Coroação
Olhei para a pessoa a minha frente, não podia ser eu. Os cabelos loiros estavam meticulosamente trançados em um coque maravilhoso. E o vestido azul escuro, junto as jóias reluzia, fazendo os olhos violetas parecerem azulados. Meu cabelos, meu vestido, meus olhos.
-Está linda, como uma rainha deve ser. -disse Leila, se posicionando atrás de mim e colocando as mãos nos meus ombros e sorrindo, parecendo orgulhosa de seu trabalho.
Ela usava um vestido verde claro e brincos com esmeraldas, que ressaltavam sua pele bronzeada. Além de saltos finos, prateados e um batom vermelho vibrante. Estava muito bonita, como sempre fora, com seus cabelos castanho-claros encaracolados em um rabo de cavalo alto e bem feito.
-E você como Dama Real.-eu disse, a olhando através do reflexo do espelho, esperando por sua reação.
-Não pode ser sério. -ela estreitou os olhos, apesar de reprimir um sorriso.
-Mas é.- respondi, me virando para ela e a encarando, antes de segurar sua mão. -Quero você ao meu lado. Estamos juntas nessa.
Ela sorriu e me abraçou. Assim que Leila me soltou, Stefan, um dos mordomos reais que estava acostumado a me servir, bateu na porta, parecendo ansioso com toda aquela situação.
-Alteza, está na hora. -disse ele, com a voz abafada pela porta de mogno.
-Obrigada Stefan. -eu falei, abrindo a porta e puxando Leila pela mão.-Venha logo.
€€€
Respirei fundo. Me olhei uma última vez na parede do corredor, que tinha mármore tão polido que era possível ver o próprio reflexo nele. Continuei me observando, procurando falhas. Se eu não as encontrasse, certamente alguém iria encontrar por mim.
Não tendo visto nenhuma, olhei para frente, para as portas fechadas. Conseguia ouvir a movimentação que vinha de dentro. Tentei respirar até que finalmente anunciaram minha entrada.
-A Princesa dos Estados Unidos Sulistas da América, Janette Castellian. -anunciou uma voz grossa, vindo do outro lado das pesadas portas de ouro maciço.
Ao se abrirem, respirei fundo e entrei na Sala do Trono, parecendo prestes a ter um ataque do coração. Todos os súditos (que importavam para o rei e a rainha) estavam lá. Fui devagarinho como se estivesse para me casar, analisando aqueles que estavam em pé, entre as fileiras de cadeiras da Candelária, me observando entrar.
Procurei pelo homem que amava, inutilmente. É claro que minha mãe nunca o deixaria sequer pisar no castelo, mas ainda havia uma boba esperança florescendo no meu coração. Sei que deveria estar me vendo, de algum lugar.
Todos sorriam para mim e alguns acenavam com a cabeça, como se fossem meus amigos de infância, com largos sorrisos e roupas super caras. O problema era que eu não tinha amigos de infância.
O Bispo estava à minha frente e atrás dele, havia o familiar trono de prata e pérolas, com estofado de couro azul em que normalmente meu pai estava sentado. Ele agora se encontrava vazio, clamando por mim.
-Tragam a coroa!-a voz dele se espalhou pela sala, fazendo meu coração tremer enquanto eu segurava minhas mãos suadas à frente do corpo, tentando não mostrar o quão nervosa estava.
Um casalzinho de crianças, um menino negro de olhos verdes e uma menina branca de olhos castanhos, entrou na sala do trono, timidamente. Os dois seguravam juntos uma almofada de veludo grande, cada um de um lado, sorrindo.
Nela, uma coroa de prata com diamantes por toda sua extensão, resplandecia sob a luz do por do sol que vazava pelos vitrais coloridos na parede atrás do trono. Pareciam estrelas caídas do céu e reorganizadas em forma de coroa, de tão brilhante.
Quanto mais perto ela chegava, mais nervosa eu ficava. Seria mesmo? Eu realmente não estava sonhando? Eu teria que governar? Minhas cicatrizes cobertas por maquiagem começaram a coçar. Alguma coisa não estava certa naquilo tudo... Havia algo me pinicando, como uma etiqueta fora do lugar.
Eu me aproximei do altar e me virei para o público, assistindo os dois pirralhinhos fofos andando até mim com sorrisos encantados.
Minha mãe sorria, lacrimejando. Parecia estar orgulhosa da filhinha amada. Nem parecia aquela mulher de ontem, ou da semana passada, ou aquela que foi a minha vinda inteira. Quase parecia uma progenitora normal.
Seus cabelos loiros escondiam os fios grisalhos e a coroa de ouro brilhava em sua cabeça. Sua postura era de uma verdadeira rainha e seu vestido dourado mostrava todo seu poder.
Eleonora realmente uma víbora. Eu sabia que por dentro, ela estava louca para me empurrar da sacada da torre mais alta do castelo e até hoje, não sei porque ainda não o fez. Talvez por saber que eu a levaria junto, se ela tentasse.
Meu pai, ao seu lado, reluzia felicidade. Sobre seus cabelos (em sua maioria grisalhos), uma coroa de prata com pérolas pairava levemente. Ele emanava realeza e honra. Meu pai sim, era um verdadeiro rei, sábio e humilde, tentando fazer o seu máximo, mesmo que o país ainda conseguisse ter muitos problemas.
Já meus irmãos, estavam sentados logo após os dois, mais perto das paredes. Joseph, o mais velho, estava sentado em seu assento especial de príncipe com uma mulher qualquer no colo, nela sua coroa de prata se encontrava e ambos riam à toa, completamente bêbados. Ao lado de sua prostituta, estava a mulher com quem ele era casado, com vontade de cavar um buraco no chão, enquanto analisava uma mecha de seu cabelo escuro, totalmente humilhada. Minha vontade era de puxar meu irmão dali pela orelha e deixá-lo amarrado perto de uma fogueira, para ver se o álcool no sangue o fazia ter uma combustão instantânea.
Jullian, perto deles, estava completamente tenso, com a sua coroa pendendo um pouco para a esquerda. Ele tinha apenas dezoito anos, mas muitas responsabilidades caíam sobre ele. E, sinceramente, se eu pudesse mudar o destino de alguém ali, seria o dele. Ele era gentil e cavalheiro com todos, todas as damas da corte caíam aos seus pés, por ser extremamente belo e parecido com nosso pai, de cabelos negros e olhos castanhos escuros. Eu dei um sorriso confiante e ele se endireitou, provavelmente se sentindo melhor.
Voltei meus olhos para frente eas criancinhas já haviam chegado até o Papa, que segurava minha coroa sobre minha cabeça, ainda que esta não encostasse em meus fios loiros.
Ele proferia as palavras sagradas, enquanto todos os assistiam em silêncio. A proximidade da coroa me dava uma sensação fria. Com ela, meu destino estava selado. De súbito, aquele vestido apertado começou a coçar. Eu queria muito sair correndo e não sabia ao certo quais eram as forças que me mantinham em pé, de frente para o bispo.
-Assim declaro, pelo poder investido não só em mim, mas como em todos vocês, cidadãos sagrados deste país, Janette Castelliano Dos Estados Unidos Sulistas da América, Rainha deste país até o fim de seus dias, ou até que seu herdeiro ou herdeira complete vinte e um anos.-disse ele, alto o suficiente para todo o reino ouvir.
Tudo aquilo estava sendo gravado ao vivo, obviamente. Provavelmente, metade dos EUSA estava sentada em bancos de madeira pobre em frente à praça onde havia uma grande televisão holográfica, que me mostraria ao vivo e em cores.
Sentei no trono, tensa e desconfortável, agora como Rainha, onde meu pai costumeiramente sentava, enquanto sentia a coroa finalmente pesar sobre minha cabeça, me fazendo ficar ereta como uma estátua, com medo que uma preciosidade daquelas caísse e rolasse, salão abaixo.
As duas criancinhas que estavam agora ao lado do bispo aplaudiram, acompanhadas por todo o salão e provavelmente, todo o povo dos Estados Sulistas. O Papa saiu do altar e se ajoelhou em frente à mim em uma reverência perfeita.
Todos no salão se abaixaram, em sinal de respeito, até mesmo minha mãe, ainda que de má vontade.
-Saúdem todos a Rainha Janette!-gritou meu pai com um sorriso, me surpreendendo.
-Vida longa a Rainha!-gritaram os nobres e todos os outros do salão, incluindo até mesmo a equipe de gravação, soldados e criados. As palavras vibraram pela catedral. Pareciam ter sido proferidas até mesmo pelas estátuas dos Santos nas paredes.
Agora era oficial e não havia mais como voltar atrás.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro