Inimigos - III
Andrew despertou antes do clarear do dia e afastou-se um pouco dos homens ainda adormecidos. Embora não fosse um homem dado aos luxos, fazia um bocado de tempo que não dormia tão mal. A partida às pressas, o fez sair sem mesmo um cobertor para forrar o chão duro e ainda pior que isso, sua mente não deixava de retumbar a palavras do índio.
"Ela pertence aos Mandan, pertence a Lua Negra" 一 ouviu mais uma vez a voz imponente do chefe ressoar em sua cabeça.
E se Green estivesse falando a verdade? E se fosse da escolha de Elena ainda estar com os índios? 一 Ele balançou a cabeça tentando dissipar tais pensamentos. Embora tivesse ouvido e até visto com os próprios olhos, histórias sobre homens e mulheres brancos que deixaram suas vidas pra viverem com peles vermelhas, aquilo não condizia em nada com o que conhecia da esposa.
Elena embora um bocado teimosa, era uma mulher de princípios cristãos, doce e delicada demais para querer viver da forma rústica dos selvagens.
Sacudiu a cabeça e voltou o olhar ao longe, avistando uma fumaça ao longe cortando o céu que começava a clarear anunciando um novo dia.
一 Achei você 一 falou com um breve sorriso.
Despertou os homens e em pouquíssimo tempo estavam todos cavalgando em alta velocidade em direção ao acampamento.
Tokalah despertou sentindo a vibração emanada do couro de búfalo sobre o qual dormia. Levantou-se rapidamente e avistou Mansir cochilando junto ao que restou da fogueira. Correu o olhar pelas quatro direções e percebeu que haviam sido imprudentes na escolha do acampamento, estavam expostos e com pouca visibilidade a longa distância.
一 Levantem 一 gritou chamando a atenção do pequeno grupo, que aos poucos foram despertando ainda sonolentos.
一 Sei que tem pressa de voltar ao vale, mas todos estão cansados e temerosos com o futuro, devia ser um pouco mais complacente, irmão. 一 Mansir falou baixinho ao irmão mais novo.
一 Tem algo vindo 一 respondeu o chefe ainda sentindo aquela vibração pulsando dentro dele. 一 precisamos ir, Mansir.
Antes mesmo que pudessem terminar de levantar o acampamento, Enepay avistou a silhueta de alguns cavaleiros sobre o monte. Apesar de não se vestirem de azul como os Waikikis, o garoto reconheceu o Capitão Norton entre eles.
一 Tokah... Tokah 一 gritou ao líder que voltou o olhar ao grupo. 一 Eu acho que a trégua acabou 一 observou o menino.
一 Se eles querem guerra, terão guerra. 一 disse Tokalah empunhando rapidamente um rifle e jogando um segundo para Enepay. Montaram em seus cavalos e levou poucos segundos para que os dois grupos se encontrassem a uma distância de poucos metros.
O barulho, a fumaça das armas e a poeira levantada pelas patas dos animais deixavam o ambiente confuso. Os nativos puderam ouvir a voz de um dos homens exigindo que largassem as armas e se rendessem, no entanto isso só fez com que a furia se instaura-se entre os homens, fazendo-os avançar em direção a armada de Charlottetonw.
Andrew tirou a baioneta da cintura, desviando-se do machado de Falcão Amarelo e enterrando a ponta da arma entre suas costelas, fazendo com que o jovem nativo caísse e fosse pisoteado pelo próprio cavalo. O cerco fechou-se diante dos olhos de Tokalah, embora seu grupo fosse um pouco maior que o dos olhos d'água, eles pareciam saber exatamente o que estavam fazendo, cercando-os e acuando-os e todo aquele que ousava tomar a frente para tentar ultrapassar o bloqueio acabava ao chão. O líder Mandan e seus homens formaram um círculo de defesa, embora soubessem que não haveria munição o suficiente para vencer aquele embate, aquela era a melhor maneira de levar quantos homens brancos possíveis com eles.
一 É a última chance, rendam-se, me entreguem suas armas e poderão viver. 一 Bradou Andrew sentindo o peito pulsar 一 Ninguém mais precisa morrer 一 gritou ele e Tokalah finalmente o reconheceu, o indígena semi cerrou os olhos e o colocou na mira de seu rifle. No entanto correu o olhar pelos seus homens, com ele, estavam tres líderes de clã com seus filhos, Mansir, um curandeiro e Enepay, seu legado. Se todos morressem ali, a nação Mandan estaria totalmente perdida e vulnerável, mais uma vez, errou em confiar nos brancos, em sua promessa de trégua e palavras vazias. Jogou seu rifle ao chão e desceu de Omaha, encarando Andrew com imponência.
一 É a mim que quer, deixe- os ir.
Andrew embaiou a baioneta e tomou sua pistola em mãos , descendo de Negro e caminhando alguns passos na direção do indígena.
一 Está enganado, não é você quem eu quero. Quero minha esposa e meu cunhado se volta em casa, a salvo.
一 Elena já está em casa. 一 retrucou Tokalah que levou um soco forte de Andrew que o fez pender para o lado, fazendo seus homens firmarem a mira no capitão.
一 Mande seus homens baixarem as armas, eu lhe garanto que temos munição de sobra pra vocês e pra aqueles que ficaram no vale. 一 falou e Tokalah arregalou os olhos 一 O que? Pensava que seu esconderijo permaneceria secreto para sempre? Sabemos onde está cada um de seus clãs, incluindo seu precioso vale, então ou você se rende, devolve os reféns e aceita os termos do acordo ou vão estar todos mortos até o fim do inverno.
Tokalah voltou-se a seus homens e sinalizou com a mão, imediatamente eles lançaram seus rifles para frente e Andrew fez sinal para sua armada desmontar. Em alguns minutos o grupo de Mandan estava de joelhos sobre a mira dos rifles, Andrew correu o olhar sobre os homens e mentalmente avaliou o valor deles dentro de seu povo. Além de seu grande chefe Lua Negra, decidiu que manteria, o curandeiro, Mansir , o manto Nuvem e Enepay como reféns para a troca. Aos outros, deixou que partissem levando o corpo de Fera Selvagem e um recado a tribo dizendo que se os reféns não fossem devolvidos até o por do sol do dia seguinte, a cada hora que se passasse do prazo um daqueles homens morreria.
一 Sabe que não importa se devolverem Elena e o irmão, vão nos matar de qualquer jeito 一 Nuvem sussurrou a Tokalah em sua língua mãe 一 Eles não honraram sua palavra de trégua dada por um de seus chefes brancos, porque honraria essa? Deveríamos ter lutado e matado quantos desgraçados olhos d'água conseguíssemos. 一 disse o nativo tentando forçar o couro que prendia seus punhos, amarrado de maneira tão forte que já podia sentir suas mãos formigando devido a dificuldade do sangue em circular.
一 Não espero que eles cumpram, espero que nossos irmãos tenham tempo de se preparar. 一 respondeu o índio sem tirar os olhos de Andrew mais a frente.
一Hey vocês dois, sem conversinha, seus malditos pagãos 一 ralhou Gilbert se aproximando 一 olha só pra vocês一 ele riu chamando a atenção de seus colegas, incluindo de Andrew que evitava olhar para Tokalah e também para Enepay a fim de controlar a raiva dentro dele. 一 Um bando de degenerados sem alma. Não passam de animais selvagens, talvez pior pois estes tem alguma serventia aos planos do senhor. 一 Disse e o velho curandeiro Ike, resmungou algo incompreensível a ele.一 O que disse pele vermelha? 一 falou colocando a ponta do chicote no queixo do velho homem que o encarou profundamente. No mesmo instante Tokalah e Mansir trocaram olhares e assim que Gilbert levantou a chibata, o líder Mandan usou as pernas para derruba-lo e em seguida Mansir passou os braços amarrados por sua cabeça firmando em seu pescoço trazendo- o ao chão. Nuvem vermelha chutou os joelhos do homem próximo a ele e Tokalah avançou na direção de Andrew que cerrou os punhos na direção dele.
O indígena ainda com as mãos presas usou a cabeça para acertar a testa de Andrew o deixando tonto e em seguida lançou-se sobre ele derrubando-o no chão. Andrew chutou suas pernas quando este tentou alcançar a baioneta presa a sua cintura e os dois rolaram pela terra seca. Enquanto Norton tentava acertar o rosto do índio Tokalah tentava firmar-se sobre ele, usando a lateral de seu braço contra o pescoço do capitão. Andrew relutou, chutou e socou o quanto suas forças lhe permitiam, mas quanto mais movia-se mais sua traquéia era estrangulada pelo nativo que o encarava firme. Um disparo ecoou chamando a atenção do líder Mandan, que ao ver Mansir cair logo a frente dando a oportunidade para Andrew alcançar seus olhos enterrando seu polegar sobre a pálpebra de Tokalah, o obrigando a solta-lo. Assim que escapou do braço dele, Andrew retirou a pistola do cinto e fez um disparo contra o índio, fazendo-os tombar para traz.
Levou alguns minutos para que a armada de Charlottetonw retomasse o controle da situação, amarrando os nativos as rodas da carroça, enquanto o sangue de Mansir ainda se espalhava manchando o chão.
Tokalah estava ferido, o disparo havia atravessado seu ombro mesmo com a dor e o sangue escorrendo ele urrava de ódio, tentando livrar-sr das cordas .
一 Não disse? Uns animais 一 resmungou Gilbert tirando um lenço do bolso, limpando os respingos do sangue de Mansir que ficaram em seu rosto. 一 você está bem capitão?
一 Só ficarei bem quando Elena estiver em casa. 一 respondeu puxando o ar para os pulmões.
一Wa yá kté ni.一 bradou o líder Mandan 一Eu vou matar você, eu vou matar todos vocês!
Andrew olhou para o homem amarrado diante dele e embora não compartilhasse a crença de Gilbert de que os índios eram como animais selvagens, desprovidos de uma alma. A imagem a sua frente dizia o contrário. A fúria de lua Negra estava estampada em suas feições, o corpo suado, o sangue escorrendo, os longos cabelos negros e sujos colando ao rosto cujo os olhos se assemelham a os de um lobo trincando os dentes sedento por estraçalhar sua presa, estavam muito mais perto de uma fera incontrolável do que um ser humano.
一É melhor calar a sua boca, antes que eu arranque sua língua, não preciso te devolver inteiro. 一 Falou Andrew se abaixando rente ao rosto do nativo que cuspiu em seu rosto e que foi respondido bofetão e mais alguns socos que fizeram um fio grosso de sangue escorrer pelo nariz dele. 一Eu só não mato você agora, porquê eu honro meus acordos e preciso que esteja vivo para que eu tenha a minha mulher de volta. Mas quando isso acabar, eu vou caçar você e não vou parar até enfiar uma bala na sua cabeça. Está ouvido?
一 Nunca a terá de volta. 一Tokalah esforcou-se a falar sentindo o rosto latejar de dor. 一 Elena não pertence a você, nunca pertenceu. Ela pode não ter escolhido ir para aldeia, mas ela me escolheu e continuará escolhendo. Mesmo que a leve de volta, mesmo que me espanque, mesmo que me mate. Serei eu, serei sempre eu, seu Waikikis nojento 一 Disse com a voz fraca antes de levar outro muito que o fez perder a consciência.
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