~Capítulo 10: A Caçada
"Para caçar ratos, o gato esconde as unhas"
- Provérbio Japonês
*Povoado Country 'Presente' (09 de maio de 2020)*
Ficou em pé olhando para o caos instalado no quarto que se hospedava. A frase escrita na porta da varanda e as coisas reviradas. Esperou pequenos instantes até quando bateram na porta principal do cômodo e caminhou ao objeto a fim de atender a visita. Abrindo-o revelou uma Adryelle preocupada e nervosa com as coisas descritas sobre o ocorrido. Entrou no cenário e leu a frase ainda sem saber nada do que dizia, olhou para o amigo e constatou que estava passando bem baixando o nível de preocupação e visualizando a expressão preocupada em sua face.
Caminhou por todo o lugar verificando as marcas e entrando na suíte para ver se não tinha mais nada a preocupar. Assim, sustentou o olhar do amigo e tentou ser calma e breve:
- Vou pedir para algum funcionário arrumar essa bagunça e checar nas câmeras quem pregou essa peça em você - Foi interrompida no momento que positivou a situação catastrófica instalada entre eles e os demasiados convidados. Para Andrey era bastante claro que alguém desejava entregar um aviso e também entendia as estranhezas acontecidas nos últimos dias.
Ele sentou na cama ainda sem dizer nada e passou a mão no objeto bagunçado. Ficou fixado perto do álbum e o pegou nas mãos. Já o havia checado e sabia que mais pistas podiam sair dele, algum tipo de segredo obscuro não entendido ainda perpetuava naquelas páginas e sentiu o colchão baixar quando a amiga repousou ao seu lado olhando aquelas páginas de fotografias sem entender nada direito.
- Como isso veio parar aqui? - Ela reconhecia o pequeno livro de cor grafite. Chegou a sua residência sem remetente e achou que fosse apenas mais um dos presentes - Estava na minha mala. Enviaram como presente de aniversário - Na altura dos acontecimentos entendia que não havia sido um presente, entretanto com os nervos precipitados devia ser mais rígida nas informações que passaria ao amigo preocupado.
Sustentaram seus olhares novamente até que Andrey começou a sussurrar sentindo o medo nas entranhas e sem desejar que alguém ouvisse e instaurasse pânico entre os convidados:
- Não acho que tenha sido uma peça - Começou com suas impressões, sem a intenção de deixá-la preocupada, porém sabia que faria mesmo assim - Três pessoas sumiram com notícias bestas e não atendem minhas ligações. Micaelly deixou aquele retrato no posto com a mesma frase escrita na minha parede agora e tem esse álbum abandonado aqui com todas nossas fotos em preto e branco - Fez uma rápida pausa querendo ouvir o silêncio da melhor amiga cabisbaixa e pensativa - Alguma coisa estranha acontece embaixo dos nossos narizes e estão tentando nos avisar.
O objeto foi retirado de suas mãos e a outra pessoa no cômodo começou a virar as páginas do pequeno livro ilustrado sobre o colo. Ao passar das folhas perceberam algumas pessoas coloridas nas imagens sem cor. As pessoas ficavam marcadas e pareciam seguir uma sequência que nenhum dos dois deu o trabalho de perceber. Adryelle notava as veias de preocupação na testa de uma das pessoas que mais a importavam naquele lugar e resolveu ocultar o encontro com Iasmim por hora a fim de fazer com que repousasse e ficasse calmo.
- Eu entendo - Falou a garota ajeitando a o colar com seu nome no pescoço - Não sei o que está acontecendo. Mas, Arthur pregou peças na gente antes - Disse percebendo que sua positividade espantava a ideia e o medo que os dois enfrentavam. Pensando no benefício resolveu continuar - As meninas entrarão em contato e prometeram estar aqui no dia do aniversário. Sei que pode parecer errado tentar ser positiva...
- Não é errado - Ele a interrompeu novamente quase convencido da ideia instalada sobre tudo ser flores e pensar em ignorar aquele momento - Entendo o quanto sua festa é importante, mas vamos parar e pensar. Caso nenhuma das meninas entre em contato até amanhã vamos ligar para suas famílias e avisar que não sabemos do paradeiro de nenhuma delas. Vamos tentar agir com raciocínio uma vez que não temos conhecimento sobre quem fez isso, logo olhe nas câmeras e espero mesmo que Arthur seja o responsável.
Ela assentiu e levantou da cama. Pensaram melhor e limparam juntos o cômodo inteiro. O álbum foi posicionado embaixo do colchão e devido a todos os arrepios da invasão os dois se abraçaram e saíram do quarto desejando um pequeno descanso. Andrey pegou uma nova chave na recepção e repousou no outro quarto que o colocaram. Já Adryelle se alinhou na cama ao lado do namorado e o abraçou querendo parar de pensar naquilo e pretendendo focar nos eventos que o dia reservaria para seus convidados e também para a anfitriã dedicada ao bem-estar de todos.
Uma iluminação bastante precisa e gritos abafados ecoando em seus ouvidos. Lavínia sentiu algo duro nas costas e uma dor de cabeça muito forte na parte frontal de sua nuca. Abriu os olhos e mesmo assim a vista permanecia escura, mas sentia a iluminação do lugar, assim como o cheiro forte de coisa queimada e a outra presença agitada. Quando seus olhos focaram na figura amordaçada, começou a lembrar dos últimos acontecimentos da noite passada e sentiu seus dedos apertarem o papel molhado preso em sua mão direita.
Finalmente conseguiu agilidade nos movimentos e soltou a fotografia segura em seus dedos. Olhou para a garota sentada e clamando por ajuda com uma mordaça na boca e logo levantou cambaleando e chegando à cadeira a fim de prestar suporte.
- Ai meu Deus - Gritou puxando a corda da boca da conhecida, quebrando uma unha e sem ligar para a dor que causou. Seu corpo todo molhado na chuva que pegara do lado de fora do hotel antes de ter sido raptada - O que aconteceu? - Perguntou colocando os dedos entre os nós nas mãos de Mayara que chorava e respirava cansada de gritar por socorro.
- Foi no navio - Mayara balbuciou com lágrimas nos olhos e o imenso desespero ecoando em qualquer pessoa que visualizasse aquele momento. Sentiu o peso das cordas afrouxar e conseguiu mover novamente seus membros. Em seguida conquistou o movimento das pernas e levantou cambaleando e apoiando uma mão no móvel cinza posto ao seu lado. No cenário apenas aquele móvel cinza, que mais parecia uma mesa, abarrotado de papéis jogados como se fossem nada. Uma cadeira no meio da sala e duas portas para saídas distintas, ambas muito bem trancadas. Na parede lateral havia um mural de fotos com muitas pessoas conhecidas por elas e de capturas distintas e peculiares.
Lavínia abraçou a outra pessoa no cômodo afagando as costas para que passasse o choro e limpou as lágrimas que desciam dos seus próprios olhos. Sentiu seus pés descalços no chão quente daquela sala e começou a sufocar com o horrível cheiro de coisa queimada. Queria que Mayara tivesse terminado o que dizia, mas a falta de ar que sentia devido a todos os gritos a impedira de falar. Restava esperar alguns instantes até estar recomposta e pronta em prosseguir. O medo arrepiava seus braços e pernas, nem sequer pensou na descoberta feita antes ao entrar no quarto e pegar seu ex-namorado com sua melhor amiga. De repente chegaram situações muito importantes lidando com a sobrevivência de seu ser.
- Ele usa um casaco verde, não me deixou ver seu rosto nenhuma vez - Ela falou com dificuldade e desabou no chão sentando para descansar mais um pouco. As duas permaneciam bastante suadas e isso piorava o cansaço - Ele mata pessoas e queima os corpos por aquele corredor - Apontou para a porta ao outro lado de onde estavam - Eu vi Hillary e Lindinêz mortas próximas de mim - Começou a gritar com as recordações traumáticas dos momentos que esteve naquele lugar - não podia fazer nada para ajudar e eu sinto muito medo - Deitou a cabeça no colo da outra pessoa que mesmo sem ser íntima, passou a mão nos fios de cabelo e tentou manter a calma que no momento não existia.
Cabisbaixa e muito assustada, Lavínia permaneceu olhando para a figura ali em sua frente ainda sem acreditar na veracidade desses acontecimentos. Virou para a parede de fotos e observou uma fotografia sua, colada e marcada em um X muito grande que cobria toda dimensão da imagem. Outras saíam das paredes e mostrava faces conhecidas de pessoas correndo perigo apenas pela marcação no ambiente.
- Meu Deus - Tudo que pensou em dizer apertando a única mão que podia apertar - O que estamos fazendo aqui?
A resposta jamais foi dada, gases entraram no cômodo. Vapor de cor púrpura rompeu todo o campo de visão das duas, que ficaram extasiadas e aos poucos sonolentas, ao inalar o cheiro de lavanda na sala. Deitaram no chão uma ao lado da outra, enquanto a pessoa embaixo do capuz verde entrava e depositava alimentos no canto da sala e dois ventiladores. Seus planos eram incompreendidos, mas aqueles utensílios ajudariam as duas no progresso do que devia ser feito a fim de obter seu plano. Arrancou quatro imagens da parede, eram respectivamente: Hadassa, Daniel, Herman e Anny, ou seja, pessoas que nem imaginavam o que o destino guardava.
Nem todos permaneciam com pique para continuar acordados e competir no torneio de esportes. O time formado por Cíntia acabou vencendo e ela comemorou bastante com todos os ajudantes da equipe. O torneio terminou tarde e depois todos foram beber e dançar em uma boate aberta em um dos salões de festa no hotel. O pessoal que participaria da caçada dormiu mais cedo pelas responsabilidades da manhã.
Andrey voltou para o quarto anterior e pegou o álbum nas mãos outra vez. Olhava com atenção para uma foto dele com o Willian e o Chris, os três estavam em tons preto e branco. Na foto ao lado notou Letícia em cores vivas e o resto da fotografia com os mesmos tons escuros. Aquilo chamava atenção e não sabia em qual sentido, mas entendia facilmente a questão e se ressentia por não descobrir logo os motivos de sua desconfiança. Retirou a fotografia do pequeno livro a fim de observar a parte atrás dela.
Havia um número ali gravado e o remeteu ao dia mais trágico de toda a sua vida. O dia que ouvira aquele número - e sentiu remorso com a situação - sendo sussurrado por uma pessoa antes especial e agora temido por seus atos passados.
*Aracaju (23 de novembro de 2017)*
Acordou. Mexeu as mãos impedidas de exercer movimentos completos e focou o olhar na pessoa sentada em sua frente. Os cabelos loiros e os olhos azuis no campo de visão que não desejava ter, encaravam os pequenos movimentos dos pés e das mãos amarrados na cadeira. Reconhecia o lugar no qual estava: as paredes antigas, os móveis quebrados e as imensas caixas em todos os cantos revelava o porão da casa dos Ning.
- Está com fome? - Willian perguntou ainda sentado e com um olhar bastante preocupado - Não amarrei muito forte para não te machucar.
Sustentaram os olhares e a pessoa livre à frente parecia preocupada e serena, como sempre havia sido. Talvez as aparências pudessem enganar de fato e todo aquele tempo o rapaz era mesmo o assassino frio e calculista revelado no dia anterior. A máscara caiu e o doce e risonho Willian Ning revelou seus segredos tenebrosos em instantes. Assassinara a mãe, tinha um caso sexual com a meia-irmã e sequestrou o melhor amigo tentando manter todas as suas ações criminosas em absoluto sigilo.
- Precisamos conversar - Sussurrou sabendo que qualquer palavra dita ecoaria em todo aquele ambiente. Pelo que parecia a casa estava vazia, poderiam ouvir os passos nos andares acima caso alguém estivesse na residência. Andrey virou a cabeça para o teto e notou que gritar clamando socorro não seria uma ideia ideal - Não, ninguém está em casa - Willian o conhecia de forma demasiada e entendia aqueles pensamentos como se fossem os seus próprios. Pescou novamente o olhar da pessoa que beijara no dia anterior e pretendia fazê-lo entender todos os acontecimentos a fim de preservar os laços anteriores.
A feição rígida transparente no rosto do melhor amigo irradiava toda a fúria e remorso por todos os acontecimentos descobertos.
- Que prova de amor - Foi à resposta instantânea e irônica dada por Andrey ao perceber o quanto aquela situação era uma tremenda sátira icônica - Matou a tia Charlotte para manter seu relacionamento com a Iasmim - Ele sorriu mesmo com a dor de cabeça imensa afugentando a testa, sabia sobre o assassinato cometido e entendia os motivos percorridos até a morte de Charlotte. Saber que o assassino de sua amiga era o próprio filho dela maltratava seu subsconsciente de formas inexplicáveis - Não consigo entender direito ainda. Esse não é o Willian que conheço - Começou a chorar sem entender o motivo das lágrimas que desciam dos seus olhos e molhavam toda a extensão de seu pescoço.
Notou uma lágrima descer do olho direito do melhor amigo, mas não queria sentir piedade. Queria sentir raiva pelas ações e pretendia sentir a mesma raiva momentânea quando contasse toda a história para as autoridades e o caso fosse fechado. Pensou em Adryelle e no crime que ela confessou antes, começou a imaginar se caso Willian confessasse o crime dele da mesma forma as coisas não seriam diferentes e a resposta era negativa. A situação confessada na festa do dia anterior era reversível e um plano havia sido bolado para ajeitar as consequências sem complicar nenhuma pessoa sequer.
Em contrapartida, a situação descoberta na noite anterior sobre a luz acesa e a porta entreaberta do quarto de Willian não era reversível. Uma pessoa foi assassinada e a vida dessa pessoa jamais poderia ser devolvida. Logo, caso aquele crime também fosse confessado às ações não seriam diferentes em forma alguma. Mesmo que os dois fossem crimes articulados e não devessem ser cometidos, uma pessoa mostrara arrependimento enquanto o garoto de cabelos loiros chorando em sua frente demonstrava descaso com o assassinato.
- Sou a mesma pessoa que sempre fui. Alguém capaz de fazer todo o possível para ajudar quem ama - Ouviu a voz embargada e mesmo assim não pretendia mudar a posição dos pensamentos - Minha mãe recriminou a gente e planejou me mandar para a Alemanha, apenas para separar nós dois - Ele disse levantando da cadeira e chegando perto o suficiente para colocar suas mãos nos ombros de Andrey - O que aconteceu precisava acontecer e eu sinto muito que tenha descoberto e esteja nessa situação agora.
- Isso não é justificável - Disse querendo mexer as mãos e inquieto com os pés, mas sem conseguir se soltar - Willian se abaixou e desfez os nós dos pés do amigo mostrando simpatia e mostrando uma situação antes não destacada: ele não pretendia machucar Andrey, queria apenas ganhar tempo para alguma outra coisa - Você vai fugir? Por isso me mantém aqui preso, quer ganhar o tempo de fugir e não se importa caso eu conte algo a alguém.
Raciocínio rápido com coisas pequenas, os pontos se encaixavam e o ser em sua frente assentiu com um pequeno balançar de cabeça que disse tudo que precisava saber. Depois das pernas soltas ele levantou e se aproximou o suficiente para entregar um beijo na bochecha, o singelo e costumeiro beijo de despedida daqueles dois. O último beijo que Andrey receberia e lembraria-se daquele momento não como o fim de algo, mas como o início de uma coisa bem maior e por anos ficaria se lamentando pelas decisões tomadas.
- Eu amo você - Willian falou ao seu afastar - Chris saiu cedo de casa, foi à delegacia - Começou a subir as escadas do porão querendo sair dali - Quero que seja feliz e sinto muito por tudo. Mas, você escolheu o meu irmão e ele me contou sobre o beijo e acho que nós dois merecemos um desfecho, seja bom ou ruim. Fico feliz que a pancada não tenha te machucado, sentir-me-ia muito mal com isso - Caminhou o suficiente para colocar a mão no trinco da porta e olhou para trás uma última vez, sabendo que em instantes Andrey se libertaria das cordas presas em suas mãos e quando isso fosse feito, estaria longe o suficiente - Meu pai foi solto. Adryelle pediu ajuda ao pai dela e eles conseguiram, vou morar com ele e a Iasmim vem junto comigo. Isso é tudo que precisa saber. Não sei como ela descobriu que era meu pai e resolveu ajudar, mas acredito que venha de você e muito obrigado. Por favor, conte a ela sobre a minha gratidão.
Então Adryelle conseguiu reverter todo o seu erro. Mesmo como um crime, ela zelou sua promessa e retirou o inocente de trás das grades dando-lhe a liberdade que merecia. Eles sustentaram os olhares mais uma vez e o garoto de cabelos loiros abandonou o cômodo preparado em fazer tudo que era necessário para escapar de seu crime.
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