9° Celsius
Nesse pouco tempo de convivência, o principezinho conseguia ser bem inconveniente, mas mesmo assim, a viagem estava sendo mais fácil com uma companhia, por mais miserável que essa companhia fosse.
Nós andávamos junto à estrada, mesmo não estando nela, enquanto o ser odioso a minha frente assobiava uma música antiga que sempre toca nos clássicos da meia noite.
-Vai espantar todos os pássaros num raio de um quilômetro se continuar assobiando tão alto. -Eu disse, de mal humor. Ele aumentou o tom só para me irritar. Eu bufei e revirei os olhos, ajeitando a capa cinza para cobrir melhor o meu rosto, e, se possível, bloquear aquele som que ficara extremamente irritante depois de um tempo.
-Como consegue ser tão irritante, ser miserável?-Eu perguntei. Ele não respondeu. Só mudou a melodia. Para um que eu conhecia tão bem. Eu me lembrava de cada detalhe daquele filme. A escola, as vassouras, os professores e até mesmo a bolinha dourada que voava sem parar. Era difícil pegá-la, eu me lembrava bem.
-Essa música...-Eu falei deixando que ele subentendesse o quanto eu a conhecia bem. Ele não respondeu, mas deu um sorriso, o que me impressionou, afinal, uma criatura tão repugnante não deveria mostrar qualquer gestos de felicidade. Certo?
-Estamos chegando, mais um dia de viagem, apenas. Venha, vai anoitecer, teremos que nos abrigar.-Disse o príncipe autoritário como sempre.
Havia um pouco à frente algo similar a uma clareira, apesar de bem menor. O príncipe se sentou em uma tora de madeira que havia perto de uma grande árvore oca e aberta, quase como uma pequena caverna. Eu sentei no chão e me apoiei na tora, pronta para dormir, mas um trovão retumbou nos céus e cotas grossas de chuva começaram a cair. Eu praguejei alto e vi aquela árvore oca que estava próxima do príncipe. Eu já ia entrando, mas Trevor me parou, bloqueando a passagem.
-Não, não, não rainhazinha. Pra entrar tem que pagar. -Eu cruzei os braços, erguida uma sobrancelha e olhei para ele, esperando que falasse.-Um beijo, e você pode entrar.
Eu ri da proposta dele e levantei a perna para chutar onde o sol não brilha, mas ele agarrou a minha perna e colocou envolta da cintura dele. Eu tentei me soltar mas ele era forte demais. Ele me puxou pra perto e eu o encarei, irritada. Era realmente uma pena que fosse tão cretino. Mas se ele queria jogar, eu também poderia.
-Eu tenho outra ideia. Me deixe passar e eu prometo que não te xingo nem te bato a noite toda e a gente conversa. Se você merecer...-Eu faço uma pausa e agarro a gola da blusa dele, puxando-o para perto. Meu estômago protestou pela ideia horrenda que estava prestes a dar.-Posso lhe dar mais que um beijo.
Ele encarou os meus lábios e foi difícil pra mim não encarar os dele. Mas eu nunca o beijaria, e sabia que ele não merecia nem um abraço meu.
-Feito.-Ele disse, soltando a minha perna e me deixando passar.
-Obrigada.-Eu disse, entrando na árvore. Eu já estava um pouco molhada, mas a chuva ainda estava fraca. O que eu notei é que a temperatura caiu brutalmente. Tirei a minha capa molhada e as botas e abri a minha bolsa de viagem impermeável. Ali havia uma pele pequena, caso a temperatura caísse. Mesmo com ela eu estava congelando.
-Você vai congelar aí, vem pra cá. Eu vou acender meu lampião.- Ele disse. Me aproximei do lugar onde ele estava deitado. O calor do lampião penetrou na minha pele, e Trevor me olhou enquanto eu me encolhia o mais próximo que podia do lampião sem encostar na pele onde o príncipe estava deitado.
Trevor aproximou o lampião de si, e o calor reconfortante foi embora.
-Ei!-eu protestei, me enrolando mais na pele fina.
-Você me deve uma conversa.-Ele disse. -E sem xingar. E outra coisa, minha pele, meu lampião e minha árvore, então se eu merecer o que você prometeu e você não me der, vai ser chutada pra fora.-Ele disse.
Eu revirei os olhos. Já não merecia, de qualquer maneira.
-Ok. Se você conseguir me fazer sorrir. Sorrir de verdade, de felicidade, eu faço o que prometi.-Disse eu, reprimindo o nojo que se alastrava pelo meu corpo.
-Tudo bem... Então...-Ele encarou a pequena chama do lampião antes de falar.-Por que está atrás daquela bruxa?
-Bem... Você sabe, eu estava prometida a John e fui coroada rainha e sinceramente, eu não queria nada disso. Eu vou até ela porque sei que ela pode mudar destinos. Não importa o preço que tiver que pagar.-Eu falei, encarando a chama também, para não ter que olhar para aquelas duas piscinas azuis que eram os olhos daquele príncipe hediondo.
-Quer a minha opinião sincera?-Ele perguntou, agora encarando a pele onde estava.
-Na verdade não. Mas nós fizemos um trato então...-Eu disse, fazendo graça e olhando para as minhas botas sujas de lama.
-Acho que está sendo egoísta.-Ele falou, tornando a olhar-me nos olhos.
Indignação começou a brotar dos meus poros e minha vontade era de chutar a cara dele. Como ele podia falar algo assim?
-Como é? É egoísmo querer casar por amor? É egoísmo querer assumir quando me sentir preparada?-Eu perguntei, estreitando meus olhos. O que aquele príncipe sabia sobre altruísmo, afinal?
-Não. Mas é egoísmo por a vida das pessoas que ama e de outras pessoas em risco somente por suas vontades.-Ele disse, com a voz baixa.
Aquelas palavras me atingiram como uma faca. Ele estava completamente certo. Eu fui egoísta, e John está morto por minha causa.
-Você tem razão. Droga.-Eu disse, escondendo meu rosto entre as minhas mãos frias. Eu olhei então para as cicatrizes no meu braço antes de voltar a falar.-Mas agora tenho que continuar. Essa viagem custou demais pra voltar atrás.
-Realmente. Mas, princesa, você acha que vale a pena jogar esse futuro fora por outro? Problemas sempre vão existir. E você sabe, toda a magia vem com um preço.-Ele disse, se aproximando um pouco.
-Acredite, nenhum futuro pode ser pior do que esse. Eu tenho que tentar, príncipe.-Eu respondi, olhando pra ele.-Eu não tenho escolha.
-Sempre há uma escolha.-Ele disse, ainda mais próximo.
Um sorriso passou pelos meu lábios e eu fechei os olhos, negando com a cabeça.
-Seu otimismo me comove.-Eu disse, ainda sorrindo. Merda. Eu abri e arregalei os olhos. Trevor mantinha um sorriso convencido no rosto.
-É, parece que o Sr. Otimista aqui ganhou.-Ele disse.
Ah não. Não acredito que prometi uma coisa dessas pra ele. Eu encarei o chão da caverna e lágrimas estúpidas insistiam em tentar sair pelos meus olhos.
Trevor me olhou e uma sombra de preocupação passou pelo seu rosto, sumindo tão rápido quanto apareceu. Ele pigarreou e encarou o teto.
-Sabe... Tá frio demais hoje e... Bem, eu acho que vou diminuir o preço. Só um beijo está bom.-Ele disse. Eu sorri de novo. Não dava pra acreditar que ele tinha algum tipo de sentimentalismo.
-Eita, isso é outro sorriso? To vendo que esse beijo vai ter que ser mais longo...-Ele disse, se sentando nas peles.
-Vem logo aqui.-Eu falei, puxando-o pra perto pela gola da camisa. Eu encostei no tronco da árvore, e nós dois estávamos muito próximos. Ele colocou as mãos na minha cintura e eu aproximei ele ainda mais. Eu sentia a respiração dele na minha face e me permiti fechar os olhos. Talvez não fosse tão ruim se eu imaginasse que era apenas um filho de algum duque da corte, e que estávamos em algum canto do castelo. Minhas mãos deslizaram até o seu pescoço e eu quebrei todo o espaço que havia entre nós.
Era um beijo calmo, e não parecia que eu estava sendo forçada a fazer isso. A boca dele tinha um gosto salgado, como se ele tivesse bebido água do mar. Ele apertou a minha cintura e involuntariamente eu soltei um suspiro. O beijo começou a esquentar depois disso, e aquilo parecia estar indo muito longe. Mas eu não queria que parasse.
Eu decidi jogar tudo pro alto e puxei ele ainda mais pra mim. Ele correspondeu, me apertando na cintura de novo e colocando uma das mãos no meu cabelo. Ele começou a puxar minhas madeixas de leve e eu não resisti. Soltei um gemido baixo e então finalmente dei por mim.
Eu parei o beijo bruscamente, apesar de querer ficar ali pra sempre. Eu evitei encarar o príncipe, e parece que ele tentou fazer o mesmo.
-Bem, considere pago.-Eu disse ofegante, limpando minha boca daquele veneno odioso. A temperatura caiu ainda mais é uma rajada de vento quase apagou a lamparina. Eu me apertei na pele e senti a mão de Trevor no meu braço. Ele percebeu o quanto eu tremia e se aproximou. Eu me afastei involuntariamente e o encarei.
-Nós vamos morrer de frio de não ficarmos juntos. É isso é porque estamos embaixo de uma árvore. Imagine no descampado!-Ele falou.-Devem estar fazendo muito menos do que 9° Celsius lá fora.
Eu não falei nada, apenas me aproximei dele, deixei que seus braços rodeassem a mim e que seu casaco envolvesse parte do meu corpo. Me senti enjoada, mas nã falei nada. Fiquei apenas encarando seu colete de couro embaixo do casaco, com vontade de vomitar pelo o que havia acabado de acontecer, antes de cair em um sono sem sonhos.
Oi amoreeees. Quem pescar as referências é um deuso (a). Kkkkk. To de volta galera, e podem esperar quietos aí que semana Q vem tem mais, viu?
Beijos açucarados.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro