. Correndo pelo campo, o urso de Daeva gritava e batia em todos que ficam em sua frente, que tentavam impedir que achasse á Zagan.
— Estava a me procurar, irmã? — Zagan surgiu na frente de Daeva, ele já não montava o cavalo preto, umas mãos brilhavam com o poder maligno saindo em ondas verdes e seu sorriso mostrava desprezo.
— Você poupou meu trabalho vindo me encontrar! — Ela desceu do urso e com um movimento acendeu suas mãos revelando sua magia ainda pura.
— Da outra vez me pegou desprevenida, mas agora vou vingar a vida de Haures! — Gritou e avançou.
Os dois lutaram, Daeva lançou seu poder em forma de flechas flamejantes avermelhadas que Zagan desviava e devolvia em forma de facas verdes e pretas. Em um momento, Daeva surgiu atrás dele e, rapidamente, o deu uma rasteira, em seguida, chutou o rosto do irmão com tanta força que seu nariz sangrou, entretanto, o mais novo segurou seu tornozelo e a rainha veio ao chão. Zagan segurou no pescoço de Daeva e começou a sufocá-la, a mais velha apertou os olhos com a força que seu irmão usara para esganá-la, porém, socou brutalmente a barriga do mais novo, nesse momento, ela se levantou e criou uma esfera com as mãos lançando a direção de Zagan que já tinha se levantado. O rei desviou e a esfera alcançou o chão, com isso, terra e poeira fizeram uma neblina tensa surgir. Os dois não conseguiam se ver, porém, sentiam o poder um do outro.
O mais novo avistou sua irmã, foi lentamente na direção dela. Já planeja o que fazer há dias.
Quando Daeva finalmente o encontrou, não demorou para atacá-lo novamente, os golpes que a rainha acertava no homem fazia sangue escorrer por seu corpo, mas Zagan parecia não revidar.
— Como fez para que Haures não conseguisse usar seus poderes contra você? — Daeva perguntou, no momento que acertou um golpe em Zagan que se afastou para se recuperar. Ele sorriu limpando o sangue que escorreu de sua boca.
— Quer mesmo saber, irmã? — Ele questionou, se aproximando, ela franziu as sobrancelhas. Zagan, com um rápido movimento, avançou em Daeva que nem teve tempo de pensar em se defender. — Foi assim... — Sua mão segurava o rosto de Daeva, suas unhas pontudas machucavam suas bochechas, o ferimento fazia com que Zagan pudesse corromper a magia de sua irmã, a fumaça preta e verde adentrou o corpo de Daeva.
— Zagan... — Ela tossiu, tentou respirar novamente, sentia seu corpo doer devido ao poder que estava se tornando maligno.
— Não queria saber? — Ele sorriu, estava na hora de acabar com isso. Ergueu a mão na altura do peito de Daeva para aplicar seu golpe fatal, nesse momento, Kali lançou seu poder em forma de raio em Zagan que soltou Daeva, ambos foram jogados cada um para um lado. Kali correu ao auxílio de sua irmã que estava muito debilitada, caía no chão.
— Teria coragem para me matar, Kali? — Perguntou Zagan, se levantando e andando lentamente em direção as suas irmãs.
— Se der mais um passo, Zagan, eu juro pela memória de nosso pai que te mato sem pensar duas vezes! — Ela gritou, sua mão acendeu apontando para seu irmão e com a outra mão segurou Daeva. — Vá para trás! — Ergueu a irmã fazendo Daeva segurar em seu pescoço. Zagan invocou uma grande esfera de poder verde para lançar em suas irmãs, mas assim que a explosão aconteceu apenas seu exército estava no campo de batalha.
***
A guerra continuava e a situação estava cada vez pior, a esperança já não existia mais. Com a rainha Daeva doente, rei Haures morto, rei Zagan destruindo tudo ao ponto de poucos terem a magia pura, podiam considerar o fim. A escuridão estava conseguindo o que queria, todos que conseguiam conjurar seus poderes estavam em perigo.
— Vossa majestade, o conselho pede uma decisão. Devemos atacar? — O general Caik perguntou para Kali quando a rainha deixou os aposentos de sua irmã.
— Eu não posso tomar decisão agora, a minha irmã está morrendo. — Ela colocou as mãos sobre os olhos e abaixou os ombros.
— Precisamos de uma decisão, vossa majestade. — Ele faz uma reverência. Kali olhou para dentro do quarto vendo sua irmã dormindo, pensou no que seus dois irmãos mais velhos sempre faziam. Pedir ajuda ao pai.
— Preciso de algumas horas. — Kali explicou e sumiu diante dos olhos do homem que já estava acostumado com essas atitudes da rainha.
Kali parou em frente a estátua do pai, ajoelhou-se e chorou.
— Meu pai, as coisas estão difíceis... Haures está morto, Zagan virou um assassino e Daeva está doente, estou sozinha... Preciso de uma orientação... — Suas mãos seguravam seu peito e lágrimas escorriam pelo seu rosto. Luzes brancas rodearam ela e a estátua do pai, no altar de pedra próximo onde Kali estava, surgiu uma profecia, ela secou as lágrimas se levantando e olhando para a pedra, com os dizeres:
Não há mais necessidade de vossas mãos de sangue sujar
Pois quando as esferas alinhadas estiverem tudo ira melhorar A criança abençoada nascerá e a esperança surgirá junto a vós Seu poder será tão grande que a magia restaurada vai estar O mal não aguentará e diante de seus olhos cairá Somente o bem vai restar E assim tudo melhorar Graças a criança que vós salvará
— Uma criança? — Kali encarou a estátua do pai. — Uma criança vai resolver todo esse problema? — Ela cruzou os braços. — Não acredito, pai. Essa é a solução que me dá? — A rainha negou com a cabeça repetidas vezes.
Não podia ser alguém adulto? Pensou.
— Obrigada, meu pai. — Se curvou á estátua e voltou ao seu reino.
Quando entrou no quarto de sua irmã a mesma acabara de acordar.
— Irmã? O que houve? — Ela tentou se levantar, mas estava muito fraca.
— Fique deitada, querida. — Kali deu a volta na cama e deitou ao lado da irmã. — Pedi ajuda de nosso pai... — Daeva a encarou com os olhos arregalados. — Ele me deu uma solução. — Continuou e olhou para frente, seus pensamentos giravam.
— Deve ter sido algo muito ruim para você estar com essa cara. — Daeva encarou a irmã. Kali concordou com a cabeça, ainda olhando para frente.
— Uma criança vai nascer daqui três noites... Ela vai restaurar a magia. Nosso pai me avisou através de uma profecia em seu memorial. — A rainha explicou e colocou a mão na testa.
— Lembra de quando você tinha pesadelo? — A pergunta repentina de Daeva fez com que sua irmã mais nova franzisse a testa, em seguida, Kali balançou a cabeça concordando. — Bastava eu esperar que ouvia você bater na minha porta, eu sempre abria e você pulava nos meus braços.
— Por que está falando assim? — Kali se virou e encarou a irmã. Já imaginava onde aquilo chegaria, um nó se formou na sua garganta, sentiu seu coração acelerar.
— Cuide dessa criança como eu cuidava de você... — Daeva segurou o rosto de Kali. O estrago que Zagan fez em uma magia foi perverso, a mais velha não tinha como fugir, se continuasse viva, lentamente, sua magia seria maligna. Seu corpo não aguentaria, sua mente não suportaria. Daeva abriu mão de lutar por sua vida para que não fosse corrompida. Agora, sentia que não podia mais lutar ou ajudar, mas, com as revelações de sua irmã, acreditava que havia uma saída. Uma solução. — Essa criança é a nossa esperança... Prometa que vai amar a criança, Kali! — Lágrimas escorrem pelo rosto de ambas violentamente. O que fazer quando suas mãos estão acorrentadas pelas incoerências do destino. O que fazer quando seu corpo não aguenta mais? Daeva não estaria ao lado de Kali dali em diante. Sua irmã estaria sozinha e era isso que mais a machucava. Queria ter a certeza que sua irmã faria o que fosse preciso para dar um fim nisso.
— Prometo. Eu vou amar ela assim como você me amou... E se ela tiver pesadelo serei a primeira a abraça-la. — Kali falou de maneira apressada, chorava que nem uma criança. Sentia-se com seis anos novamente, com medo, em um quarto escuro, sozinha.
— Adeus, Kali... Minha irmãzinha linda. — Daeva deu o último suspiro e fechou os olhos encerrando sua jornada.
— Não... — O pranto da rainha foi ouvido por quem estivesse perto daquele quarto. Um grito triste e doloroso.
***
— Meia-noite de exatos três dias, a criança da profecia vai nascer, eu quero que todos os dominadores da magia ainda pura procurando por ela. Usem os oráculos que sobraram e as minhas águias para localizar seu paradeiro, quero um grupo de pessoas em cada reino, não deixem passar uma pequena vila se quer, essa criança precisa ser encontrada antes que meu irmão a encontre. — Do alto de seu trono, Kali explicou, havia enterrado há poucos sua irmã no mesmo lugar que enterrou o irmão. — Quando encontrarem quero ser a primeira a saber, quero que me levem até ela... Se essa conversa deixar esse Castelo e se espalhar por outros lugares não hesitarei em castigar o culpado. Alguma pergunta? — Questionou e os súditos negaram com a cabeça.
Através dos oráculos e videntes, os magos encontraram a criança em uma vila afastada no Reino de Tier, a casa era humilde, mas era bem apresentada, distante da realidade de Kali que cresceu em meio castelos e riquezas.
— Veja, querida. — O homem negro, alto, com olhos azuis pronunciou, parando de varrer a casa e apontando as pessoas que se aproximavam. — É a rainha Kali e sua corte. — A mulher morena com longos cabelos cacheados se levantou, ajeitando seu bebê no berço.
— Será que fizemos algo? — Ela andou até a pequena janela tentando ver melhor os nobres com suas roupas brilhantes e coloridas, apenas a rainha usava preto.
— Já vamos saber. — Seu marido abriu a porta e fez uma reverência assim que os nobres pararam na frente de sua casa, Kali se mantinha séria, mas fez uma reverência aos dois que estavam cada vez mais confusos.
— Meus senhores, preciso da ajuda de vocês. — Ela se aproximou, subindo os degraus da varanda e parando em frente aos dois. — É sobre seu bebê. — Olhou para o berço e viu a criança mexer os braços.
— O que podem querer com nossa filha? — A mulher perguntou, entrou na frente da visão da rainha impedindo que olhasse o berço.
— Sua filha foi abençoada pelos deuses. — Kali passou pela mulher seguindo para o berço. — Ela tem um poder inexplicável. — A criança, vendo Kali sorriu e ergueu os braços para ela, a rainha sorriu de volta e pegou a criança no colo.
— Vossa majestade, veio aqui para levar a nossa filha? — O homem perguntou, a mulher se desesperou e os guardas tiveram que segurá-la. — Não pode fazer isso! — Continuou.
— Não leve o meu bebê! — A mulher gritava e tentava se soltar dos guardas, mas não teve sucesso.
— Sinto muito. — Kali acalentou a criança que começou a chorar devido os gritos.
— Ela vai salvar muitas pessoas e um dia vai voltar para vocês. — Passou por eles saindo da casa e levando a menina. Podia ouvir os gritos de seus pais, olhou para a criança e sentiu algo acender em seu peito. Talvez esperança.
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