Caos no Palácio - V
Khalid estava absorto em seus pensamentos quando o som suave de batidas na porta o interrompeu. Erguendo os olhos, viu o guarda real, cuja postura imponente refletia a importância do recado que trazia. Com um aceno de cabeça, Khalid se levantou e seguiu o guarda pelos corredores do palácio até a suntuoso jardim real, onde a rainha o esperava para compartilhar o desjejum.
一 General.
一 Rainha.一 Ele disse fazendo uma reverência. 一 E onde está sua criada? O convite se estendia a ela também.
一 Ela havia saído para buscar meu desjejum, mas imagino que deva ter se perdido pelo palácio. Pedi a um guarda para que a procurasse. Me perdoe rainha, mas não entendo o motivo deste convite.
一Venha 一 disse acenando com a mão em direção a mesa montada no jardim onde Baketamun os aguardava com um olhar ansioso, antes de se aproximarem a rainha diminuiu o passo segurando o braço do general em seguida. 一 Em breve, vocês passaram muito tempo juntos, Baketamun é um rapaz promissor, mas o faraó é um homem exigente e imprudente as vezes. Só queria me garantir de que com sua tutoria, meu filho estará seguro.
一 Com toda a certeza minha rainha. Jamais colocaria o príncipe herdeiro exposto a perigos desnecessários. Amenhotep sabe muito bem disso.
一 Ótimo. Você sabe o quanto foi difícil pra Amenhotep se firmar perante o povo e o clero como faraó, queremos garantir que essa sucessão não seja questionada como a dele. Esse tipo de questão trás muita instabilidade ao reino. Hoje a tarde durante a apresentação do príncipe aos generais, garanta que eles entendam que estão diante do seu futuro rei. Fui clara?
一 Como a seda mais pura.
一 Ótimo. Vou deixar que vocês a sós, embora imagine que ele vai ficar um pouco decepcionado por não ter trazido a moça dos olhos azuis como as águas do Nilo em dias de primavera. 一Isetnefret disse com um sorriso.一 Você precisam se conhecer, com licença general.
Khalid reverenciou a rainha e caminhou com passos firmes até o príncipe herdeiro, um jovem de olhos brilhantes e curiosos, que o aguardava pacientemente.
一Príncipe Baketamun, 一 saudou Khalid, inclinando levemente a cabeça em sinal de respeito.
一 General Khalid, 一respondeu o príncipe com um sorriso tímido.
Sentaram-se à mesa, onde uma variedade de iguarias egípcias estava disposta diante deles. Khalid, no entanto, não podia deixar de notar a inquietação nos olhos do jovem cuja as mãos mexiam-se ansiosas e trêmulas.
一Príncipe Baketamum, há muito a aprender antes de assumir seu lugar como faraó e líder do nosso exército 一 começou Khalid, sua voz carregada de gravidade. 一A jornada será árdua, repleta de desafios e sacrifícios, mas tente se manter calmo. Imagino que deve ter ouvido histórias sobre mim.
一 Sim, e pelo que meu pai disse não são apenas histórias.
Khalid contou brevemente sua condição, e o quanto isso havia sido benéfico ao país desde que ele jurou sua espada ao antigo faraó. O príncipe ouvia atentamente, mas havia uma distração em seu olhar, como se sua mente estivesse em outro lugar, ate que finalmente encontrou coragem.
一 General Khalid, me fale mais sobre Willa 一 interrompeu o príncipe, carregado de curiosidade. 一 Ela parece uma serva diligente e dedicada. Como ela veio parar em seu serviço?
Surpreso pela mudança repentina de assunto, Khalid ponderou por um momento antes de responder. Era evidente que o príncipe estava mais interessado na serva do que nos deveres que o aguardavam como futuro faraó.
一 Despojo de guerra. 一 falou e o garoto olhou confuso. 一 Quando um exército vence o outro seus soldados tem direito de tomarem pra si os itens valiosos daqueles que foram derrotados.
一 Sim eu entendo o conceito, mas ela é uma garota, não uma arma ou joia.
一 Pessoas são recursos, meu príncipe. Compreendo sua aversão, mas às vezes é necessário considerar as realidades brutais da guerra. Os perdedores muitas vezes se tornam prisioneiros, e a escravidão pode ser uma maneira de garantir a estabilidade e a ordem em nosso reino.
一 Eu entendo que as vezes prisioneiros de guerra são necessários para manter a paz, mas não posso concordar com a ideia de tirar a liberdade e a dignidade de outros seres humanos sem nenhum motivo senão porquê podemos. Willa por exemplo, o que ela fez pra que delegarmos um destino tão cruel?
一 Você fala com o coração, Baketamun, mas às vezes precisamos fazer escolhas difíceis para proteger nosso povo. Quanto a Willa, ela sempre foi tratada com dignidade e respeito em minha casa.
一 Fico feliz em saber disso general, mas ainda assim ela é uma escrava e não fez nada além de estar no meio de uma guerra que ela não causou, a verdadeira grandeza de uma civilização é medida pela forma como trata seus mais vulneráveis?
一 Suas palavras são nobres príncipe, e eu as respeito. Mas as coisas são como são, o que você considera crueldade, muitas vezes garante que não seja o seu povo a sofrer o mesmo. São assim que as coisas funcionam a muito tempo e se quer um conselho, não dívida esse tipo de pensamento com seu pai. Receio que ele possa não ser tão receptivo quanto eu.
一 Quanto ela custa? 一 perguntou firmando seus olhos castanhos sobre o general.
一 Pretende comprar a liberdade dela? 一 Khalid levantou o olhar aos dele e o príncipe assentiu a cabeça. 一 Ela não tem preço e mesmo que tivesse e eu acredite em sua visão jovem e imatura do mundo, sei que a última coisa que faria seria a colocar num navio para Pérsia, não é? 一 ele falou se levantando. 一 Se me permite príncipe herdeiro, preciso tratar de alguns assuntos pessoais até a reunião com o faraó mais tarde.
Baketamun assentiu com a cabeça e viu Khalid se retirar a passos lentos.
***
Willa seguia o guarda com passos rápidos e cautelosos, mantendo-se próxima o suficientes para não perder de vista seu destino, mas distante o bastante para não chamar a atenção. A curiosidade ardente sobre o que havia acontecido com Abdul que queimava em seu peito superava qualquer receio que pudesse surgir, impulsionando-a a continuar adiante, mesmo que isso significasse explorar os corredores sombrios e misteriosos do palácio.
À medida que avançavam pelos corredores labirínticos, Willa começou a sentir um arrepio percorrer sua espinha. Uma sensação de inquietação começou a se insinuar em seu peito, e seus passos hesitaram por um momento antes de continuar a seguir o guarda.
Finalmente, chegaram a uma porta de madeira maciça, adornada com hieróglifos antigos e símbolos enigmáticos. O guarda abriu a porta sem hesitação, revelando uma escadaria estreita que se estendia para baixo, desaparecendo nas sombras abaixo. Willa prendeu a respiração quando percebeu para onde estavam indo. O subsolo do palácio era um lugar sinistro, envolto em mistério e rumor. Era onde Pashedu, o sacerdote real encarregado dos rituais de mumificação e estudos secretos, realizava suas práticas sombrias.
Um calafrio percorreu o corpo de Willa imaginando se encontraria Abdul sobre aquela mesa fria de sal e natrão, mas quando a última porta foi aberta encontrou o jovem em pé próximo a bancada vazia.
一Willa...一 Ele sussurrou e ela caminhou até ele percebendo de imediato que ele estava machucado, porém devidamente tratado com ataduras limpas cheirando a hortelã.
一O que houve? O que está havendo?
一 O senhor Nebhotep encontrou seu colar ele disse pegando as mãos da garota. Achei que ele fosse me matar.
一Ah por Deus, você está bem? Pashedu lhe ajudou? 一 Willa perguntou com estranheza.
一 Sim mas. Me escute com atenção eu consegui uma forma para sejamos livres, nem precisaremos deixar o Egito! Podemos viver aqui, teremos uma boa quantia pra começar uma vida, uma vida de verdade, uma vida nossa, sem senhores ou castigos.
一 E o que vai custar? 一 a garota perguntou desconfiada.
一 Eu contei a Nebhotep e ao sacerdote o que me disse sobre seu senhor. Sobre ele ter assassinado um faraó.
一 Você fez o que? Eu lhe pedi pra que não contasse a ninguém.
一Eu não tive escolha, Nebhotep iria me matar se não me mostrasse valioso. Escute Willa, tudo que você precisa fazer é colocar isso no vinho dele essa noite. Não vai mata-lo até onde ser nada pode, mas servirá ao plano de meu senhor e de Pashedu. Eu não entendo bem, mas eles pretendem mostrar ao faraó que ele não digno de sua confiança, ele será preso e depois disso, nós dois seremos livres Willa.
一 Você enlouqueceu? Mesmo que pudesse e confiar na palavra de Nebhotep o que não podemos, eu jamais trairia o senhor Khalid dessa forma.
一 Como pode dizer isso, esqueceu o que ele vai fazer com você? Ele lhe vendeu para um prostíbulo imundo, você ao menos tem ideia do que aquelas mulheres são obrigadas a fazer?
一 Eu sei muito bem, no entanto você não achou que seria tão ruim quando lhe contei, não é mesmo? Além do mais
eu estava enganada, o senhor Khalid está tentando me manter segura, mas não posso lhe explicar agora. De qualquer forma eu jamais faria parte de um plano indigno como este, eu não sei como você pode pensar em algo assim. Khalid é um bom homem, fiel ao faraó e ao Egito.
一 Ele é um monstro Willa! Você viu com seus próprios olhos, como pode defende-lo?
一 Olhe pra você, olhe o que Nebhotep lhe fez, o senhor Khalid pode não ser o mais simpático e gentil dos homens, mas ele não é um monstro, Nebhotep sim e Pashedu talvez seja ainda pior. Como pode confiar neles? Como pode aceitar tramar contra um homem inocente, você é o príncipe dos Arameus, onde está a sua honra? 一Ela questionou irritada e sentiu um empurrão forte de Abdul a prensar contra a parede.
一 Minha honra? Os egípcios a tiraram de mim, junto com minha família e meu reino, e o seu amado general Khalid foi a causa disso. Então você vai me obedecer e vai colocar isso no vinho dele, entendeu? 一 ralhou Abdul junto ao rosto de Willa.
一 Foi você não foi? O senhor Khalid não mentiu, você matou seu irmão, matou o seu rei.
一 Eu fiz o que achei necessário, por mim e por você. Aquela batalha estava perdida, achei que com aquele ato talvez o faraó fizesse algum acordo que salvasse o que havia restado do nosso povo! Eu estava tentando nos proteger, como estou agora! 一 Ele gritou segurando o braço dela com firmeza 一 Então Willa é uma ordem e você vai fazer o que eu mandar! 一 continuou e ela reuniu todas as forças para empurra- lo obrigando-o a solta-la.
一Não, não lhe devo obediência, não sou sua esposa e você não é meu rei, nem mesmo meu príncipe! 一Willa protestou entre lágrimas. 一 Vou contar tudo ao senhor Khalid. 一 Girou se dirigindo a porta de madeira e assim que a abriu deparou-se com o corpo imenso de Nebhotep diante dela.
一 Onde pensa que vai, preciosa?
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