Capítulo 14: Amizade Colocada á Prova
Laura entrou na redação da emissora sentindo-se como uma estranha em um lugar que deveria ser seu refúgio. Durante as semanas em que interpretara Isla Frost no reality, seus compromissos como assistente de produção acumularam-se como uma pilha crescente de urgências não resolvidas.
As luzes fluorescentes da sala pareciam mais fortes do que nunca, refletindo nos monitores, enquanto o som constante de vozes e teclados preenchia o ambiente. Laura ajeitou os óculos sobre o nariz, tentando focar no que estava diante dela: uma lista interminável de e-mails não lidos, documentos pendentes e chamadas perdidas.
Ela suspirou e passou a mão pelo rosto, exausta. O "atestado de saúde" que pedira para justificar sua ausência no trabalho parecia agora uma mentira ainda maior do que sua personagem no reality. Isla Frost era uma máscara, mas aqui, na redação, Laura sentia que nem mesmo sua identidade real estava intacta.
Foi então que ouviu uma voz familiar atrás dela.
— Isso é o que chamamos de desastre fashion, Laurinha. E eu não estou falando só da pilha de papéis — disse Rafael, seu melhor amigo, com o tom provocador de sempre.
Laura virou-se e encontrou o sorriso acolhedor dele. Rafael estava com uma bolsa grande de maquiagem em uma mão e um cinto de utilidades de figurino pendurado na cintura. Como sempre, ele parecia mais arrumado do que qualquer um no escritório, mesmo depois de horas correndo pelos bastidores dos sets. Como responsável pelos figurinos e maquiagens dos programas da emissora, ele era uma das pessoas mais requisitadas, mas nunca deixava de aparecer quando ela precisava.
— Rafa? O que você está fazendo aqui? — perguntou Laura, surpresa e, ao mesmo tempo, aliviada.
— Ah, sabe como é, ouvi uns boatos pelos corredores que você estava aqui, enterrada viva entre papéis e trabalho acumulado. Achei que talvez precisasse de alguém para salvar o dia. — Ele puxou uma cadeira e sentou-se ao lado dela, colocando sua bolsa de maquiagem sobre a mesa antes que ela pudesse protestar.
— Eu estou bem. — Laura tentou soar convincente, mas sua voz entregou o cansaço. — Só preciso organizar tudo isso. Não é tão ruim quanto parece.
Rafael ergueu uma sobrancelha, claramente não comprando a desculpa.
— Laurinha, pelo amor, você está a duas olheiras de virar a protagonista de um filme de terror. Isso não é só trabalho acumulado; é um clamor por ajuda.
Ela revirou os olhos, mas acabou soltando um suspiro de derrota.
— Tá bom, talvez seja meio ruim. É só que... entre o reality, o trabalho aqui e... tudo o mais, eu me sinto... sufocada.
— Tudo o mais? — Rafael perguntou, inclinando-se com um sorriso malicioso. — Isso inclui um certo galã ou estou só imaginando coisas?
Laura arregalou os olhos e balançou a cabeça rapidamente.
— Não! Claro que não! É só... o peso de manter a personagem e ainda lidar com minha vida real. É como se eu fosse duas pessoas ao mesmo tempo, e nenhuma das duas está dando conta.
Rafael a estudou com um olhar misto de preocupação e compaixão. Depois, abriu sua bolsa e tirou um corretivo.
— Certo, primeiro, vamos tirar essas olheiras. Você não vai resolver nada se continuar com essa cara de zumbi. Depois disso, eu assumo parte do caos dessa mesa.
Laura tentou protestar, mas Rafael já estava com o pincel em mãos, pronto para retocar o rosto dela.
— Rafa, não é hora para isso!
— Claro que é. Confia em mim, ninguém resolve problemas com olheiras desse tamanho. E outra, você sabe que eu sou multitarefa. Enquanto te arrumo, você vai me explicar o que eu posso resolver por você.
Ela suspirou, mas deixou que ele começasse. Era difícil dizer não a Rafael, especialmente quando ele já estava cuidando dela antes mesmo que ela pedisse.
— Você é insuportável, sabia? — disse ela, meio rindo, meio resignada.
— E você é sortuda por me ter. — Ele piscou para ela, ajustando o tom do corretivo. — Agora, vamos lá. O que é urgente?
Enquanto Rafael ouvia com atenção e organizava mentalmente as tarefas que poderia assumir, Laura sentiu uma pontada de alívio. Por mais caótico que tudo estivesse, ele estava ali para ajudá-la. No fim das contas, ter alguém que enxergava além da máscara de Isla e ainda sabia como acalmar sua tempestade interna era mais do que ela podia pedir.
Laura exalou um suspiro de alívio ao olhar para a mesa limpa diante dela. O caos de papéis, e-mails e chamadas perdidas finalmente estava organizado. Com a ajuda de Rafael, ela conseguiu colocar o trabalho em dia mais rápido do que imaginava. Ele fora incansável, tomando as rédeas de várias tarefas e até ajudando a responder alguns e-mails, sempre com a energia que ela tanto precisava naquele momento. Agora, ao olhar ao redor, a sensação de vitória era agridoce.
Ela estava, de fato, exausta. No entanto, ainda havia algo mais a fazer. Quando pegou o celular e viu a mensagem que havia chegado, seu coração deu um salto.
"Urgente: Candidatas do Reality devem comparecer à emissora imediatamente para a gravação de um comercial. Estejam prontas para estar no palco em 30 minutos."
Laura olhou para Rafael, que estava mexendo no seu celular, descontraído, como se não houvesse mais nada a fazer naquele dia.
— Parece que a Isla Frost não vai descansar hoje, não é? — ela murmurou, mais para si mesma do que para ele.
Rafael sorriu, já prevendo o que viria a seguir.
— Pode deixar que eu vou dar conta disso — respondeu ele, com um tom que beirava o divertido, mas também o cúmplice. Ele então levantou-se, pegando rapidamente os itens que havia deixado de lado. — Vamos para o meu setor de figurinos. Prepare-se para o toque de Midas.
Laura suspirou e seguiu Rafael, sentindo uma mistura de desconforto e excitação. Não era apenas mais um trabalho. Cada vez que ele a transformava em Isla Frost, ela sentia a separação entre as duas personalidades se aprofundar. Mas, ao mesmo tempo, era também o momento em que ela se sentia mais forte e imponente — a máscara de Isla era sua armadura.
No setor de figurinos, Rafael trabalhava com uma destreza impressionante. Ele começou com a maquiagem: contornos meticulosos, olhos marcados com uma sombra esfumada que parecia hipnotizar e lábios vermelhos, perfeitos, como se fossem feitos para seduzir. Cada pincelada parecia aumentar o poder de Isla, e Laura teve dificuldade em não se perder totalmente na persona que ele estava criando.
Enquanto Rafael trabalhava, ele comentou sobre os detalhes do comercial que iriam gravar: um cenário sofisticado, voltado para um estilo de vida luxuoso e distante, quase onírico. Era a imagem exata de Isla Frost. Algo que ela já começava a temer, porque sentia que, a cada vez, mais da sua verdadeira identidade se perdia naquelas roupas e maquiagens.
Quando finalmente terminou, Rafael deu um passo para trás, inspecionando o resultado com um sorriso satisfeito.
— Está perfeita, como sempre — ele disse, satisfeito. — Isla está pronta para conquistar o mundo.
Laura se olhou no espelho, vendo não apenas a figura estonteante de Isla, mas também a distorção entre o que ela estava sendo e o que realmente era. Por um momento, sentiu uma onda de desconforto, mas logo se recuperou. Ela precisava ser Isla agora. Não havia mais espaço para dúvidas.
Ao chegar ao estúdio para o comercial, Laura fez sua entrada com confiança. As câmeras, as luzes brilhantes e o estúdio agitado a receberam com um silêncio temporário. As candidatas estavam sendo organizadas para a gravação, e Laura se manteve em seu papel, agora mais do que nunca. Quando entrou no palco, o olhar dos outros, especialmente de Dahlia Monet, foi instantâneo.
Dahlia estava parada perto de uma das câmeras, seu olhar afiado e calculista observando cada movimento de Laura. Seu sorriso parecia genuíno, mas havia algo em sua expressão que deixou Laura desconfortável. Quando a gravidade da situação atingiu, Dahlia se aproximou, sua voz suave, mas carregada de veneno.
— Isla, querida — ela disse, com um sorriso tenso, colocando uma mão de leve sobre o ombro de Laura. — Sempre tão deslumbrante, não é? Mas não se esqueça de que o jogo aqui é bem mais complicado do que você imagina. As pessoas podem achar que você é única e imbatível, mas, como todos sabem, todo castelo de cristal tem seus pontos fracos.
Laura a olhou nos olhos, tentando não deixar transparecer a tensão crescente.
— Não entendo... que está falando, Dahrria — respondeu Laura, sua voz doce e tranquila, como Isla faria.
Dahlia se aproximou mais, com uma risada suave que parecia mais um sussurro venenoso.
— Claro que entende. Só não quer admitir. Mas a competição está apenas começando, e eu não sou de perder — ela disse, antes de se afastar, deixando um rastro de ameaça sutil no ar.
Laura permaneceu imóvel por um momento, o coração batendo forte no peito. A mensagem era clara, mas o que mais a incomodava não era o conteúdo da ameaça, mas o modo como Dahlia conseguia sempre manter o controle da situação, manipulando as pessoas sem nunca levantar a voz.
Enquanto isso, Rafael, que estava ao lado, percebeu a tensão e discretamente sacou seu celular, começando a gravar a conversa sem que nenhuma das duas percebessem. Ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, precisaria dessas provas. Algo lhe dizia que essa guerra de palavras não ficaria apenas no campo da rivalidade.
Laura, ainda com a tensão em seu corpo, se afastou de Dahlia e se preparou para o comercial. Ela não podia deixar que nada a derrubasse agora. Afinal, ela não era apenas Isla Frost — mas ela não sabia quanto mais conseguiria manter essa fachada sem que tudo desmoronasse.
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