Capítulo 19
Parabéns Letícia!
Fiz esse capítulo como um presente atrasado kkkkk
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Segui o garoto até a parte mais desolada da cidade. Ele pareceu surpreso por eu ter realmente o seguido. Mas logo depois se apressou, claramente com um destino em mente.
Talvez ele achasse que eu não o ajudaria se parasse por tempo o suficiente para o questionar.
Apreensão começou a tomar conta de mim conforme a cidade se tornava cada vez mais decadente conforme prosseguimos.
Não demorou muito para chegarmos a um beco.
Não estávamos sozinhos.
Uma outra criança se agarrava a mão de um homem. Era uma garotinha, não muito mais nova que o garoto ao meu lado. Ela estava igualmente surrada e abatida, olhando horrorizada para o beco vazio.
Segui o seu olhar. Não havia nada mais do que lixo no chão. Mantas velhas e desgastadas estavam jogadas umas sobre as outras formando o que deveria ser uma cama. Não havia ninguém ali. Porém uma mancha de sangue ainda molhada provava que há pouco tempo tinha havido.
- Dana? - o menino que me trouxe perguntou atordoado.
A menina levou um momento para responder. Seu olhar grudado nos panos antes de se virar para o garoto.
- Irmão - sussurrou a garota - Ela não está mais aqui. Quando eu cheguei não estava, levaram ela...
A voz de alguma forma soou morta para um rosto tão jovem.
O menino olhou a garota atordoado por um segundo depois seguiu o olhar para as mantas sujas, quase com medo. Seu rosto ficou pálido conforme ele encarava a mancha de sangue fixamente.
Olhei para as crianças sem entender.
- Garoto? O que está acontecendo? Onde está sua mãe?
Minha voz pareceu chamar sua atenção.
Ele me olhou por um segundo antes de responder.
- Eu apenas fui buscar ajuda - ele engoliu em seco, a voz de repente trêmula - mamãe... Ela estava sangrando muito... Eu e minha irmã saímos para buscar ajuda... e então...
Eles parou, um soluço escapando dele antes que o engolisse a força.
- Pensei que haveria pessoas pra ajudar na taverna... Eles tem dinheiro lá... mamãe disse que pessoas com dinheiro podem quase tudo...
Olhei para o menino abalado sem entender nada. Ele não estava fazendo sentido.
- Sua mãe foi sequestrada?
Tomei um susto com a voz do homem ao lado. De alguma forma tinha esquecido sua presença ali.
Ele ainda segurava a mão da garota abatida. Olhei para ele por um momento... Ele parecia vagamente familiar.
E ele era bonito, muito bonito.
As roupas que ele usava não pareciam surradas como as do restante da cidade. Haviam vários adereços com ele. Vi dois anéis em seus dedos. Anelar e indicador respectivamente. Suas orelhas também estavam furadas com pequenas esferas de ouro. Ele se destacava na cidade em que a maioria das pessoas parecia mal ter o bastante para se alimentar.
Seu cabelo era de um louro pálido trançado nas costas, seu rosto angular e simétrico se encaixava perfeitamente com os olhos verdes, aumentando ainda mais minha sensação de reconhecimento.
Ele quase parecia... Lianof.
Senti todo a cor drenar do meu rosto conforme me dava conta. Não parecia exatamente Lianof.
Mas outra criança, em outro lugar e outra época.
Imagens de um garoto prestes a ser esmagado por um javali selvagem veio a minha mente.
Um garoto defendendo seu irmão em um julgamento injusto...
Não poderia ser...
Senti meu coração acelerar e fiquei atordoada por um momento.
O rosto era muito parecido para ser engano. Embora mais velho parecia o mesmo garoto.
O irmão de Lianof...
Uma série de pensamentos me assaltaram de uma vez só.
Isso era bom não era? O irmão gentil dele o ajudou quando todos, inclusive o próprio pai estavam contra ele. Se ele estava aqui, não poderia ajudar?
Antes que o pensamento se estabelecesse no entanto, outra coisa veio a minha mente. Mas se era ele, então o que estava fazendo aqui nessa cidade? Como isso era possível?
Não fazia sentido.
Minha mente não era capaz de acompanhar os acontecimentos.
- Eu te conheço?
A voz do homem me tirou dos meus pensamentos e me dei conta que o estava encarando o tempo todo.
- Você... Parece familiar.
Ele piscou lentamente em minha direção.
- Familiar?
O som de choro chamou nossa atenção para a cena atual.
A menina que antes estava apenas atordoada, finalmente começou a chorar. Soluços fortes e violentos que soaram muito altos para um corpo tão pequeno produzí-los.
O som tirou o menino do próprio sofrimento e um olhar de determinação cobriu o seu rosto.
- Eu vou atrás dela!
O menino se virou, prestes a sair.
- Espere! - o homem segurou o mão do garoto bem a tempo.
- Me solte!
- Sua mãe foi levada? Você sabe por quem? Correr sozinho e sem um plano não vai ajudá-la. Eu posso ajudar se me contar tudo.
O garoto engoliu em seco mas por fim parou de tentar fugir. Ele olhou desconfiado para o homem, parecendo hesitar.
A irmã dele ainda chorava ao lado. Não tendo soltado a mão do homem.
As duas crianças eram irmãos, isso era claro.
Os dois haviam se separado para procurar ajuda?
Olhando para o homem e a garota, parecia ser o caso.
Eu estava atordoada com toda a impossibilidade da situação. Se for mesmo o irmão de Lianof aqui e agora... Essa informação por si só era demais.
Mas haviam coisas mais urgentes primeiro.
Me agachei até a altura do menino.
- Qual o seu nome?
- Dovan.
- Dovan, você pode me contar - deixei minha voz o mais suave possível - vou fazer todo o possível pra trazer sua mãe de volta. Você e sua irmã precisam dela certo?
O menino olhou para a menina que chorava e por fim pareceu tomar uma decisão.
- Minha mãe perdeu o bebê.
Um aborto?
Olhei para as mantas no chão. Isso explicava o sangue. Mas onde estava a mulher?
- Ela estava se recuperando, mas começou a sangrar do nada. Eu e minha irmã saímos pra procurar ajuda - ele olhou para a garota antes de continuar. Estava mais calmo agora, embora ainda estivesse pálido o suficiente para me preocupar - mas ela não estava mais aqui ao que parece.
- Você sabe aonde ela pode ter ido?
Ele hesitou mais uma vez antes de me olhar nos olhos.
- Estávamos fugindo.
Pisquei, surpresa.
- Do que vocês estavam fugindo?
- Minha mãe ela... ela.. - ele gaguejou e engoliu em seco, por fim continuando com urgência - ela podia apenas esquentar as coisas, eu juro!
- Garoto?
- Ela não era mal como os outros, ela só nos proteja do frio no inverno e fazia comida, mais nada!
Eu ainda não estava entendendo.
Mas parecia que eu era a única.
- Sua mãe é uma herdeira? - Perguntou o homem, a voz de repente vazia.
O menino não respondeu.
- Por isso você sabe onde ela está certo? Vocês estavam fugindo - continuou o homem.
- Ela não é má - o menino rugiu.
Fiquei atordoada por um momento. A mãe deles era uma herdeira? Me concentrei nas duas crianças. Não senti nada. Os filhos claramente não eram.
Nem sempre a habilidade de um herdeiro passava para os filhos, principalmente se um dos cônjuges não fosse.
- Você disse que ia me ajudar! - o garoto argumentou.
- Você não disse que sua mãe era uma herdeira.
Franzi minha testa. A menina que por fim tinha acabado de chorar se afastou do homem, agora indecisa.
A mãe do garoto, machucada, havia sido capturada por ser uma herdeira? Eu juntei os pontos.
- Por favor me ajudem - o menino se desesperou - eles vão matá-la.
- Se acalme - tentei confortá-lo - Você sabe onde ela está?
O menino assentiu.
- Eu acho que sim.
Tomei uma decisão.
- Então me leve até lá.
O homem olhou pra mim como se eu tivesse dito a coisa mais absurda que ele já tivesse ouvido.
- Você está louca?
- Eu quero apenas ver a situação.
Uma expressão de desolação passou por um segundo por seu olhar.
- Não é possível ajudá-los - ele sussurrou levemente.
De repente percebi algo no homem que não havia notado antes. Ele carregada um ar de melancolia a sua volta como uma capa. Imaginei o porquê.
Talvez não fosse possível ajudar a mãe do menino.
Segui o garoto mesmo assim.
****
A cena na praça me chocou.
Quando o garoto falou que sua mãe havia sido levada, eu de alguma forma imaginei um lugar como o armazém em que eu fui presa. Talvez grandes e algemas. Isso era pior. Muito pior.
Estávamos em uma praça pública. Uma multidão de pessoas haviam se reunido para observar o espetáculo a frente.
Cercados por essas pessoas estavam um homem e um mulher.
A mulher sangrando, estava amarrada em uma espécie de poste no centro na rua. Sangue descia pela sua perna e ela parecia cansada e abatida.
- Vocês vêem isso? Uma herdeira entre nós!
O homem rugiu, chamando a atenção da multidão.
As pessoas murmuram entre si enquanto observavam a cena.
O homem era esquelético e alto, sua roupa parecia ser a de algum oficial. Um símbolo de um urso sob um fundo roxo podia ser visto no seu peito esquerdo. Ele estava em pé e rígido como se mantendo a postura pudesse de alguma forma parecer mais imponente.
Sua aparência fazia um contraste gritante com a da mulher magra com o cabelo desgrenhado. Suas roupas eram tão puídas que parecia que podiam ser desfeitas com a menor brisa. Ela ainda sangrava. Com certeza o homem a puxou de onde ela estava e a trouxe diretamente pra cá.
Que nojo.
Ele se virou para a população.
- Eu me pergunto - ele rugiu - como ela pode estar entre vocês e ninguém ter notado!
Ele balançou a cabeça para si mesmo como se estivesse decepcionado.
- Quando fui mandado para essa cidade, todos os meus companheiros soldados sentiram pena de mim, Tervas é uma cidade amaldiçoada, eles disseram, mas vocês sabem o que eu respondi? - ele se virou para a multidão e fez um gesto grandioso com a mão - Que eles estavam errados! Por que eu senti o potencial aqui. Não vi bêbados, prostitutas e famintos. Vi cidadãos de Canor!
Ele apontou para a mulher.
- Mais isso! Isso me decepciona! Nosso reino está em guerra! Cada um desses seres poderia ser usado para o nosso bem! - ele falou com tanta força que as veias do seu pescoço se destacaram, sobressalentes - Enquanto as pessoas estão morrendo na linha de frente, ela escapa e se esconde entre nós como um rato! E de alguma forma ninguém a viu?
Ele pareceu se acalmar, sua expressão quase de dor.
- Como oficial escolhido para tomar conta dessa cidade, por mais que eu queira, não posso deixar isso sair impune - ele colocou a mão no peito como se o que ele estivesse prestes a fazer o causasse profunda dor - Eu vou ter que aumentar as taxas dessa cidade, para que isso não se repita...
A multidão começou a xingar. Revoltados, homens e mulheres começaram a gritar, um falando mais alto que o outro. As mais diversas queixas podiam ser ouvidas.
- Morreremos de fome!
- Os impostos já estão muito altos!
- Como vamos viver assim?
- Se quiserem culpar alguém - o homem ergueu ainda mais a voz e apontou para a mulher no poste - culpem ela! Foi ela que fez isso com vocês. Egoístamente se escondendo enquanto poderia estar lutando! Se os herdeiros estivessem fazendo sua única função vencendo a guerra vocês não estariam nessa posição! Ela fez isso com vocês!
A multidão ainda estava em alvoroço. Muitos gritos começaram a se voltar contra a mulher. Não havia mais nenhum olhar de simpatia.
- Egoísta!
- Como pôde fazer isso?
Alguém jogou uma pedra, acertando as costas da mulher que gemeu fracamente em resposta.
Assisti a tudo horrorizada. Parecia feio demais para se olhar, mas de alguma forma não consegui desviar os olhos.
Um movimento perto de mim chamou minha atenção.
- Mamãe! - a menina gritou, começando a correr em direção a mulher.
O menino a pegou bem a tempo. Colocando a mão sobre sua boca e a puxou para trás.
- É tarde demais agora - seus olhos tinham lágrimas não derramadas.
Mas o pior de tudo foi a aceitação em sua voz.
Olhei em volta. Com os gritos da multidão a voz da menina não foi ouvida, mas todo cuidado é pouco.
Olhei a mulher a frente.
Isso não poderia continuar assim. Isso...
Dei um passo a frente. Apenas para sentir uma mão no meu ombro.
- O que você está fazendo? - o homem perguntou, a voz exasperada.
- Alguém tem que ajudá-la.
- E você vai fazer isso indo até lá? - ele me olhou incrédulo.
Na verdade eu não tinha um plano. Mas sabia com certeza que se não fizesse nada, essa mulher ia morrer ali, na frente de seus filhos. E ninguém a não ser eles iriam lamentar a sua morte.
- Não posso simplesmente deixá-la.
Ele inclinou a cabeça em direção a cena.
- Isso é um lugar de punição para herdeiros que desobedecem, o garoto provavelmente já sabia o que aconteceria se ela fosse pega. Por isso nos trouxe aqui. Não há o que fazer.
Mas mesmo assim...
- Não podemos simplesmente deixá-la lá.
Ele me olhou nos olhos.
- Por que?
Pisquei. Por que?
- Como assim?
- Por que você defenderia uma herdeira? - ele estreitou os olhos para mim - ao menos que você seja uma?
Tudo parou para mim por um momento. Não ouvi mais as pessoas. Não senti mais raiva ou indignação. Só sobrou uma coisa.
Medo.
Puro e simples medo.
Com todas as pessoas ali. Se ele me entregasse...
Não seria mais uma mulher que eu não conheço presa sendo odiada e xingada por todos.
Seria eu.
Engoli em seco. As pernas de repente fracas.
- Eu... O que? - eu estava abalada demais para controlar minha expressão facial agora.
Ele só precisaria gritar e chamar a atenção do oficial. E estaria tudo acabado.
Sem missão. Sem luta. Sem respostas.
Mas quando ele abriu a boca o que saiu foi diferente do que eu pensei.
- Eu sabia - sussurrou o homem.
Ele suspirou e massageou a testa como se estivesse com dor.
- Por que isso sempre acontece comigo? - ele pareceu estar mais resmungando consigo mesmo.
Engoli em seco, ainda com medo.
- Escuta - ele olhou para mim - eu tenho um plano. Você estaria disposta a ouvir?
Assenti, ainda sem saber o que sentir ou dizer. Meu coração batia freneticamente.
Ele se aproximou do meu rosto e sussurrou no meu ouvido.
Cheirava a canela... Meu cérebro ainda nublado pelo choque reconheceu.
Quando ele por fim se afastou e me olhou em busca de confirmação quase desejei não ter ouvido.
Ele era louco.
E eu era ainda mais pra estar se quer considerando isso.
Mas eu assenti mesmo assim.
Ele sorriu. E de alguma forma pareceu familiar.
Ele olhou para as crianças, ainda alheias a nossa conversa, assistindo a cena de terror que se desenrolava na frente deles.
Ele se aproximou delas.
- Espere! - peguei seu braço.
Ele me olhou interrogativamente.
- Qual é seu nome?
Ele piscou surpreso.
- É Darius.
Foi tudo o que eu precisava de confirmação.
Esse era o irmão de Lianof.
*****
Só havia duas coisas que eu sabia nesse momento.
A primeira, eu provavelmente estava louca.
A segunda, eu era uma louca determinada.
A cena ainda se desenrolava na minha frente. O homem agora, já satisfeito com o que tinha falado, desenrolou um chicote da cintura em direção ao chão.
O desgraçado ia chicoteá-la.
A mulher já estava ferida. Ela não ia sobreviver a mais nenhum dano.
Se eu não fizesse nada, não haveria como essa situação terminar de outro jeito.
Talvez ser uma louca determinada não seja ruim afinal.
Darius havia ido embora e levado as crianças com ele. Isso fazia parte do plano.
Um plano, dois loucos e duas crianças esfarrapadas.
Um plano rápido, impensado e estúpido.
O único plano.
Ótimo.
Olhei em volta. Quando ele ia começar isso?
O homem ergueu o chicote.
Se ele não fizesse isso agora não daria tempo.
Antes que o homem abaixasse a arma aconteceu.
O estouro ecoou pelo ar e fez as pessoas que assistiam a cena pularem. Logo depois veio a fumaça.
Como Darius reproduziu esses sons eu não fazia ideia, não havia tempo para perguntas.
- É um ataque - uma voz familiar rugiu.
- Fujam - uma voz mais jovem e feminina a seguiu.
Era a minha deixa.
Conforme a voz sumia uma pessoa repetiu para a outra, a informação passou a ser ecoada pelos presentes e logo todas as pessoas estavam fugindo e gritando.
- Estamos sendo atacados!
- É Ikar, eles vieram!
Esse foi o plano de Darius.
Era impossível salvar a mulher enquanto ela estava cercada por pessoas. Com todos os olhos nela, qualquer tentativa de resgatá-la estava fadada ao fracasso.
Mas se houvesse uma distração...
Era aí que entravam Darius e as crianças.
Não teria funcionado em outro local.
Mas esta era Tervas. A cidade assombrada por uma guerra que poderia acontecer a qualquer comento. As pessoas estavam tensas. Estavam assustadas.
E Darius não teve escrúpulos para se aproveitar dessa tensão.
Só havia um resultado possível.
Caos.
Pessoas correram e gritaram em todas as direções. O oficial tentou conter o caos. Outros soldados, que eu não havia notado entre as pessoas foram contra o fluxo da multidão desesperada, lutando por cada centímetro para não serem empurrados para trás enquanto se moviam em direção ao som.
Ninguém ia prestar a atenção em uma herdeira amarrada e fraca.
Ninguém a não ser eu.
Me aproximei rapidamente em direção ao poste. A mulher estava amarrada com cordas. Um colar de ferro estava fechado em torno do seu pescoço. Provavelmente ferro astral, que enfraquecia qualquer herdeiro.
Não havia porque prendê-la com algemas. Com isso envolta do pescoço dela provavelmente as cordas também não eram necessárias.
Puxei a adaga do meu quadril e cortei as amarras o mais rápido possível.
Cada segundo era precioso.
Não demoraria muito para perceberam que não havia ataque.
Arranquei uma das cordas e estava prestes a seguir para outra quando um som chamou minha atenção.
Ou a falta de um som. Uma voz que até então gritava que ficou subitamente em silêncio.
Ergui meus olhos.
O oficial me encarava fixamente, os olhos surpresos a menos de um metro de distância de mim.
Não havia tempo para pensar.
Me movi em direção a ele, adaga preparada.
Ele foi mais rápido.
O chicote que ainda estava em sua mão foi brandido em direção ao meu pescoço numa velocidade cortante.
Ergui minha mão esquerda em reflexo.
A corda se enrolou no meu pulso. A dor queimante me fez gritar. Mas eu não parei.
Eu me senti invencível por um momento. Poderosa. Não havia mais medo, hesitação ou planejamento.
Era só eu e ele.
Só haveria um vencedor.
O homem soltou o chicote, prestes a puxar a espada da bainha em sua cintura.
Eu não deixei.
Movi minha mão com a adaga em direção ao seu coração.
Ele se moveu para parar meu movimento, desistindo da espada.
Senti sua mão se envolver em torno do meu pulso direito e torcer, gemi de dor, ouvindo o som da adaga caindo no chão.
Mas não havia tempo para pausa. Aproveitando o impulso puxei minha cabeça para trás num movimento subito e a abaixei em direção ao seu nariz.
Ele grunhiu. Ouvi o som nauseante de algo quebrando e vi o sangue escorrer pelo rosto do homem.
Ele levou a mão direita ao nariz em reflexo, mas ainda não soltou meu pulso com a outra.
Mas eu não tinha só uma mão.
Puxei minha outra adaga com minha mão esquerda ainda ferida do chicote e não hesitei. Com um movimento rápido e decisivo, a abaixei em direção ao seu coração com toda a força.
Ele olhou para mim chocado por um momento, antes de cambalear para trás, soltando minha mão presa, a adaga ainda enterrada no peito. Ele olhou para baixo, ainda incrédulo, antes de cair frouxo no chão, sem vida.
Eu o havia matado.
Cambaleando, me movi trêmula, o coração acelerado.
Eu matei um homem.
Não havia tempo para pensar. A maioria das pessoas já havia saído e nossa luta tinha chamado a atenção de mais de um par de olhos.
Peguei a adaga no chão e me movi para a mulher.
Ele me encarou, trêmula.
Levantei o braço e cortei o resto de suas amarras. Ela cambaleou antes de cair em direção ao chão.
O ferro astral.
Olhei a estranha coleira em volta do seu pescoço.
Não havia tempo nem meios para tirá-la. Guardei a adaga rapidamente na minha cintura.
- Quem é você? - a mulher sussurrou.
- Uma idiota a quem o seu filho pediu ajuda.
Coloquei o braço da mulher em volta do meu pescoço e a movi em direção ao beco mais próximo. Era crepúsculo. Já havia escurecido o bastante para que o lugar parecesse ameaçador e sombrio.
Me movi para lá. A escuridão do beco me rodeou, mas continuei andando.
Ouvi sons atrás de mim.
Dois guardas se moviam em minha direção.
Apressei o passo. O beco terminava em uma encruzilhada. Me movi para a direita. Segui por um momento e a rua se dividiu em mais dois lugares, depois três. Era um labirinto. Eu não conhecia essa cidade, não sabia para onde ir.
Ouvi os sons de perseguição se aproximarem. Com o peso da mulher me puxando pra baixo, não consegui ser rápida o bastante.
- Aqui! - a voz de um garoto chamou de uma esquina.
Me movi para lá.
- Dovan! - a mulher exclamou, rouca.
O menino lançou um olhar preocupado para ela. Os sons de perseguição se aproximavam.
Não daria para nós três escaparmos.
Não com a mulher ferida nos atrasando.
- Aqui - empurrei a mulher para o garoto.
Ele me olhou atordoado. Cambaleando com o peso extra da mãe.
Sorri pra ele.
- Proteja sua mãe.
Ele abriu a boca para responder, mas eu não esperei mais.
Me movi em direção aos sons de perseguição.
E dei de cara com os guardas. Eles pararam. Obviamente reparando na minha aparência desgrenhada e o sangue em mim.
Já tive dias melhores
- Ei - gritou um deles.
Corri, indo em toda a velocidade na direção contrária a que o menino e a mãe estavam.
- Pare! - um dos guardas rugiu.
Ouvi o som de perseguição e apenas corri mais rápido.
Entrei em um uma rua estreita e estava correndo em alta velocidade quando senti uma mão me puxar em direção a um beco. Era apenas o espaço entre duas casas. Tão pequeno que eu não havia notado.
Uma mão cobriu minha boca e um corpo me empurrou em direção a parece.
Nesse momento a escuridão já havia caído o suficiente para que eu não pudesse identificar o rosto.
Lutei com todas as forças. Até que ouvi uma voz sussurrar no meu ouvido, quase um ronronar próxima o bastante para fazer cócegas.
- Não sei porque, mas não estou nem um pouco surpreso.
Eu conhecia essa voz.
Ouvi o som dos guardas, eles passaram direto por nós, seguindo reto antes de virarem na próxima esquina.
Respirei aliviada, sentindo a mão cair do meu rosto.
- Então Ana, que tal me contar uma história?
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NOTA DA AURORA: É sempre interessante observar os travessões que eu coloco cuidadosamente no texto virarem hífens.
Meus dedos doeeemmmmm.
O que acharam do capítulo? Gostaram?
De quem era a voz?
Como vocês acham que o irmão de Lianof foi parar aí?
Gostaram da foto dele? Nunca acho ninguém que pareça com o Lianof da minha mente aff
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