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4: Casa de Boneca

- ALERTA DE GATILHO –

Esse capítulo possui cenas envolvendo baixa autoestima e relacionamentos abusivos. Respeite os seus limites!

...

Lugares, lugares, vão para os seus lugares

Vista seu vestido e coloquem seus rostos de bonecas

Todos pensam que nós somos perfeitos

Por favor, não deixe eles olharem através das cortinas

Foto, foto, sorria para a foto

Pose com o seu irmão, você não vai ser uma boa irmã?

Todo mundo pensa que nós somos perfeitos

Por favor, não deixe eles olharem através das cortinas

– Melanie Martinez -

4 meses e 27 dias para O Dia

Andressa, que estava apoiada na quina da janela de seu quarto, no segundo andar da casa, ouviu seu celular vibrar, tirando a sua concentração na movimentada rua de Belo Horizonte às cinco da tarde.

Ao apanhar o aparelho que estava sobre sua cama, a jovem logo percebeu o que se tratava: ela havia acabado de ser adicionada em um grupo com um monte de gente que nunca vira na vida.

Arregalou os olhos, surpresa. Estava junto com os seus quarenta e sete adversários do concurso.

Como não havia muito o que fazer naquela noite além de planejar como convencer seu pai a prosseguir no reality, a jovem decidiu conhecer mais os outros participantes.

Um dos primeiros que checou o perfil, foi Alexandre Galdino.

"Ele será um dos principais concorrentes... Já trabalha com música e também compõe" ela pensou.

Sua curiosidade falou ainda mais alto e entrou em uma das redes sociais do homem. Além de postagens compartilhando personalidades famosas, normalmente associadas a algumas lutas sociais, ela também notou que o cantor era habituado a gravar pequenos vídeos. Reproduziu um deles em seu dispositivo, em que ele estava em seu camarim, provavelmente se preparando para algum show.

— Galera, hoje eu vim falar sobre um assunto importante. Como vocês devem estar sabendo, o mundo das artes está lidando com mais um caso de assédio. Dessa vez, com o ator e diretor americano, Robert Taylor. Fazem cinco dias que ele foi acusado e eu ainda não vi nenhuma providência a respeito. Nem mesmo uma previsão para isso. Sabe o que vai acontecer? Nada! Passarão panos quentes na situação e o "galã" de Hollywood continuará trabalhando e sendo exaltado. Até quando, galera? Até quando vamos ficar calados enquanto há mulheres tendo seus corpos tratados como objetos? Até quando ficaremos quietos enquanto tem gente como ele vivendo sem sofrer impunidade nenhuma? Até quando iremos aceitar comentários que culpam a vítima, ao invés de lhe oferecer proteção? A gente tem que mudar esse cenário. Mulheres que me assistem: juntas, vocês são mais fortes! Prezem pela sororidade! Vão à luta!

O vídeo acabou, mas a rede social logo indicou outro para Andressa assistir. Dessa vez, Alexandre parecia estar em sua casa mesmo.

— Galera, é bem verdade que, durante toda a história da humanidade, os homens e as mulheres tiveram tratamentos diferentes. Existia coisa pra menino e coisa pra menina. E é óbvio que, pra maioria das coisas, a vida foi mais difícil para as mulheres! Notem só quantas mulheres na política nós temos em relação aos homens. Notem a diferença gritante de salários entre homens e mulheres que exercem a mesma função. Notem todas as barreiras que as mulheres precisam ultrapassar pra ter direitos que nós, homens, temos, como, por exemplo, ser contratado numa empresa sem ser questionado se quer ter filhos. É importante que todos tenhamos consciência da desigualdade de gênero para que possamos lutar contra. Principalmente vocês, mulheres, empoderem-se! E homens, ajudem também! Sejam pró-feministas e desconstruam o machismo de vocês a cada dia!

A cada vídeo que passava, Andressa ficava mais curiosa em relação a Alexandre. Suas mensagens eram, em sua maioria, manifestações contrárias ao machismo e outros preconceitos, estereótipos e opressões.

Após checar seu perfil por mais alguns minutos, cansou-se e foi até o próximo da lista: Henrique Martins.

13 de novembro de 2010

8 anos, 8 meses e 7 dias

"Churrasco dos Hoegen"

A mensagem chegou no correio eletrônico de todos os amigos e familiares da família Hoegen com três dias de antecedência. Havia chegado o momento.

Não era muito comum o Senhora Nina Hoegen abrir a sua residência para uma confraternização daquelas. Mas sempre que o fazia, todos os convidados saíam satisfeitos e alegres.

A maioria das confraternizações que faziam não tinha motivo algum. Mas dessa vez, havia um motivo. Um bom motivo.

Após quatro anos vivendo no Rio de Janeiro, eles partiriam para outra cidade. Alisson, o patriarca da casa, como Segundo-Sargento do Exército, fora transferido para Santa Catarina. Portanto, eles deveriam abandonar as raízes e boas memórias que deixaram lá e viver em outro lugar.

Nicole Martins ficou desolada quando soube da notícia.

A garota de catorze anos chegou a chorar em seu quarto ao saber que a única amiga que tinha na escola, Ana Laura, a deixaria de vez, para outra cidade. E, possivelmente, nunca mais se veriam de novo.

Ao saber do churrasco de despedida, implorou para sua mãe deixá-la ir ver a sua amiga pela última vez. Joana estava resistente quanto aquilo. Particularmente, ela não estava interessada em ir naquele evento.

Mas sua filha sabia convencer a mãe. A menina de pele bem escura fez o possível para agradá-la. Lavou a louça, varreu a casa, limpou os móveis, ajudou na cozinha, deixou o banheiro impecável e jogou o lixo fora. Tudo da melhor forma possível para que Joana soubesse recompensar depois.

E ela soube. No dia do churrasco, Joana se arrumou e levou Nicole e seus outros dois filhos para o evento.

Ao chegar lá, a garota de pele branca e cabelos loiros escuros, herdados do pai, e olhos castanhos, vindos de sua mãe, recepcionara a família com o sorriso mais sincero e alegre do mundo. Assim como havia aprendido.

As mães das meninas já se conheciam devido às reuniões escolares de pais que frequentavam, mas nunca tiveram um diálogo de mais de cinco minutos. Todavia, elas também se cumprimentaram. Quando perceberam, seus filhos já estavam fora do campo de visão das duas.

Apesar de aquilo ser uma despedida, Ana Laura não queria um clima triste em sua casa. Logo que os convidados chegaram, ela os chamou para o interior da casa, na sala de estar, e apanhou o material necessário para que iniciassem um jogo muito apreciado por todos, apesar de ela mesma ter dificuldade.

— Você sabe jogar ONE? — O pequeno Henry, de apenas doze anos, perguntou para a menina, com os olhos brilhando ao ver o baralho de cartas metade vermelhas, metade pretas, na mão da anfitriã.

— Sei sim! — Ela respondeu, pondo a mão na cintura e empinando o nariz. A menina se sentou no chão, apoiando suas costas no sofá, em cima de um grande tapete de veludo e fez um sinal para que os outros fizessem o mesmo.

O garoto de cabelos crespos lhe lançou um olhar travesso e desafiador. Ele se sentou junto com Nicole e mais três crianças, inclusive Astrid, a filha mais nova do casal anfitrião, de onze anos.

As cartas foram distribuídas e o jogo teve seu início.

— Não, Ana Laura! — Micaela Pinheiro, uma menina de cabelos cacheados, exclamou, com as sobrancelhas arqueadas, assim que a irmã de Astrid fez sua jogada — Você só pode descartar se a sua carta for da mesma cor ou do mesmo número que a última que jogaram!

Todos do grupo se viraram para a menina que, engolindo a saliva, recolheu o cartão e o pôs novamente junto com o resto.

"E agora?" Ela pensava, aflita "Por que fui inventar de jogar esse jogo?"

Aquele montante de números e cores pareciam rabiscos sem sentido algum para ela. Sua visão ficava turva. Engoliu em seco. Olhou novamente a carta que foi descartada mais recentemente.

Um sete verde.

Estreitou as pálpebras e olhou de novo para o que tinha em mãos. Não havia verde em suas mãos. Mas estava certa de que havia uma carta com o mesmo número. Pegou-a e a lançou no centro.

Ela lançou a carta um da cor vermelha.

— Um vermelho? — Henrique indagou, com a voz alta demais. Em seguida, deu uma gargalhada histérica que fez todos voltarem o olhar para ele, assustados com o escândalo.

Ana Laura ficou com as bochechas de seu rosto coradas.

— O que houve, gente? Fiz algo errado? — Ela perguntou, fazendo um bico.

— Você é muito ruim, Laura! Caramba! — O garotinho zombou, fazendo um bico.

— E daí? — A pequena Astrid o indagou, levantando a sobrancelha esquerda e fuzilando o garoto com seus grandes olhos azuis — Ela é boa em muitas outras coisas!

Astrid sempre foi boa em elevar a autoestima dos outros.

Enquanto discutiam, Nicole sentiu um cheiro vindo do outro canto da sala. Algo doce, frio e que ela gostava muito: sorvete.

— Gente, olha! — Ela virou sua cabeça em direção ao pote do doce que estava sendo distribuído para os convidados pela anfitriã — Tem sorvete ali, ó!

O jogo foi interrompido. Imediatamente, os pré-adolescentes largaram suas cartas no chão e correram até Nina Hoegen para pegar um pouco da sobremesa.

A criança gorda de pele negra, bem escura, foi uma das primeiras a pegar uma porção do doce gelado e logo se sentou no chão novamente para retomar a partida de cartas.

— Ai, Nicole! — O pequeno Henrique veio logo atrás, com seu copo contendo o mesmo conteúdo. Ao avistar sua irmã fazendo mesmo, lançou-lhe um olhar acusador com as sobrancelhas bem arqueadas e um tom de voz debochado — Vou contar pra mamãe que você tá comendo sorvete de novo hoje!

— E qual o problema? — Ana Laura perguntou.

— Ela vai engordar e ficar que nem a Taís! — O garoto se virou para a loira, exibindo um sorriso maldoso.

Ana Laura encarou sua amiga imediatamente, que ficara calada com o pronunciamento.

— Não liga pra ele, Nico! — Ela disse, segurando nos punhos da garota, chamando-a pelo apelido na tentativa de elevar sua moral — Ele não sabe do que tá falando!

Mas a garota não se convencera. Afinal, tinha na sua mente que seu irmão estava certo. Não podia engordar mais do que já estava. Como ficaria sua imagem para os outros? Ninguém ia gostar dela sendo gorda.

— Nicole! — Ouviu sua mãe chamá-la pelas suas costas com uma voz exclamativa — Você já comeu sorvete quando veio!

Ao se aproximar da criança, a mulher tomou o copo de sorvete de suas mãos e o levou consigo. Ela tocou no ombro da criança e chegou seus lábios bem próximos a sua orelha.

— Quer ficar inchada igual a sua prima Taís, é? — Ela sussurrou e se afastou um pouco, encarando os grandes olhos escuros e tristes da menina, que balançou a cabeça, em negativa — Pois bem...

Joana caminhou para fora da sala, deixando as crianças sozinhas para brincar, novamente. Ao avistar o primeiro cesto de lixo, ela jogou o copo com a sobremesa calórica.

Com a mandíbula ligeiramente caída, Ana Laura não se conformava com a cena que via. Esperou a mulher ficar longe da visão deles para chamar Nicole em um canto e, então, dividir o seu copo de sorvete com ela.

Às oito horas da noite, após uma hora de viagem no ônibus, dez minutos de caminhada, tendo o desprazer de ouvir assovios direcionados a ela de um adolescente qualquer na rua, Nicole chegou em casa.

Seu vestido florido já não estava o mesmo de quando saiu. Estava mais empoeirado com o estado precário do ônibus que precisou pegar para voltar para casa. E também tinha um pouco mais de umidade, já que a garota transpirava muito com o calor do transporte público que não possuía um ar-condicionado.

Levou um susto quando observou, estacionado no quintal, um carro que nunca vira na vida. Não era luxuoso, mas parecia confortável. Logo, imaginou quem seria o seu dono.

Passou pela varanda da residência e entrou na sala, finalmente.

— Filha — Sua mãe foi a primeira a notar a sua presença no recinto, ela falou da cozinha, que era no estilo americana — Como foi seu dia?

— Foi ótimo, mãe — Ela disse, caminhando direto para o seu quarto. Precisava descansar.

Sobre o sofá, sentados de frente para a televisão, estavam Rayane, Henrique e Bernardo.

Henrique nem virou sua cabeça em direção a irmã quando esta chegou. Permaneceu com os olhares fixos no notebook em seu colo, com os fones de ouvido em suas orelhas.

"Nossa, que voz é essa da Andressa" ele pensava, enquanto ouvia um trecho de uma música que Dêssa gravara e postara no Yourtube.

Rayane Martins, a filha caçula da família, de catorze anos, também não deu a mínima para a chegada da mais velha. Continuava com seu celular, em uma conversa empolgante com suas amigas de escola pelo aplicativo de mensagens.

Lavynia: Migs, o boy acabou de me chamar pra sair de novo

Ray: Mentira, cara! Sério?

Lavynia: Pois é, querida.

Ray: Ai, que bom, migs. E o que foi que vc disse?

Lavynia: Ah, eu não respondi, né. Vou esperar depois de amanhã pra responder. Falo que tava ocupada...

Ray: Ah, sim! Tá certo. Mostra que tá desinteressada mesmo. Ele vai comer na tua mão hahaha

Lavynia: Será, ray? Ele tem aquela vagabunda da ex dele que eu tenho certeza que continua atrás do meu homem

Ray: Liga não, Lah! Você é mil vezes mais bonita que aquela lá

Lavynia: Ai, obrigada, flor! Mas seria tão bom ter aquela vadia longe

Ray: Ah, isso é, né hahaha

Ray: Mas me diz, o que seus pais dizem sobre isso?

Lavynia: Ah, eles são super de boa. O Enzo é um cara bom, trabalhador e eu tenho certeza que vai querer me pedir pra namorar aqui em casa.

Lavynia: Mas e vc, migs? Como que vai o teu boy?

Ray: Que boy, querida?

Lavynia: Ué? E aquele cara que ficou te olhando no intervalo?

Ray: O Rick? Tá doido que vou ficar com aquele crianção. Meninos da nossa idade são tudo um bando de melequento... Sem paciência.

Lavynia: Ai, é verdade. Tenho um ranço que, olha...

Lavynia: Mas fica triste não que, cedo ou tarde, vai aparecer um cara pra ti

Ray: Ah, obrigada, migs. Espero mesmo. Essa vida de solteirona não tá dando mais pra mim... Vejo vocês tudo namorando e eu aqui, com teia de aranha na boca...

Lavynia: GRITO

Do outro lado do sofá, Bernardo era o único que realmente estava interessado na programação que passava na TV que, no caso, era um noticiário.

Ao ver que Nicole chegara, o homem de pele escura, cabeça raspada e músculos bem desenvolvidos, acompanhou, apenas com seus olhos pretos, o caminhar da filha até seus aposentos.

Lembrara-se da conversa que teve, horas atrás, com uma das líderes da igreja que frequentava.

O templo da Igreja da Fonte era situado em uma região bastante movimentada da cidade do Rio de Janeiro. Apesar de ter sido construída há mais de sessenta anos, foi há cinco anos que aquela construção realmente se mostrou influente no lugar.

Uma das grandes causas desse fato se deu pela ascensão de Rose Batista e seu marido como pastores da igreja. Ambos foram para lá levando uma visão do Evangelho que nem sempre era difundido pelas outras instituições.

Com paciência e sabedoria, eles conseguiram levar aos outros pastores, entre outras pessoas, o pensamento de que os cristãos devem ser porta-voz da Palavra de Deus. De que todos eles são responsáveis por falar de Cristo para as outras pessoas. Não com o propósito de tornar a igreja mais cheia. Mas em ajudar a somar, com mais uma alma, o Reino de Deus.

Além disso, o casal, claramente usado pelo Espírito Santo, foi usado para difundir a ideia de que, para falarmos de Deus, é preciso amar o outro e, de forma alguma, fazer seleção de pessoas.

"Não há alma nenhuma no mundo que não precise de Cristo. Nós, cristãos, temos a missão de levar essa mensagem e acolher, com compaixão e amor, as pessoas, independente do pecado!" Disse a mulher, em uma de suas pregações.

Eram três horas da tarde e Rose, que já era aposentada e, por isso, dedicava-se exclusivamente a pastorear, estava em seu gabinete tendo uma conversa com o pai de Nicole.

— Olha, Senhor Bernardo, seria um prazer para mim tê-los em nossa igreja — A mulher de pele negra escura e cabelos crespos disse, ajeitando seus óculos, com um sorriso de leve — Colocou em seu currículo que cursou Teologia em uma faculdade muito boa, escreveu dois livros espirituais, um sobre finanças e outro sobre relacionamentos na perspectiva cristã, pregou em diversos locais e mais uma série de coisas que realmente são incríveis, mas...

— Sim, sim! Muito obrigado! — Ele disse, gesticulando com a mão ao interromper a pastora — E estou caminhando para publicar meu próximo livro sobre família, em que eu conto minha experiência e uma série de coisas!

— Ah, claro! Mas como eu ia dizendo? Ah, sim... — Ela quase se perdeu em seu raciocínio, mas logo o retomou — Senhor Bernardo, sinceramente, isso aqui não é uma empresa, daquelas que querem lucros. Por isso, não vai ser um currículo cheio de coisas que vai nos convencer de que pode ser pastor daqui. Acho muito boa a sua vontade de pastorear nessa igreja. No entanto, após orar muito, Deus confirmou, em meu coração, que não é esse o desejo Dele.

O homem arqueou as sobrancelhas e, por um segundo, ficou boquiaberto com aquela resposta. Não conseguia acreditar. Logo ele, um seminarista que já participou de diversos projetos, não era capaz de liderar um ministério daquela igreja?

— Não entendi — ele inclinou a cabeça e franziu o cenho. Rose deu um suspiro, já percebendo que aquela conversa se alongaria e ela teria trabalho — Então você tá me dizendo que eu não tenho vocação pra ser pastor dessa igreja?

— Não foi o que falei, senhor Bernardo.

— Disse que Deus falou que não era pra eu ser pastor! Se isso não quer dizer que pastorear não é a minha vocação, o que é?

— Quer dizer que não é esse o momento! Fique, assista a mais dos nossos cultos, participe de nossos cursos de maturidade cristã e venha nas escolas bíblicas. Participe de nossos projetos. Quem sabe um dia?

Ele negava com a cabeça, inconformado. Comprimia os lábios e cerrava os punhos.

— Posso fazer uma pergunta?

— Pois não.

— Seu marido sabe que tá tomando essa decisão? — Ele perguntou, levando a mão no queixo e a fuzilando com os olhos. No entanto, a expressão de Rose manteve a mesma, apesar de ter se surpreendido negativamente com a reação do homem.

— Primeiramente, não fui eu, sozinha, que decidi isso. Eu e os outros seis pastores da igreja, incluindo meu marido, decidimos, por unanimidade, que o senhor não deve liderar a igreja com a gente. E em segundo lugar, eu espero, de coração, que o senhor repense bem sobre seus conceitos! Há muito preconceito e egocentrismo em suas falas e em seus escritos, senhor Bernardo. Estaremos aqui para ajudá-lo a desconstruir esses pensamentos, se assim...

— Quer saber? — Ele a interrompeu novamente. Dessa vez, conseguiu fazê-la mudar de expressão. Com a mão direita, fechou os punhos e socou a mesa de madeira da pastora e se levantou para ir embora — Chega! Quando seu marido voltar de viagem, eu falo com ele dessa decisão sem sentido!

Rose engoliu em seco. Suas pálpebras se abriram consideravelmente e sua mandíbula deu uma leve caída. Após o homem bater a porta com arrogância, a mulher suspirou, balançando a cabeça na horizontal, incrédula.

— Que Deus ainda faça um milagre na vida desse homem!

Ao se dirigir ao seu quarto, Nicole só queria paz. Precisava tirar aquela roupa suada de seu corpo, tomar um banho e se jogar na cama, para estar pronta para o dia seguinte.

Antes de abrir a porta, surpreendeu-se pelo fato de a luz estar ligada. Quando o fez, soube o porquê.

Alexandre Galdino estava sentado em sua cama boxe, vestindo uma roupa casual, com um violão em mãos e um computador ao lado.

— Mozão! — Ele se virou para ela e exibiu um sorriso assim que percebeu sua presença.

Nicole ergueu as sobrancelhas no primeiro instante. Não esperava por ele ali. Suspirou e o cumprimentou. Sentiu-se feliz por poder contar com a presença do noivo, que era alguém que amava muito.

No entanto, não conseguia entender um motivo que explicasse o porquê de se sentir tão pior que quando era solteira.

— Tudo bom, chuchuzinho? — Ela falou, aproximando-se dele e lhe dando um beijo rápido.

— Tudo ótimo! Só hoje, arrumei um patrocinador, fui convidado para fazer a abertura de um show muito chique e me chamaram para participar em uma festa!

— Ah, sério? — Ela disse, sentando-se na cama ao lado dele, prestando atenção no que ele diz com euforia — Que bom, amor! Fico feliz por você.

Ela esperou Alexandre perguntar como ela estava. Como se passou um minuto e ele não o fez, ela mesma falou.

— Meu dia foi muito cheio! — Desabafou, finalmente, e jogou seu corpo na cama — Você acredita que um garoto assoviou pra mim na rua?

— Quê? — Ele elevou uma das sobrancelhas, visivelmente indignado.

— Pois é! Eu tava vindo pra cá quando aconteceu. Sorte a minha que não aconteceu mais nada, mas fiquei desconfortável...

— Que absurdo! Um cara desses tinha que sofrer as consequências! — Ele exclamou, unindo as sobrancelhas.

— Ai, Alê... Mas vamos tentar não falar sobre isso, por favor? Já passou! — Ela falou, pondo a mão na testa.

— Tá bem, amor — Ele a observou novamente, com carinho. Seus olhos passearam por todo o corpo da mulher. Alexandre a admirava. Naquela posição, ele apenas a imaginava sem roupa e gostava muito do que sua mente elaborava. Mas então, um pensamento lhe ocorreu que o deixou indignado — Nico, posso te falar uma coisa?

— Diga.

— Não gosto desse teu vestido.

Ela o fitou imediatamente e se sentou novamente, encarando-a com dúvida.

— Por quê? — Falou, apoiando o queixo na mão.

— Aliás, não gosto dessa sua roupa. Você é uma negra tão linda, sabe? A cada dia que passa você tá mais bonita. Mas, veja, essas suas roupas não te valorizam. São justas demais. Complicadas demais. Teu brinco é muito grande. E esse batom é bastante chamativo.

— Nossa, Alê... Obrigada. Mas eu gosto dessas roupas. Comprei esse vestido semana passada — respondeu, sendo sincera — Será que engordei e nem percebi? Deus, eu tenho que emagrecer pra caber aqui de novo...

Não era das vestimentas que Nicole não gostava. Pelo contrário. Ela sempre se sentiu ela mesma trajando roupas daquele tipo. O que ela não suportava era do seu próprio corpo cheio de imperfeições. E a si mesma.

— É, pois é...

— Acho que eu vou pra academia fazer musculação e algum aeróbico. Que acha?

— Ah, pode ser.

— Mas... — Ela se virou e começou a fitar a parede, pensando em uma situação para aquele "problema" — Como vou pra academia se chego morta do trabalho? Não tenho tempo pra mais nada, Alê! E agora?

— Ah, benzinho... Também queria falar contigo sobre isso. — Ele contou, procurando encontrar as palavras certas para dizer aquilo.

— O quê?

— Eu acho que você tá trabalhando demais, sabe? Eu sei que você tá na faculdade e quer ter a experiência para entrar bem no mercado de trabalho, mas, se eu fosse você, largaria esse estágio. Tá ruim demais lá pra você.

— Não, Alê! — Nicole balançou a cabeça, em negativa, e franziu o cenho para ele — Eu não posso largar esse emprego. Como eu vou arrumar outro?

— Então... Você não precisa arrumar outro com tanta pressa assim. Se achar melhor, pode ficar em um trabalho mais simples mesmo. Um que, apesar de ganhar menos, não tem problema. Eu consigo segurar as pontas das nossas futuras despesas.

— Ai, Alê... Não sei. Tenho que pensar. Até porque, meu contrato termina no final desse ano.

— Então, pronto. Final desse ano você pode sair de lá.

— Bem, isso é, né. Mas...

— Pensa bem. Eu não gosto de te ver assim tão cansada... — Ele falou e lhe deu um beijo, tentando parecer romântico.

— Pensarei. Mas, agora, responde uma coisa... Você realmente acha que eu devo mudar a forma que me aparento? Por que quer me mudar agora?

— Mudar? Não, calma aí. Você não entendeu — ele disse, após pensar um pouco a respeito — Acontece que você é tão bonita naturalmente, sem maquiagens nem nada. E essas coisas, sei lá... São desconfortáveis. Você precisa de conforto, sabe?

— Ah, sei bem... — Ela suspirou. Respirou fundo.

Sua vontade era de iniciar uma discussão longa ali. Estava exausta da forma como se sentia com Alexandre. De forma bem sutil, ele conseguia a pôr para baixo com atitudes como aquela. Criticando seu corpo, a forma como se vestia, seu trabalho — que, apesar dos momentos difíceis, estava sendo uma boa experiência —, e até mesmo quando ele insinuava que ela não era inteligente.

Preferiu relevar. Afinal, seu amor por Alexandre era indiscutível. Maior até que o seu amor por si mesma. Aliás, não era muito difícil encontrar alguém que Nicole amasse mais que ela mesma.

"Alexandre é um bom rapaz. É um homem que preza pela igualdade de gênero e quer um mundo melhor" as pessoas disseram. Inclusive sua mãe, que nem era favorável a essa militância.

O relacionamento entre eles não poderia ser acabado por coisas assim. Eles já tinham dois anos de namoro. Iria jogar toda essa história no lixo? E depois? Com quem ela iria ficar?

"Pare de ficar vendo problema em tudo, Nicole!" Ela pensava.

Nicole deu mais um sorriso para o noivo e lhe deu um outro beijo. Aninharam-se por um tempo, mas logo depois a jovem se viu na necessidade de ir tomar um banho para descansar, finalmente.

Alexandre acompanhou sua futura esposa ir para fora do quarto com o olhar.

"Não vejo a hora de poder desfrutar esse corpo" pensava ele "Ela poderia ter um pouco mais de peito, mas mesmo assim, deve ser uma máquina na cama"

O Dia

17h12m

Astrid se olhou no espelho de sua casa antes de sair.

Seu olhar era neutro. Não tinha expressão alguma. Apenas encarava seu reflexo enquanto escutava os batimentos acelerados de seu coração.

Ouviu a porta de seu quarto bater. Reconheceu a voz de Nina Hoegen, sua mãe.

— Astrid, seu amigo já está aí — A mulher falou, do outro lado.

— Obrigada, mãe. Já estou indo — Ela disse, sem sair do lugar.

Respirou fundo. Observou novamente sua aparência. Astrid não costumava utilizar muita maquiagem para sair. Muito menos naquela ocasião. Apenas passou um batom cor de rosa.

Seu desejo mesmo era utilizar um vestido preto, mas não seria conveniente aquela cor em um casamento. Portanto, optou por um azul.

Definitivamente, Astrid não estava em seu melhor dia. Algo estava errado e ela não conseguia pensar naquilo.

—Astrid? — Ela ouviu a voz de Vinícius e três batidinhas na porta. Aquilo a trouxe de volta para a realidade.

— Víni — Com os olhos arregalados, virou-se para a entrada de seu quarto — Pode entrar.

O rapaz apareceu em seu quarto com blusa social, calça jeans e sapato. A roupa era nova, por sinal. Ela exibiu um sorriso leve ao vê-lo. Afinal, apreciava a companhia de Vinícius.

— E aí? Como você está? — Ele perguntou, empolgado ao vê-la. Aproximou-se da jovem para lhe cumprimentar com um beijo na bochecha, mas se surpreendeu quando a garota a puxou para um abraço. Um abraço forte e demorado.

Enquanto era envolvida pelos braços de Vinícius, a jovem fechava os olhos e pensava naquela situação que lhe incomodava demasiadamente.

Ao se afastarem, o rapaz pode ver, no olhar dela, o desespero.

— Víni... Tem alguma coisa muito errada com esse caso!

— Como assim? — Ele inclinou a cabeça e levantou uma das sobrancelhas — Não já foi solucionado?

— Solucionado? — Ela se levantou e ficou dando voltas pelo seu quarto — Você não ficou sabendo direito da história, né? Pois tem muita coisa errada nela e eu não imaginava que Daniela fosse capaz de fazer o que fez...

— Hum, sei... Então, você quer se envolver nessa investigação?

— Víni... — Ela parou por um momento, encarando o jovem — Ele é meu amigo. Eu preciso me envolver. Eu não vou deixá-lo na mão. Eu tenho que ajudá-lo. Eu faria o mesmo por você.

Ele comprimiu os lábios e cerrou os olhos.

— Astrid, eu te admiro, sabe? — Ele confessou, deixando a moça ligeiramente desestabilizada — Mas toma cuidado. Vejo que você carrega muito peso de outras pessoas nas suas costas. Uma hora você pode não suportar tantos.

A garota engoliu em seco e se sentou novamente em sua cama. Suspirou.

— Enquanto eu estiver viva, Víni, eu vou fazer o que estiver ao meu alcance para ajudar as pessoas — Ela falou, após um tempo em silêncio — Inclusive, provar para todos e para mim mesma que o meu amigo não é nenhum assassino!

— Está bem... — O jovem confirmou, levantando-se e ficando de frente para ela e lhe estendendo a mão — Se é isso o que quer, estou aqui para te ajudar a carregar esse peso todo.

Ela deu um leve sorriso e assentiu.

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