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𝓦agner Homero os conduziu a um quarto da pousada, próximo da escadaria, o mesmo que Domingos e Lea haviam ficado no passado.
— Venham, rápido. Está tudo livre.
— E as câmeras, padre?
— Não se preocupem, o chefe da segurança está do meu lado.
— E qual é o seu lado? — perguntou Nora.
— Aquele que estiver contra a Ordem. Fiquem tranquilos.
Adentraram o quarto e qual não foi a surpresa com a pessoa que os esperava, sentado à pequena mesa...
— Jorge? Que faz aqui?
— Ora — indignou-se —, é assim que você recebe aquele que os veio salvar? — E riu. — Mas eu respondo. Padre Homero sabia de toda a esquematização e me ligou. Vim o mais rápido que pude. Mas, meu Deus, onde vocês estavam? Limpando o porão?
— Antes fosse — respondeu Bruno. — Tivemos uma tarde de Indiana Jones, meu amigo. Algo surreal.
— Vão tomar um banho — sugeriu Padre Homero.
— Juntos? — E Bruno olhou para Nora.
Ela rechaçou a ideia, que no fundo a agradava:
— Claro que não! Um de cada vez!
Padre Homero, prevendo o estado em que os encontraria, arrumara algumas roupas. Nora ficara linda, vestida em calça de moletom e camisa polo, nada combinando com ela, mas qualquer coisa lhe caía bem.
— Agora que me dei conta, Bruno. Se tivéssemos esperado mais um pouco, o padre teria aberto a parede e teríamos luz no fim do túnel.
— Paciência, agora já foi, como íamos adivinhar? Mas padre, explique a situação, como está? Antes de me acertarem a cabeça, o Padre Germano disse que ele, Javier e Juan iam para Congonhas. E deixaram Yago tomando conta de nós.
Padre Homero confirmou:
— Sim, Yago ainda está no depósito, pensando que vocês estão dentro da passagem. O melhor que vocês fazem é ir embora com o Sr. Fontana, imediatamente. Muito em breve o Yago vai descobrir. Eu mesmo: acho que chegou o fim da linha para mim, vou com vocês.
Bruno tinha uma dúvida e não poderia deixar passar a oportunidade:
— Essa galeria secreta, existe por quê?
— Meu filho, você bem sabe, esse tipo de passagem subterrânea era muito comum em construções seculares como esta. Há motivos nobres, outros nem tanto. No presente caso, era usada por contrabandistas, em sua maioria travestidos de padres e seminaristas. Muitos chegavam ao Seminário pela porta da frente e suas 'mercadorias' eram então escoadas secretamente pela passagem, para interceptadores do outro lado. Antigamente não havia a rodovia Presidente Dutra, que só foi inaugurada em 1951. A passagem saía praticamente dentro da Mata Atlântica. Muitos seminaristas, ao descobrirem, a utilizavam para encontros furtivos com mulheres na floresta.
"Quando o Padre Germano chegou ao Seminário, em 1999, ele fechou a passagem com duas paredes de tijolos, uma em cada extremidade. Porém, quase ninguém sabe, o fez com a engenhosidade das cortinas móveis."¹
— E infelizmente ainda utilizada para fins escusos.
— Sim. Contrabandos de relíquias e torturas, por parte da Ordem. Infelizmente o Seminário foi cooptado por esses seres abjetos e até me perdoem falar assim, mas é isso que eles são.
— E o esqueleto, padre? — perguntou Bruno.
— Esqueleto? — assustou-se Nora. — Que esqueleto?
— O que nós pulamos no escuro, lembra? Eu o vi quando saímos, com a luz da escada, mas não quis lhe falar.
O padre nos tranquilizou:
— É falso. Serve como elemento de tortura psicológica.
Nora estava encafifada:
— Padre, e por que em 2001 o senhor nos deixou cair na lábia de Padre Germano?
Padre Homero expressou-se com pesar:
— Não pude evitar, minha filha. Eu era o verdadeiro contato de vocês, mas a Agnus, desconfiada, resolveu passar o comando da ação para o Padre Germano. Daí não pude fazer nada. Germano fingiu o tempo todo, inclusive que conhecera Omar e que Aziz lhe telefonara. Tudo mentira.
Nora perguntou:
— Eu só não entendo por que ele nos ajudou a fugir.
O padre elucidou:
— Porque queria que o Manolo os seguisse. Tudo foi planejado pelos dois.
E assim Bruno finalmente entendeu por que Manolo e Enrico conseguiram chegar a Conselheiro Lafaiete, atrás de Domingos. A sorte ali, foi o delegado Jonas já estar de sobreaviso, ajudando o sobrinho a andar um passo à frente dos bandidos.
Nesse ínterim, a porta do quarto foi aberta e a surpresa foi geral:
— E eis que confirmo o que queria: há um traidor aqui, não é, Padre Homero? Pensaram que eu já estava longe, não é? Mas existem mais agentes duplos. O novo chefe da segurança é um deles!
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Padre Germano, acompanhado de Yago, ambos armados, renderam a todos e os reconduziram ao subsolo, agora com a galeria devidamente iluminada, uma vez acesas as lâmpadas pelo outro lado. Só então Bruno teve a real noção do que haviam enfrentado. Um arrepio correu por sua espinha e ele apertou fortemente a mão de Nora.
O casal ia na frente, seguido de Padre Homero e Jorge, lado a lado. Padre Germano e o segurança iam atrás, também emparelhados, mas quando se aproximaram do túnel, o padre mandou que Yago tomasse a dianteira e saísse na frente, para não haver perigo de ser surpreendido, caso deixasse os reféns saírem primeiro. Assim que todos saíram, Padre Germano, que saiu por último, ordenou ao segurança:
— Jogue Padre Homero no túnel.
— Não, por favor! — implorou ele.
— Agora é a sua vez de sofrer, Judas. E merece! Mas vou ser bonzinho, vou deixar a luz acesa, só que ficará amarrado. Quem sabe você não venha a engrossar o número de esqueletos aí dentro.
Padre Homero resignou-se e entrou. Vendo a parede mover-se e fechar novamente a passagem, nada puderam fazer.
— Você é um monstro! — esbravejou Nora.
— Cale a boca! Vamos, o furgão nos espera.
— Furgão?
— Isso mesmo, Sr. Fontana. Vamos fazer uma longa viagem.
Bruno perguntava-se onde estariam Javier e Juan. Parecendo telepata, Padre Germano disse:
— Javier e Juan já foram na nossa frente, de avião. Nós iremos de carro. Destino: Congonhas, Minas Gerais.
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Partindo-se de Aparecida, em direção a Congonhas, considerando-se os traslados de carro, somados ao tempo de espera para embarque e desembarque, bem como o tempo de voo, a viagem de avião levava em torno de 7 horas. De carro, diretamente à cidade mineira, 8 horas, praticamente o mesmo tempo.
Mesmo com duas paradas, ainda assim o furgão chegou primeiro ao destino, tendo em vista que o voo de Javier se atrasara em uma hora. Tendo conversado com o espanhol por telefone, Padre Germano dirigiu-se diretamente, via GPS, ao retiro dos Casqueira, alugado pela Ordem para fins de cativeiro.
— Como soube do retiro? — perguntou Bruno.
— Sabemos desse lugar há muito tempo, desde que Casqueira andou por aqui, em 2001. Eles me confidenciavam quase tudo, lembra-se?
Padre Germano e o segurança, conduzindo os três, entraram no casebre.
— Vocês vão ficar aqui. De olho neles, Yago. Enquanto isso, eu vou ao Santuário, 'meter a marreta' numa estátua.
— E depois será preso — disse Jorge.
— Engana-se. A igreja e o adro dos Profetas estão cercados por tapumes, pois está tudo em reformas. E por causa da pandemia, as festividades também foram canceladas. Hoje é dia do Jubileu do Senhor Bom Jesus de Matosinhos e os romeiros vão acompanhar as missas pela televisão. Ou seja, estará tudo a meu favor: praticamente vazio!
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O som de uma sirene tirou-os do prumo. Germano espreitou pela janela:
— Mas o que é isso?
Na estrada de terra, exatamente do local onde Olavo Ravacini havia trombado com a árvore derrubada por Domingos, um policial berrou:
— Padre Germano, libere os reféns e saia com as mãos para fora.
Ele não compreendia:
— Como? Como souberam que estamos aqui?
Jorge explicou:
— Sempre estar um passo à frente, como diria Domingos Casqueira. Definitivamente, eu não confio em ninguém e antes de ir para o Seminário, contatei o ex-delegado Basílio, um amigo de longa data, pedindo a ele um favorzinho: me arrumar um chip — e mostrou a eles, por dentro da gola da camisa —, e assim fui acompanhado via satélite. Provavelmente o Deic de São Paulo considerou muito estranho eu estar vindo para cá e comunicou a polícia regional. Tua casa caiu, Padre Germano.
— Mas não foram tão eficientes, assim! — E deu-lhe um murro. Nocauteado, Jorge caiu na mesma cama surrada em que Olavo Ravacini um dia fora encontrado também desmaiado. Bruno tentou socorrer o amigo, mas Yago o impediu. Nisso, Padre Germano agarrou Nora e saiu, sendo escoltado pelo capanga:
— Não atirem ou ela morre.
— Abaixe a arma — gritou o policial.
— Não! Joguem as armas no pasto, atrás de vocês, bem longe. Se não fizerem isso, eu a mato!
Os policiais, sem traquejo e experiência para lidarem com situações de sequestro, fizeram o que ele pediu. Padre Germano continuava a dar ordens:
— Bruno, pegue os celulares deles e arrebente o fio do rádio amador.
Uma vez feito, Padre Germano ainda ordenou a Yago que atirasse em dois dos pneus do carro:
— Agora não vão a lugar algum. Bruno, entre no furgão, você dirige! E não tente nada, ou mato Nora.
Entraram no carro, com Bruno dirigindo em disparada pela estrada de terra. Os policiais demoraram a encontrar as armas, caídas no meio do capim, mas não havia muito o que fazer com apenas um pneu sobressalente. Além disso, sem poder solicitar reforços, o padre colocava-se em grande vantagem.
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Nota:
¹ Passagem secreta fictícia (N. do A.)
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