• Dia 5 •
Inspirei a brisa fresca que tocava meu rosto ainda de olhos fechados, o canto dos pássaros ecoava em volta.
Com pressa, abri os olhos e me surpreendi com o lugar, parecia um bosque, com árvores tão altas e por toda parte, que mal dava para ver o céu. Os cheiros de pinheiro e eucalipto eram fortes, assim como o cheiro de terra molhada.
A grama alta, os arbustos, os galhos de árvores caídos no chão. Era um lugar bonito, mas que infelizmente eu não reconhecia. Olhando em volta notei que estava sentada em cima de uma toalha de piquenique em uma clareira e que tinha uma cesta com comida ali também.
— Oh, você acordou, finalmente!
Assustei-me com a voz suave surgindo do meu lado. Virei o rosto e não acreditei no que estava vendo. Mamãe sorriu para mim enquanto mexia em uma coroa de flores roxas.
Estava linda como eu me lembrava, seus longos cabelos escuros soltos e emoldurando seu rosto de traços delicados, ela sorria e era como se nunca tivesse ficado doente.
— Mamãe?
Não sabia o que dizer, a saudade que sentia dela era enorme. Não fazia a mínima ideia do que estava acontecendo, mas era tão bom vê-la. Tinha quase certeza que era um sonho, do qual eu não queria acordar nunca mais.
— Coloca, vai ficar linda! — Ela disse estendendo a coroa de flores para mim.
Quando não me mexi, mamãe se aproximou e ela mesmo colocou a coroa em minha cabeça. Meus olhos marejaram com o seu toque suave, antes que pudesse pensar, me joguei em seus braços e comecei a chorar.
Já se passaram quatro anos e era como se tivesse sido no dia anterior que meus avós deram a notícia de que ela partira, eu nem pude me despedir. Aconteceu tudo tão rápido e só me restou as lembranças, a saudade.
— Shh, está tudo bem, querida! — Seu carinho me fez chorar ainda mais.
— Eu sinto tanto a sua falta, mamãe.
— Eu sei, filha.
Mamãe se afastou para poder encarar meus olhos e foi como se ela ainda estivesse viva. Esqueci os últimos anos e me concentrei naquele momento, nós duas juntas, como nos velhos tempos. Seu olhar caloroso transmitia tanto amor, tanto carinho.
— Minha princesa! Você sempre foi tão forte, amável e espontânea com o seu jeitinho desastrado. Tenho muito orgulho de você, Treeny. Só quero que seja feliz e que aproveite cada momento da vida sem arrependimentos. Não tenha medo, querida, eu estarei aqui para te proteger.
Suas palavras me confortaram, mas me deixaram confusa. Mamãe depositou um beijo na minha testa, fechei os olhos para aproveitar o seu toque e quando os abri, ela não estava mais na minha frente...
— Mamãe?
Sentei no meio da cama com a respiração descompassada, olhando ao redor. Estava no meu quarto, o despertador tocava sem parar ao lado da cama.
Foi só um sonho.
Tudo não passou de um sonho, mas as palavras da minha mãe... suas palavras ecoavam na minha mente e fiquei pensando nelas enquanto me arrumava para a escola.
Mamãe sempre dizia para eu ser forte, que ela confiava em mim, então talvez eu devesse fazer o mesmo. Não tinha muitas pessoas do meu lado para me apoiar, nada mais certo do que eu confiar e acreditar em mim mesma.
Não queria me prender nas situações ruins que aconteciam comigo, tinha que ser forte e me concentrar nas coisas boas.
Os pensamentos fervilhavam dentro de mim durante o café da manhã e o caminho da escola. Só me distrai quando vi Sebastian encostado no meu armário, ele sorriu ao me ver, estava usando uma jaqueta preta por cima de uma camiseta branca. Seus cabelos loiros estavam bagunçados e era a primeira vez que não tinha nada os escondendo.
Parecia um mar de fios dourados, que deviam ficar mais lindos sob a luz do sol, minhas mãos chegaram a coçar de vontade de acariciá-los.
— Bom dia, Treena!
E lá estava ele me cumprimentando com um beijo no rosto. A sensação boa que ele provocava em mim surgiu como em um passe de mágica, o formigamento onde seus lábios tocavam na minha bochecha enviava uma onda de eletricidade pelo meu corpo e senti minhas pernas bambearem um pouco.
Era como se meu corpo estivesse despertando de um sono profundo, fazendo eu me sentir mais viva.
— Bom dia, Sebastian!
Ele se encostou no armário ao lado e ficou esperando enquanto eu conferia meus horários. Guardei os livros na bolsa antes de seguirmos lado a lado pelos corredores até a primeira aula.
— Ei, estava pensando, podíamos sair hoje depois da escola, o que acha?
Sebastian chamou minha atenção entre um corredor e outro, me assustando com a sua proposta. Ele queria sair comigo? Tipo, sair mesmo? Aquilo nunca tinha acontecido antes, ninguém nunca me chamou para sair, nem para ir na sorveteria que ficava perto da escola.
Era uma novidade assustadora que me deixou sem reação.
— Nossa, não esperava por essa reação. — Ele rebateu, olhando para o meu rosto.
Meus olhos arregalados, a boca aberta, tinha certeza que minha expressão não era das melhores. Sebastian, com toda certeza, era a única pessoa que conseguia provocar diversas emoções em mim em um curto espaço de tempo.
— Eu... — Tentei explicar minha reação, mas nada saiu.
— Relaxa, se não quiser, não precisa aceitar. Só foi uma ideia, mas adoraria dar uma volta com você depois da escola. — Sebastian me tranquilizou, com um sorriso no canto dos lábios.
— Eu... eu vou adorar sair com você.
Aceitei o seu convite me recordando do sonho com minha mãe, suas palavras me incentivando a ser feliz e aproveitar cada momento da minha vida. Sebastian me convidar para sair era uma novidade, eu só precisava me acostumar com as mudanças que estavam acontecendo comigo, para assim não sentir medo ou ficar assustada.
Seu sorriso apareceu, que chegava aos olhos. Não dissemos mais nada, apenas seguimos para a sala e as aulas se foram com rapidez.
Na hora do almoço Sebastian e eu ficamos na biblioteca lendo um livro para a aula de Literatura. Foi quando minha ansiedade começou a aumentar com o passar das aulas. Sebastian se tornou tão presente, que parecia que ele sempre esteve do meu lado, chegava a ser loucura a conexão que surgiu entre nós, era tão natural e repentina, mas eu gostava muito.
Quando o sinal tocou no fim de mais um dia na escola, senti meu coração acelerar. Sebastian não disse nada ao deixarmos a sala, ele só me seguiu até o meu armário e depois até a saída. Nos encaramos por alguns segundos antes de ele se afastar na direção do estacionamento e seguir até o seu carro, onde ele se encostou na lateral cruzando os braços.
Sem perder mais tempo, segui até o carro com o motorista esperando. Seria a primeira vez que não iria para casa depois da escola, chegava a ser emocionante, não só por sair com um garoto, mas sim por sair com Sebastian.
Cameron e Carter me encararam com os olhos arregalados quando avisei que não ia para casa e que tinha carona de volta. Suas expressões foram engraçadas, mas por um milagre, eles não disseram nada. Sorri antes de me virar e seguir na direção de Sebastian, que retribuiu o sorriso quando me viu, parecendo aliviado por eu não ter desistido de sair com ele.
— Então, aonde vamos? — Indaguei, parando na sua frente.
— Eu pensei em um lugar legal, mas não vou dizer ainda.
Franzi o nariz com sua resposta, o que fez ele rir e me puxar para um abraço. Seus braços a minha volta fizeram minhas pernas fraquejarem um pouco, inspirei seu perfume masculino com um toque de limão e o frio na minha barriga só ficou mais intenso.
Sebastian beijou o meu rosto e me puxou para entrar no carro. Não conhecia muito sobre carros, mas sabia que o seu era um muito bom. Tinha o seu cheiro misturado com aromatizador. Depois de tomar o seu lugar e dar partida, ele ligou o rádio do carro, colocou em uma estação local e ficou cantando o caminho todo até chegarmos ao boliche no centro da cidade.
Sorri pela escolha do lugar, poucas, foram as vezes que estive no boliche e podia garantir que não foram grandes momentos, mas eram lembranças da minha mãe tentando juntar a família.
Quando entramos no local, sorri com as luzes neon. Da entrada dava para ver o enorme balcão do lado direito, onde ficava os sapatos próprios para o jogo.
Em frente do balcão tinha algumas mesinhas altas com bancos de madeira escura. Poltronas de couro vermelho formavam um espaço reservado para cada pista lado a lado. Tinha algumas pessoas jogando, Sebastian tentou me convencer a jogar com ele, só que eu ganhei a discussão dizendo não.
Por mais que tenha insistido, Sebastian respeitou minha decisão e juntos fomos até a lanchonete do outro lado das pistas. Não era muito diferente de outras lanchonetes, as mesas estavam dispostas em fileiras intercalando em cores vermelha e azul, e cada uma delas tinha uma lanterna japonesa em cima.
Ele fez o pedido quando a garçonete veio até a nossa mesa. Não consegui esconder o sorriso por estar ali com ele, ainda era surreal que tivesse sido convidada para sair com um garoto, mesmo que não fosse nada formal.
— Vamos fazer um jogo rápido de perguntas para nos conhecermos melhor? — Sebastian sugeriu quando ficamos sozinhos.
— Tudo bem.
— Quantos anos tem? — Perguntou tentando se manter sério, mas um sorriso se insinuava no canto da sua boca.
— Quinze, e você?
— Dezesseis, gosta de animais? — Sorri com sua pergunta, não esperava por aquilo.
— Gosto, sempre quis ter um gato, mas nunca pude. E você?
— Gosto, sou louco para fazer um safari na África e conhecer a selva. — o jeito que ele falou me fez rir e bem lá no fundo uma parte desejava fazer a mesma coisa que ele, só que com ele. — Me diz uma mania sua.
— Hã... tenho a mania de organizar meus livros por ordem de cor. — Contei, fazendo ele franzir a testa e me encarar com uma expressão de interrogação.
— Então temos uma devoradora de livros aqui? Nunca conheci alguém que fizesse isso. Como consegue? Eu não teria coragem de separar minhas sagas. — Sebastian sorriu no final e passou pela minha cabeça que ele gostou do meu jeito.
Era clichê dizer que eu amava ler, que sempre preferi ficar trancada no quarto e que o mundo literário era mil vezes melhor que o mundo real em muitas situações. Mas aquela era eu, uma devoradora de livros, como ele mesmo disse.
— Sabe como é, os livros acabam sendo uma válvula de escape e separar por cor é fácil, também não conseguia separar, mas com o tempo você se acostuma.
— Entendo, gosto de ler também. Uma vez fiz uma competição com minha mãe, ela também gosta, quem lesse mais livros em um mês ganhava um vale presente para comprar mais livros. Consegui vinte e três, ela conseguiu dezenove. Teria conseguido mais se estivesse de férias na época.
Fiquei surpresa com sua confissão, não por ele competir com a mãe para ver quem lia mais, e sim por ele dizer tudo aquilo para mim sem problemas. Sebastian falava comigo como se fossemos conhecidos de longa data, e quanto mais tempo passávamos juntos, não parecia que tínhamos nos conhecidos há cinco dias.
— Vinte e três é um bom número. Que gênero você prefere? — Indaguei, tomando a iniciativa de ser mais participativa na conversa.
— De tudo um pouco, mas ficção científica é meu ponto fraco. E o seu?
— Leio muito romance, mas amo fantasia, mitologias e terror. Meu avô até me deu uma edição de colecionador dos terrores do Stephen King quando fiz treze anos. — Comentei.
— Agora eu estou surpreso, quem diria que uma romântica gosta de terror? Garota, assim eu me apaixono. — Sebastian brincou, rindo.
Suas palavras fizeram meu coração acelerar, até poderia ser o princípio de um infarto, e meus olhos se arregalaram. Sebastian falou tão tranquilo que nem se deu conta do efeito que sua frase causou em mim, tentei me recompor para ele não perceber o meu momento bobo.
A conversa entre nós fluiu suave.
Comemos, rimos e nos conhecemos um pouco mais. Ele me contou dos seus gostos, suas manias e até sua preferência por escutar música em disco de vinil. Achei fofo por ele ser um garoto moderno, mas apegado a antiguidades.
Sebastian se mostrou ser uma pessoa diferente da sua aparência, que era legal e muito inteligente, não tinha preconceito com nenhum assunto e acabamos falando de tudo um pouco.
Em meio de tudo, acabei percebendo que enquanto falava, ele me observava com um sorriso nos lábios e um brilho diferente nos olhos. Não sabia descrever bem o que acontecia, me deixou constrangida a ponto de querer me esconder, mas permaneci do seu lado desejando conhecer mais dele do que nunca.
Eu queria que Sebastian fizesse parte da minha vida.
Ficamos tão envolvidos na nossa conversa, que só me dei conta do horário quando escutei uma mulher reclamando com sua filha por ter que ir para casa fazer o jantar. Pedi para Sebastian me levar para casa e ele não recusou meu pedido. Deixamos o boliche lado a lado, seguindo para o seu carro no estacionamento.
Durante o caminho fui dizendo a direção que ele devia seguir enquanto fomos conversando sobre alguns livros. Sebastian era engraçado, me fazia rir com facilidade e aquilo me fez gostar ainda mais dele.
O que trouxe a ordem de Trevor a minha mente outra vez, e eu percebi que era uma bobagem, Sebastian mostrou ser uma boa pessoa e tinha certeza absoluta que ele não seria capaz de me machucar ou me enganar.
— Apesar de você ter se negado a jogar boliche comigo, me diverti hoje e adoraria repetir mais vezes.
Sutil como um rinoceronte, as palavras de Sebastian fizeram meu coração acelerar mais uma vez. Ele sorriu enquanto parava o carro na entrada da minha casa e senti o ar sumir quando ele se virou para mim.
Ele não parecia se importar com a grandiosidade que era a minha casa. O brilho diferente de mais cedo retornou a seus olhos e quis saber o que tudo aquilo significava, quis entender o que estava acontecendo entre nós dois.
Me perdi um pouco em devaneios, e só voltei a realidade quando Sebastian desceu do carro e veio abrir a porta para mim. Cavalheiro e surpreendente, sorri com sua atitude, ele vinha sendo o causador de muitos sorrisos meu.
— Tchau, Treena!
— Tchau, Sebastian!
Ele beijou meu rosto, o contato ardendo em minha pele e me deixando desnorteada como nas outras vezes. Fiquei parada, sem reação, mesmo depois de ele já ter ido embora. Me sentia feliz, muito feliz, e sentia que podia continuar assim se Sebastian estivesse na minha vida, se ele estivesse perto e me fizesse sorrir.
Não precisava de palavras ou gestos, só a sua presença era o suficiente para eu me sentir bem e era loucura pensar assim, porque fazia tão pouco tempo que ele apareceu na minha vida.
Tão pouco tempo e parecia anos.
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