Capítulo 6
O som do trem nos trilhos era alto, já passava da meia noite, mas o barulho não deixava Celina dormir, o que era irônico já que era do Chalé de Ares, e os filhos dele não eram nada quietos.
- Estão acordados? - Percy perguntou de repente.
- Não, mas eu gostaria de dormir. Se pudesse ficar quieto, agradeço. - Celina respondeu.
- Celina! - Annabeth chamou sua atenção, num tom severo.
Celina fez careta, depois de saírem da casa da Medusa, todos prometeram que tentariam ao máximo serem agradáveis, para que não gerasse brigas e a missão fosse comprometida.
- Foi mal. - Celina se desculpou, mais por ter sido pega no flagra por Annabeth, do que por remorso pelo jeito que tinha respondido Percy.
- Você e a Thalia eram muito unidas, não? - Percy perguntou para Annabeth.
- Sim.
- Como ela era? - Percy perguntou. - Ela foi a última filha proibida antes de mim, deve ter passado pelas mesmas coisas.
Houve um pequeno silêncio antes que Annabeth respondesse, e os dois esperaram pacientemente o tempo dela. Sabiam que falar de Thalia era um assunto delicado para Annabeth.
- Ela era forte. Ela sabia que era uma filha proibida e não dava a mínima. Brilhava por conta própria e isso era algo de se admirar. - Annabeth dizia isso com um tom carinhoso e também triste, cheio de saudades. - Quando a gente se conheceu, o Luke cuidou de mim logo de cara. Mas a Thalia... Ela me fez merecer.
- É por isso que você implica comigo? - Percy perguntou. - Tenho que merecer o seu cuidado?
- É. Talvez. - Annabeth respondeu.
Celina fez outra careta e imitou as falas dos dois, sem voz. Ela preferia quando os dois estavam brigando, e não tendo conversas amigáveis e sentimentais.
- Sinceramente, não faz muito sentido pra mim. - Percy comentou.
- O que não faz sentido pra você?
- O jeito que todos vocês falam. O jeito que os deuses querem que a gente pense: tem que queimar oferendas para receber a atenção dos pais. Tive que acabar com a Clarisse para que meu pai admitisse que era meu pai. Não deveria ser desse jeito. As pessoas próximas da gente não deveriam nos tratar assim.
- Você quer saber como eu fui parar na rua, pra começo de conversa? - Annbeth perguntou. - Percy, eu era um presente pro meu pai. E é assim que funciona com a Atena, nascemos de um pensamento que ela tem e somos entregues para um parceiro que ela sinta conexão. Durante um tempo eu fui tratada como um presente, ele cuidava de mim. Ele me amava, eu sentia...
Annabeth fez uma pausa, estava com a voz embargada. Celina via sua mão, mesmo no escuro, e quis segura-la, mas não fez.
- Aí ele conheceu outra mulher, e tiveram seus próprios filhos. E para ela eu não era um presente. Eu era um problema. Então eu fugi, com sete anos. Não são os deuses que pensam assim... É todo mundo. - Annabeth continuou. - Mas com eles da pra saber as regras: é só mostrar respeito que vão ficar do seu lado pro que der e vier.
Um momento de silêncio, Celina ouviu Percy se movimentar no seu colchão no chão.
- E você, Celina? - Percy perguntou. - O que você acha?
Celina respirou fundo, pensando no que deveria responder.
- Eu concordo com vocês dois em partes. Talvez eu seja um pouco mais radical por causa da minha história... - Celina começou, brincando com as mãos. - Antes de minha mãe morrer..
- Sua mãe morreu? - Percy perguntou, surpreso. - Eu... Não sabia.
- Tudo bem... - Celina engoliu em seco. Ela não falava muito sobre aquilo. - Antes de minha mãe morrer, eu ouvia todos os amigos dela falando que ela deveria se livrar de mim, porque eu era uma "criança problemática", sabe? Por causa das coisas que eu via e dizia. Vocês devem saber do que estou falando. Eles diziam que eu era esquizofrênica e que minha mãe ficaria melhor sem mim.
- Que coisa horrível! - Percy disse.
- Mas minha mãe nunca deu ouvidos à eles. Ela me dizia que não tinha nada de errado comigo, ela me enchia de amor e carinho. Acho que você entende isso, Percy. Por tudo que você está fazendo, tenho certeza que sua mãe é tão incrível como a minha era.
- Ela é. - Percy concordou.
Celina sorriu, ao reviver as memórias com sua mãe.
- O que aconteceu depois?
- Depois que minha mãe faleceu? - Celina perguntou, ouvindo um murmúrio de concordância. - Como eu era a "criança problemática", ninguém quis ficar comigo, e eu fui para um orfanato. E eu era diferente de todas as crianças de lá. Não aguentei por muito tempo e também fugi. Eu já tinha nove anos na época. Fiquei um ano inteiro naquele lugar.
- Então sua mãe morreu quando você tinha oito? - Percy perguntou.
- É.
- Sinto muito. Deve ter sido bastante doloroso. - Percy lamentou.
- Foi. Bastante. - Celina concordou. - Principalmente depois que eu descobri que meu pai matou ela.
- Ares fez o que? - Percy perguntou, se levantando de seu colchão e olhando diretamente para Celina. - Por que ele faria algo assim?
- Porque ele é um Deus. Ele pode fazer isso. - Celina respondeu, sentindo os olhos encherem de lágrimas. Mas se forçou à não derramar nenhuma gota. - Eu não confio em nenhum Deus, e em nenhum adulto. Estamos por conta própria, Percy.
Percy abriu a boca para falar, porém, os murmúrios de Grover chamaram sua atenção.
- Tá acordado? - Percy perguntou.
- Agora eu tô. Obrigado. - Grover respondeu, com a voz um pouco irritada.
- Você tá bem? - Celina perguntou, franzindo a testa.
- Ele fica irritado quando não dorme. - Annabeth comentou.
- Ele fica irritando quando não dorme. - Grover repetiu com voz fina.
Celina comprimiu os lábios, tentando não rir.
- Uau. - Percy disse, surpreso.
- Você nunca tinha viajado com ele antes. É diferente daquele internato firulento.
- Quem é firulento? Você é firulento... O que é firulento? - Grover resmungava. - Acho que tô com fome.
Todos riram, fazendo a tensão desaparecer.
[...]
Algumas horas depois, quando todos acordaram, eles saíram de sua cabine e foram para o vagão restaurante.
Celina estava sentada em uma das mesas, olhando pela janela, admirando o campo verde e o sol nascente.
- O que tá pensando? - Annabeth perguntou, se sentando ao lado de Celina.
Celina desviou o olhar para Annabeth, dando um suspiro.
- Na minha mãe. - Celina respondeu. - A conversa de antes me trouxe lembranças dela.
- Como ela era? - Annabeth perguntou.
Um sorriso cresceu nos lábios de Celina com aquela pergunta, e Annabeth correspondeu.
- Ela era tão linda. Lembro que eu achava que ela era a mulher mais bonita do mundo! - Celina respondeu, com o sorriso aumentando cada vez mais. - Também era bastante gentil e engraçada, mas também era muito, muito brava. Lembro que, quando os amigos dela falavam que ela deveria se livrar de mim, ela brigava com eles, dava lições de moral, parecia uma leoa, e meu me sentia protegida por ela.
- É muito bonito o jeito que você fala dela. - Annabeth comentou. - Com um brilho no olhar.
- Você fica assim também quando fala da Thalia. - Celina respondeu. - Como seu pai era?
O sorriso de Annabeth foi diminuindo, até que ficasse com uma expressão triste no rosto.
- Eu não tenho muitas lembranças sobre ele. - Annabeth respondeu, com pesar. - Já faz muito tempo.
- Sabe o que eu acho?
- Não!
- Eu nem falei nada! - Celina riu.
- Apenas pelo seu tom eu sei o que você iria sugerir, e não, não vou contatar o meu pai.
- Mas Annie... Olha, eu sei que foi difícil pra você, ser deixada de lado pela pessoa que deveria ter o maior carinho e amor por você, mas eu daria tudo pra ter minha mãe de volta. - Celina disse. - Você não sabe a sorte que tem.
- Sorte? Sorte por ter um pai que não liga pra mim, e uma madrasta que me odeia?
- Isso já faz anos, Annie! Tenho certeza que seu pai está arrependido de não ter te protegido, e acredito que sua madrasta também se arrepende de ter te visto como um problema. E eu aposto que você seria uma ótima irmã mais velha!
- Você acha? - Annabeth perguntou, inclinando a cabeça para o lado.
- Com certeza. - Celina assentiu. - Você ajudaria eles com o dever de casa e eles iriam dizer: Uau! Minha a Mana Annie é tão inteligente! Nunca mais vou ter dificuldades para estudar!
- Mana Annie? - Annabeth riu. - Gostei de imaginar isso.
- E então? Eu não estou dizendo o que você tem que fazer, mas eu acho que você deveria dar uma chance pra sua família, não só o Luke.
Annabeth desviou o olhar para a janela, pensativa.
- Vou pensar no seu caso. - Annabeth respondeu.
Celina assentiu e a atenção das duas se voltou para Percy e Grover, que chegaram com o café da manhã e se sentaram em frente à elas.
- Apenas dois dias até chegar em Los Angeles. Estamos com folga no prazo para chegar no submundo. - Grover comentou, com um sorriso aliviado.
- Eu posso fazer uma pergunta idiota? - Percy perguntou.
- Parece que você gosta que eu zoe você. - Annabeth disse, fazendo Celina dar uma risada nasal.
- Fala aí. - Grover incentivou.
- Eu nunca pisei em Los Angeles na vida, e acho que vocês três nunca foram para lá também. Então, como vamos saber para onde temos que ir?
- Não faço ideia. - Grover respondeu. - Mas esse é o passo 37, a gente ainda está no passo 4. A gente resolve isso quando chegar lá.
- É... Aproveitando a pergunta idiota...
- Só pergunta, Percy. - Celina revirou os olhos.
- "E irá fracassar em salvar aquilo que mais no fim". Lá em Jersey eu falei que o Oráculo disse que a missão ia fracassar, e ninguém tocou no assunto. Acho que é uma coisa que a gente deveria levar um pouco mais à sério... - Percy se interrompeu ao olhar para a janela, os outros olharam também.
Lá fora, no campo, centauros corriam, e ninguém além deles pareciam ter os notado dentro do trem.
- Aquilo são...
- Centauros. - Annabeth completou, assentiu com a cabeça logo em seguida.
- Ninguém nem sabe que eles estão ali. - Percy comentou.
- Antes existia vários deles por todo o lado. - Grover disse.
- E o que aconteceu com eles? - Percy perguntou.
- Humanos. - Grover respondeu, em tom triste. - Alguns milhares de anos atrás, o Deus da floresta, Pã, desapareceu. Desde então, sem Pã para proteger o mundo natural, os humanos estão fazendo de tudo para acabar com a natureza.
- Os satiros mais corajosos se ofereceram para serem buscadores, para encontrar o Pã. - Annabeth completou, olhando com o mesmo tom triste que Grover. - Ninguém nunca voltou.
- O seu tio, que encontramos na Medusa, o Ferninando. Ele era um buscador? - Percy perguntou, e Grover assentiu.
Eles caíram em um silêncio por alguns segundos, até que Annabeth voltou à falar, se direcionando à Grover.
- O Oráculo não disse que a gente fracassaria. "Fracassar em salvar aquilo que mais importa", pode ser qualquer coisa. É assim que as profecias são, é assim que o destino funciona. Pode ser um monte de coisa.
- Quanto mais você se esforçar pra entender, mais difícil fica de entender. - Celina continuou, dando um sorriso maroto. - E você já não é muito bom em pensar, né, Cabeça de Alga?
- Celina! - Annabeth repreendeu, e Celina riu.
- Eu só tô brincando, Annie. O Percy nem liga mais, não é? - Celina perguntou, vendo Percy sorrir.
- Prefiro essas suas piadinhas do que você tentando forçar minha cabeça na privada. - Percy respondeu.
- A Celina fez o que?! - Grover perguntou, surpreso. - Quando isso aconteceu?
Os outros três riram da expressão de Grover, e antes que pudessem explicar o que tinha acontecido nas primeiras noites de Percy no acampamento, um homem com uniforme policial se aproximou da mesa onde eles estavam sentados.
- Com licença, as passagens, por favor. - Ele pediu.
Annabeth mexeu em sua bolsa e entregou as quatro passagens para o homem, que as analisou.
- Estão na cabine 17B?
- Sim, por quê? - Annabeth perguntou.
O homem mandou que eles o seguissem, e foi o que eles fizeram. Eles foram levados até a cabine onde eles tinham dormido, e se surpreenderam com o que viram: a cabine estava destruída, a janela estava quebrada e vidro estava espalhado por todo o chão.
- Podem explicar isso? - O policial perguntou.
- Espera.. Tá achando que a gente fez isso? - Percy perguntou.
- Fizeram?
- Mas como teríamos feito isso? E por quê? - Celina perguntou.
- Me digam vocês.
- Senhor, quando fomos tomar café tava tudo intacto. - Grover tentou fazer o policial acreditar neles. - Nós não sabemos como isso aconteceu.
- Tem uma testemunha que diz que ouviu uma janela se quebrando e vozes de crianças. - O homem indicou uma mulher, que falava com outra policial, alguns metros atrás deles.
- Tá de brincadeira. - Percy bufou, impaciente.
- Que horas vocês saíram da cabine?
- A gente vai ser preso? - Annabeth perguntou, indignada.
- Olha, é bom você não usar esse tom comigo, mocinha! - O policial mandou.
Annabeth o encarou, com uma expressão que deixou Celina arrepiada.
- A gente vai ser preso? - Annabeth perguntou novamente, ainda mais rude que antes.
[...]
Alguns minutos mais tarde, eles tinham voltado para o vagão restaurante, sob a surprevisão dos policiais. Eles seriam levados para a delegacia responder sobre o estrago da cabine.
Eles estavam sentados em uma mesa, observando o policial que os tinha interrogado.
- A gente só tá enchendo linguiça pra saber se esse cara é um tipo de lobisomem? - Percy perguntou.
- Acho que ele não é um mostro. - Annabeth comentou.
- Mas se ele não é um monstro, o que tá acontecendo aqui? - Celina perguntou. - Por que alguém ia destruir o nosso quarto?
- Talvez estivessem procurando alguma coisa. - Grover sugeriu.
- Mas a gente não tem nada. - Percy respondeu.
- A galera que acha que você roubou o raio mestre de Zeus discorda disso aí. - Annabeth disse.
- Entendi. - Percy suspirou.
- Mas ninguém vai achar nada com a gente.
- Mesmo assim, a gente não pode passar o dia respondendo perguntas na delegacia de Saint Louis. - Annabeth disse. - A gente tem que sair antes que a gente se atrase..
Annabeth foi interrompida por um toque em seu ombro, e todos olharam para a mulher que estava depondo contra eles há poucos minutos. Ela tinha um sorriso no rosto, e Celina não se sentia confortável olhando para ela.
- Será que eu posso sentar? - A mulher perguntou, deixando sua bolsa na mesa ao lado da deles e se sentando no banco. - Ah... Pobres criaturas. Seus pais não estão aqui, não é?
Da bolsa da mulher vinha um xiado estranho, era como se tivesse algum animal ali dentro. A mulher se dirigiu à bolsa quando falou em seguida.
- Não é verdade, preciosa? As crianças ficam assustadas quando estão sozinhas. - Ela voltou seus olhos para os quatro na outra mesa. - Tudo bem, eu sou mãe. Eu sei como devem estar assustados.
Ela se virou e pediu para que a policial se retirasse, enquanto isso, eles trocaram olhares entre si. Aquela situação estava muito estranha.
- Eu quero que saibam que eu não acho que vocês fizeram aquela bagunça na cabine. - Ela revelou. - Eu só queria um tempo à sós com vocês. Eu preciso que entendam algumas coisas...
- Tem alguma coisa na sua blusa. - Grover disse de repente, atraindo a atenção para si. - Parece que é vidro.
Celina olhou para a blusa da mulher, reparando nos pequenos cacos brilhosos em sua roupa.
- Ninguém quebrou de dentro a janela da nossa cabine. - Grover continuou. - Alguém quebrou a janela pelo lado de fora.
O sorriso da mulher vacilou, e o animal dentro de sua bolsa ficou ainda mais agitado.
- Ai, meu bem, eu sei, eu sei... - A mulher dizia num tom acolhedor. - Você está impaciente... Oh! Mas estamos quase lá!
Ela se voltou para as crianças, o sorriso tinha voltado.
- Não é culpa de vocês, mas infelizmente, vocês vão ter que pagar o preço pelos erros dos seus pais....
- Escuta moça, eu não sei o que você é, mas desconfio do que seja. - Celina à interrompeu, impaciente. - Já encontramos monstros iguais à você, e acabamos com todos!
O sorriso da mulher se alargou.
- Monstros iguais à mim? - Ela riu. - É claro que são iguais à mim... Eles eram meus filhos.
Aquela revelação fez o coração de Celina parar por alguns instantes, então os batimentos voltaram com tudo, tão rápidos. Era como se Celina tivesse corrido uma maratona. Sua boca ficou seca e o corpo todo tremeu.
Mas o pior foram as lembranças que voltaram e fizeram a cabeça dela latejar.
- Filhos? O que quer dizer? - Percy perguntou.
- A mãe dos monstros...
- Equidina.
Equidina sorriu ao ouvir seu nome, e novamente acalmou o animal em sua bolsa, que estava cada vez mais agitado.
- Monstro.. - Ela repetiu a palavra que Grover usou. - Que palavra estranha. Se pensar que a minha vó, é sua bisavó, e que isso sempre foi um caso de família.
O sangue de Celina circulava muito rápido em seus ouvidos, fazendo ela escutar as palavras de Equidina abafadas.
- Mas, ao meu ver, o semideus é a criatura mais perigosa: desordeira, violenta... Se fosse para eu escolher um propósito, seria ficar no caminho de monstros iguais à você.
Ela se virou para Celina, e continuou à sorrir ao ver as lágrimas em seus olhos.
- Está me reconhecendo agora, Celina? Quanto tempo, não?
Foi muito rápido. Em um segundo, Celina estava sentada ao lado de Percy, no outro, tinha avançado para cima de Equidina, pronta para mata-la.
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vai Celina! acaba com ela!
o que vcs acham que aconteceu? qual o passado de Celina? pq o Ares matou a mãe dela? qual é a treta dela com a equidina?
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