Capítulo 1
Lia entrava em tantas lojas quanto podia. Eu até já considerava que minha amiga estava atingindo a onipresença, de tão rápida que ela se movia. Parei por um instante para descansar sobre um banco de frente à uma loja de artigos natalinos. Forcei minha visão e notei que as palavras "ARTIGOS DE NATAL, SÓ AQUI!", estavam sobrepostas a uma outra. Preferi ignorar.
— Maurício, seu molenga, anda logo com essas sacolinhas! — gritou Lia, enquanto saía da loja com um pacote cheio de guirlandas verdes e brancas. E algumas que eu não sabia se eram brancas com enfeites verdes ou o contrário.
— Sacolinhas... hunf! — reclamei ao olhar para a dúzia de sacolas aos meus pés.
Consegui alcançá-la assim que chegamos à loja com árvores de natal. Era uma das maiores lojas que havia no shopping. Tinha árvores de todos os tamanhos e cores por todos os lados. Os tamanhos variavam de quinze centímetros até mais de dois metros. Tanto Lia quanto eu, ficamos impressionados com o espaço. Várias pessoas estavam ali para comprarem suas árvores, onde a tradição prevalecia sempre.
— Da próxima vez vou trazer um carrinho de mão!
— Ora, não seja reclamão. Os homens não são fortes como dizem? — rebateu Lia.
— Mas não somos burros de carga — acrescentei, e olhei zangado para as várias sacolas. — E também não somos polvos, para termos oito braços e carregar tudo isso.
Lia olhou discretamente para as sacolas e acenou com a mão.
— Não exagere, são só umas coisinhas. E só para você saber, polvos têm tentáculos. Agora vem, vamos escolher a melhor árvore.
— Não são pinheiros? — apontei, colocando as sacolas num guarda-volumes. A garota que estava ali passou uma dificuldade gigantesca para guardar todas as sacolas.
— E pinheiros são o quê? — Lia guinchou e começou a rir. Minhas orelhas ficaram tão vermelhas quanto as bolinhas que estavam sobre o balcão do guarda-volumes.
— Cale a boca e vamos logo! — derrotado, arrastei Lia pelo braço.
Checamos cada árvore. Desde o tamanho do espaço que ocuparia, até a estabilidade que teria conforme os penduricalhos fossem postos nos galhos. Fiquei muito tentado a levar uma verde para adicionar as costumeiras bolas vermelhas. Lia queria inovar. Escolheu uma árvore azul arroxeada para encher de bolas multicoloridas.
— Onde é que você já viu uma árvore com folhas azuis? — debochei.
As maçãs do rosto dela ficaram vermelhas. Aproveitei para tirar uma foto com o celular.
— Esse tesouro aqui guardarei para a posterioridade... — Algo que não me impediu de rir. Lia era sempre autoconfiante e isso a impedia de ficar vermelha, aquela fora uma ocasião que até mesmo para mim foi impressionante.
Ela coçou as bochechas com o indicador. Tentando aliviar, ou talvez, diminuir o rubor. Seu rosto adquiriu um brilho estranho e ela agiu como se nada tivesse acontecido.
— Ora, Mau querido. O que importa é a decoração.
— Mas as árvor...
— Elas são da cor que cada um quer e ponto! — disse Lia, aborrecida. Jogou os cabelos para trás e andou até a árvore de um metro e meio com folhas azuis. — Olha que linda! Ela é uma diva.
Dei uma gargalhada alta. Tão alta que duas senhoras me olharam feio.
— Tá mais parecendo uma árvore que a Lady compraria, não você.
— Tem razão, melhor comprar a de cor laranja — observou Lia. Quase caí de costas.
Após longas discussões, palpites dos vendedores, mais discussões, sermões das senhoras e um ataque de risos, optamos por levar uma árvore de um metro e oitenta na cor branca. Onde as bolas para a decoração se alternariam em vermelhas e douradas (Lia fez questão de comprá-las).
Saímos da loja com as sacolas caindo por todo o lado. Lia reclamava e eu não me aguentava de tanto rir. Uma aglomeração no shopping, não muito longe de onde estávamos chamou a nossa atenção.
— Ah, vamos ver o que é, Mau? — Lia implorou. Seus olhinhos faiscando de curiosidade.
— Não temos muito tempo, amor — respondi, simulando um gesto doce. — Mas podemos passar por perto para dar uma rápida olhada.
Ela gritou satisfeita e deu um pulo de tão contente. Uma das sacolas se rasgou com o peso, derrubando as embalagens no chão. As caixas com as bolas se abriram e o piso do shopping ficou colorido de vermelho e dourado. Lancei um olhar feio para Lia, enquanto pegávamos as bolas que rolavam para todos os lados.
— Obrigado! — Agradeci a um rapaz que trabalhava numa loja ali perto, quando ele veio com duas bolas azuis. — De onde surgiram essas daqui?
Procurei os olhos de Lia que deu de ombros. Não compramos essas. Procurei o rapaz que as trouxera, mas ele já tinha sumido.
— Ah, vai ver alguém colocou nas sacolas por engano, agora vamos logo. Vai que eles estão dando balas? — Ela riu. Sacudi a cabeça.
Caminhamos até a pequena multidão. Acompanhavam um desfile. Uma plataforma simples e não muito grande foi posta e ao fundo havia sido montada uma estrutura com cortinas vermelhas. De lá saíram belíssimas moças e rapazes vestidos com roupas natalinas.
Caramba! Fiquei fascinado por uma das modelos. Ela não tinha o padrão esquelético (da suposta beleza) que era exigido. Tinha curvas maravilhosas, cabelos da cor de chocolate e seus olhos eram de um dourado incrível. Mas me distraí ao olhar para as bolas azuis que o rapaz me trouxe. O tom da cor delas era impressionante. Um azul-escuro que me dava uma sensação de déjà vu.
— Olha quanto gato! — Lia admirou-se ao ver dois rapazes saírem detrás das cortinas.
Um deles era bronzeado e tinha cabelos louros que caíam por sobre os ombros. Estava usando um casaco vermelho e branco, e um short até os joelhos. Apenas seu abdômen definido ficava à mostra. O outro era um negro alto e bem musculoso. Vestia um casaco semelhante ao do outro, mas os detalhes mudavam de cor e ele vinha com um gorro do Papai Noel. Olhou na direção de Lia e deu uma rápida piscadela.
— Maurício, me segura! — Lia agarrou meu colarinho e o puxava freneticamente, quase me sufocando. — Me segura, que senão eu subo lá e agarro ele. Não, mentira.
— Ai meu Deus! — Comecei a rir, enquanto me desvencilhava de suas mãos fortes.
Saíram mais um casal de modelos.
A garota, que aparentava ter entre dezoito e vinte e dois anos, era negra e muito formosa. Seus cabelos volumosos dançavam conforme desfilava. Seus belos olhos tinham a cor exótica do mel. Ela vestia um vestido vermelho com rendas brancas e um cachecol branco que, sutilmente, assemelhava-se com a neve. Trazia consigo um saco de presentes e de lá jogava flores artesanais na cor vermelha.
O rapaz era vários centímetros mais alto. Possuía cabelos negros e ondulados. Seus olhos eram azuis-escuros. Tão azuis quanto o mar. Seu semblante era decidido e sério. Vestia uma calça branca com riscos dourados. Um blazer bem cortado caía-lhe perfeitamente, também branco e com os mesmos detalhes em dourado. Em sua mão um cajado e um sino na ponta.
Ele me olhou por um instante, antes de fazer a curva e voltar para as cortinas, franzindo o cenho de leve. Não sei o que houve, mas me senti muito estranho com aquilo. Novamente tive a mesma sensação de déjà vu. Não sei se ele também teve essa mesma sensação. E se teve não disse nada, tampouco demonstrou alguma reação. Virou-se e continuou caminhando pela passarela.
— Caramba! Que olhada — alfinetou Lia, ao ver que fiquei atormentado.
— Ah, cale a boca e vamos logo! — falei e marchei em direção à saída. Lia me seguiu dando risada.
Durante o período em que voltávamos ela torrou todaa minha paciência. Dei graças quando passamos do portão para dentro.
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