Capítulo 2
A noite em Eldridge continuava a se arrastar enquanto Lucas se afastava do beco, seu coração ainda acelerado pela adrenalina da caçada. O sangue que manchava sua faca parecia pulsar com uma vida própria, e ele não conseguia afastar a sensação de que algo muito mais sinistro estava à espreita nas sombras.
Enquanto caminhava, ele se lembrou de sua melhor amiga, Ana. Ela sempre foi seu apoio, a única que conhecia sua verdade. Desde que eles eram crianças, Ana tinha um jeito especial de ver o mundo. Ela era curiosa, questionadora e, acima de tudo, não tinha medo de se aproximar do desconhecido. Mas Lucas se perguntava se essa coragem poderia se transformar em uma vulnerabilidade, principalmente agora que ele se envolvia em um mundo tão sombrio.
Ele decidiu que precisava encontrá-la. Ana costumava passar as noites em uma biblioteca antiga, mergulhando em livros de mistérios e lendas urbanas, sempre em busca de respostas. Lucas sabia que ela poderia ajudá-lo a entender mais sobre o que estava acontecendo na cidade. Ele precisava de alguém que acreditasse nele e que pudesse juntar as peças desse quebra-cabeça macabro.
Ao chegar à biblioteca, a atmosfera já tinha mudado. O prédio, geralmente iluminado e acolhedor, parecia agora uma fortaleza escura. As luzes estavam quase apagadas, e a única fonte de iluminação vinha de uma lâmpada fraca que piscava na entrada. Ele empurrou a porta, que rangeu de um jeito desconfortável, e entrou.
"Ana?" ele chamou, sua voz ecoando nas prateleiras empoeiradas. O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Ele percorreu os corredores, a tensão crescendo a cada passo. Finalmente, encontrou Ana, sentada em uma mesa, cercada por pilhas de livros. Ela olhou para cima, e seu rosto iluminou-se com uma expressão de alívio.
"Lucas! Você está bem?" A preocupação em sua voz era palpável. "Eu estava começando a me preocupar. Você desapareceu."
"Eu... eu precisei fazer algo," Lucas respondeu, hesitando. Ele não podia contar tudo a ela. Não ainda. "Eu matei um deles, Ana. Um demônio."
Os olhos de Ana se arregalaram. "Um demônio? Você está falando sério?" Ela se inclinou para frente, a curiosidade misturada com um medo genuíno. "Como você sabe que era um demônio?"
"Eu posso ver a verdade, Ana. Eu sinto quando algo não está certo," Lucas disse, passando a mão pelos cabelos, angustiado. "E eu preciso de sua ajuda para entender mais. Há algo muito maior acontecendo aqui."
Ana olhou para os livros à sua volta, como se estivesse tentando encontrar uma resposta. "Eu li algo sobre demônios disfarçados. Dizem que eles se alimentam do medo e da dor das pessoas. Mas a maioria das histórias não se passa em lugares como Eldridge. Isso é mais como um pesadelo."
"Eldridge é um pesadelo," Lucas murmurou. "E eu não sei quantos mais estão por aí."
No meio da conversa, um barulho repentino fez os dois se virarem. A porta da biblioteca se abriu com um estrondo, e um homem alto entrou, sua figura obscurecida pela sombra. Ele tinha um olhar intenso, e Lucas imediatamente sentiu que algo estava errado.
"Vocês estão falando sobre demônios, não estão?" o homem disse, sua voz profunda e ameaçadora. "Eu sou o que você poderia chamar de especialista nesse assunto."
"Quem é você?" Lucas perguntou, a desconfiança evidente em sua voz. Ana parecia tão intrigada quanto apavorada.
"Meu nome é Victor," o homem respondeu, avançando para a mesa. "E eu tenho informações que vocês precisam. Mas o que eu tenho a dizer pode não ser fácil de ouvir."
Lucas trocou um olhar com Ana. Ele não confiava em estranhos, mas a urgência da situação o levou a ouvir o homem. "O que você sabe?"
"Eldridge é um lugar onde os demônios conseguem se camuflar. Eles são atraídos pelas emoções humanas - tristeza, raiva, desespero. Quanto mais uma pessoa se afunda em suas próprias sombras, mais fácil é para eles se infiltrarem," Victor explicou, seu olhar fixo em Lucas. "E você, garoto, tem uma habilidade única. Você pode vê-los, mas isso vem com um preço."
"Qual preço?" Ana fez a pergunta que Lucas não se atreveu a formular.
"Cada demônio que você mata deixa uma marca em você, uma escuridão que vai crescendo. Um dia, você pode se tornar um deles," Victor respondeu, sua voz grave como um sino fúnebre.
Lucas sentiu um frio na espinha. Ele já se sentia consumido pela escuridão, mas agora isso parecia mais real. "Então, o que você quer de nós?"
"Preciso que vocês me ajudem a encontrar um que está se movendo nas sombras, um demônio que é mais poderoso do que os outros. Ele está atrás de algo que eu possuo, e se ele conseguir, Eldridge estará condenada," Victor disse, sua expressão se tornando sombria. "Se ele não for detido, a cidade se tornará um verdadeiro inferno."
"Como podemos ajudar?" Ana perguntou, seus olhos brilhando com determinação.
Victor sorriu, mas não era um sorriso reconfortante. "Precisamos de coragem. E precisamos agir rápido. O demônio está se alimentando das pessoas, e não podemos deixar que ele continue."
A conversa foi interrompida por um grito distante que ecoou pela rua. O som era agonizante, um grito de puro terror que fez o sangue de Lucas gelar. Ele e Ana trocaram olhares, e sem pensar duas vezes, correram em direção à porta. Victor os seguiu, os passos pesados e decididos.
Ao saírem da biblioteca, o que encontraram os paralisou. No meio da rua, um grupo de pessoas estava cercado por uma figura grotesca, uma criatura que se contorcia entre as sombras, seus olhos brilhando com uma malícia insaciável. O demônio estava se alimentando.
"Precisamos fazer algo," Lucas disse, seu coração batendo descontroladamente. Mas o medo o paralisava.
"Vamos!" Ana gritou, puxando Lucas. "Não podemos deixar que ele faça isso!"
Victor avançou, sua presença imponente fazendo com que o demônio olhasse para ele. "Saia daqui, você não pertence a este lugar!" O demônio riu, um som horrendo que parecia ecoar na mente de Lucas.
"E você é apenas mais um que vai se juntar aos outros," o demônio respondeu, lançando-se em direção a Victor, suas garras afiadas cortando o ar.
Lucas não pensou duas vezes. Ele puxou sua faca, sentindo a familiaridade do metal em sua mão, e correu em direção à criatura. O grito de uma mulher o atingiu como uma lâmina, e ele não podia permitir que mais vidas fossem perdidas. Ele precisava agir.
A luta foi brutal. O demônio era ágil, suas garras cortando o ar, enquanto Lucas tentava encontrar uma abertura. Ele viu Victor lutando, sua força surpreendente, mas o demônio parecia se regenerar a cada golpe. O sangue jorrava, e o cheiro metálico preenchia o ar.
Ana, por sua vez, não recuou. Ela encontrou uma barra de ferro entre os destroços e a usou como arma. "Lucas! Agora!" ela gritou, e ele se preparou.
Com um movimento rápido, Lucas atacou, a faca penetrando o lado do demônio. A criatura urrou de dor, e Ana aproveitou a oportunidade para desferir um golpe na cabeça do demônio. A luta se transformou em um massacre. O demônio, em um último esforço, lançou suas garras em direções aleatórias, fazendo com que Lucas caísse para trás, o impacto da queda fazendo sua visão escurecer.
A cena se desenrolava em um turbilhão de sangue e gritos. O demônio estava se contorcendo, a vida se esvaindo dele enquanto Lucas, agora de pé novamente, se uniu a Ana e Victor para dar o golpe final. A lâmina cortou a carne, e a cabeça do demônio rolou pelo chão, um sorriso macabro congelado em seu rosto.
O silêncio que se seguiu era ensurdecedor. O que restava da criatura era uma poça de sangue e vísceras, e Lucas sentiu o peso de suas ações. Ele havia matado mais um, mas a escuridão dentro dele parecia crescer, como se estivesse se alimentando de seu próprio horror.
"Isso não é o fim," Victor disse, olhando para eles com um semblante grave. "Isso foi apenas o começo. Eles virão atrás de você, Lucas. Você precisa estar preparado."
Lucas olhou para os destroços ao seu redor, a cidade que antes era familiar se transformando em um campo de batalha. Ele sentiu a pressão da responsabilidade sobre seus ombros. E, no fundo, uma pergunta ecoava em sua mente: até onde ele iria para proteger aqueles que amava?
A resposta era simples, mas aterrorizante. Ele estava apenas começando a entender a verdadeira natureza do combate que enfrentava, e a linha entre caçador e presa estava se tornando cada vez mais indistinta. Enquanto o sangue se espalhava pelo chão, uma ideia sombria tomou forma em sua mente: talvez, no final, ele também fosse um demônio.
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