Magos
Não sabia ao certo quanto tempo havia se passado desde que eu anunciei as mortes de praticamente todo o grupo rebelde. Impassível, congelada, mas de mãos trêmulas.
Eu estava sentada no sofá de meu quarto, com as pernas estendidas nele e as costas apoiadas no braço estofado.
Havia algo se movendo dentro de mim. Algo gélido, escorregadio, como água recém-descongelada. Se espalhava por todo meu corpo, sem pressa, da ponta de meus dedos até o último fio de cabelo.
Foi como se eu tivesse acordado de um sono que durou tempo demais. Não haviam mais lágrimas para chorar, ou perdas para lamentar. Havia apenas a presença latente do poder que meu corpo abrigava.
Não entendia muito bem o que era aquilo, mas eu queria mais. Mais informações, mais verdades, mais força. Não podia ser uma rainha fraca, não mais.
Algo terrível estava vindo, numa onda avassaladora, e como governante, eu precisava estar pronta para a catástrofe.
Mesmo que na verdade, eu não estava pronta nem mesmo pra levantar do sofá.
Eu estava prestes a cochilar quando Sinbad entrou no quarto. Sem bater à porta, sem dizer nada até que estivesse sentado na mesa à minha frente.
Eu ergui as sobrancelhas pra ele, tentando ao menos fingir que algo daquilo me perturbava.
-Temos que terminar aquela conversa.-ele diz, simplesmente.
Me ajeito no sofá, o olhando, ansiosa para ouvir o que tinha a dizer. Aquilo que saísse de sua boca mudaria minha vida para sempre, eu sabia disso.
-Prossiga.-eu falo baixo, olhando-o, sem perder um mínimo detalhe de suas ações.
Ele suspirou, colocou os cotovelos apoiados nos joelhos e uniu suas mãos, as olhando.
-Esse poder dentro de você... Eu já o vi antes.-ele começa a falar.-Existem alguns poucos seres capazes de praticar magia com essa mesma magnitude que você. De onde eu venho, essas pessoas são chamadas de Magi, ou magos.-ele explica, calmamente, agora me olhando.
-Eu sou uma maga?-pergunto, olhando em minhas mãos.
-Acredito que sim.-ele fala, suspirando.-Normalmente, são apenas três magos, equilibrando o mundo, mas quando um deles se distancia de seu objetivo de manter a paz, outros magos aparecem, quantos forem necessários para derrotar o corrompido.-ele fala.-Eu conheci alguns magos durante a minha vida. Incluindo aquele que se tornou mau. Faz bastante tempo, mas eu lembro deles.
-Então, eu sou uma substituta?-pergunto, pensativa e ligeiramente ofendida.
-Não sei ao certo. Eu não conheço nenhum dos magos de agora. Você pode como não pode ser uma dos originais.-ele falou, gesticulando.-Mas o mais importante, Jane, é que você não pode sucumbir ao ódio. Você não pode se deixar corromper. Eu sei que o que aconteceu com Jeremy foi intenso, mas você não deve procurar vingança.-ele diz, pegando minhas mãos.
É a minha vez de suspirar, mas de irritação.
-Você não entende, Sinbad. Você é um rei, sempre teve tudo o que queria, toda a atenção que desejou.-eu disse, olhando para baixo.-Jeremy só tinha a mim. Se eu não sentir a dor de sua perda, se eu não vingá-lo... Ele será esquecido no tempo. Para sempre. Eu não posso deixar isso acontecer.
-Janette, isso não o trará de volta.-falou o rei de Sindria, baixinho.-Ele não será esquecido. Você sempre i terá em mente, assim como os sobreviventes ao ataque, assim como cada cidadão desse reino, mesmo que de maneiras diferentes.-ele aperta minhas mãos geladas com mais força.
-Não é o suficiente.-minha voz sai embargada com essas palavras. Eu respiro fundo e me recomponho.-O que eu devo fazer? Como ativo o meu poder?
-Deve treinar e estudar. Não apenas magia, mas combate corpo a corpo, luta com armas, teoria da magia. Músculos fortes e uma dieta saudável ajudam a magia a fluir, já que ela faz parte de você, como um órgão vital. Se alguém a tirar de você, você perderá parte de sua identidade. -explica Sinbad, seriamente.-Nós, eu e meus subordinados, iremos ajudá-la nesse processo. Nenhum de nós é muito bom em feitiçaria, mas podemos ajudar com os treinos corporais e mentais.
-Obrigada por isso, Sinbad.-eu falo, afagando sua mão.-Não saberia de nada disso se não fosse você.-dou um sorriso triste.
-É isso que amigos fazem.-ele sorri também.-Ajudam.
Meu sorriso aumenta um pouco e eu olho em seus olhos. Ele não desvia o olhar, ficamos nos encarando assim por um tempo.
Seus atraentes olhos dourados procuravam algo em mim, algo que eu não sabia ao certo o que era. Seu toque era tão quente em contraste com a minha pele fria. Éramos perfeitos opostos, era um fato risível.
Ele de cabelos roxos, eu de cabelos dourados. Ele de olhos dourados, eu de olhos violetas. Eu era frio, ele era calor. Ele era dos desertos do leste, eu das florestas do oeste. Ele era homem, eu mulher. Ele era rei e eu, rainha. Éramos sol e lua. Eu não sabia o que falar ou como reagir sobre aquilo.
Depois de algum tempo, alguém bate na porta. Soltamos nossas mãos eu peço Que a pessoa entre.
Ja'far e Spartos entram no quarto. Ja'far me okha nos olhos, algo raro de acontecer.
-Me desculpe, Majestade. Estávamos apenas procurando o Rei Sinbad. Ele tem assuntos a tratar.-disse o subordinado.
-Mas é claro, Ja'far. Me perdoe por tomar tempo tão precioso de vosso rei.-eu me levanto, com um sorriso agradável.-E por favor, me chame de Jane.
Aquele sorriso doía no meu rosto. Era tão forçado, tão ridículo. Ja'far pareceu não notar e se notou, não comentou nada. Agradeci ele por isso.
-Não há problema, Janette.-ele diz, com um pequeno sorriso.
Ele era bonito, mas não me atraía muito. Era uma beleza silenciosa, calma demais, camuflada demais.
Assenti com a cabeça e olhei para Sinbad.
-Obrigada pelas informações, Sinbad. Eu vou cobrar essas aulas.-eu falo, de maneira ligeiramente formal.
-Majestade.-ele diz, fazendo uma reverência. Seus subordinados o imitam e os três deixam meus aposentos.
Deito em minha cama, estranhamente confiante sobre o que viria a seguir.
Eu era uma Maga. Não havia nada que eu não pudesse fazer. Eu era totalmente invencível.
.
O Mago gargalhava, observando o desenrolar dos fatos em sua bola de cristal.
-Você viu, Michaelis?-perguntou ele, limpando as lágrimas dos olhos.
-Vi sim, Mestre.-respondeu seu discípulo, o olhando de soslaio.
-Ela descobriu!-ele diz, ainda rindo com seus dentes brancos e levemente afiados.-Ela descobriu sobre a gente, Michaelis!-ele grita, animado.
-Tecnicamente, ela não sabe quase nada. Apenas que é uma Maga.-disse Michaelis, sendo realista e austero.
-Não importa, meu querido subordinado.-falou o Mestre, ainda com um grande sorriso no rosto.-É só questão de tempo. Ela logo conhecerá a todos os outros Magos da Lua. Ela logo se unirá a mim. Não levará muito tempo até que sejamos um casal.
-Se quer que isso realmente aconteça, Mestre, você terá que falar com ela. Sinbad a impede de seguir os mesmos passos que o senhor. Você sabe disso.-falou Michaelis, com as mãos entrelaçadas.
A caverna escura onde seu mestre morava não lhe dava calafrios já havia um tempo, mas aquela risada... Poderia fazer qualquer um tremer de medo.
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