Há muito tempo, os quatro reinos foram divididos entre os quatro filhos do semideus Aron, sua hora havia chegado e o homem sempre se orgulhou de ter preparado seus filhos para comandar seu valoroso império.
Haures, o mais velho, ficou com Reino de Lup, Daeva, a segunda filha, ficou com Reino de Urs, Zagan, o terceiro, ficou com Reino de Tier, Kali, a mais nova, ficou com Reino de Vultor.

- Não posso acreditar que nosso pai se foi. - A bela Kali lamentou-se, seus olhos escuros estavam marejados, os cabelos brancos presos em uma trança. Usava um vestido preto para simbolizar o luto.

- Ele já sabia - Daeva, a ruiva alta e encorpada abraçou sua irmã mais nova com carinho. - A última vez que conversamos parecia mais uma despedida. - Continuou enquanto colocou o cabelo de sua irmã para trás.

- Irmãs, nosso pai não queria que ficássemos a chorar e se lamentar pelos cantos. - Haures, o mais velho dentre seus irmãos, moreno, e o mais alto da família. Seus olhos azuis estavam úmidos. Se virou lentamente e viu seu irmão parado em um canto, a expressão do jovem era séria. - Zagan, venha ficar perto de sua família nesse momento tão difícil. - Ele ergueu as sobrancelhas e apontou a cabeça para as irmãs.

- Não sou mais criança para mandar em mim, irmão. - Zagan, o penúltimo dos filhos respondeu e revirou os olhos, o moreno de olhos negros não suportava que seu irmão o mandasse. Apenas deu de ombros e continuou no mesmo lugar.

- Não é momento para desavenças passadas, nosso pai gostaria que pelo menos hoje vocês se entendessem. - Daeva cruzou os braços. - Vamos apenas seguir com que ele pediu. - Ela soltou sua irmã, beijando delicadamente o topo de sua cabeça, indo em direção a grande estátua de seu pai para prestar seus respeitos.

- Daeva tem razão, hoje nós vamos apenas honrar nosso pai. - Kali secou as lágrimas e passou por seus irmãos sem olhar para eles, parou ao lado de sua irmã e fez uma reverência a estátua de seu pai.

- Zagan, vejo o quanto nossas desavenças parecem insignificantes agora. - Haures se aproximou de seu irmão lentamente. - Proponho uma trégua. - Ele diz seriamente.

- Nós nunca teremos uma trégua. - Zagan se afastou do irmão e desviou o olhar para a saída. - Apenas não quero acabar com você no memorial de nosso pai. - Sorriu de lado e cruzou os braços.

- Você é um insensível. - Haures cuspiu as palavras e parou ao lado de Kali para prestar seus respeitos ao pai. Os três deram as mãos.

- Para funcionar é preciso os quatro filhos, Zagan. - Kali sorriu para Zagan e jovem negou com a cabeça. - Não faça isso com sua família. - Zagan, não conseguindo ignorar o pedido de sua irmã mais nova, seguiu ao lado dos outros irmãos. Ele estendeu a mão para Daeva e abaixou a cabeça.

A pequena corrente das mãos entrelaçadas brilhou com uma forte luz branca e fez a estátua brilhar também. A claridade simbolizava que a magia estava pura e genuína, era assim que ela deveria permanecer.
O ritual para mostrar ao pai que zelavam pela magia foi executado como o esperado, agora cada um cuidaria de seu próprio reino.

- Quero que tome cuidado, irmão. - Kali abraçou Zagan, ele retribuiu esse gesto de carinho a apertando contra seu corpo. - Não estou mais ao seu lado para lhe impedir de tomar atitudes imprudentes. - Ela aconselhou e se afastou para conseguir ver o rosto de Zagan.

- Eu sempre tomo. Preocupo-me com você, Kali. - Eles se afastaram, Zagan tirou o cabelo de sua irmã que insistia em cair sobre seus olhos. - Nunca viveu sem um membro da família antes!

- Posso fazer isso. - Ela segurou a mão dele gentilmente. - Não sou mais criança. - Ela riu e ele negou com cabeça. - Sentirei saudades.

- Eu também. - Ele diz por fim e afastou de sua irmã.

Daeva nada disse, apenas abraçou cada um de seus irmãos, ela ainda sentia muito pela morte do pai. Eram muito apegados.

- Nos veremos em breve, irmãos. - Haures fez uma reverência colocando a mão sobre o peito para seus irmãos que também fizeram o mesmo para ele.
Um por um foram seguindo para seus reinos, estava na hora de assumir o legado deixado por Aron.

Os anos foram passando rápido. Ao todo, uma década.
Cada um tinha seu modo de governar, mas as coisas estavam indo bem e o mais importante a magia continuava pura.

Entretanto, o mal despertou.
A escuridão, após anos adormecida surgiu querendo vingança ao seu grande inimigo Aron que a derrotou e aprisionou no mais tenebroso dos lugares, o tártaro.
Porém, a escuridão vendo que Aron já não vivia mais, resolveu se vingar usando um de seus filhos, Zagan precisamente, pois o rapaz mostrava uma certa obscuridade em sua essência.

O jovem rei foi corrompido pela escuridão.

Os aposentos do penúltimo filho de Aron resistia a penumbra e ao frio da noite, foi um dia difícil e a única coisa que gostaria de fazer era dormir por horas sem ser incomodado.
Lentamente, as portas são abertas, ele se levantou para gritar com quem o perturbava quando viu uma bela mulher.

Estranhou a mulher que andava calmamente olhando para ele. Ela era alta e magra ao ponto que ao redor de seus olhos serem fundos, pálida como a lua, e seus cabelos e olhos eram escuros como a noite. Zagan deu um passo para trás, tinha um clima pesado no ar.

- Quem é você? - Ele perguntou, cruzando os braços. - Como entrou no meu castelo? - O monarca a observava com receio, a misteriosa dama correu os olhos pelo aposento. Achava que os humanos tinham mal gosto.

- Sou uma velha amiga de seu pai. - Ela rodeou o corpo do rei. - Meu nome é Evie. - Sorriu e parou na frente dele.

- Evie, como entrou no meu castelo? - Zagan perguntou novamente, e segurou o braço dela apertando forte.

- Eu posso entrar onde bem-quiser, Zagan. - Ela passou a mão pelo rosto dele, porém, o rei desviou de seu toque a soltando abruptamente.

- Fale o que você quer antes que eu te mate! - O rei revirou os olhos para ela, já estava perdendo a paciência. A mulher sorriu. Gostava do impetuoso filho de seu inimigo, aquele monarca seria útil.

- Você! - Ela diz, Zagan fez uma expressão confusa, a mulher riu.
- Não precisa se assustar, vossa majestade. Tenho uma proposta para lhe fazer. - Ela desviou o olhar e começou a andar pelos aposentos. Viu uma pintura de quatro crianças, elas estão abraçadas. O mais alto segurava um bebê, a menina ao lado dele abraçava um garoto pequeno, os olhos do bebê eram iguais a do garoto, Enquanto que os mais velhos tinham os mesmos olhos azuis.

- Que proposta teria para um rei, Evie? - Zagan observava cada movimento daquela mulher, sentia que se descuidasse por um segundo algo ruim podia acontecer.

- Se tiver disposto, vossa majestade, terá todo o poder que desejar. - Evie encarou a pintura, as crianças, embora fossem diferentes eram muito unidas, como uma família. - São seus irmãos? - Ela apontou para a pintura, Zagan parou na frente dela.

- Esqueça os meus irmãos! - Ele cruzou os braços. - Fale de uma vez. - Zagan podia não admitir, mas prezava o bem estar de sua família. Jamais os envolveria em suas confusões.

- O poder que você precisa, eu tenho. É bem maior do que tudo que já viu. - Ela se aproximou dele. - Basta dizer sim. - Evie segurou os braços do rei, Zagan sentiu seu coração acelerar. Ele sabia que exista algo extremamente poderoso que nunca conseguiu ter, seu pai teve isso, Haures teve isso, mas o jovem Zagan não foi considerado digno pelo velho Aron para ter esse poder. Esse foi um dos motivos para que ele e seu irmão mais velho não fossem amigos.

- Como posso confiar em você? - Ele falou baixo, encarou a mulher e sentia uma forte atração por ela.

- Olha para nós, Zagan. - Evie segurou o rosto dele com as duas mãos. - Somos destinados a lutar juntos, a magia verdadeira vive em nós. Preciso que aceite lutar comigo. - Os lábios de Evie chegou a encostar nos lábios de Zagan.

O rei engoliu em seco, seu coração estava acelerado. Acreditava nas palavras daquela mulher, desde sua figura surgiu em seus aposentos sentia um grande poder exalar dela, um poder que ele sempre almejava. Um poder que foi negado á ele.

- Eu não p... - Zagan não conseguia falar. Sua mente voltou ao momento que ouviu seu pai dizendo você não é digno desse poder. O rei balançou a cabeça, precisava esquecer essas palavras senão jamais mudaria a visão de si mesmo.

- Ouça, majestade, eu sei o que é ter essa visão de si mesmo, sei como é ter alguém que você ama te machucando. - A mulher deixou escapar uma lágrima, por alguma razão que o homem não entendeu, limpou o choro dela rapidamente. Evie sorriu.

- Faça isso comigo, Zagan, mostre que todos estavam errados, prove pra todo mundo que você é capaz de fazer qualquer coisa. Eu acredito.

- Não consigo dizer não a você, Evie. - Os dois se beijaram e uma fumaça preta com luzes verdes passou a rodeá-los. - Sim. - Zagan sussurrou e Evie sorriu vitoriosa, eles voltaram a se beijar.

***

O dia de prestar a homenagem a Aron havia chegando.

Parados em frente a estátua do semi-deus estavam Haures, Daeva e Kali.

- Ele deve estar fazendo de propósito. - Haures passou de um lado para o outro. - Sempre querendo chamar atenção. - Olhou para a porta, mas nem sinal do mais novo.

- Não se preocupe, irmão. - Daeva respirou fundo. - Ele logo chegará.

- Não entendo Zagan. - Kali revirou os olhos e cruzou os braços. - Basta seguir com o que é a nossa responsabilidade e podemos voltar a nossos reinos!

- Ele sempre vem, atrasa, mas vem. - Daeva olhou para a estátua do pai e uma lágrima escorreu pelo seu rosto, a secou antes que alguém visse.

- Não precisam chorar, meus irmãos. - Zagan surge no lugar com um sorriso assustador, os três o olharam confusos. - Estou aqui. - Seguiu para seu lugar de costume para realizar o ritual.

- Brotou do chão? - Haures perguntou, sarcástico. - Nem o vimos chegar. - Ele também foi ao seu lugar de costume.

- É bom ver você. - Zagan sorriu, ignorando o comentário de seu irmão. - É bom ver todos vocês.

- Zagan, você está bem? - Kali perguntou e colocou a mão na testa de seu irmão para checar sua temperatura.

- Melhor impossível, querida irmã. - Ele riu e ela concordou com cabeça, indo ao seu lugar de costume.

- Já que todos estão aqui podemos começar o ritual de uma vez. - Daeva segurou na mão de sua irmã e seu irmão mais novo.
Fecharam os olhos para começar, com isso, não viram que a luz não estava forte e branca, o verde e preto começaram a cercar os quatro. A magia foi corrompida.

- Tem algo de errado... - Haures pronunciou e abriu os olhos, nesse momento, um soco fez ele cair. Foi Zagan.

- O que está acontecendo? - Kali perguntou, a corrente tinha se desfeito. Ela viu Haures recém-caído no chão com um pouco de sangue no canto de sua boca, Zagan sorria e encarava seu irmão. A rainha correu na direção do mais velho, vendo se ele estava bem, o mais novo a encarou.

- Zagan? Você agrediu Haures? - Daeva se pois na frente dele e cruzou os braços. Kali ajudou Haures a se levantar.

- Eu vou fazer bem pior que socar ele. - Zagan ergueu a mão e suas duas irmãs voaram para longe sendo sugadas por uma nuvem preta com mãos e rostos agonizantes. O rei de Tier olhou para Haures com ressentimento, ódio. E ele o odiava. Por todas as vezes que foi menosprezado, humilhado e deixado para trás por ele e seu pai. Agora, tomado por forças malignas, Zagan viu a sua chance. Nunca mais seria o segundo. Haures não estaria mais em seu caminho.

- Você quer me matar? - Haures perguntou, sarcástico. Não a primeira vez que eles brigaram, pensou que daria alguns socos em seu irmãozinho que logo ficaria quieto.

- Eu vou! - Esbravejou, uma luz verde e preta saiu das mãos de Zagan. Haures estranhou e deu um passo para trás.

- Sua magia foi corrompida? Desde quando isso está acontecendo? - Haures perguntou, irritado.

- Não importa! Finalmente vou acabar com você! - Zagan gritou, avançou rapidamente em seu irmão.

Haures desviou, mas, por alguma razão, sua magia falhou quando ele tentou acertar um golpe no mais novo.

- Você não pode me vencer, Haures! - Zagan riu diabolicamente e segurou o pescoço de seu irmão. - Você nunca foi melhor que eu! - Gritou. Haures tentou se defender, mas Zagan chutou sua barriga fazendo o mais velho quase cair de joelhos no chão.

- Nunca quis ser melhor que você. - Haures não conseguia usar sua magia, não podia se mover. Estava nas mãos de Zagan. - Era para sermos uma família. - O mais velho tossiu, a força que seu irmão usava enquanto apertava seu pescoço era tanta que sua visão começou a ficar embaçada.

- Nós somos uma família. - Zagan encarou para a expressão apática de Haures se perguntando como ele permanecia calmo em meio essa situação.
- Mande lembranças ao nosso pai. - Sussurrou o mais novo. Sem hesitar, enfiou sua mão dentro do peito de Haures arrancando seu coração. os olhos azuis frios do mais velho se arregalaram ao ver seu coração nas mãos de seu irmão. Zagan revirou os olhos, apertou o coração de seu irmão o transformando em poeira, em seguida, a soltou lentamente pelo ar.

- Não! - Kali e Daeva gritaram quando conseguiram reverter a magia de Zagan, voltando ao memorial e vendo que um acabou de assassinar o outro.

- Zagan, o que diabos você fez? - Daeva esbravejou e empurrou o peito de seu irmão, o corpo de Haures pendeu e antes de cair no chão, ela o segurou em um abraço. O sangue começou a escorrer pelas mãos de Daeva, manchou suas roupas e seu rosto.

- Por que o matou? - Kali gritava e batia com todas as suas forças em Zagan que se divertia com a situação.

- Se Haures estivesse vivo impediria meus planos... Foi melhor assim. - Zagan tirou um lenço de sua roupa, o usando para limpar sua mão que pingava com o sangue do irmão.

- Eu vou matar você! - Daeva gritou, enquanto chorava abraçada ao corpo sem vida de Haures.

- Você vem comigo, irmã? - Ele estendeu a mão para Kali, ela se afastou dele indo até Daeva e segurou o ombro da mais velha.

- Você não é mais meu irmão. - A mais nova abaixou a cabeça e lágrimas escorreram pelo seu rosto.

- Não podem me vencer agora! Eu sou o mais poderoso! - Ele gritou, as luzes verdes e pretas começaram a passar de um lado para o outro com uma ventania que fazia os cabelos e as roupas voarem.

- Você nunca esteve tão fraco, Zagan. - Daeva o encarou e usando seus poderes fez com que Kali, o corpo de Haures e ela se teletransportassem para o mais longe possível do memorial.

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