Por meu filho - III
一 Seus amigos são uns filhos da puta 一 disse Cheveyo enquanto Elena se despedia.
一 Você me venderia ao primeiro viajante que encontrasse pelo caminho e faria o mesmo com eles 一 Retrucou Elena desamarrando os pés dele
一 Ao primeiro não, aquele que pudesse pagar o preço.一 Respondeu e Elena balançou a cabeça.一 Sou bom com barganhas.
一 Se fosse não estaria amarrado. Não seja ganancioso e disperse o gado, não leve mais do que precisa e eles vão pensar primeiro em reunir o rebanho do que em matar quem fez isso e boa sorte. 一 Falou se levantando e caminhando pra junto de Condessa, quando seus olhos pairaram sobre o corpo de um dos cowboys mortos com escalpo arrancado e rosto desfigurado.
一 Foi Kewanne, ele perdeu a família no ataque aos Arikare, fazendo isso ele acredita que condena a alma dos homens brancos a vagar solitários pela terra, assim como ele segue agora, sem sua mulher e filho.一 A voz de Tokalah preencheu os ouvidos dela.
一 Não é isso que estou olhando, depois de Little big Horn nenhuma mutilação me assusta 一 falou se abaixando e empurrando o homem para o lado, abrindo a gola da sua camisa com cuidado tentando evitar tocar no sangue. Quando abriu afastou-se rapidamente ao ver feridas vermelhas subindo pelo peito até a garganta.
一O que é isso? 一 Tokalah se abaixou curioso.
一 Não chega perto, eu espero estar enganada, mas creio ser varíola. Se for, qualquer um que tocou nesse homem, nos outros ou nos pertences deles pode ficar doente e o gado ...一 Ela parou por instantes tentando raciocinar 一 Bom, animais não tem variola, mas dizem que a doença sobrevive em objetos por um tempo... O pelo deles.... Não podemos voltar a aldeia, essa doença já é mortal nas cidades na aldeia, vai ser um extermínio. 一 Disse nervosa e Tokalah 一 arregalou os olhos e soltou um longo suspiro.
一 Quanto tempo? Até sabermos se estamos doentes?
一De sete a uns 15 dias.
一 É muito tempo, Elêna. Preciso alimentar os meus irmãos.
一 Ainda há cavalos, vão resistir há mais alguns dias, mas não vão sobreviver a isso Tokalah. Não estou sendo exagerada, quando houve um surto dessa doença em Londres, não havia lugar para enterrar tantos mortos, isso vai matar mais da metade da aldeia. Já passaram por coisas assim, sabe o que as doenças do homem branco podem causar no seu povo, confie em mim. Não é seguro voltar agora.
一Ficar aqui fora também, não é, vão achar que estamos mortos, tem cinco clãs diferentes e os Arikaras no vale, pouca comida e ninguém pra manter o controle. Se não voltarmos eles vão matar uns aos outros.
一 Se voltarmos, corremos o risco de matar todos eles.... Tokah.... Por favor me escute, eu sei oq ué estou falando.
一 Eu sei que sabe, mas eu também sei. Com o rebanho, vai levar uns cinco dias até a aldeia, se houver alguém doente, voltamos a discutir, mas por enquanto, seguiremos viagem.一 falou findando a conversa.
Seguiram atravéz da planície em trote lento, Tokalah obrigou os homens a se livrarem dos pertences e escalpos tirados dos cowboys mortos e todos os dias Elena examinava o grupo em busca de possíveis sintomas.
Enquanto parte dos homens se preocupava em manter o rebanho unido no ritmo da cavalgada, Tokalah, Enepay, Nuvem e Elena seguiam na retaguarda.
Desde as novas deliberações do governo, as planícies indígenas tornaram-se território ainda mais hostil. Enquanto a cavalaria protegia os fortes e cidades, a terra agora estava tomada por ladrões, justiceiros, garimpeiros e colonos em busca de um pedaço de chão fértil pra chamar de seu. E os encontros entre esses grupos, costumavam ser sangrentos. E como se não bastasse a fome que se alastrou pelas aldeias com a morte dos búfalos, fazia com que muitos dos acampamentos nômades e até mesmo clãs de mesmas nações, que antes conviviam em harmonia, vissem uns aos outros como inimigos, na busca por comida e peles quentes. Tokalah apesar de ter sobrevivido há mai invernos difícieis do que gostava de lembrar, não havia visto nada como aquilo. A fome castigou seus irmãos como nunca, doenças de inverno levaram os mais fracos e como previu, o bebê de Tasha fora um dos primeiros a ser cremado em uma pequena pira sepulcral.
Findando o quarto dia de viagem e apesar de cavalgar lado a lado, Elena e Tokalah haviam trocado poucas palavras. A mulher, percebeu o líder dos mandan preocupado e receoso, sempre encontrando uma desculpa ou desviando a atenção para outro quando ela voltava a ele. Passava as noites em rondas e no pouco que descansava, Elena não tinha coragem de acordá-lo. E Enepay fazia o mesmo o que a deixava profundamente ansiosa com o que havia acontecido nos meses longe dos mandan.
一Por favor, abra a boca 一 disse a Kewanne durante a checagem no fim do dia e o nativo apenas sorriu, voltando-se ao outro homem ao seu lado, com um comentário o qual Elena foi incapaz de entender, mas que fez ambos os nativos soltarem uma gargalhada.
一 É melhor fazer o que ela disse e se Tokalah ouvir esse tipo de desrespeito, seu escalpo vai decorar a camisa de guerra dele. 一 Disse Enepay no dialeto dos Arikaras fazendo o homem sorrir de forma irônica e deixar que Elena continuasse o exame.
一 Tudo certo, pode perguntar a ele se teve algum dos sintomas que já explicamos?一 Ela questionou a Enepay fez uma pausa longa antes de perguntar e repetir a resposta de Kewanne. 一 E você está bem? Perguntou Elena ao garoto enquanto os outros se afastavam. 一 Parece abatido.
一 Minha cabeça está doendo um pouco, mas já doí antes disso, então não deve ser nada. 一 Ele respondeu baixando o olhar.
一 Eu vou dar uma olhada em você. 一falou levando a mão a testa dele 一 sua temperatura parece normal, mas talvez esteja um pouco desidratado, tem mantido seu cantil cheio? O sol foi mais forte hoje, não seria ruim criar o costume de usar chapéu, nem tudo que o homem branco cria é uma afronta a natureza. 一Falou examinando os olhos do rapaz que deu um leve sorriso.
一 Tonturas? Dor a no peito? Tosse? Alguma pústula? 一 Disse e o garoto a olhou confuso 一 bolhas avermelhadas na pele?
一 Não. Só a dor de cabeça.
一 Devia ter me avisado, mas isso é bom, deve ser apenas uma desidratação. Você vai ficar bem se descansar e beber bastante água. 一 Falou com um sorriso preocupado. 一 O que aquele Arikara disse? Posso não entender uma vírgula do que ele falou, mas pelo tom que respondeu, imagino que não seja nada lisonjeiro.
一Não vale a pena você saber.
一 Concordo, mas tem coisas que valem, o que aconteceu? Tokalah mal me olha, ele me culpa pela morte de Witshaswakan e Mansir? É isso?
一 Não, não tem nada a ver com você. Ele está feliz que você está de volta. Só está preocupado e... 一 o garoto ponderou por instantes 一 Ele ficou doente por um bom tempo, mas quando começou a melhorar, Kinauhauk o desafiou pelo manto. Eles lutaram, Lua venceu, condenou e matou Kinauhauk por traição 一 Ele fez uma pausa e suspirou profundamente 一 Esse tipo de crime é muito grave, a linhagem de Kinauhauk devia morrer com ele.一 Disse fazendo o coração de Elena disparar ao entender o que o garoto quis dizer 一Acho que ele simplesmente não sabe como te contar isso, tem medo do que vai pensar. Eu não deveria ter falado, mas achei melhor que você soubesse por mim do que descobrir no vale 一 disse o garoto 一 enquanto via Elena petrificada com os olhos marejados diante dele.一Senhora Elena...
一 E Kimimela? 一 perguntou ela.
一 Ele poderia tê-la expulsado, mas não o fez. Agora, ele tem que encará-la todos os dias, tem sido difícil. Ele amava os garotos como ama todos os seus irmãos, mas ele sabia que precisava demonstrar sua força para evitar que outros os desafiassem ele estava fraco, não venceria um oponente mais forte que Kinauhauk.Ele fez isso para nos proteger Wewomi e a mim. Um novo manto me sangraria e tomaria Wewomi pra ele. Mas mesmo sabendo que fez o que devia ser feito, não torna as coisas mais fáceis. Não muda o fato de que muitos na tribo não o olham mais da mesma forma. Ele só não quer que você também o veja assim, como um assassino.
Elena respirou profundamente pra evitar cair em lágrimas e sorriu para o garoto disfarçando o choro.
一 Você precisa descansar, vá se deitar eu vou ver ver o que teremos pro jantar. 一 Falou limpando as lágrimas que teimaram em descer por suas bochechas 一 Pra ser sincera adoraria que matassem um daqueles bois. Estou cansada de carnes de caça. 一 Falou mudando o assunto aí tentar se recompor.
一 Eu acho que não vai ser hoje senhora Elena 一 falou o rapaz acenado com a cabeça para Tokala e nuvem que voltavam munidos de algumas cobras e um pássaro carniceiro.
一 É. Que seja cobra, então. 一Falou ainda tentando afastar a angústia que as palavras de Enepay lhe causaram.
Viu os acender a fogueira e se sentarem em círculo enquanto assavam a caça sobre as brasas. Não conhecia ninguém além de nuvem do novo grupo de guerreiros e vinha tentando manter uma certa distância, até que Tokalah se aproximou com um pedaço de carne enfiado na ponta de uma faca.
一 Não obrigada, não estou com fome.
一 É claro que está, não comeu nada o dia todo. Coma, não é ruim como está pensando. Insistiu com o assado diante dela que se deu por vencida. Estava faminta e o estômago roncava há horas.
一 Enepay está doente. Pode ser só uma desidratação, mas melhor manter certa distância até termos certeza, se for só isso ele deve amanhecer melhor amanhã. E você? Se como se sente?
一 Não estou doente.
一 Não é isso que estou perguntando, está me evitando o tempo todo, nem sequer olha pra mim. Não perguntou nada sobre nosso filho ou em como foram esses meses, e quando tento fazer isso você foge.
一 E o que eu teria a perguntar? Se você se sentiu feliz enquanto nosso filho crescia na sua barriga e você se deitava com aquele Waikiki pra que ele não te espancasse até a morte? Se seu parto foi tranquilo? Sendo que disse que não o vê desde que nasceu, e nesse dia o segurou por poucos minutos até que aquele Waikiki infeliz atirou em você e tomou o meu filho pra ele? Você disse que seu irmão garantiu que ele está bem cuidado e parte de mim quer acreditar nisso, mas eu vi o que o capitão é capaz de fazer, ele me torturou por horas e tudo bem eu faria pior com ele se tivesse a chance. Mas eu também vi o ele fez no clã de maralah, com aquelas mulheres, aquelas crianças... bebês... Entao não Elena, eu não quero falar dele, eu não quero pensar em como o meu filho está agora, sendo que eu não posso fazer nada por ele.
一 Ele está bem, eu sei que está. Andrew não me tocou, ele salvou minha vida e me deixou ter uma gestação em pacífica e segura, mesmo depois de eu tê-lo envergonhado. Você só conheceu um lado dele e ele não é tão ruim quanto pode parecer as vezes.
一 Você o defende agora?
一 Não, ele me causou a maior dor que poderia causar. Tirou o meu filho, dos meus braços! E sim, ele é um homem horrível as vezes, mas as vezes ele é bom e gentil. E eu realmente acredito que é assim que ele está agindo com meu bebê.
一 Não foi por ser bom e gentil que você vive fugindo dele... 一Respondeu se levantando. 一 Tente descansar, amanhã começamos a subida, será bem difícil com aqueles animais pesados destruindo o caminho, mas precisamos deles vivos, não sabemos quando teremos búfalos novamente pra caçar. Depois que chegarmos, começaremos a pensar em como vamos pegar o menino. E não importa se ele o enterrou ou se esteja o tratando como um filho, eu vou matar aquele maldito Waikiki, nem que seja a última coisa que eu faça.
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