30: Juízo Final
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É o juízo final
A história do bem e do mal
Quero ter olhos pra ver
A maldade desaparecer
-Alcione-
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Demorou cerca de trinta minutos para Louise chegar na tal casa. Estacionou a viatura policial no local apropriado, acompanhada de Paula e Ulisses. Atrás dela, chegaram também Astrid e Vinícius, seus fiéis amigos.
Após discar os números no interfone, aguardou alguns segundos para uma mulher, a mesma que a atendeu dias atrás, se pronunciar.
— Alô? — Disse a senhora — Casa da família Lima, em que posso ajudar?
— Aqui é da Polícia. Estamos atrás do senhor João Victor Lima Aguiar. Por gentileza, abra a porta!
— O João? Não tenho autorização para deixá-la entrar.
— Escute aqui — disse ela, impaciente — você vai abrir essa porta ou a arrombaremos. Não ouviu? É da Polícia!
— É que na verdade ele não está aqui, senhora.
— Como é?
— É. Ele... Saiu. Não disse onde foi.
— Quando ele saiu?
— Hoje de manhã.
Louise uniu bem as sobrancelhas. Era como se, a cada minuto que passava, seu sangue efervescia.
— Se você não abrir essa porta, eu juro que...
Imediatamente, o portão foi aberto automaticamente.
A detetive suspirou. Sem perder tempo, os cinco detetives adentraram a enorme mansão que existia naquele nobre bairro do Rio de Janeiro.
A entrada para o interior da casa se abrira pouco antes de eles se aproximarem. A mesma mulher, a empregada doméstica, os recebia gentilmente.
— Vocês me desculpem. Ele falou pra eu não dar informações.
— Onde ele está? — Louise questionou.
— Ele tá lá no quarto dele faz duas horas — Ela estava com os braços e pernas trêmulos, não conseguia deixar de expressar seu nervosismo — Se trancou de lá e não sai desde que uma amiga dele foi embora.
— Ai, meu Deus! — Vinícius levou as mãos a boca, virou seu olhar para Astrid e, juntos, os dois correram até o quarto do rapaz.
— Como é? — Paula inclinou a cabeça.
— Ai, por que eu tô falando isso? — Ela disse, voltando seus olhos para o chão — Veio aqui, ainda pouco, uma moça alta e loira, vestida de preto e jaqueta jeans, com uma mala de viagens nas mãos. Os dois entraram no quarto. Ela saiu, mas ele continuou lá. Não lembro o nome dela... Não sei se era Amanda, Alice, Aline... — em um instante, lembrou-se — Ah! Analice! Isso! Era Analice!
— Analice? Mas como a...
De repente, Louise, Paula e Ulisses ouviram o grito de Astrid vindo do segundo andar, acompanhado de batidas fortes de algo em madeira.
— Gente! Venham aqui! — Astrid dizia.
Apressados, todos se reuniram na frente da porta do quarto do apresentador de TV. Vinícius estava com as sobrancelhas unidas e dentes trincados, mas não perderia o fôlego. Bufou.
— Abra a porta, João Victor! — Paula dizia.
— Não adianta — O universitário disse e, tomando um impulso, jogou seu corpo contra a porta de madeira, mas, apesar do barulho, não teve efeito. Cansado, afastou-se do lugar.
— E cadê a chave dessa porta? — Ulisses perguntava.
— Não tem. Ela fecha por dentro — Astrid explicou.
— Dá licença! — Vinícius disse. Dessa vez, segurava uma marreta que encontrara em um dos quartos abertos ao lado. Todo mundo acatou ao pedido e se afastou dali. Ele precisava usar toda a sua determinação e raiva para aquilo. Em um movimento único, acertou a maçaneta da porta e a destrancou.
Ele suspirou por uns instantes. Conseguiu. Deu um leve sorriso por isso.
Entrando na sua frente, Astrid se aproximou da porta e a empurrou delicadamente. No entanto, não estava preparada para o que veria a seguir.
O quarto do apresentador estava uma bagunça. Portas dos armários abertas. Chão coberto por roupas casuais, formais, perucas, maquiagens, cuecas, entre outras coisas. A cama também era cheia de objetos aleatórios. Era como se um furacão tivesse passado por ali.
Todavia, com a coluna encostada na parte de madeira da cama, com a cabeça sobre o colchão, trajando uma calça preta confortável e uma camiseta vermelha, essa quase tão escura quanto o líquido escarlate que transbordava de sua testa e sujava o lençol. Seus braços caídos tocavam o chão. Sua mão direita, entretanto, tocava também o revólver responsável por aquele estouro em seu crânio
João Victor estava morto.
Ao avistar o corpo sem vida do rapaz, a empregada doméstica começou a lacrimejar. Entrou em desespero.
— Ó, não! Não pode ser! — Ela disse.
— Astrid, acalme ela — A inspetora pediu a jovem. Louise também se espantou com o que viu, mas não podia deixar as coisas fugirem de seu controle.
Imediatamente, a loira foi até a mulher, enquanto os outros se aproximaram, cuidadosamente, da cena do crime. Paula logo apanhou seu celular do bolso e começou a fotografar tudo o que via.
— Senhora Cláudia? — Louise a chamou, sem tirar os olhos do cadáver — Em qual carro estava a tal amiga de João? A Analice?
— Ai, eu não entendo bem de modelos de carros... Era um grandinho, branco
— Uli, faz um favor? — Ela perguntou ao seu assistente — Liga pro delegado. Diz a ele que é pra bloquear todas as vias das proximidades e pararem todo o carro branco que encontrar. Ela não deve ter ido pra muito longe. E manda chamar mais uma viatura pra cá.
— Tá ok, mas... Pra quê outra viatura? Não podemos começar agora? Só a gente?
— A viatura é pra vocês dois — Ela se virou para Paula também — Façam o trabalho de investigação aqui. Enquanto isso, eu vou atrás dessa bandida!
— Eu vou contigo, Lou — Vinícius falou, prontamente.
— Não, Víni! É perigoso demais. Mas, se quiserem ajudar... — Ela se virou para a loira — Astrid, que tal se a gente fosse na sua casa pegar a sua moto?
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Em poucos minutos, após o comunicado feito pela vencedora do reality, Ana Laura, em suas redes sociais, a respeito do falecimento de João Victor Lima, não havia assunto mais comentado. Em seguida, todos os canais de TV, principalmente a TeleMil e os pais do artista, se propuseram a dar as notícias sobre o ocorrido, ainda sem muitas informações.
— E... Agora! — Disse o homem-câmera que estava a frente da mansão Lima, filmando a matéria que era exibida ao vivo para toda a população brasileira.
A repórter, uma mulher de cabelos curtos, tentava permanecer neutra após o grave acontecimento.
— Boa tarde, estamos aqui na casa de William e Helen Lima. Eles não estavam na residência na hora da morte, apenas a governanta, dona Cláudia. Estamos aqui com a investigadora da Polícia Civil, Paula Borges, que tem mais informações sobre o caso — A câmera, em seguida, captou a detetive ainda fragilizada — Paula, o que a Polícia sabe até agora?
— Bom, já sabemos que foi um assassinato. Já havíamos encerrado as nossas investigações sobre a morte do cantor Henrique Martins e viemos aqui porque a conclusão da Polícia é que todas as provas indicavam para ele. Ele matou Henrique. E quando viu que não haveria escapatória da Polícia, preferiu morrer. Porém, outra pessoa fez isso para ele.
Imediatamente, a testa da repórter franziu. Sua curiosidade começou a aguçar ainda mais. Não assimilou corretamente o que a detetive dissera. Como era possível?
— Poderia explicar melhor? Como assim ele foi o assassino do Henrique? E por que iriam querer matá-lo? Vingança?
— Como já sabemos, Henrique estava dirigindo o carro que atropelou Mariana Madalena. O que viemos saber depois, porém, é que ele estava acompanhado de mais alguém.
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Vinícius abriu a porta do carona dando de cara com as garrafas de vodca no chão. Além delas, avistou outros detalhes interessantes que preferiu analisá-los em silêncio e com cautela.
— Que está vendo? — Perguntou a loira.
— Cinco, seis, sete! — Ele falou, agachando-se para apanhar um objeto que, no momento, Astrid foi incapaz de deduzir o que era até vê-lo nos dedos de seu amigo — Sete cacos de vidro.
— Vidro? Acha mesmo? — A jovem loira se aproximou, semicerrando os olhos para analisar o material — Está mais para uma lente...
— Vocês têm alguma sacola ou algo parecido pra eu guardar esse material?
Rapidamente, Nicole tirou de sua bolsa uma bolsa de plástico e a entregou para o colega que logo fez questão de guardar o material.
— Qual foi a última vez que Henrique usou esse carro mesmo? — Astrid perguntou, mais para si mesma do que para os outros — Ah, sim. Foi na madrugada de quinta-feira mesmo, certo?
— Sim. Foi! — Ele exclamou. Certamente aquela pista seria a chave para a resolução do crime. Permaneceu pensando ainda por alguns segundos, até voltar a falar com sua amiga — Astrid, o Henry nunca usou óculos, né?
— Não...
— Isso significa que alguém que usa óculos, ou alguma lente, entrou nesse carro e quebrou essas lentes aqui. Confere?
— Céus! — Ela levou as mãos a boca — Isso faz sentido! A batida no carro fez o óculos da pessoa quebrar. A garrafa de vodca e essas lentes... É óbvio! Ele não estava sozinho quando matou a Mariana! Ele estava com... Com...
— Com a pessoa que, até a morte dela, ostentava seus óculos de cor azul escura.
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— Sejam muito bem-vindos ao estúdio de filmagens do Estrela do Rock! O reality show musical mais promissor dos últimos tempos! — A voz conhecida do carismático apresentador, João Victor, soou por todo o auditório espaçoso com, aproximadamente, duzentas pessoas e, pelo menos, cem cadeiras vagas. Fora os homens responsáveis por gravar aquelas cenas que, posteriormente, serão exibidas em rede nacional.
O jovem, conhecido na emissora por fazer papéis muito famosos desde criança, utilizava roupas caras, como de costume. Ao abrir um sorriso, suas bochechas quase que tocavam os óculos azuis-escuros que utilizava quase sempre, além de conseguir empolgar, com facilidade, todos os presentes. Afinal, não era à toa que fora chamado para apresentar o programa.
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— Inspetora Louise Ferguson — Ela disse, apresentando-lhe seu distintivo — Foi lhe dada a ordem de comparecer à Delegacia hoje. Mas o senhor não apareceu.
— Entrem — Ele falou, deixando a porta aberta.
Após a rápida análise que os policiais fizeram do local, eles logo voltaram a atenção para o próprio apresentador.
João Victor vestia um roupão branco, volumoso e de veludo. Não dava para dizer que estava nu, mas apenas uma faixa amarrada em sua cintura prendia suas vestimentas que eram largas nos braços e descia até os joelhos. Nem mesmo seus óculos, que sempre o acompanhavam, ele usava. Andava descalço.
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— E que, depois, nunca mais foi visto com ele! — Astrid completou, compreendendo, por fim, o caso — Céus! O João Victor! Ele mentiu! Ele estava com o Henrique no carro. Era cúmplice! Provavelmente também participou da ocultação do cadáver da Mariana! Víni, tá percebendo que ele é o nosso maior suspeito?
— Agora soma isso ao fato de que Henrique estava em crise. Os livros bíblicos, Astrid... Lembra também das conversas dele! Ele estava muito mal por ter matado a avó do seu futuro filho, e queria assumir seu erro e impedir que um inocente seja condenado. Ele ia confessar!
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— Faz tempo que a gente não se fala... Está arrependido do que fez?
Ele fitou o teto por um instante.
— De certa forma, sim. Muitas vezes, agi por impulso. Sofria pela negligência dos nossos pais e acabei entrando pra uma vida que nunca foi a que eu quis. Mas eu posso te garantir que não foram meus pais que me fizeram querer mudar. Eles ainda não têm mente disposta para compreender o que passamos pra tornar nosso mundo um lugar melhor.
— Você está no caminho certo, Henry! — Ana o confortou, olhando-o de relance — E o seu coração? Como está?
— Bem, eu... Eu tô muito mais confortável agora, admito. Eu preciso me tratar de verdade! E, bem... Assumir esse filho que agora me espera.
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— Imagine o desespero que um garoto mimado e com um futuro certo como o João estaria ao saber que poderia ser preso como cúmplice de assassinato! Pense só em como ficaria a cabeça dele só de cogitar a possibilidade de ter seu nome envolvido num caso polêmico como esse!
— Estaria perdido — Ela concluiu, com as mãos na cintura.
— É isso! O assassino do Henrique só poderia ser uma pessoa que esperou até o último instante para fazê-lo não confessar o crime. Uma pessoa que não é muito experiente com violência, já que tentou fazer vários ferimentos no corpo do Henry antes de efetivamente matá-lo. Uma pessoa em que ele tinha uma consideração para não o atacar de volta. Um crime que, certamente, foi cometido no impulso. No impulso de ver que sua vida estava a um passo de acabar. E que precisava agir rapidamente. Mas que, antes, ficou atrás de Henrique o tempo todo para não ter que tomar tal atitude.
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Henrique, após arrumar os últimos fios de seu cabelo para deixá-lo no estilo que desejava, saiu do banheiro, passou pelos corredores e desceu a escada que levava ao salão onde aconteceria a cerimônia.
Logo encontrou, no meio das pessoas, sua amiga Astrid, acompanhada de Vinícius e mais uma moça elegante e bonita que nunca vira na vida. Além de João Victor, Alexandre e Ana Laura.
— Então quer dizer que não é mais o Léo?
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— É... Desculpem, mas eu vou ir atrás da Andressa — Henrique informou, mexendo seus punhos descontroladamente.
— Henry! — João Victor o puxou — Ela ainda não chegou, lembra?
— Ah, é. Eu...
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— Quando e onde rolou essa conversa?
— Ela rolou assim que a Dêssa chegou. Lá para as dezenove horas. Fomos para a cabine dois, que era a cabine mais espaçosa onde nós, cantores, nos preparamos. Decidimos, de vez, cantar Hallelujah juntos. Fizemos um ensaio rápido e estabelecemos algumas condições. Logo, voltamos para o andar de baixo.
— E você voltou lá pra cima antes do casamento?
— Negativo!
— E mais alguém voltou? — Ele semicerrou as pálpebras e fez que não com a cabeça. Louise olhou para baixo e mudou a pergunta — Tinham quatro cabines para produção, certo? Para quê elas eram?
— A primeira cabine era só para a noiva. Era dedicado apenas para quando a Nicole fosse subir lá, após o casamento, para retocar a maquiagem e iniciar a sessão de fotos e vídeos. E, mais tarde, tomar um banho para retornar. A segunda era para nós, cantores, que seríamos os destaques, né. E para o João Victor, é claro. Por isso era a maior. A terceira, também grande, era para todos os padrinhos e a quarta para as madrinhas.
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— E você tem algum palpite de quem poderia ser o assassino dele?
— Sinceramente, senhora, não. Não faço ideia.
— Nem tem percebido ele ficar mais... Estranho? Ou feito coisas diferentes nos últimos dias?
— Bom... — Ela coçou a cabeça — Na noite que morreu a minha mãe, ele tava junto com o João, o apresentador. E ontem ele parecia um pouco mais colado na Ana Laura também.
— Sobre essa festa que ocorreu na noite do falecimento da sua mãe... O que aconteceu?
— Eu já tava brigada com o Henry. Só fui também porque era meio que obrigatório para os cantores se promoverem e tal. Todo mundo tava lá, inclusive ele. Pra falar a verdade, naquele dia ele parecia estar bem alegre... Talvez por causa da bebida.
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— Lembra da noite do crime? — Vinícius perguntou, fazendo os dois refletirem — A partir do momento que começou a festa, o Henry não ficou sozinho por um minuto. Ele sempre estava lá...
— Realmente, Víni! Todas as pistas apontam para o João. Ele poderia facilmente, após sair do camarim com os cantores, ter ido com Henrique para um canto, ter matado ele, e depois ter escondido o corpo no camarim da Nicole. Mas outra pessoa poderia ter feito a mesma coisa. Tinha que haver algo que nos indicasse que foi realmente ele!
Os pensamentos do jovem estavam acelerados. Seus olhos não miravam nada em específico. Com o indicador direito sobre a boca e as sobrancelhas unidas, ele forçava seus neurônios para achar as respostas daquele enigma.
— Víni, pensa bem! — Astrid semicerrou os olhos — Se o João Victor cometeu um assassinato no impulso, sabendo como ele é, você acha mesmo que ele iria se preocupar em forjar a cena no camarim da Nicole e tentar esconder provas?
— Hum... — Ele ficou pensativo — Realmente, não o imagino fazendo isso.
— E é aí que entra uma das nossas principais pistas: o bilhete que achamos com a Letícia! — Ela disse, fazendo o rapaz se virar para ela com os olhos arregalados — Ele pode até ter matado o Henrique, mas ele não seria capaz de fazer o que fez com o corpo para tentar despistar a Polícia — Astrid fez uma pausa, e os dois permaneceram em silêncio — E é isso!
— O Henry sabia que eu estava me formando em Direito — ele dizia — Era uma das poucas coisas que ele conhecia sobre mim. Sabia que eu poderia ajudá-lo na sua situação. E também conhecia a Daniela, que era policial! E lembra que ele sempre admirou a Polícia? Especialmente a Polícia Civil?
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— Ah, o Henry era um ótimo irmão... Divertido, inteligente, criativo... Quando criança, ele queria ser policial civil, acredita? Acho que até pouco tempo atrás ele ainda queria, antes de querer virar cantor — Nicole se perdia em seus pensamentos ao lembrar do irmão.
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— Não fazia sentido ele chamar a Letícia. Mas fazia sentido ele chamar a Daniela! Era a oportunidade perfeita para a Daniela forjar uma prova para tentar incriminar a Letícia! Afinal, ninguém poderia saber que a vítima tinha feito contato com ela. É isso!
— Porém, ela chegou lá poucos instantes depois de Henrique já ter sido morto! — Ele concluiu — Aí está a principal prova contra o João. Se fosse qualquer outro suspeito nosso, a Daniela certamente tomaria uma ação mais enérgica e procuraria prender a pessoa. Mas, como era o caso do nosso suspeito mais rico, ela viu a oportunidade perfeita para ganhar dinheiro!
— Mas... Quanto?
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— Trinta milhões de reais? — Vinícius falava para Louise, através da ligação que fazia para a mesma através do modo viva-voz do seu celular que estava anexado no seu carro enquanto dirigia.
— Ela disse também que estava com uma mala de viagem de tamanho pequeno, preta — Louise, do outro lado da linha, falou, utilizando o mesmo recurso com o telefone na viatura policial — Bandida! — Ela esbravejou — A gente precisa pegar ela, Víni!
— A Paula disse também que já tem toda uma equipe de inteligência pra tentar adivinhar pra onde ela estaria indo, mas ainda nada.
— Ela é inteligente. Não deixaria rastros. Muito menos nos arquivos da Polícia... — Louise se concentrava para se manter focada no trânsito e nos seus pensamentos para conseguir prender a criminosa.
Vinícius não chegou a terminar a conversa, repleta de comentários e expressões de seu nervosismo, quando percebeu que já era a hora de estacionar o carro e receber a outra pessoa que entraria ali.
— Louise, já cheguei já! Ela tá na porta de casa... — Ele disse, concentrado no trânsito. Cautelosamente, ele estacionou o veículo na margem da rua e abriu a porta ao seu lado.
— Víni! — Mesmo do outro lado da linha, Louise pode escutar e identificar claramente a voz de Nicole, que rapidamente entrou no carro portando, em suas mãos, uma caixa em forma de cubo devidamente lacrada — Eu me arrumei o mais rápido que eu pude.
— Nicole! — A policial falou, do outro lado da linha — Tá tudo bem?
— Louise? É... Sim. Estou... — A moça ainda parecia desnorteada. Seu nervosismo só piorou quando Vinícius voltou a movimentar o carro — Tô meio perdida ainda com isso. Tipo... A Daniela matou o João Victor, que matou o Henrique, que matou a Mariana?
— Basicamente. É uma longa história, mas agora precisamos da sua ajuda pra pegar ela! Víni, em quanto tempo você chega aqui?
— Catorze minutos.
— Tente se apressar! A Polícia colocou agora as primeiras viaturas nas vias. Já tem um helicóptero sobrevoando a Avenida das Governador Carlos Lacerda mas ela pode estar em qualquer lugar! Também contatei o aeroporto Santos Dumont e o Galeão. Mas não podemos contar que ela não vai escapar de avião por conta disso.
— Qual era o veículo que ela tava dirigindo? — Nicole perguntou.
— Um HB20 branco. Por quê?
— E sabemos alguma coisa se ela planejava sair do país?
— É a hipótese mais provável, mas ainda não temos certeza. Até porque, ela tá longe da fronteira ainda. Mas ela pode estar em qualquer lugar!
— Gente, peraí! — Louise falou, do outro lado da linha — É a Astrid aqui!
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No apartamento de Daniela, onde ainda vivia Andressa, Iago e Letícia, a estudante de Psicologia visava a estrada de longe, com os membros ainda trêmulos, segurando o telefone que chamava por Louise.
— Louise, oi! Então, eu tô com o perito da Polícia que enviaram pra cá. Bem, nós não achamos o celular dela, mas ele também não manda sinal então deve estar destruído. O notebook tava praticamente destruído, mas o perito da Polícia que veio aqui conseguiu restaurar o HD. Ele descobriu que ela tinha contatos com um criador de identidades falsas! Estou enviando agora o endereço pra você.
— Hum... Ah, é a dois minutos de onde eu estou. Ok, vou lá descobrir.
— Tem outra coisa! Conversei com o pessoal aqui... Eles falaram de duas vezes que ela precisou sair para fazer uma ligação... Pelo orelhão do condomínio!
— Quê? Como assim?
— Era tarde da noite. As meninas achavam que era porque o telefone dela estava estragado e ela dizia que precisava fazer um telefonema para um amigo que morava na França e, como lá o fuso horário era diferente, tinha que ir à noite para falar com ele. O Ivan acabou de checar as ligações e adivinha? Ela tem contato com gente da Bolívia! E disse que os encontraria. Não deu muitos detalhes.
— Bolívia? Hum... Uma viagem internacional... Ela não seria louca de ir de avião.
— Ônibus! — Astrid exclamou.
— Vou mandar mais algumas unidades irem até a Rodoviária imediatamente. Enquanto isso, vou checar por quem ela está se passando.
— Ok! E eu já estou a caminho também.
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Doze minutos após buscar a sua amiga, Vinícius se deparou com o trânsito levemente congestionado devido ao bloqueio da via causado pela Polícia Militar existente a alguns quilômetros dali.
— Pode ser aqui? — Ele questionou.
— É. Acho que sim.
Imediatamente, o jovem estacionou o carro no acostamento e Nicole saiu pelo outro lado do veículo portando a caixa que segurava em mãos. Abriu-a e retirou, lá de dentro, um drone.
— Faz um tempo que eu mexi nele, mas vamos ver... — Ela disse, enquanto posicionava o equipamento corretamente e utilizava os controles. Após alguns instantes, as hélices começaram a girar e ele já plainava no ar — Isso!
— Excelente, Nico! Agora vamos! — Ele falou, convidando-a para entrar no carro sem tirar os olhos da tela que exibia tudo o que a câmera do drone avistava.
Em seguida, o veículo voltou a se mover e, em poucos minutos, já parava novamente no engarrafamento.
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Vinte minutos foram suficientes para que todas as viaturas da Polícia Militar acompanhassem Louise na operação em busca do criador de identidades falsas. O lugar marcado era uma locadora de CDs e DVDs.
Os criminosos, dois ex-presidiários experientes, foram presos. Não sem, antes, confessar à Polícia o nome que utilizaram para produzir o documento usado por Daniela.
— Como é? Tem certeza? — Ela perguntou a eles enquanto eram conduzidos à viatura.
— Não dá pra afirmar nada! Infelizmente, ele disse que não se lembra dos nomes que fez.
— Tá bom — Ela disse, suspirando, e voltou-se ao policial militar ao seu lado — Muito obrigada pela presteza. Espero que mesmo assim a gente consiga pegar aquela cretina.
— Vamos ajudar sempre que precisar.
Louise mal se preparava para voltar às ruas quando, de repente, sentira seu celular tocando novamente.
— Alô? — Ela perguntava.
— Louise, aqui é a Paula. Acabei de receber a notícia da Delegacia. Uma mulher de aproximadamente trinta anos prestou queixa aqui de roubo da sua bolsa. Ela falou que quem a assaltou foi uma mulher branca, alta, loira e óculos escuros, que dirigia um HB20.
— Daniela! — Ela esbravejou — Brigada, Paula! Vamos continuar aqui tentando achar ela. Vamos rastrear esse telefone.
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Astrid já estava na Avenida das Governador Carlos Lacerda. A jovem já percebia o drone de Nicole rondando a região. Sentia que chegava perto do momento de encontrar a assassina de João Victor.
Quando sentiu a vibração de seu telefone no bolso, estacionou a moto no acostamento, tirou o capacete e atendeu a ligação de Vinícius.
— Ela roubou um celular? — Astrid perguntava, com uma sobrancelha levantada.
— Exato! A Louise me avisou isso faz uns seis minutos...
— Gente... É só entrar no Google agora e rastrear o celular da mulher, não é não?
— Pois é! Fizeram isso! Porém, o último lugar que o rastreador marcou foi na frente do Barra Shopping.
— Então ela passou por aqui mesmo...
— Passou, mas tem um detalhe... Não foi de HB20.
— Não?
— Com a ajuda do drone da Nicole, encontramos o veículo estacionado em um beco. Não na estrada.
— Gente... Surreal! Ela tá indo viajar com motorista de aplicativo!
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— Mas você não é a Patrícia não, é?
A passageira do banco de trás deu uma risada cínica.
— Não, não. Ela é minha irmã. É que meu celular descarregou e por isso ela fez o pedido pra mim. Meu nome é Rozani.
Não fazia muito tempo que o motorista saíra do Barra Shopping com a passageira de cabelos loiros, jaqueta jeans, óculos escuros e uma mala pequena de rodinhas. Não trocaram muitas palavras durante a viagem rumo a Rodoviária Novo Rio.
— Caramba! — Ele esbravejou, semicerrando os olhos, ao avistar o fluxo lento de veículos na estrada — Acho que vai demorar um pouquinho...
— Ah, que pena! Mas... Fazer o quê, né?
— Eu posso ligar a rádio agora. Deve estar passando as... — o homem já se preparava para apertar os botões quando foi rapidamente interrompido.
— Ah, não! Não precisa! É... Na verdade, eu acho que prefiro ficar no silêncio.
— A senhora que manda!
— Brigada.
A mulher observara o seu redor através do vidro preto. Dezenas de viaturas policiais patrulhavam as ruas da Avenida das Governador Carlos Lacerda e um drone sobrevoava a via. Certamente, todo mundo já estava falando sobre a morte do apresentador João.
De repente, avistara uma moça cuja fisionomia reconhecera. Estava de jaqueta e calça de poliéster preta, sobre uma moto robusta, passando por entre os carros do congestionamento.
"Astrid" ela pensou.
Demorou cerca de trinta minutos para o trânsito, enfim, conseguir voltar a ter um fluxo razoável. Aos poucos, as viaturas policiais também pararam de ser vistas pela criminosa e o veículo já estava prestes a percorrer as vias da avenida tranquilamente até, enfim, chegar à Rodoviária Novo Rio.
— Chegamos, dona! — O homem, simpático, disse, após parar o carro no local movimentado — Ficou trinta e nove.
Daniela respirou fundo. Era o momento mais crítico de seu plano. Colocou as mãos por dentro da jaqueta e inclinou seu tronco na direção do motorista.
— Ok. Mas... — De dentro de suas vestes, ela tirou seu revólver e, rapidamente, encostou a ponta do cano na têmpora do homem — Vamos pro estacionamento.
De repente, os olhos do motorista se esbugalharam e quase ficou sem voz.
— Oh, pera, calma aí! Moça, por favor, não, eu... — Ele gaguejava.
— Não quer que eu estoure tua cabeça? É só fazer o que eu mando. Agora... Estaciona o carro no estacionamento.
O homem engoliu em seco. Seu corpo foi tomado pelo medo. Sentia uma frente fria passando pela sua barriga, arrepiando sua espinha. Não havia como reagir. Assim como a passageira mandou, ele obedeceu.
Após obedecer o comando, estacionando o veículo no estacionamento da rodoviária, o homem permanecera com os membros trêmulos.
— Agora, eu vou sair do veículo e você vai sair junto comigo. Vai pegar minha mala e seus documentos, e vai me acompanhar até entrarmos no ônibus.
— E-eu vou viajar com você?
— Vai sim, idiota! E se você fizer alguma gracinha, qualquer coisa, eu faço carne moída dos teus órgãos! Vai pagar pra ver?
— N-não...
— Ótimo! — Ela disse, abrindo a porta e, enfim, escondendo a arma novamente dentro do bolso de sua jaqueta.
Ainda assustado, ele não desobedeceu a mulher. Saiu do carro com seus documentos e apanhou a mala de dinheiro que estava no bagageiro.
— Anda! — Daniela falou, rispidamente, sempre com as mãos dentro dos bolsos e próximas ao homem — Vamos! Antes que a gente perca a hora!
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— Merda! Ela enganou a gente direitinho! — Vinícius esbravejou, dentro do carro, ao lado de Nicole, também impaciente.
— Calma, Víni! A Astrid vai... — De repente, Nicole sentiu seu celular vibrar — Ah, é ela... Astrid?
— Nico, foi difícil, mas eu tô aqui na Rodoviária. Acabei de chegar. Tem mais duas viaturas da Polícia Militar, mas ninguém sabe qual é o plano dela então a gente pode esperar por qualquer coisa!
— Polícia Militar? — Vinícius escutava a conversa — Ótimo! Tomara que isso dê certo...
— Vai dar, Víni! Já fizemos o contato.
— Tá bem. Assim que eu sair do engarrafamento, a gente chega aí.
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— Última chamada para o ônibus destino Araruama! — O funcionário falava, em alto tom, em meio a plataforma de embarque. Faltavam dois minutos para o horário da partida.
— Calma aí!
De longe, a mulher de cabeleira loira, óculos escuros e jaqueta jeans, caminhava apressadamente pelo pátio de onde partiam os veículos de grande porte, acompanhada do homem de média estatura e pele acobreada, portando uma mala pequena de rodinhas.
— Boa tarde! — Ele disse, ao apresentar os seus documentos e o da mulher para o motorista.
Antes mesmo de o motorista apanhar os documentos, uma quarta figura apareceu, surpreendendo os dois passageiros. Um homem alto, de pele e olhos claros, com a farda da Polícia Militar, saiu da guarita onde se reuniam os funcionários da empresa e se aproximou com os olhos semicerrados entre os dois.
— Boa tarde, só o procedimento normal aqui — o policial disse e passou os olhos pela identidade do homem — Estão indo de viagem, é... Flávio e Helena?
— Sim, sim! — Ele respondeu, engolindo em seco.
— Comemorando nosso aniversário de cinco anos de casamento! — A mulher acrescentou, esboçando um sorriso falso — Não é, amor?
— Tudo certo, então — O policial falou, sorrindo, e entregou novamente os documentos para o casal — Boa viagem para vocês!
— Deixa que eu guardo a bagagem de vocês — O motorista falou, e eles prontamente assentiram.
Os dois, imediatamente, guardaram seus documentos e caminharam em direção ao ônibus.
— Ah! Só uma coisa — O policial disse, fazendo-os parar e se voltar novamente a ele — Vocês conhecem alguma Ivana?
— Quem? — Flavio inclinou a cabeça.
— Ivana Regis da Cunha? Não conhece? — os dois se entreolharam, confusos — E Hugo Silveira de Souza?
— Desculpa, seu policial, mas a gente nunca ouviu falar...
— É que é muito estranho, Helena, você não conhecer nem mesmo os seus pais.
Imediatamente, a ex-policial arregalou os olhos e sua mandíbula caiu ligeiramente.
— Motorista, abra a mala — ele ordenou, e assim foi feito. O dinheiro foi todo descoberto — A casa caiu pra você, Daniela!
A mulher permanecia paralisada, gélida. Ela foi pega. Já não havia mais escapatória, mas ela ainda assim não desistiria.
— Nunca! — Ela gritou e, em um movimento rápido, sacou sua arma com o braço direito e, com o esquerdo, agarrou o pescoço de Flávio, fazendo-o como refém.
Imediatamente, os nervos de todos em volta começaram a se aflorar. O policial rapidamente sacou também a sua pistola e se posicionou na porta do ônibus, para ela não tentar entrar ali.
— Daniela, larga ele! — Ele ordenou, com a arma apontada para a criminosa.
— Me deixa entrar no ônibus e ninguém vai sair ferido.
— Tá pensando o quê? Que vai sair por aí de ônibus e ninguém vai conseguir pegar você? Que se matar esse homem você vai estar livre? Não! Se entrega!
Com os dentes trincados e as sobrancelhas unidas, ela bufou.
— Tem razão — Ela falou e, com o braço esquerdo, empurrou o homem para frente, que quase caiu no chão.
No entanto, logo posicionou sua arma em direção a própria cabeça.
— Daniela, não! Larga essa arma!
— Ah, é? Me diz! — Seus olhos estavam bem abertos. Seu rosto, avermelhado — Por quê?
Em um movimento lento, ela apertou o gatilho. Porém, antes de completar o procedimento para efetuar o disparo, sentiu uma dor aguda vinda de trás, na nuca, que a fez cair no chão e largar sua arma.
Com os batimentos cardíacos acelerados, Astrid largou o extintor de incêndio que usara para atacar a criminosa, ainda incrédula com o que acabara de fazer, e se apressou para apanhar a arma que deslizara pelo solo enquanto o agente de segurança a algemava.
— Muito bom, Astrid! — Ele exclamou, suspirando — Por muito pouco!
— E-eu ainda não tô acreditando no que eu fiz — A moça disse, com as mãos ainda trêmulos, quase deixando a arma cair com tanta insegurança ao manuseá-la.
— Não! Me solta! — Ainda sentindo uma dor aguda na área onde foi golpeada, Daniela se agitava para tentar escapar, mas foi contida pelo policial.
De repente, reforços policiais chegaram. Tanto os que já estavam em outras áreas da rodoviária, quanto outros que havia aparecido no horário oportuno. Dentro de uma das viaturas, saiu Louise Ferguson.
— Levem-na! — Ele disse, entregando a criminosa para mais dois policiais que prontamente a conduziram para o destino correto.
— Muito obrigada, Jean! — Louise falou, aproximando-se do homem e, logo, observando seu cadarço de identificação na farda e procurando se corrigir — Digo... Soldado Smith!
— Foi por pouco, Louise! Mas quem teve o maior trabalho foi a Astrid.
— G-gente... Eu não sei o que fazer com isso aqui — A loira ainda estava tremendo. Segurava o armamento como quem segurava uma bomba.
Segurando uma risada, Jean apanhou o revólver e o guardou e entregou para um de seus colegas de trabalho.
— Astrid! — A voz de Vinícius chamou a atenção dos três, que se voltaram para trás. O universitário vinha correndo acompanhado de Nicole — Você tá bem?
Ele chegou esbaforido. Visivelmente preocupado. Envolveu a amiga com os braços e demorou a soltá-la.
— Tô melhor agora. Obrigada! — Ela disse.
— A gente viu que você tava segurando a arma... O que houve?
— Ai, nem eu sei direito... — a jovem confessou, afastando-se de seu amigo.
— Dantas! — O homem exclamou, cumprimentando o universitário que o ajudara em uma difícil missão no período em que servira ao Exército.
— Caramba! Quanto tempo! — Os dois se cumprimentaram com um abraço.
Em poucos minutos, a rodoviária já estava rodeada por muitos curiosos. A imprensa logo chegou. Três canais de TV já montavam sua estrutura para cobrir a série de notícias. Em menos de trinta minutos do ocorrido, já estava sendo divulgado em todas as mídias que foi presa a cúmplice do misterioso assassinato de Henrique Martins.
— Sendo assim... — Louise respirou fundo. Aos poucos, os batimentos cardíacos de todos foram diminuindo a intensidade. Enfim, acabou — Vamos pra casa! Não há mais nada para se fazer aqui.
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