Filho do mar
Notas iniciais:
Aqui está mais uma fanfic, espero que gostem ^^
Co-Autor: PurpleGalaxy_Project
_Avaliação por: @madu_Koofus
_Betagem por: DarkBlueKisss
_Design por: ggukminte
_Trailer por: Lety_azul
°°°
"Já parou para pensar que os sentimentos que nutrimos por alguém são como as ondas do mar?"
As coisas para a vila não pareciam ir muito bem. Os moradores começaram a ficar aflitos com a mudança climática repentina, o frio exagerado que costuma ter está o triplo do exagero esse ano e o povo está pensando que isso significa mau presságio, como se algo ruim estivesse prestes a acontecer a qualquer momento.
Olho para o lado de fora. Os peixes estavam devagar, pareciam calmos como se não soubessem o que estava ocorrendo, talvez seja isso mesmo, diferente dos outros como eu que não conseguia conviver com essa calmaria, pareciam apressados demais para fazer as coisas. Odeio admitir isso, mas precisava de ar... O mesmo ar que minha irmã respira atualmente.
— Onde vai? — Meu pai, um homem de meia idade, a pele um pouco mais escura que a minha, e os olhos como da maioria que habitava esse mar, azul como o oceano. — Vai visitar aquela?
— "Aquela" é sua filha — murmurei, pegando uma bolsa com alguns suprimentos. — E sim, vou visitá-la, faz umas semanas que não a vejo.
— Ela foi banida do mar, por que a visitaria?
— É lei não visitá-la? — Olhei para meu pai de modo sério. — Ela pode não conseguir mais pisar os pés aqui, mas posso muito bem pisar os meus fora desse mar.
Meu pai não falou nada, apenas se levanta abanando a mão, dizendo-me para fazer o que eu bem entender, desde que não o incomodasse. Dou um grande sorriso, gritando um "obrigado" enquanto saía de casa.
Aqui onde vivo não é diferente da superfície, tenho pernas e braços como humanos, falo sua língua sem muita dificuldade, sei a maioria das leis já que minha espécie está incluída em algumas, a única diferença é que somos humanos que vivem debaixo d'água, convivemos com peixes de diferentes tamanhos ao invés de trens, ou seja lá como o pessoal de cima chama. Seres como eu usam a famosa correnteza para chegar mais rápido em algum lugar e várias coisas desse tipo.
Nada muito complicado para se lembrar. Pode parecer estranho no início, com toda certeza, mas essa é minha casa, onde nasci e passei a morar desde então. Talvez seja por conta das coisas que ouvi quando criança, ou pelo fato da minha irmã ter me abandonado aqui e ido morar com o seu atual marido na superfície, mas odeio os humanos.
Meu nome é Kim Taehyung, tenho meus 19 anos e sou filho do mar.
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Subo para a superfície sem muita dificuldade, ignorando os olhares do povo mais velho ao me ver nadando para tal lugar, mas precisava ver minha irmã. Mesmo que ela não esteja por aqui, ainda posso vê-la sempre que quiser, e como anda as coisas ultimamente. Preciso abusar um pouquinho desse meu "poder" enquanto ainda não proibiram de subir à superfície.
Olho ainda na água para a cidade fora dela. Algumas pessoas passavam apressadas para lá e pra cá sem olhar para o mar; os carros passavam pela pista fazendo muito barulho para meus ouvidos. Suspirei, já sentindo a diferença climática.
Subo os degraus de uma escada que tinha ali, onde vejo bastante pessoas brincando aqui perto, sentando-me no último degrau, virando-me para o sol, fechando os olhos e esperando um pouco o tempo passar para minhas roupas secarem um pouco, ou melhor dizendo, para eu tomar coragem para visitar a minha querida irmã.
Quando sei que já deu a minha hora, começo a andar para fora dali, longe do mar, ignorando as pessoas que me encaravam curiosas ou com medo, não que eu seja uma das sete maravilhas do mundo, mas não sou tão assustador assim para sair de perto... Ou sou?
— Tae! — Uma voz familiar chama a minha atenção, um garoto mais ou menos da minha idade corria em minha direção balançando os braços. — Minha mãe mandou te entregar.
— O que é isso? — Abri a sacola de plástico curioso com o que tinha dentro.
— É pra sua irmã, tem alguns temperos para comida.
— Hmm... Vou entregar para ela, obrigado Jimin.
Jimin é um amigo que fiz aqui na superfície, sua mãe é dona de um mercado próprio para temperos, fica em uma barraquinha perto da entrada da cidade, perfeito para os turistas que entram e saem da pequena vila. O conheço faz quase três anos e, para a minha surpresa, sua mãe também veio do mar, igual a minha irmã. Isso o faz meio filho do mar, certo?
— Quer vir comigo? — perguntei, vendo sua bicicleta estacionada perto de um muro.
— Infelizmente tenho que trabalhar, alguns moradores pediram alguns temperos por encomenda.
— Encomenda? — Levantei uma das sobrancelhas, confuso.
— É, tipo... Eu tenho que entregar o que eles pedem em suas casas.
— Só você? — O Park concorda. — Isso não parece nem um pouco legal.
— Até que gosto, conheço um monte de gente. Hoje mesmo uma senhora me deu um pote de bolos de baunilha, estava uma delícia.
— É, devo imaginar — sussurrei sem entender muita coisa. — Lá em casa a senhora que mora perto de uma escola me dá algas todo final de semana.
Jimin fez uma pequena careta, olhando-me, o que me fez rir de sua cara. Voltei a olhar para a sacola e para a bicicleta logo em seguida. Andar por aqui sem a ajuda da água era cansativo.
— Pode me deixar perto da casa da minha irmã? — murmurei com uma voz fina enquanto balançava seus braços. — Por favor, Minnie, prometo que não vou te deixar cair como da última vez.
— Tae, pare com isso. — Tentou se afastar, mas não deixei, ainda o aborrecendo da melhor forma que consegui: fazendo cócegas. — Ei! Tá, tá, eu vou, agora parou!
— Nossa, que fracote — debochei, seguindo-o até a bicicleta, montando na parte de trás naqueles tipos de grade como costumava fazer, ficando de costas para ele. — Obrigado.
— Está me devendo uma.
Sorri, sentindo o vento forte em meus cabelos. Gostava de andar de bicicleta apesar de nunca ter pedalado antes; olhar a passagem era relaxante de alguma forma. Daqui onde estou, passando rapidamente entre as pessoas, parecia que os humanos não eram assim tão ruins como o povo da minha vila costumavam falar.
Os mais velhos, principalmente, falavam que humanos não eram como a gente por diversos motivos e precisamos ter cuidado com eles. Se pudéssemos evitá-los, seria melhor ainda. Às vezes, pergunto-me por que eles falam dessa forma, mas aí quando acabo esbarrando em um mero humano, vejo o que eles queriam dizer.
— Chegamos — Jimin falou, parando a bicicleta. — Boa sorte.
— Você sabe que vai ser a mesma coisa, mas obrigado mesmo assim.
Vejo isso na maioria dos humanos que tive contato. Esse ódio que eles têm da gente ou o preconceito por sermos de espécies completamente diferentes, ou melhor dizendo, ser algo que eles não estão acostumados a conviver, não consigo entender.
— Taehy?! — Escuto a voz da minha irmã e a vejo na porta com uma criança no colo. — É você mesmo?
— Quem mais seria? — Dei um pequeno sorriso, indo em sua direção. — Ele está?
— Ele? — Ela olha para trás e vejo a figura masculina aparecer com uma cara nada boa.
Sei sobre tudo isso. Sei porque o marido da minha irmã é um desses humanos idiotas, o motivo por ela ter sido banida do mar e o responsável pelas minhas brigas com ela.
— Quanto tempo — falou sério. Apenas o encaro, não querendo responder. — Bem, já volto.
Continuou olhando, andando devagar em minha direção passando por mim, antes de murmurar algo que já estava acostumado a escutar: "você fede a peixe", mas como já havia escutado essa frase várias vezes desde que minha irmã conheceu esse homem, aquilo não me afetou como antigamente, se fosse a alguns anos atrás, estava em cima daquele humano bestial lutando com tudo que tinha até não sobrar mais nada daquele rosto idiota.
— Vem, sorte sua que a casa está limpa.
— Mana, as coisas não precisam estar perfeitas quando eu for te visitar.
Murmurei, arrastando meus pés pelo chão de terra. Já estava sentindo falta da água, aqui é muito mais difícil para respirar do que no mar, mas não vou reclamar, pelo menos aqui na cidade é mais limpo do que várias outras que conheço.
— Papai não brigou com você? — minha irmã perguntou, curiosa como sempre.
— Ele só mandou eu tomar cuidado. — Sorri animadamente pegando a minha sobrinha no colo. — Ela cresceu desde a última vez que a vi.
— Não é?
— Ela tem os nossos olhos. — Brinquei com o nariz da pequena. — Uma pena ser filha daquele ser.
— Taehyung, não começa — retrucou a mais velha, trazendo-me uma xícara de chá. — Ele tá mudando.
— Duvido, é vaso ruim, não vai se quebrar tão cedo. — Suspirei baixinho, olhando para a pequena em meus braços, cabelos negros e olhos azuis como o meu.
— Bem, como está lá com o papai? A vila continua a mesma?
— Bom.... Por que não vai dar uma olhada?
— Você sabe que não posso, se alguém me ver ali...
— Ah, por favor, ninguém vai te ver lá, e se isso ocorrer, não é como se fossem te matar ou algo do tipo.
— Taehyung... Isso não teve a menor graça.
Fiz bico, bebendo um pouco do chá, olhando para o lado. A casa onde minha irmã vivia era até que grande para três pessoas morarem. Tinha uma sala que dividia com a cozinha, um corredor com três quartos e dois banheiros, uma escada fora da casa que dava acesso a mais um quarto que, segundo ela, era o quartinho da bagunça, um tipo de sótão, vamos dizer assim. Perguntei para ela por que tantos quartos, minha irmã me respondeu que um em especifico era só meu.
— Mas sério, como está lá embaixo?
— Estranho...
— Estanho como? — Sentou-se do meu lado, comendo alguma coisa branca. O que era aquilo? Algum tipo de bolo?
— Ah, bem, a semana está bem gelada, os peixes estão sumindo aos poucos, o chefe da vila falou para começar a armazenar comida, não entendi bem, mas o próximo inverno vai ser bem difícil para nós que mora no mar.
— Ah, isso ocorreu há alguns anos atrás, eu nem tinha nascido ainda. — Espreguiçou-se. — Isso é quase uma hibernação.
— Como os ursos?
— É. — Minha irmã riu do meu exemplo. — Não sei quanto tempo vai durar, mas a última vez que isso ocorreu, durou mais ou menos três anos para o povo acordar.
— Eu realmente não entendo nada sobre isso.
— Meu deus, Tae, você aprende isso na escola.
— Provavelmente eu faltei às aulas. — Minha irmã me olhou feio, levantando-se do sofá. — Mas dormir por três anos é muita coisa... Não é?
— Bom, você nem vai perceber, vai estar dormindo e, quando acordar, nem vai sentir que o tempo passou.
— Olha... Posso dormir aqui hoje?
— Por que isso de repente? Pensei que o meu marido te incomodasse.
— Eu posso suportar, contanto que ele não venha me encher o saco depois.
— Engraçadinho. — Ela riu, parecendo nervosa.
— O que houve?
— O quê? Não houve nada, por quê? — Colocou seus cabelos longos atrás da orelha, desviando o olhar.
— Você está muito estranha, o que está acontecendo?
— Bem... — Deu um pequeno sorriso. — Você não tem mais um quarto.
— Por que não? O que houve com o meu?
— O Remy mudou tudo e virou um escritório.
— Remy?! O que o seu marido fez no meu quarto? Justo no meu?
— Ah, ele precisava de um lugar para trabalhar, o quarto da sua sobrinha não dava, nem o nosso.
— E o quarto lá fora?
— Ele disse que é muito longe das coisas... E suas coisas estão lá.
— E onde eu vou dormir? No sofá não dá, lá no quarto pelo menos eu tinha privacidade e o seu maridinho não ia me incomodar. — Suspirei, pensando. — O quartinho da bagunça não dá para eu ficar?
— Remy me disse que não tem outro lugar para colocar aquelas coisas.
— Remy? Eu quero que ele se lasque.
— Sinto muito, Taehy, mas você demorou tanto para voltar...
— Foram só uma semana — murmurei chateado, devolvendo minha sobrinha à minha irmã.
— Onde vai?
— Pegar minhas coisas, depois vou para casa.
— Taehyung, fica, você pode dormir no quarto da pequena junto com ela.
— Ela nem dorme no quarto sozinha, a coitada nem tem um ano de vida ainda, por favor... É melhor eu ir, antes que o Remy — pronunciei o nome daquele homem da maneira mais infantil que consegui — volte e eu arrebente o nariz dele como da última vez.
Marchei até a porta sem olhar para trás, subi aquelas escadas e empurrei a porta de madeira pesada daquele local empoeirado, tampei o nariz sacudindo a poeira em volta e abrindo a janela para iluminar o local. Realmente aquele quarto estava uma baderna.
— Céus, onde eles colocaram?
Tirei algumas madeiras do caminho, abrindo caminho para a cama onde dormia de ponta cabeça junto com as minhas coisas de lado. Suspirei aliviado ao ver que todas estavam ali e nada havia sido jogado fora.
Pego apenas um colar de conchas que ganhei do Jimin e saí daquela casa, não poderia pegar as outras coisas porque iam molhar e estragar com a pressão da água ou por simplesmente molhar.
— As coisas dos humanos são tão fracas....
Murmurei, sentindo o vento aumentar quanto mais perto que chego do mar. De longe, vejo o marido da minha irmã seguir o caminho para a casa e rapidamente pulei para a água, realmente não queria vê-lo tão cedo.
É impressionante, sempre terminava assim, eram poucas as vezes que eu e minha irmã terminava o dia bem. Sempre quando retornava para casa, meu pai vinha no meu quarto duas horas depois falando que minha irmã havia ligado para casa pedindo desculpas, mas às vezes isso cansa.
A mesma rotina. Não sei porque tento conversar com ela sabendo que no final seria a mesma coisa, uma troca de palavras um abraço e, de repente, estou me mandando dali, ainda mais agora que não tenho nem um quartinho para mim.
— Por que reclamo tanto? — falo comigo mesmo. — Bem, não é como se eu tivesse um lar aqui mesmo.
Conforme vou me aproximando da vila onde moro, vou vendo as pequenas luzes azuis se ligar no fundo do oceano, indicando que lá embaixo já estava escurecendo. Pergunto-me se lá de cima os humanos conseguem ver...
Quando sinto que o meu dia não poderia piorar, sinto algo estranho. De repente, a atmosfera começou a ficar mais tensa, como se o ar que respirava começasse a se esvaziar dos meus pulmões. Olho para os lado, vendo os peixes nadarem rapidamente, como se estivessem fugindo de algo, como se a água não fosse mais um lugar seguro para ficar.
— Tubarão? — perguntei, sentindo o meu sangue esfriar. — Monstro marinho?
Olho para trás, desesperado, e vejo o porquê daquela sensação: algo estava vindo na nossa direção. Estava ferrado, a única coisa que dava para fazer era fugir dali, junto com os outros peixes, mas talvez por eu estar com o corpo meio sem energia pelo medo, não fui rápido o bastante.
— Merda! Merda! — gritei, vendo que estava encurralado. Olhava para todos os lados e só via aquele bicho. — Malditos humanos!
Era uma enorme rede de pesca, daqueles bem resistentes e eficientes para pescar vários peixes de uma vez, o desespero era grande, ninguém tinha me falado que isso poderia acontecer algum dia, ninguém me disse como sair dessa situação desde que nasci.
No fim, fui capturado como imaginava. Meu coração não parava quieto no meu peito, sentir as cordas dessa rede me deixava enjoado, tudo bem pescar alguns peixes, até eu faço isso, mas o problema aqui é que eu não sou um.
— Alguém me socorre, por favor — sussurrei, sentindo meus olhos quererem chorar.
Agarro na rede com força, sentindo ser puxado para cima, olhando na direção da vila e, aos poucos, a luz azul que iluminava aquele lugar ia sumindo até não poder mais enxergar... Ah, então os humanos não conseguem vê-las da superfície, isso é tão triste... Elas são tão bonitas.
Respirei fundo quando saí da água, olhando para baixo vendo o meu reflexo sob a água. Meus olhos estavam vermelhos, estava chorando de medo, meus ombros estavam rígidos e não queria olhar para trás, porém para a minha surpresa, a rede balançou e começou a girar, olhei para frente e o vi. Aquele humano me encarou assustado... Maldito ser humano.
Yoongi on
Estava no meio do mar, perto do litoral naquele final de tarde, meu avô tinha saído e mandou ver se conseguia pescar alguma coisa para hoje a noite. O mais velho já tinha pedido permissão para o prefeito da cidade, na verdade, ele basicamente era um dos únicos habitantes a ter permissão de pesca na hora que quisesse.
Segundo ele, por morar aqui na beira do mar ao invés na cidade como todo mundo, ele tinha mais liberdade de fazer o que quiser, mas acredito que não seja bem isso, afinal, ele não é o único a morar aqui com a gente.
Não que eu odeie pescar, até que gosto, fico lendo um livro ou algo do tipo para passar o tempo. A verdade é que gosto de ficar mais na minha, gosto de entrar em vários pensamentos e não parar mais, já que, fora desse barco, não tenho tempo para isso.
O único problema é fazer isso quando você não quer pensar muito, quando é obrigado a fazer, mesmo que meu avô tenha falado para mim que não era, sei que se não voltar para casa com pelo menos um peixe, o mais velho me botará para dormir com os cachorros hoje a noite.
— Okay, acho que já deu um tempo. — Olho para o relógio em meu pulso, começando a rodar a corda da rede para cima. — Espero que tenha pego alguma coisa.
Fui rodando aquele treco até sentir que estava com um pouco mais dificuldade que o costume, sorri para mim mesmo um pouco surpreso com o peso que estava fazendo em meu barco.
— Não acredito, pesquei um dos grandes!!
Estava animado, meu avô irá ficar feliz com a minha evolução de pesca; contudo, conforme fui subindo a rede, vejo que tinha algo estranho, e quando olhei para aquilo, meus olhos quase saltaram para fora. Havia peixe sim, contudo, também havia um semi humano.
Ele tinha cabelos presos em sua testa por conta de estar molhados pelo mar, usava roupas normais e estava descalço, sua pele tinha um tipo de brilho que nunca tinha visto antes, e quando este olhou para mim, pude ver aqueles olhos azuis que tive sempre curiosidade para saber se realmente eram reais ou só a escola que enganava a gente.
— Azuis... — O garoto me encarava confuso, respirando pesado e agarrando aquela rede com força. — São lindos.
Ele ficou me encarando por alguns segundos antes de começar a se debater tentando se equilibrar naquelas redes e o olhar confuso passou a ser de raiva.
— Porra, me tira daqui seu idiota!
— O quê...?
— Não escutou? — gritou, puxando-me pelo buraco da rede, agarrando a minha blusa e me trazendo para perto de ti. — Me tira dessa merda, senão eu te mato.
Ainda confuso, faço o que ele me pediu. Trago a rede para o barco e o tiro dali, o garoto de cabelos negros se levanta com dificuldade, tirando algumas algas de seu corpo, agora me encarando constrangido.
— Nunca mais faça isso, quase me mata do coração.
— Desculpa, não sabia... Pensei que nesse horário vocês estariam em casa, e não fora...
— Bom... — Limpou a garganta. — Era, mas tive um pequeno contratempo e... — Parou a frase no meio. — Por que estou te dando explicações? Isso foi quase um sequestro, sabia?
— Ah, por favor... Não exagera.
— Não exagera? Fala isso porque não foi você que foi pescado como um peixe!
Fiquei calado, observando-o. Ele caminhava para lá e para cá enquanto falava alto, foi então que percebi que ele estava mancando. Olhei na direção de seus pés e vi que um estava vermelho e inchado, acho que se machucou com a rede.
— Me desculpa — falei,apontando para o seu pé. — Acho que você torceu.
— Eu sei, idiota. Sua culpa.
Cocei a cabeça sem saber o que responder, não estava esperando aquilo e muito menos que o semi humano fosse falar daquela forma. Suspirei baixinho, vendo alguns peixes no barco ainda vivos e sem muito o que fazer, vou na direção dos remos e começo a remar na direção de casa.
— Ei, o que está fazendo? — Não falei nada, apenas continuei. — Você não está me sequestrando, não é? Você sabe muito bem que é só eu mergulhar, e mesmo se fosse atrás, sou mais rápido que vocês, humanos, não é?
— Ei, garoto.
— É Taehyung, idiota — murmurou, me encarando.
— Mesmo que você fizesse isso, não iria conseguir...
— Como?
— Por que não fez isso então? Por conta do seu pé, agora fique quieto, não vou te sequestrar, relaxa.
Taehyung, como havia falado, cruzou os braços, sentando-se no barco, olhando para o outro lado emburrado. Sorri, remando sem parar até chegar em casa. Não era muito longe, levou menos de dois minutos para pisarmos em terras, mas nesse pequeno tempo, o outro pareceu se acalmar. Quando cheguei, ajudei-o a sair, mesmo que ele não aceitasse no início. Pego os peixes e corro na direção da porta.
— Meu avô já deve ter chegado, não se preocupe, ele vai cuidar de seu pé, e quando se recuperar, pode voltar para casa.
— Não tenho dinheiro... Lá no mar a gente paga com outro tipo de moeda.
— Mas quem disse que pedi dinheiro? Apenas se senta aí que vou chamar o meu avô.
Olhei para o semi humano na minha frente sentar no banco do lado de fora da casa, olhando para o próprio pé, fazendo uma leve careta ao tocar. Corri até a cozinha, deixando os peixes ali e dando de cara com o mais velho abrindo a geladeira para pegar uma bebida.
— Conseguiu pescar?
— Consegui. — Ri baixinho. — E, bem... Tem um cara aí fora, ele machucou o tornozelo. Não tem como o senhor dar uma olhada?
— Um amigo?
— Não, acabei de conhecer, ele é meio... Rude.
— Ele que vá procurar um médico na cidade — respondeu-me, abrindo a garrafa. — Não sei por que não foi para um hospital ao invés de vir aqui, no meio do nada.
— Espera, vô — chamei-o, vendo ele ir para fora, parecendo pronto para expulsar seja lá quem for. — Ele não é um cidadão da cidade... É um dos semi humanos da cidade do mar. — Foi então que ele parou e me encarou, confuso. Dei um pequeno sorriso, constrangido. — Pesquei ele sem querer.
Meu avô ficou me encarando sem nenhuma expressão antes de dar meia volta e se enfiar dentro do quarto. Respirei fundo por algum motivo, nervoso pelo comportamento do mais velho, até vê-lo retornar sem a sua garrafa de cerveja e com uma malinha de medicação em mãos.
— Onde ele está?
— Lá fora.
O acompanhei. Taehyung estava lá e, para a minha surpresa, encarou meu avô com cara azeda. Em silêncio, o mais velho começou a cuidar do machucado. O de olhos azuis não reclamou, encarando-me de forma calma, até parecia outra pessoa daquela forma.
— Obrigado, mas posso ir agora?
— Mas como vai nadar se mal consegue mexer ele?
— Oras, eu me viro. — Quando ele ia se levantar, meu avô tocou em seu ombro.
— É melhor você passar a noite aqui, ouvi dizer que o mar ultimamente está bem estranho. Amanhã você pode ir, vai ser mais seguro.
— Oh... Não quero incomodar...
— Não será incomodo. — Meu avô me encarou sério. — Vou encher a banheira, pode ajudar a entrar.
— Vai banhar agora? — perguntei, aproximando-me de Taehyung, que agarrou a minha mão para se equilibrar.
— Não é pra mim — murmurou, entrando na casa.
— Oras, é pra quem então?
— Pra mim — Taehyung falou de repente, fazendo-me o encarar confuso. — Falei que não precisava... Mas ele percebeu.
— Percebeu?
— Minhas escamas estão secas.
— Escamas?
Foi então que percebi que aquele brilho que havia reparado quando o vi pela primeira vez eram escamas, mas agora quase não consigo vê-las, havia lido sobre isso na escola, mas nunca parei para pensar em como elas são ou como funcionavam.
— Como ele sabe?
— Por que está perguntando para mim? O avô é seu — retrucou, entrando na casa, olhando tudo ao redor — É, realmente, é uma casa de pesca, praticamente.
— Não reclama..
— Não estou reclamando, é confortável, pelo menos vocês não se incomodam com o cheiro de peixe. — Fiquei confuso e acho que ele percebeu. — Eu cheiro peixe por ser do mar, entendeu?
— Ah...
Ainda confuso, o acompanho até o banheiro. Ele não tinha cheiro de peixe, tinha cheiro de brisa do mar, algo refrescante como ninguém, não sei explicar, mas por ser praticamente um pescador, sei qual é o cheiro de peixe, e não é o caso dele... Ele tinha um cheiro bem único, e muito bom, confesso.
— A banheira está pronta — Meu avô saiu do banheiro com um saco de sal, daqueles grandes, vazios. — Não sei se tem sal suficiente para você.
— De verdade, isso já é muito — Taehyung estava sem graça, olhando para os lados. — Está perfeito.
Fiquei na porta do banheiro, o encarando curioso. O semi humano observava tudo ao redor, tocando nas conchas que ocupava 80% dessa casa. Meu avô sempre gostou delas, então a moradia tinha bastante delas.
— Venha. — Meu avô tocou o meu ombro, fazendo-me segui-lo para fora do banheiro. — Não o incomode.
— Não vou, mas... — Encolhi os ombros. — E se eu quiser usar o banheiro?
— Usa o de fora.
— Mas é muito longe e está escuro de madrugada, aquele banheiro é praticamente um trauma de infância.
Meu avô nada falou, apenas se sentou no pequeno sofá, ligando a televisão que o mais velho pendurou com pregos e parafusos para não cair e poupar espaço naquela mini casa. Sentei-me do seu lado, vendo-o mudar de canal até encontrar algo que goste.
— Você pescou ele?
— Pois é, isso ocorre, não é?
— Não, normalmente isso não ocorre — falou, suspirando baixinho, parecendo querer falar mais alguma coisa, mas não conseguindo.
— Pensei que você iria mandá-lo embora e não cuidar de seu ferimento.
— Por que eu faria algo assim?
— Por ser um semi humano. As pessoas da cidade são assim, eu já vi elas tratarem eles de maneira grossa e cruel.
— Por que você acha que não moro lá? Eles são idiotas, não vale a pena serem entendidos.
— Mas seus filhos e netos moram lá.
Meu avô apenas me encarou, mandando eu calar a boca. Acabei rindo baixinho do mais velho, olhando na direção do banheiro. A porta estava fechada e podia escutar a água da banheira aberta, como meu avô havia deixado.
Algumas horas se passaram e meu avô foi dormir em seu quarto, porém fiquei ali na sala entretido no celular, que quando fui notar, já era de madrugada. Peguei uma coberta e me enrolei, indo na direção de meu quarto, porém a luz fraca que saía do banheiro me chamou a atenção. Aproximei-me com cautela, olhando pela fresta; não dava para vê-lo e, sem querer, a porta se abre. Estava mal trancada.
— Garoto? — chamo-o, colocando minha cabeça para dentro do banheiro — Tá aí?
Vou me aproximando da banheira e o vejo submerso. Arregalei os olhos, vendo sua pele com uma cor diferente. Estava brilhante, como se fosse uma camada protetora o cobrindo por inteiro, um brilho azul bem único, assim como seus olhos.
Seus olhos estavam fechados e respirava profundamente, daquele jeito parecia que estava tão confortável. Apesar de ser uma banheira pequena, ele conseguiu se enfiar por completo, coube direitinho. Se fosse um ser humano, eu já teria ligado para a ambulância e acordado meu avô pedindo socorro por ter alguém na banheira daquele jeito, quase fiz isso na verdade, mas me lembrei rapidamente que Taehyung não é um humano como a gente.
— Boa noite — sussurrei, saindo dali e desligando a luz do banheiro. Olhei mais uma vez na direção da banheira, vendo o brilho de sua pele iluminar um pouco o banheiro escuro — Tão bonito...
Saí dali, deitando-me no sofá. Hoje vou para o meu quarto, talvez o garoto do mar se levante com fome e não saiba onde encontrar... Precisa ter alguém aqui para ajudá-lo, nem que seja alguém como eu.
"Assim como o amor, elas surgem,
crescem, pegam impulso e, ao longo do tempo,
vão perdendo a força...
Até o momento em que atingem seu limite
e se solta na areia..."
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