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O Mαɳυʂƈɾιƚσ - Cαρ. 17

𝓒𝓸𝓷𝓼𝓮𝓵𝓱𝓮𝓲𝓻𝓸 𝓛𝓪𝓯𝓪𝓲𝓮𝓽𝓮

𝟙𝟟 Voltei ao presente... Trinta dias tinham se passado, desde minha chegada ao Brasil. Temeroso e sozinho, uma vez que Lea tomara outro caminho, retornando à Europa, agora, mais do que nunca, necessitaria ter a coragem que me faltara, ao não falar a ela dos sentimentos que nutria; coragem para enfrentar a Ordem; e coragem para encarar minha doença.

— Não sei se acredito em metade do que você me contou, Domingos — disse meu tio.

— Se acreditar em metade, já estará bom. É a porcentagem do mundo que tenho para vasculhar e encontrar o documento "Q", pois acredito é certo que está no hemisfério Sul.

Inspirei o ar da fria tarde, soltando-o devagar, enquanto o ar quente transformava-se em névoa diante de meus olhos. Quando jovem, eu sempre imaginei se tratar de vapor d'água, o expirado pela boca, mas um dia soube a verdade: o vapor é invisível aos olhos e sai dos pulmões condensando-se ao contato do ar frio, e o que parece fumaça ou vapor é, na verdade, uma névoa d'água. Isso me fez pensar numa coisa... Há tempos não via o tio. Ele seria confiável? Ou seria como aquela suposta fumaça, que parecia ser, mas não era? Afinal, eu realmente poderia confiar em alguém mais, que não fosse Lea? Entretanto, tinha que me fixar numa certeza: não deveriam caber dúvidas, nem quanto a tio Jonas, tampouco quanto a tia Laura.

Tio Jonas soltou fumaça pela boca — essa sim verdadeira, ao menos em parte, expelida pelos pulmões após uma tragada no cigarro:

— Você precisa tomar cuidado. Temos que tomar providências.

Sem prévio aviso, minhas faces ruborizaram-se, quase ao ponto de chamas poderem brotar espontaneamente de minhas bochechas. Senti novamente aquela dor e baixando a cabeça, coloquei as duas mãos sobre o couro cabeludo. Apertava com força, tentando extirpar o mal insuportável. Tio Jonas preocupou-se:

— O que houve?

— Ando com terríveis dores... — E tentei desconversar: — Mas não é nada não, vai passar.

— Domingos, não precisa mentir, eu já sei de tudo. Antes de partir, Lea me falou do tumor. É benigno, mas só um especialista pode realizar essa cirurgia, o Dr. Saul Horowitz.

— Especialista esse que foi sequestrado pelo Hamas — arrematei, em desalento. — E ainda que ele estivesse livre, quanto não cobraria por essa operação?

Eu falava de coragem e nem para contar ao tio que estava doente, eu tivera iniciativa, precisando que Lea fizesse o trabalho por mim. Seria já reflexo da doença, aquela minha falta de atitude? Como diria tia Laura, "falta de expediente"?

Segundo o médico, meu tumor ainda era pequeno, mas tumores menores às vezes fazem mais estragos do que os grandes, tudo depende da localização. Em mim crescia lento, como de comum nos benignos, e por ora causava apenas cefaleias, mas eu já começava a sentir pequenas dificuldades na coordenação motora.

— Você ainda tem as terras do retiro, penso que devam valer um bom dinheiro — lembrou tio Jonas. — Será o suficiente?

— Se eu não tiver de pagar o resgate do neurocirugião, creio que sim. — Ao menos o senso de humor eu não havia perdido. Alterações de humor são esperadas, dentre muitos outros sintomas, mas ainda estava livre delas.

Em algum momento daqueles dias, a tragédia que se abatera sobre nossa família em 1964, com a morte de minha mãe e o autoextermínio de meu pai, tornando-me órfão, voltaria à tona em nossas conversas. Não era um assunto que eu gostasse muito de relembrar. Tio Jonas também não, pois sempre houvera uma questão nebulosa em toda a história: a de que meu pai se matara por conta de uma traição de minha mãe, tal fato potencializado pela trágica morte dela.

Mas naquela conversa, fatos novos seriam revelados e tudo por conta de uma carta despedida, escrita e assinada por meu pai. Estava em poder de tia Laura, guardada por 37 anos. Tia Laura, com certeza, seria a melhor pessoa a se confiar um segredo, estava comprovado, mas meu pai não tivera a intenção de que a história fosse ocultada, pelo contrário. A decisão de poupá-lo havia partido dela. E também de poupar a todos, principalmente a mim, de mais uma funesta descoberta.

— Eu sempre desconfiei da traição — afiançou a tia. — Adriana não gostava do Jerônimo. O casamento com ele era apenas um arranjo comercial entre famílias, o que ela nunca aceitou, mas não teve forças para se esquivar.

Apesar do acerto familiar, tia Laura explicou que no sangue de minha mãe corria um sentimento de 'quebrar amarras', de 'liberdade, ainda que tardia', numa linda alusão ao texto escrito na bandeira de Minas Gerais. E isso a impeliu à relação extraconjugal, para viver um amor verdadeiro, pois seu casamento era uma farsa. Meu pai descobriu e ficou possesso. E conforme ela nos explicava, ele não possuía o perfil de quem fosse tirar a própria vida, ao saber que sua esposa tinha um amante, não somente por isso...

— Não! Ele era explosivo e ciumento. E vingativo! Era meu irmão e eu o conhecia bem. Ele não se mataria simplesmente, pelo contrário, ele primeiro se vingaria.

E foi o que fez! No dia 12 de junho de 1964 minha mãe estava na praça do Santuário, em Congonhas, numa manifestação contra a ditadura militar. Meu pai, imaginando que ela ali estava na companhia do amante, foi atrás dela. E tendo confirmado suas suspeitas, valendo-se da confusão no embate entre os soldados do Exército e os manifestantes, atirou nos dois.

Foram dois os disparos, um acertou minha mãe e o outro zuniu no ar, cruzando o alto da escadaria e colidindo nas costas do profeta Baruc, cuja parte superior partiu-se em duas, da altura dos cotovelos até a cabeça. O amante escapou ileso e enquanto tentava socorrer minha mãe, meu pai fugia, covardemente.

— E foi isso — concluiu ela. — Dada à confusão, os tiros ficaram na conta dos soldados, sendo o caso abafado devido a interesses óbvios da ditadura nascente. E da família, também.

O duro golpe da verdade, tantos anos depois, abalou-me ainda mais. Tia Laura não sabia de minha doença e se soubesse, talvez não tivesse me revelado mais essa verdade.

— Sua mãe teve a parcela dela de culpa, mas no fundo ela foi a grande vítima, tal violência não se justifica aos olhos de hoje. Pelo crime que cometeu, eu jamais poderia ter deixado impune a memória de meu irmão. Por isso estou revelando isso a vocês.

Naquela época havia a falsa ideia da legítima defesa da honra, uma tese absurda.

— Tive pena dela, tinha acabado de voltar da Europa e estava muito feliz pela conclusão dos estudos.

A viagem à Europa era uma história quase lendária no seio da família, relembrada há bem pouco tempo por Omar, em Qumran. Entre 1960 e 1963, minha mãe fora estudar em solo europeu — e foi assim que se tornou aluna de Omar Khaled. Ao retornar, casou-se com meu pai e eu nasci, em dezembro de 63. E foi nessa viagem que Omar trouxe na bagagem o documento "Q".

— Omar Khaled veio trazê-la pessoalmente, aproveitando para conhecer as obras de Aleijadinho, que Adriana lhe falara tão bem. Isso foi em janeiro de 63, sendo que seus pais se casaram em fevereiro.

Omar acabou estendendo sua estada por mais quinze meses, até que aconteceu a tragédia. Tendo feito contatos, acabou contratado para restaurar o profeta Baruc, permanecendo ainda por mais dois meses no país, até retornar à Turquia.

Tia Laura concluiu:

— Somente o arrependimento pelo que fez, faria Jerônimo tirar a própria vida — finalizou, com lágrimas nos olhos.

Apesar do choque da revelação, a confirmação por tia Laura daquela viagem, da qual só ouvíamos falar e de cujos acontecimentos ela fora testemunha ocular, davam conta da possibilidade de que a história de Helga e do códice pudessem ser realmente verdade. Mas onde, afinal, ele teria escondido o documento?

Uma suspeita passou-me pela cabeça, certo dia, quando visitei o túmulo de minha mãe, no cemitério Bonfim, em Belo Horizonte. Na lápide havia a seguinte inscrição: "Libertas quae sera tamem" (liberdade, ainda que tardia), o famoso lema dos Inconfidentes, e abaixo da frase, os seguintes dizeres: "Sob o céu do Cruzeiro, Adriana deu sua vida, lutando por liberdade, a sua e a de seu país".

A família Casqueira jamais teria solicitado ou aceitado aquela inscrição, ainda mais desconhecendo o que meu pai fizera, porém, o túmulo pertencia à família de minha mãe.

Interessado na referência ao Cruzeiro, perguntei a tia Laura quem havia mandado escrever aquilo — e convenhamos, algo muito atípico para um epitáfio e muito perigoso, a julgar pela constante repressão das Forças Armadas, durante a ditadura, e ela disse:

— O Sr. Omar!

Os fatos que narrarei a seguir chegaram ao meu conhecimento alguns dias depois da conversa com tio Jonas e tia Laura. Eu e Lea por vezes conversávamos, nos valendo de telefones públicos, temendo usar e-mails ou linhas particulares. A notícia que ela me trazia era bombástica: Jerome Gasly estava morto!

O francês tinha falecido num desastre de carro, quando saía de sua propriedade em Beauvais, na França, onde costumava passar férias uma vez por ano. Ao sair do local e descer a íngreme ladeira de acesso à avenida principal, o veículo colidira com um muro de pedras logo abaixo e o acidente ceifou sua vida.

O automóvel: um Lancia Aurelia B24S Spider 1955, conversível. A polícia constatou que não havia como alguém sobreviver àquela colisão, principalmente num carro não projetado para absorver choques, onde a quantidade de movimento se transferia toda para o ocupante. A morte fora instantânea. O motivo: uma falha no sistema de frenagem.

Haviam mexido nos freios? A perícia dissera que sim. Gasly deixava o carro sobre cavaletes para que os pneus não sofressem avarias por achatamento, retirando também a bateira. Só ele mexia no Lancia, quando de suas viagens esporádicas à França. A primeira coisa que fazia, ao chegar toda vez, era recolocar as rodas, tirar os cavaletes e repor a bateria, para uma volta. Fácil, portanto, a quem quisesse, preparar uma pequena surpresa ao miserável. Confesso: não estava nem um pouco triste com sua morte, pelo contrário, mas ao explanar suas suspeitas acerca da autoria do crime, Lea alertou-me:

— É coisa da Ordem, Domingos. Olha, cada vez mais me preocupo com você. E comigo própria.

Expliquei a ela que Gasly teria sido morto por razões muito mais fortes: o fato de usar a Ordem como fachada e escudo, e que, em nosso caso, enquanto não descobrissem onde estava o códice, não iriam nos matar, porque imaginavam que sabíamos de seu paradeiro.

— Você sempre confiante, meu amigo. Não me fiaria tanto nisso. E eles podem me sequestrar, quem sabe, para te obrigar a revelar um segredo que, na verdade, você nem sabe a resposta.

O pior é que ela sempre tinha razão. A ideia me fez gelar. Assim, já que meu destino parecia selado — e eu morreria de qualquer jeito, ainda mais se o Dr. Saul não se livrasse do Hamas, resolvi adiantar as coisas e acelerar o processo, eu mesmo e, quem sabe, proteger Lea de alguma forma. Mas precisava escrever toda a história, até ali e, quem sabe, deixá-la aos cuidados de alguém de confiança, talvez um jornalista investigativo, a fim de que o mundo um dia viesse a saber de todo o ocorrido. De minha região mesmo, havia um bem conhecido: Olavo Ravacini.

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