♤ OITO ♤
Viveria em um terminal de pássaros, apenas para apreciar a beleza do bater das asas.
Derek não permite minha presença no reino, não permite que ninguém vá visitá-lo. Zedara entrara no reino, mas não tivera nenhum contato com ele, apenas com Francis que tem estimado sua ajuda e me envia as informações de sua melhora. Passei a dormir durante o dia, no período noturno acabo sonhando com o seu corpo morto sobre um chão sujo e sangrento ou o de milhares de pessoas do mesmo modo. Muitos dos dias eu durmo em seu quarto aninhada em seus lençóis apenas para me recordar de sua presença e de como vivíamos antes disso tudo. Ainda não acredito que fora tão egoísta, as vezes até entendo o príncipe Lucas por causa disso. Perdemos nossas mães e mudamos nossa essência, no entanto eu tento, todos os dias, não me deixar vencer pela dor da perda e me recordar apenas dos momentos que tivemos juntas, mesmo que em boa parte deles ela estivesse me dando sermões dignas de pastores.
Escuto um miado e fico intrigada por os felinos serem dificilmente encontrados, tento retirar a ideia, só pode ser ilusão de minha mente, ouço batidas na porta e peço que entre. Valentin adentra o meu aposento e sorri, aquele sorriso caloroso e que me faz sentir vontade de sorrir também. Suas mãos estão atrás das costas e percebo que há algo entre elas, porém suas costas largas me impedem de visualizar melhor e tento me esgueirar para ver melhor . Ouço novamente o miado e levanto-me da cama para procurar de onde quer que esteja vindo o som.
— Procurando por isso?— ele me estende uma caixa com furos e ao abrir vejo o pequeno felino que tanto miava, fico tão surpresa que apenas pego a caixa rapidamente.
— Como conseguiu? São tão raros!— com as mãos, agora vazias, ele as passa por seus cabelos que estão mais longos que o costume.
—- Tudo para lhe ver feliz, um felino para animar a sua vida e cuidar de você.— sorrio, enquanto seguro o pequeno animal que se aninha em meus braços.
— Que nome daremos a ela?— questiono observando que se trata de uma fêmea. Observo os seus pelos brancos e olhos esverdeados e afago a sua cabeça.
— Olhos verdes como pedras de Jade, mas um clichê se dermos este nome a ela. Que tal esmeralda, uma pedra tão bela quanto a outra.— noto as patas rosadas e fofas e faço que sim com a cabeça, não haveria nome melhor.
— Para mim está perfeito, não é minha pequena esmeralda? —sinto o pequeno animal agarrar suas unhas em meu vestido de seda e puxar alguns fios dos detalhes em organza, mas não me importo, esse é o melhor presente que poderia ganhar.
— Muito obrigada, a mulher que casar com você será muito afortunada. És um homem, gentil, carinhoso, amável e sem sombra de dúvidas amigo e parceiro.— me aproximo e o abraço com cuidado para não machucar o pequeno bichinho.
— Sabe da minha predileção por uma certa dama, porém entendo que o seu coração pertença a outro e que também é digno de seu coração. Sabe, nunca lhe falei, mas eu passei muito tempo ao lado do rei Derek. Seus princípios de igualdade e liberdade fazem os olhos brilharem, ouvi seus discursos e por isso, aceitei ficar na linha de frente do seu exército. Sei que não entende meus motivos para defendê-lo quando ele é meu rival na busca do seu amor, porém sabe que sou justo, jogo limpo, assim como ele, que nunca interferiu na nossa amizade, mesmo ele sabendo dos meus sentimentos para com a senhorita.
Ângelo e eu conversamos durante algum tempo e vi em ambos as mesmas qualidades, ele será um bom rei futuramente ao lado de Cefeida.— observo o olhar de Valentin, como se estivesse realizando uma viagem no tempo.— Sempre me divertia ao vê-la ser subestimada por sua pouca idade e sua face tão doce, tão forte foi ao suportar a dor da perda de sua mãe. — fecho os olhos e faço carinho no meu nome bichinho de estimação, tocar nesse assunto é difícil, abandonei todos aqueles que amava e sinto tanto por ter feito meu pai passar por toda aquela situação. Me sinto mal por lembrar do que fiz e tentei fazer, que Ângelo precisou me salvar e meu pai sofreu duas vezes por minha culpa.
— Eu fui uma péssima irmã, as coisas ficaram tão claras ultimamente. Eu abandonei as pessoas que mais amo, deixei que sofressem suas dores sozinhos, não dei o apoio e carinho que eles precisavam. Sou uma péssima filha também, papai não merecia me ver daquela maneira, ele também sofria a morte da mulher que amou durante toda a vida.— volto minha atenção para o vão do meu aposento e imagino um outro mundo para mim, pensar em uma nova história no qual o meu destino não fosse tão conturbado.
— Não se julgue dessa maneira, os dois entendem que sua dor precisava ser sentida ao seu modo. As pessoas agem de formas diferentes ao sentir a dor da perda.— faço que sim e lembro-me de outro assunto inoportuno.
— Será que um dia eu vou parar de ver os corpos mortos?— respiro fundo e lembro da imagem que vem em minha mente todas as noites.
— Ainda tem aqueles pesadelos?— faço que sim e engulo em seco, sentando-me em minha cama.
— Todos os dias, mas não acordo ninguém ou grito pela dor, apenas choro por incontáveis minutos até dormir novamente com lágrimas nos olhos.— sinto Valentin afagar os meus cabelos e agradeço eternamente por sua amizade.
Chegará o dia da audiência no congresso para saber se estou apta para continuar como destinada real. Visto-me com o mais belo vestido florido que tenho, a vinda de esmeralda tem me animado de modo que me sinto mais leve, apesar do remorso que sinto, pelo que fiz ao Derek, estar presente todo o tempo. Prendo meus cabelos com presilhas de flores e ponho um brilho rosado nos lábios, calço sapatilhas brancas e sinto o perfume de lírios que exala do meu frasco. Como vou estar na presença de conselheiros tenho que por luvas brancas, assim como os sapatos, e o usar o anel de coroa que me foi dado no dia do tão temido sim. Meu vestido é justo na cintura e solto na parte de baixo, com direito a todos os frufrus das moças. Ouço a buzina do automóvel que foi mandado pela rainha Mallory e me encaminho para porta sentindo a ansiedade se apossar do meu corpo, até pensei em tomar os medicamentos que foram passados para mim, no entanto temo pelos efeitos colaterais que posso sentir. Adentro o automóvel e observo uma face familiar.
— Lênin, é você?— ele me dá um sorriso que não chega ao olhos e sinto com pesar a sua dor.
— Sim, senhorita Haas. Quanto tempo não a vejo.— tento olhar a sua face sem demonstrar o meu pesar, soubera que seus familiares morreram todos na tragédia e que ele vira todos jogados ao chão sem vida.
— Vim para Prylea, passar um tempo longe de tudo.— digo sentindo também a minha dor.
— Entendo, voltei a trabalhar tem poucos dias. Fiquei com uma bebê pequena, que escondemos antes de invadirem a minha residência. Não consegui salvar mais ninguém e o que me mantém vivo é saber que ela está a salvo. — fico imóvel por um tempo, não sei como dizer as palavras certas, nenhuma será capaz de os trazer de volta. — Sinto muito por sua mãe, soube que também...— engulo em seco e ponho minhas mãos sobre os joelhos.
— Sim, obrigada.
Vamos o caminho todo em silêncio, sem querer acabamos abrindo uma ferida que pensei que já estar cicatrizada. Ao chegar na Câmara, meu peito arfa por um pouco mais de ar, sinto um frio na barriga e o suor tão característico em minhas mãos, adentro o local e vejo as mesmas paredes brancas e os quadros que jamais mudam de lugar. Agora, a reunião será realizada em outro compartimento e não no palco próximo das arquibancadas. Quando percebo observo diversas pessoas conhecidas de vários reinos, dentre eles príncipes, reis, rainhas e os inquisidores, que são responsáveis pela audiência. Como em todos os lugares, a mesa de reunião tem nomes para cada assento, o meu ao lado de Derek que ainda não se faz presente. Passo minutos observando todos que confiscam meus atos, como se eu fosse uma criminosa. Vejo meu pai adentrar o espaço junto ao rei Derek e Ulyel, vendo isso, inicia o discurso.
— Bom, desejo boa tarde a todos. Como estão todos presentes vou iniciar a audiência para reavaliação de uma destinada. Não costumamos fazê-lo, no entanto creio que um pedido de um rei não pode ser contestado sem antes verificar a acusação. Estão presentes como júri o rei Élan Hansen e a rainha Dorothy Hansen de Dorinlea, a rainha Kaina Ross e Otto Ross de Haffínit, a rainha Evelyn Sharon e o rei Dallas Sharon de Abeiron e o rei que vos fala e a rainha Mallory Engel de Ulyere, os inquisidores Aura Naren e Harle Hawke. Além deles estão presentes as testemunhas solicitadas pelo rei Derek Maris e familiares e amigos da destinada Jade Haas. Agora, convoco o rei Derek Maris, principal interessado na audiência, para nos informar sobre as acusações para com a sua destinada.
— Creio que como é da ciência de alguns, no último festejo em comemoração ao inverno realizado em Narin vi, com meus próprios olhos, a destinada Jade Haas beijar o príncipe da coroa Valentin Ross. Quero a anulação da minha avaliação, o príncipe Ross não aceitou a sua antiga promessa real e suas investidas foram claras para com a senhorita Jade, não há a possibilidade de uma união saudável.— observo todos me olharem e me julgarem. Papai põe suas mãos sobre as minhas e agradeço por isso, não sei como fui capaz de deixá-lo.
— É do interesse de ambos findar o compromisso real?— questiona a inquisidora Aura Naren.
— Sim, vossa excelência.— Derek diz diretamente olhando para mim, com olhos tão frios quanto as geleiras do mar antigo.
— Não fale por mim, eu não tenho interesse.— ao terminar de falar ouço os burburinhos e o olhar de meus amigos sobre mim.
— Deveriam verificar a sanidade mental da senhorita!— respiro fundo, sua voz sai tão afiada quanto as lâminas de um cutelo.
— Majestade, solicito que contenha-se. Não pode ofender alguém, não questionado suas razões psíquicas.— observo o erguer de sua sobrancelha e de como ele está disposto a acabar com tudo definitivamente.
— Eu posso comprovar o que digo, as testemunhas estão presentes.— volto minha atenção para meus amigos e sinto que eles mentiriam por mim.
— Pode citar os nomes, majestade?— Harle Hawke questiona mesmo sabendo quem são.
— Belle Roriz, Cefeida Haas e Ângelo Engel.— sinto por Ângelo, desde que tudo aconteceu Derek não permite receber suas visitas e isso o tem machucado profundamente. Eu preciso resolver as coisas.
— As senhoritas e o príncipe prometem falar apenas a verdade na presença de vossas excelências e todos os jurados?— sinto a preocupação de meus amigos e decido confrontar a autoridade e contornar a situação.
— Vossa excelentíssima, me perdoe pela interrupção, porém em nenhum momento expus os meus argumentos ou me fiz presente nesta audiência, ninguém me questionou os fatos e creio que devo me explicar. Não nego que a acusação feita pelo rei Derek não seja verdade, no impulso da dança e do meu estado emocionalmente abalado, me excedi um pouco e me deixei ser beijada pelo cavalheiro príncipe Valentin. No entanto devo confessar que o pedido para que seja anulada a avaliação seja por um desejo pessoal e não por ser prejudicial ao seu povo, peço que reveja o que foi dito e avalie melhor os termos da solicitação de vossa Majestade. Eu me arrependo de meus atos, não tinha a consciência saudável e tenho como comprovar com laudos periciais.— nem percebi que estava de pé e todos me observavam, o tremor quis retornar, mas dessa vez não serei tomada pelo medo do julgamento.
— Vossa majestade rei Derek Maris, tenho que concordar que as informações de sua destinada real são fatos importantes e nos remete a uma análise. Devemos nos apegar que a informação não é oficial para o povo, o anúncio de sua união com a senhorita Haas ainda é restrita e apenas nós, os envolvidos, sabemos o resultado das avaliações, o que não resulta em traição para o seu povo como alega em seu pedido. Além dessa acusação o rei tem mais alguma coisa para nos informar, caso não tenha, não posso dar continuidade a audiência, encerrarei o processo de análise e não colocarei as questões para o júri. Sabe que a jovem ainda não se encontra em sua posse, não pode cobrar algo dela, mesmo que ela tenha sido educada para tal ação.— ao retomar minha atenção para Derek, vejo sua face rubra e os dedos das mãos esbranquiçados.
— Vossa excelentíssima, creio que não entende, o meu receio é que no futuro ocorra uma nova traição de ambos e temo que possa ter meu nome manchado para meu povo. Como posso controlar um reino se não sou capaz de controlar a futura rainha?— as mãos de meu pai se tornam ainda mais firmes ao ouvir o insulto de Derek, retribuo o gesto, seria terrível se ele tomasse as minhas dores.
— Tenho uma solução para isso, como é da ciente de todos os presentes, o príncipe Valentin rejeitou a sua destinada Princesa Diana Hansen, fato esse que foi informado anteriormente, e a promessa Belle Roriz, por motivos de saúde, não teve como participar das etapas finais da avaliação, não sendo escolhida por nenhum dos participantes. Então, fazendo de modo que não seja injusto com ela, caso seja aceito pelo júri e as demais partes, sugiro que para não haver complicações futuras entre as partes envolvidas, o príncipe Valentin Ross deva aceitar a senhorita Roriz como sua destinada real e assim encerrar qualquer tentativa de um novo cortejo com a senhorita Haas, ressalto que dessa maneira temos dois casos resolvidos, já que a vida da promessa era uma de nossas preocupações.— me viro para ver a decisão precipitada tomada por Valentin.
— Eu aceito os termos, excelentíssima.— fecho os olhos sentindo que por minha culpa duas pessoas que não se amam terão que unir-se, que se eu desistisse de tudo, eles poderiam escolher uma outra vida. No entanto, sou fraca, um humano podre que para não perder o seu amor, perde outro um pouco menor.
— Ótimo, todos os presentes deverão assinar e dar ciência ao que foi dito e os jurados deverão votar sobre a aceitação ou rejeição do acordo. Como lei e eu sou a lei, o maior número de votos vence e não terá direito a contestação ou nova solicitação de revisão.— sinto meu peito inflar com a ansiedade, talvez um dia eu me arrependa de tudo, por hora quero apenas me agarrar a chance de ten
tar amar e ser amada novamente.
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