ALICE

       Depois que se afasta de Victor, Alice tenta recompor-se, pois o contato tão próximo a ele havia mexido muito com ela. Mal consegue prestar atenção ao que Margarida fala, mas precisa realmente fazer algo que tinha planejado, então diz que vai acompanhar a mulher até a farmácia.

Chegando lá, Alice encontra alguns itens do que quer e escolhe uma cor. Como ela vai voltar ao Rio, não quer correr o risco de alguém reconhecê-la, então decide mudar a cor do cabelo. Opta por uma bem escura, pois como seu cabelo é loiro, a tinta vai acabar desbotando e clareando novamente com os dias, então precisa ser algo que realmente faça a diferença.

Quando retornam à casa, Alice pede para Margarida ajudá-la com o tingimento. Como todos haviam saído com as meninas para a pracinha, até Victor e Jonas, elas teriam mais privacidade para a transformação, Alice queria fazer uma surpresa.

Algum tempo depois, ela está no banheiro de Margarida usando o secador para dar uma finalizada no seu cabelo. Quando termina, fica alguns segundos olhando para o espelho. Ela está muito diferente, mas fica satisfeita com essa mudança, agora é uma nova Alice. Ou melhor, é Clara.

        Sorri para sua imagem e nota que o cabelo escuro realça o verde dos seus olhos, que se destacam mais agora. Respira fundo e sai do banheiro em direção à sala, onde já ouve as vozes de Victor e Jonas. Quando ela é vista, os amigos ficam olhando para ela com a boca aberta.

— Oi... — ela diz com um sorriso tímido.

— Porra, PARA TUDO! Gata, tu sabe que já era linda antes, mas agora? Puta que pariu! Me amarro numa morena! Aí, perdeu, Victão! — Jonas diz.

Alice ri e quando olha para Victor, ele está olhando para ela com um olhar maravilhado, ainda de boca aberta e um leve sorriso começa a surgir.

— Ficou muito gata. — ele diz.

Alice da um sorriso derretido para ele e Jonas começa a cantarolar, batucando:

— Segura a onda, vai ter que segurar!

— Achei que seria uma boa ideia pra me disfarçar um pouco. — ela diz, num tom de voz baixo.

— Demorô, isso aí! — Jonas diz.

— Bom, vou até a cozinha ver se a Margarida precisa de ajuda. — diz Alice, saindo da sala.

Quando vai entrando na cozinha, da uma olhada para a sala e encontra Victor colocando uma almofada na cara e Jonas rindo. Ela da um sorriso discreto e passa a ajudar Margarida.

Eles haviam resolvido voltar ao Rio de Janeiro depois do almoço, as cidades ficam próximas, são poucas horas de viagem. Dessa forma, algum tempo depois, após as despedidas, seguem caminho de volta para casa.

Como era feriado, Alice não conseguiria resolver a questão do dinheiro ainda hoje, então ficaria na casa de Jonas, já que ele morava sozinho, até poder partir com Victor novamente.

— Tá ansiosa pra conhecer o Vidigal, Alice? — Jonas pergunta.

— Clara, Jonas. Sou Clara, agora. — ela diz.

Eles seguem animados, apesar da tensão de toda a situação, Alice notava que Victor estava mais descontraído. Ela não conseguia imaginar tamanha aflição pelo que ele estava passando e ficava feliz em tentar ajudá-lo, esperava conseguir.

Algumas horas depois, eles chegavam ao Vidigal e Jonas subiu por algumas ruelas, Alice observando tudo com curiosidade. Via crianças sozinhas brincando, meninos jogando bola, pessoas andando pelas calçadas e homens bebendo em botecos. As pessoas estão tranquilas, nem parece que passam por tantas situações difíceis.

— Te deixo em casa agora, brother? — Jonas pergunta para Victor.

— Não, vou ficar um tempo na tua casa. — ele responde.

— Sabia! — Jonas comenta com uma risada.

— Sifudê, porra! — Alice consegue ouvir Victor dizer baixinho e eles acabam rindo.

Finalmente, eles param em frente a uma casa simples e Jonas sai do carro, seguidos por Victor e Alice. Jonas abre a porta e diz:

— Princesinha do asfalto, bem-vinda ao meu humilde barraco.

Alice da um sorriso e agradece, entrando no local. O lugar era simples, mas não chegava a ser um barraco, ele estava brincando.

— Pode ficar com meu quarto que durmo aqui na sala. — diz Jonas.

— Não precisa, Jonas, eu durmo aqui.

— Pô, Ali...Clara, pode ficar lá, tanquilo! Deixa o Victor saber que tu vai dormir na minha cama. — ele diz rindo.

— Mas tu é muito filho da puta mermo, né? Fala essas porras na frente dela, cara! — Victor diz, tentando dar um chute no amigo, não conseguindo segurar um sorriso.

— Ela sabe que to zuando, né Clara? — Jonas pergunta para ela, dando uma piscadinha — mas que tu vai ficar bolado,  isso tu vai!

Victor consegue chutar a canela do amigo, que diz:

— Ai, filho da puta!

Alice apenas ri dos dois, eles sempre conseguem fazê-la esquecer dos problemas. Victor olha para ela, da um sorriso e ficam presos no olhar um do outro por um tempo, até que ela levanta dizendo que precisa ir ao banheiro. É quase noite e Jonas diz:

— Pô, tá me dando fome, vou pegar um podrão na esquina. Trago pra tu também, Clara.

— Será que não posso ir junto? — ela pergunta.

— Não, melhor tu não ficar circulando por aqui. — Victor diz.

— Você acha que tem perigo? Ninguém me conhece... — Alice insiste.

— O Victor não quer a rapaziada de olho em tu, gata. — Jonas comenta rindo — mas a galera é meio olho grande mermo, aguenta aí que vou lá, é rápido. Se comportem aí, hein crianças!

Quando ele sai, Alice fica sozinha com Victor e um clima começa a dominar o ambiente, que ela corta, puxando um assunto:

— Amanhã de manhã, eu passo na agência com o Jonas. Caso não dê certo, dou um jeito de passar em casa, a Lourdes vai me ajudar, se eu precisar. Pego mais joias e consigo o dinheiro.

— Muito arriscado pra tu Alice... — Victor começa a dizer — desculpa, é difícil se acostumar a te chamar de Clara. — completa, com um sorriso — acho teu nome tão bonito... tu é toda linda.

Quando ele diz isso, o coração de Alice da um pulo e ela da um leve sorriso. Ela está sentada no sofá e ele numa cadeira à frente, com os cotovelos apoiados na perna, tronco inclinado para frente. Victor continua olhando para ela e a vontade de beijá-lo é insuportável, até que Jonas chega com os lanches.

— Não é o banquete da tua mansão, mas da pra matar a fome. — ele diz, entregando um pão enorme para Alice com várias coisas que ela nem consegue identificar direito.

— Tá otimo, Jonas, obrigada. — ela agradece com um sorriso.

       — Como tu não é uma morena de olhos verdes, vai ter que ir buscar o teu, mané. — diz Jonas para Victor.

Quando termina de comer, Jonas diz que vai tomar banho e depois deitar, pois está cansado. Eles não haviam dormido direito na noite anterior, pois tiveram que voltar para Juiz de Fora e passaram praticamente dois dias inteiros viajando, precisavam mesmo descansar.

       Victor acaba levantando para ir embora, mas parece relutante para sair. Passa a mão no cabelo, espreguiça-se levantando os braços, deixando Alice ver um pouco do seu abdôme, por subir sua camisa e ela não consegue desviar o olhar.

      — Vou indo, então. — ele diz — toma cuidado amanhã, tá? Se precisar de mim, é só chamar.

      — Ta... — ela responde.

      — Amanhã eu passo aqui... a gente se vê.

       — Tá bom.

        — Tchau...

        — Tchau...

     Alice não é capaz de levantar para abraçá-lo, pois não confia na sua capacidade de resistência e depois de ele ter rejeitado seu beijo, ela não teria mais coragem de tentar novamente. Ele também não se aproxima e acaba saindo da casa de Jonas com um último aceno.

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