06 de março
Fiquei sabendo que o Brasil é o 4º país do mundo em número de blogueiros. Isso quer dizer que, mesmo acreditando que essa plataforma está caindo a cada dia – e estou certa – ainda assim é um meio bastante acessado. Tenho certeza que, nesse momento, você faria um comentário sarcástico sobre como havia me dito para tentar desde o começo. E sabe o que mais? Você estaria certo.
Eu pude viver isso na pele quando criei o AGarotaDaCapa.com.br. Quero dizer, quem liga para a privacidade depois que você tem praticamente sua alma dissecada pelas revistas de fofoca? Agora eu sei o que é viver como você, Sean.
Não sei se você sabe, mas quando todas as fotos da praia foram divulgadas, minha vida se transformou completamente. Haviam paparazzi me seguindo em tempo integral, adquiri haters até pessoas que "shippavam" nosso relacionamento. Eu vivia quase um reality show, mas sem ganhar rios de dinheiro.
E fala sério, gente. Que relacionamento?
Eu agi como uma vaca e você fugiu como um garotinho, foi só isso.
O que os outros chamam de relacionamento, eu chamo de ironia do destino. No entanto, uma ironia rentável e valiosa. Finalmente sai do emprego e me poupei de escrever a entrevista. Desde então, o blog tem sido minha principal renda. As pessoas ainda comentam sobre nós, mas isso tem ficado cada dia mais raro.
Mas não foi fácil. No início, eu tive muito medo de largar um trabalho fixo e ainda mais de compartilhar meus textos. Porém, não havia outra escolha certa além dessa. A revista queria que eu lançasse a matéria com todas as informações e só de pensar nessa opção eu me sentia suja – não faria isso com nenhum de nós três, principalmente com Mateo.
Depois, quando comecei a ficar conhecida, achei que tudo se resumia a você, Sean, e o sucesso não era mérito meu – e também não queria acreditar que se tratava somente de sorte. Sim, no fim, você estava certo, é impossível viver acreditando que o futuro se resume a sorte.
E então, passei a receber críticas realmente positivas, algumas pessoas chegaram no site e elas nem sequer sabiam sobre o começo de tudo. Ultimamente, tenho me convencido de que mereço e a sensação de impostora está menor a cada dia. Tenho certeza que você concordaria.
Além do mais, agora que não vou me mudar para a casa de Mateo, posso continuar usufruindo dessa vista que tanto amo.
Em outras palavras, eu estava feliz. Ou pelo menos acreditava nisso até receber essa maldita carta. Eu sei que é sua, mas não faço ideia de seu conteúdo.
E quem raios manda uma carta nos dias de hoje? Ok, eu venho ignorando todos seus telefonemas, mas não achei que chegaríamos no ponto de papel e caneta.
Sabe aquela ansiedade que sentimos quando alguém nos manda um áudio e ainda não apertamos o play? Eu odeio áudios. Às vezes demoro dias até ter coragem de ouvi-los, e normalmente era uma mensagem da faxineira informando que não poderei ir no horário de sempre, mas mesmo assim eu sinto que qualquer tipo de informação terrível pode estar naqueles 30 segundos, e enrolo até não poder mais.
Agora, multiplique essa sensação por mil. É isso aí, é assim que me sinto com a carta.
Faço um chá gelado, tomo um banho e calço minhas pantufas de coelho. Estou enrolando – e sou boa nisso. Além do mais, me sinto encenando um filme, no qual a mocinha se senta na sacada e lê uma declaração de amor de seu namorado, que está na guerra.
Só que você não está na guerra, e a carta não é uma declaração. Talvez, seja um processo por eu ter me aproveitado da situação e criado o "A Garota da Capa". Talvez meu subconsciente tenha me feito evitar todos os telefonemas porque eles eram de um advogado tentando me falir. Talvez, só talvez, eu mereça tudo isso.
As pessoas dizem que o tempo cura tudo, mas há uma sabia citação – obrigada, Nick Jonas – que concordo mais: "O tempo só cura se trabalharmos nisso agora".
E eu não trabalhei, Sean. Eu peguei tudo que aquele final de semana significou, todas as minhas sensações, todas as lembranças e risadas relacionadas a nós dois, e guardei tudo bem fundo. E não olhei nunca mais.
Até agora.
Então, assim que abro o envelope gigantesco e nossas fotos caem, eu sou arrastada muito rápido para aquele buraco que eu mesma cavei. Eu não estava pronta, mas que escolha tive naquele momento?
Você me mandou imagens de sexta e sábado, fotos que eu nem vi você tirando. Nós dois na cozinha, enquanto eu cantava com o detergente de microfone. Meus textos no chão, espalhados, e eu sentada em posição de índio enquanto lia para você. O sol na praia do Guarujá. O pastel! Eu não acredito que você tirou foto do pastel. E mais varias outras, me fazendo lembrar de coisas que já até havia esquecido. Tem até duas fotos que eu tirei de você. Deus, eu não lembrava de nada disso.
Juntei o envelope em meus braços e me permiti sorrir, como uma criança que ganhou a Barbie que tanto queria de natal, e agora não quer nem soltar a embalagem. Vai que tudo isso some?
Mas haviam mais três coisas guardadas. Um cartão postal, com uma imagem de um dos quadros de Monet, "Mulher com Sombrinha" mais especificamente, um segundo envelope menor e um pen drive.
Eu já possuía mil desculpas prontas em minha cabeça, poderia me livrar facilmente de qualquer argumento que você dissesse. Mas, quando comecei a ler, eu não queria mais fugir.
"Lena, como vai?
Eu deveria começar dizendo que foram necessários pelo menos 5 cartões postais para que eu finalmente chegasse a versão final do texto – e, mesmo assim, tenho certeza de que não é a ideal. Aparentemente, sou muito melhor fazendo música.
E é por isso que eu gostaria que você desse uma olhada no pen drive assim que acabar de ler, tudo bem?
Continuo não encontrando nenhum defeito em nós dois, e espero que, com o passar do tempo, você tenha conseguido enxergar alguns pontos positivos. A verdade é que você me parece tão familiar, de uma maneira que eu não consigo explicar direito. Eu não quero que sejamos somente estranhos que viveram dois bons dias.
Eu mudei. Sinto muito por ter te beijado sem permissão e depois fugido daquela maneira.
Gostaria que tivéssemos uma nova chance. Não sei dizer exatamente para que, mas queria que descobríssemos juntos. O que você acha?
A passagem é para hoje, as 22h. As músicas serão lançadas à meia noite, acredito que será melhor se você estiver longe daí. Estarei te esperando na casa de Monet. No entanto, vou entender se você não vier – mas reforço que sou pouco compreensivo, rs.
Peço desculpas, pois sua vida ficará um caos por mais um tempo depois do lançamento. Eu prometo negar tudo, se você não aparecer.
Beijos de sua estátua favorita,
Sean"
O papel foi pitando pelas minhas lágrimas, e eu queria dar uma bronca em mim mesma. Não era uma mensagem que devesse se perder por conta de um olho descontrolado, Elena!
Rasguei a embalagem do segundo envelope sem nem acreditar. Giverny! Ele não só havia se lembrado, como planejou a viagem inteira.
Ah, Sean.
Estava tão ansiosa que não conseguia inserir o dispositivo corretamente em meu computador. Parecia que, a cada vez que eu fazia uma tentativa, o buraco mudava de sentido e eu estava colocando em uma posição completamente absurda.
Precisei me lembrar de parar e respirar antes de conseguir. Quando finalmente acertei, seu conteúdo revelou o novo EP de Sean. O que todos os paparazzi não dariam por essas informações, hã?
Cada música fazia referência a algo que havíamos vivido. Uma delas, por sinal, comentava sobre seu novo recorde, de quatro canções para a mesma pessoa, e eu não pude evitar sorrir. No entanto, a mais importante para mim foi a primeira, denominada "Ela", com pedaços de um poema meu. Como raios você havia conseguido esse texto, eu não tenho ideia. Mas os recortes de minhas palavras eram cantados em português, e eu me senti ainda mais nas nuvens.
As letras não eram 100% reais. Era como você me disse para a entrevista, haviam algumas referências, que somente eu era capaz de entender e isso me fazia sentir ainda mais especial, como se fosse nosso segredo.
De repente, eu estava ali, em um taxi rumo à Guarulhos. Eu não sabia o que seria dali para a frente. E quer saber a melhor parte? Por mim, tudo bem. Eu também havia mudado. O futuro nós poderíamos descobrir juntos.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro