Capítulo 52: De cabelo em pé
Frustrados, sedentos, famintos e abatidos. Os corpos, desprovidos da carga de energia que a excitação que uma batalha causava, se tornaram vítimas fáceis para a fadiga física que começava a assombrá-los. A alegria de uma inesperada noite bem dormida foi substituída pelo mau-humor e desânimo. Os pés seguiam arrastados, os ombros caídos e as costas curvas. A duvidosa possível refeição havia sido abandonada há pouco tempo, seja lá o que pouco tempo em uma situação como aquela significava.
A paisagem densa que escondia os céus foi substituída por um espaçamento maior entre a vegetação e um chão de pisar diferente. As árvores apresentavam seus troncos mais curtos, recurvados e tortos, seus galhos menos preenchidos. Apesar do fácil acesso a luz externa, o céu visto ali era carregado de nuvens pesadas e escuras, trazendo uma sensação sombria e agourenta da meia luz. A inclinação ascendente que haviam enfrentado antes já se mantinha estável há algum tempo. O silêncio na paisagem ao redor voltava a perturbá-los, fazendo os pessimistas pensamentos em suas cabeças altos demais. Já haviam passado dois dias da morte de Luna. Onde estava a torre? Chegariam a tempo? Estavam perdidos? O que mais enfrentariam? Ai, que fome.
Artus notou que, à frente, a partir de determinado ponto, um espaço em arco apresentava-se livre de sombras. A luz ao fim do túnel de vegetação rubra lhe estimulou os pensamentos.
— Creio que a floresta termine mais adiante — supôs.
Cabeças pendidas em desânimo se levantaram confusas. Camus enrugou a face.
— Impossível. Ainda não alcançamos a Torre de Ignis.
— Fizemos o caminho errado? — ponderou Iarima. Pirita pôs-se de pé nos ombros de Dário em um zumbido curto e agudo.
— Não. Seguimos o poente, continuamos seguindo o poente. O caminho está certo. — O mago cruzou os braços sentindo o rosto esquentar.
— Quem garante que este sol é o mesmo que conhecemos? Nem a água é normal por aqui, meus prezados.
— Artus, por que diz isso? — quis saber Dário que não via diferença na paisagem.
— É uma conjectura, já que não há árvores mais a frente. Há outras probabilidades, de fato. Podemos estar chegando ao topo de uma montanha descoberta ou nos aproximando de uma clareira.
— E de todas as opções você escolheu a que a floresta acaba? — Edriên estreitou os olhos.
— Considerei esta a mais animadora.
Diferentes sons de descontentamento ecoaram em resposta. Apesar das reações, a novidade estimulou-os a acelerar as passadas. O solo abaixo de seus pés pareceu mais húmido e o cheiro cítrico da floresta desapareceu dando lugar ao cheiro de mofo e azedo. Os arbustos sumiram e as folhagens exibiam-se menos vibrantes. Quando alcançaram o local antecipado pelo elfo, os cinco aventureiros pararam lado a lado. Pirita levantou voo de forma tão silenciosa quanto todos os colegas ao redor. Era muito para absorver. Todas as suposições de Artus mostraram-se corretas, mas não exatamente.
O terreno diante deles seguia em um declive mediano. O que conheceram como floresta até ali, deixava de existir. Nada de imponentes árvores de frondosas copas vermelhas, tufos de vegetação rubi ou um chão recoberto de folhas. A área era aberta e adornada de poucas e sombrias árvores. Poças escuras recobriam a maior parte da extensão do enorme terreno, fazendo o solo cor de vinho exibir-se em um emaranhado confuso de finas trilhas desenhadas sobre o líquido bizarro. A paisagem inesperada, porém, não se comparava com o que se mostrava após ela:
Uma enorme construção de pedra flutuava saudando as faces boquiabertas. Sua aparência era de um prisma hexagonal cheio de reentrâncias e protuberâncias abrigando incríveis vitrais e grandiosas sacadas. Nas paredes brancas, enormes símbolos parecidos com os vistos no obelisco arcano queimavam em chamas de diferentes cores. Na metade inferior, uma trabalhada escada descia em espiral circundando o absurdo edifício até alcançar o chão. Ignorando qualquer tentativa de lógica, o contato da construção com o solo se dava apenas pela curiosa escada que claramente não tinha estrutura para sustentar um prédio daquele tamanho no ar. Completando a descabida visão, hastes como facas de vidro elevavam-se em cada vértice do topo do prédio e entre elas, chamas que queimavam em diferentes cores. Os tons exibidos refletiam as variadas e enormes runas de sua fachada.
— A Torre de Ignis — suspirou Camus.
Artus precisou conter uma lágrima. Dário inspirou profundamente e os lábios de Iarima curvaram para cima, enquanto suas sobrancelhas faziam a curva contrária. Quando assimilou a informação, Edriên apertou os punhos ao lado dos ombros e se agachou em celebração:
— Aeeeeeeê!
A espontaneidade da mini dama relaxou os demais que se permitiram sorrir mais abertamente. Até o zumbido de Pirita soou entrecortado, como uma gargalhada wisp, ou o que quer que fosse aquilo. A alegria coletiva elevou os espíritos.
Infelizmente, a comemoração de Dário e Artus não durou muito. O que seus ouvidos captaram logo lhes travou o semblante e enrijeceu os corpos. Para Artus, o que ouviu era o som de um grande animal enfurecido há certa distância dali. Para Dário, era o rugir que assombrava seus pesadelos.
A fera ecoou ao longe, mas soou familiar o suficiente para fazer todo o couro cabeludo do druida arrepiar-se de uma só vez.
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