Capítulo dois
— AAAAAAH! — Rebeca deu um grito assustador que, logo em seguida, foi abafado com a mão que largou o seu ombro e pousou sobre os seus lábios, impedindo a continuação de seu grito.
— Rebeca, cala essa boca, você vai acabar acordando a vovó e o Lucas, se é que eles já não acordaram com esse escândalo todo. — bradou Guto, impaciente. O garoto parecia extremamente zangado com toda a situação. Quando certificou-se de que a irmã estava mais calma, retirou a mão de seus lábios e continuou o sermão. — O que é que você faz acordada a uma hora dessas? E, pior, o que faz zanzando pelo quarto? Para onde é que você ia?
Rebeca sentou-se no chão do quarto, com a respiração ofegante. A menina tentava recuperar o ar que faltou após ela ter levado o susto. Depois de um curto tempo, Rebeca finalmente conseguiu se pronunciar, ainda que pausadamente.
— Guto, qual o seu problema? Quer me matar do coração? Eu sou muito nova para morrer e eu me recuso a morrer nessa fazenda, longe da civilização.
— Chega, Rebeca! Eu não estou com tempo para as tuas gracinhas, você já viu que horas são? Já devíamos estar dormindo há muito tempo. Você sabe que nossa avó acorda cedo e, como se não bastasse, também exige que a gente acorde. — o tom de Guto indicava perfeitamente seu estado. — Agora, voltando ao assunto, para onde você estava indo? Ainda não me respondeu. — questionou o garoto, mais uma vez.
— É que... — Rebeca olhou para a porta, pensou um pouco se falaria ou não o que estava acontecendo. Sem mais, resolveu desconversar, não quis preocupar o irmão. — Banheiro... eu estava indo ao banheiro... acho que bebi água demais durante o jantar, precisava fazer xixi.
— Precisava? — indagou Guto.
— Isso mesmo, precisava, porque depois desse susto, eu já não preciso, se é que você me entende. — bradou a caçula dos Malter, em tom de ironia.
— Você não está falando sério, está? Não me diga que... Espera, você não... — Guto parecia confuso em suas palavras. — Rebeca, que nojo, você já não é nenhuma criança, não pode ter feito xixi nas calças, está brincando, não é?
A menina deu uma leve risada, se divertindo com a reação do irmão.
— Claro que eu estou brincando, Guto, você precisava ver sua cara. — afirmou, rindo mais uma vez. — Agora vamos voltar para a cama e tentar dormir. Amanhã temos um dia longo pela frente e eu quero aproveitar eles ao máximo.
Rebeca virou as costas para o irmão e dirigiu-se à sua cama. Guto fez o mesmo, mas, antes de adormecer, fitou os olhos na porta e, em seguida, na irmã, que, de fato, parecia estar tentando dormir. Eu sem íntimo, o garoto estava inquieto, algo lhe incomodava na resposta da irmã.
— Algo me diz que ela está mentindo... o que ela fazia andando pelo quarto tão tarde da noite? — pensou.
Amanheceu na fazenda. Às 06h00, em ponto, já se podia ouvir as batidas de Dona Edwirges na porta do quarto, de um jeito que só os avós sabem fazer.
— Vamos, crianças, está na hora de acordar. O café está pronto e a vovó fez um bolo de cenoura delicioso. — dizia a velha senhora, continuando as batidas na porta. — Deixem de preguiça e vamos levantar, o dia está tão lindo lá fora, para ficarem trancados neste quarto.
Lucas foi o primeiro a se mexer e, olhando para o despertador, reclamou baixinho.
— 06h00? É sério isso? Vovó só pode estar de brincadeira com a gente.
— Você fala isso surpreso, como se fosse algo novo para nós. — comentou Guto, se espreguiçando. — Você sabe que Dona Edwirges sempre foi assim, ao menos desde que eu lembre. Ela sempre acorda antes do galo cantar e não aguenta ver ninguém dormir até tarde, você já devia estar acostumado. — concluiu, dando um longo bocejo.
Também bocejando, Lucas bradou.
— Há um ano, eu achava isso o máximo, mas agora parece pesado demais para mim, meu corpo precisa de mais uns minutinhos. — concluiu, deitando-se com o rosto para baixo, ignorando as batidas na porta, bem como os chamados da avó.
— Que horas são isso, gente? — Rebeca acabara de acordar. Estava bocejando e incomodada com as batidas na porta do quarto. Olhando para o despertador, ela revirou os olhos. — Que diabos de ser humano acorda esse horário? Isso deveria ser proibido por lei.
Lucas e Guto se encararam sorrindo. Sempre se divertiam com os comentários vindos da irmã e, na maioria das vezes, concordavam com ela, aquela era uma dessas vezes. Os três ainda estavam com bastante sono e muita vontade de continuar deitados, contudo, sabiam que isso já não seria possível. Guto, ainda incomodado com o ocorrido da noite passada, resolveu instigar Rebeca.
— Se você não ficasse perambulando pelo quarto, altas horas da noite, não estaria com tanto sono, não é, mocinha?
— Perambulando? — Lucas deu de ombros, pois não estava entendendo nada. — Como assim?
Rebeca, inconformada com o comentário de Guto, deu um leve sorriso e, logo em seguida, resolveu se pronunciar.
— Eu já disse que levantei para beber água e logo depois do susto que você me deu, eu fui deitar, não fiquei perambulando, como você diz.
Guto apenas deu um leve sorriso de retribuição à irmã e, logo em seguida, calou-se. Levantou-se para arrumar sua cama, informando a avó que logo estariam na cozinha. Em sua mente, outro pensamento matutava.
— Bebendo água... Ontem ela havia me falado que estava indo ao banheiro...
Às 06h30, os três irmãos apareceram na sala e, de longe, sentiram o cheiro delicioso do bolo de cenoura e demais gostosuras do café da manhã. Lucas esbanjou um grande sorriso e, não conseguindo se conter, saiu correndo em direção à cozinha. Quando Guto e Rebeca chegaram ao cômodo, Lucas já estava devorando uma grande fatia de bolo, da mesma maneira que devorou a sopa no jantar da noite passada. Dona Edwirges olhou para os outros dois netos que estavam sentando-se à mesa, deu um largo sorriso, lançando um breve comentário em seguida:
— Esse menino não tem mais jeito não. — e olhando para o neto do meio, continuou. — Desde muito pequeno já era guloso assim. — sorriu. — Vocês conseguiram dormir bem esta noite? Eu dormi como um anjo.
— Eu também dormi como um anjo, vovó, estava bastante cansado. — respondeu Lucas, enquanto farelos de bolo escapavam de sua boca. — Bom, pelo menos à noite eu dormi bem, porque às 06h00 eu já estava me acordando. — concluiu, ironicamente.
— Eu consegui dormir bem, vovó. — comentou Guto. — O dia ontem foi muito cansativo e eu realmente precisava de uma boa noite de sono.
— Vovó... — bradou Rebeca. — A senhora chamou por mim durante a noite? Chamou por meu nome?
Dona Edwirges estava ajeitando umas louças na pia, nem precisou virar-se para responder.
— Não, meu amor, não chamei por ninguém. Eu também estava cansada, caí em um sono pesado, mas, por que a pergunta?
— É que ontem à noite, ela quis bancar a turista pela casa, vovó. — ironizou Guto, dando uma grande mordida na fatia de bolo que tinha em mãos.
Rebeca encarou o irmão com indiferença, desaprovando o comentário. Virando-se para a avó, respondeu.
— É que ontem... pouco antes de eu conseguir dormir... ouvi uma voz chamar por meu nome, pedindo que eu fosse até ela... imaginei que tivesse sido a senhora.
Após ouvir as palavras da neta, a velha senhora Edwirges deixou cair de suas mãos um prato de vidro, causando um grande estrondo ao se encontrar com o chão, assustando as outras três pessoas que estavam ali.
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