Ruby Jane
Escrito por: yonginsky, coriurubici e saytrus
Os dedos espetados por várias agulhas causaram dores que Jennie não se arrependeu de sentir. Tudo isso era por um bem maior. As crianças carentes precisavam de roupas melhores que pudessem suportar o verão escaldante que fazia em Seul, assim como ela. Mas não se importou com isso quando desfez a costura do seu vestido novo e alguns já usados. Tudo era para um bem maior e mais importante do que trocar um vestido por uma calça jeans debaixo do sol escaldante.
Seu calendário e sua lista de tarefas continuava ali, pendura ao lado da foto do seu pai, para se lembrar que havia um sonho a se cumprir, ao mesmo tempo que ganhava forças da melhor figura paterna e influenciadora que ele foi. Ela se inspirava naquele porta-retratos feitos com o tecido do uniforme que um dia seu pai havia usado na marinha, ele ainda exalava o mesmo cheiro de água salgada que ela tanto gostava.
Ele aina estaria ali ao lado dela, mesmo quando seu sonho tivesse se realizado. Jennie tinha certeza disso.
Sorriu satisfeita com o resultado do seu trabalho duro, três garotinhas ficariam felizes pela peça nova e ela mais ainda. Não poderia se esquecer de tirar algumas fotos, era importante, se quisesse completar o seu álbum fotográfico com fotos de suas próprias crianções, além disso, poderia ganhar forças dos sorrisos de cada pessoa que utilizou uma de suas criações. Por isso, ela caprichou nos detalhes em renda e nos laços enfeitados, o que a fez pular o almoço o início do jantar.
Se apressou em arrumar toda a sua mesa e pendurou os vestidos em cabides para não amassá-los, quando sua mãe gritou o seu nome pela quinta vez. Jennie estava faminta, seu estômago a impedia de mentir, mas quando chegou a cozinha e viu a travessa de salada sobre o balcão da cozinha, quase chorou. Queria comer algo nada saudável e sustentável, e aquelas folhas verdes não se encaixavam em suas preferências.
Mas sentou-se na mesa e comeu sem fazer careta, quando terminou percebeu que as folhas verdes tinham até feito um efeito e sua fome passado. Ajudou sua mãe com a louça feita, e novamente correu até seu quarto, onde finalmente pode tirar fotos para sua coleção.
Talvez o fato de ainda não ter iniciado sua faculdade a deixava muito ansiosa, faltavam apenas algumas semanas e iniciaria suas aulas. Estava ansiosa para mostrar suas criações aos seus professores. Provavelmente iria lançar uma grande marca um dia, ou talvez não! Dependeria apenas dela.
Passava um lápis de desenho em uma folha antigamente branca, atualmente com um lindo desenho de um vestido. Abriu um estojo de lápis de cor e as cores foram dando vida ao desenho. Pegou uns pedaços de renda e os colocou sobre o papel colando-os, fazendo uma flechinha onde elas iriam.
Sorriu ao ver seu trabalho, talvez fosse um desenho simples, mas rico em grandes detalhes. Olhou os porta-retratos e sorriu ao lembrar de seus primeiros desenhos, vestidos de princesas como toda menina sonhava ter.
O calendário estava com vários "X" a cada dia que passava, era uma marca que ela fazia em dias que criava algo. Aquele ano estava cheio de "X" simbolizando o grande número de criações.
Jennie sonhava tão alto, o que ajudava nas suas tantas criações divertidas. E seu maior motivador era seu pai, o qual a deu o apelido de Ruby Jane. Ruby porque Jennie sempre gostou de vermelho, uma das cores que mais combinavam com a garota, e Jane porque era uma forma mais carinhosa de chamá-la.
Jennie se perdeu em seus pensamentos com o apelido, que não percebeu que quase colou seus dedos com a cola para tecidos. Soltou uma risada com seu próprio desastre, não era a primeira vez que isso acontecia. Tratou de limpar logo a mão, e guardar a cola em seu devido lugar. Olhou para fora e viu o entardecer rosado do dia. Dando início a uma nova inspiração, um vestido com tantos tons de rosas que Jennie nem se preocupou em contar.
Por cima do tecido rosa, haveria um tule branco, que daria um acabamento mais lindo ainda. Jennie não se limitava nos detalhes, pois não havia limites para sua paixão. Quando terminou, deixou secar o desenho e desceu para sair de casa. Precisava de mais alguns tecidos, assim como papeis fotográficos para a sua Polaroid.
Pegou tudo que precisava numa loja perto de casa, onde haviam vários tecidos e rendas dos mais variados valores. Precisou desviar um pouco a rota no meio do caminho para abastecer o carro de sua mãe, antes de seguir para papelaria próxima a sua faculdade.
Foi um caminho feito ao som de Rihanna e Drake, as únicas vozes que havia no pen drive já conectado no rádio de carro. Detestou quando teve que desligar a única música que conhecia assim que chegou ao seu destino.
A atendente ofereceu-lhe um sorriso amigável quando o sininho da loja tocou assim que Jennie abriu a porta. Não havia muito movimento, ao contrário dos outros dias, por isso ela não teve que se infiltrar entre as pessoas para chegar na sessão que queria.
— Sabia que era você. — Assustou-se como um gato medroso e caminhou para trás devido a aproximação súbita do alto garoto.
— Sunbae! Que susto! — Reclamou, com as mãos junto ao seu coração acelerado. Detestava ser assustada pelas pessoas, era um sentimento ruim que a trazia lembranças dolorosas. A mesma sensação de quando descobriu a morte de seu pai.
— Desculpe, Jenni-ah. — Respirou fundo e se endireitou para fitar o veterano do curso de Design. Tinham algumas aulas juntos e, algumas vezes, estiveram nos mesmos grupos, por isso ele não era completamente um estranho. Além disso, Kai morava no mesmo bairro que ela. Não era estranho encontrá-lo por aqui. Mas justo nesse horário?
— O que veio comprar?
— Nada, minha impressora parou de funcionar e aqui os estudantes tem desconto na impressão.
Jennie murmurou um "ah, sim" e rapidamente agarrou o pacote de papel fotográfico sem ao menos olhar o valor, torcia para ter sido o mais barato.
— Bom, nos vemos amanhã. Preciso voltar logo para casa. Você quer uma carona? — Indagou, por mais que no fundo preferisse voltar para casa sozinha, queria cantar a sua música em alto e bom som sem se preocupar com o que Kai poderia achar da Jennie casual.
— Vim com a bicicleta de um amigo, preciso devolver, mas obrigado.
Jennie simplesmente sorriu e se curvou despedindo-se de Kai, que acenou e observou a garota partir antes de voltar para a impressora que abandonou assim que a avistou entrando. Sua noite foi ganha, naquele dia.
(...)
Eram tantos tecidos coloridos, tantas fitas decoradas. Jennie se sentiu extasiada, a mesma sensação que teve em seu primeiro dia de aula. Daria para incorporar em vários vestidos e criar muitas coisas novas. Seus dedos formigavam com a nova remessa de tecidos comprada pela faculdade, contudo, embora a visão fosse espetacular, ela não poderia se esquecer do TCC que precisava concluir se quisesse conseguir uma vaga no famoso ateliê da sua professora.
Era um oportunidade rara e haviam muitas pessoas se esforçando para conquistá-la. Dentre eles, estavam seus amigos, Olivie e Jongin.
Naquela manhã de quinta-feira, os dois estavam mais concentrados que o normal. Curiosamente, se aproximou da mesa onde os dois estavam debruçados com um lápis em mão.
— O que estão fazendo? — Perguntou, pendurando a alça de sua mochila no encosto da cadeira. Seus olhos desceram para a folha sulfite repleta de anotações de Olivie.
— Ah, você chegou. Estou pensando em algumas coisas para colocar no meu TCC, Jongin tentou me ajudar, mas no fim, quem foi beneficiado foi ele. — Jennie riu da feição emburrada da amiga e desviou o olhar para Jongin.
— Moda andrógina, realmente é um tema difícil. — Comentou. —Os Idols estão acostumados com isso, você deveria falar a respeito na sua apresentação.
— E como está indo o seu TCC? — Jongin perguntou, ainda concentrado no que escrevia.
— Estou perto de concluir o álbum fotográfico, ainda faltam algumas criações. — Respondeu, e se inclinou para retirar o notebook de sua bolsa. — Fiz algumas edições no Photoshop e estou na trigésima quinta pagina de uma estimava de quatrocentas da monografia.
— Eu estava indo bem, mas a professora me aconselhou a tentar mudar a decoração. Tive que editar do zero. — Olivie reclamou.
— Estou quase concluindo a monografia. — Jongin comentou, surpreendendo as amigas.
— Como é possível? — Olivie questionou, incrédula. Nem ela que tinha tanto tempo conseguiu chegar a metade, então como Jongin, que ainda trabalhava meio período, teria conseguido?
— Eu tento adiantar o máximo que consigo no meu tempo livre. — Esclareceu, erguendo a cabeça. — Mesmo estando com vocês, ainda estou trabalhando. — Apontou para a sua folha repleta de anotações.
Jennie sentiu um pouco de inveja do amigo, como ela queria ter mais tempo para se concentrar em tudo que precisava fazer antes que o prazo se esgotasse. Mas estava feliz pela determinação de Jongin.
— Só não se esforce demais ou vai acabar ficando exausto muito rápido. — Aconselhou.
Jongin acenou agradecendo pela preocupação e garantiu que estava bem, seu chefe estava dando um pouco mais de espaço para ele no trabalho.
Jennie deixou os amigos se concentrarem e decidiu tirar fotos de alguns tecidos com a câmera do seu celular, teria que procurá-los na loja perto de sua casa, porque fariam uma ótima combinação com a calça do desenho que estava pendurado em sua parede.
— Vocês já pensaram nas embalagens? — Perguntou, quando voltou para a mesa, guardando o celular em seu bolso. — Estou pensando em utilizar sacolas de papel reciclável personalizadas. Reduziria um pouco dos custos com a coleção.
— Pretendo conversar com o fornecedor de sacolas da loja do meu tio, quero ter certeza de qual seria mais barata. — Jongin comentou, ainda com a cara enfiada em seu papel.
— A minha não será reciclável. — Olivie disse e Jennie deu de ombros, não julgaria a amiga quando o trabalho era totalmente dela.
Havia muitas ideias que Jennie gostaria de ter explorado em seu trabalho, mas se realmente quisesse chamar a atenção de sua professora, precisaria inovar em sua coleção a partir dos gostos do ateliê criado por ela. Por causa disso, se aprofundou ainda mais na moda minimalista com tons básicos e acessíveis para qualquer ocasião. Não foi dificultoso trabalhar com esse tema, porque o seu estilo se assemelhava a sua escolha, e qualquer um que assistisse a sua apresentação, perceberia isso.
Jongin e Olivie se despediram de Jennie quando o sinal tocou anunciando o fim daquela aula livre, algumas pessoas permaneceram na sala, o que fez a conversação aumentar aos poucos, ao ponto da garota não conseguir se concentrar naquele ambiante.
Juntou as suas coisas e partiu para a biblioteca, que ficava no outro prédio da faculdade. No meio do caminho, decidiu tirar algumas fotos pelo campus, uma ideia que acrescentaria ainda mais no seu trabalho de conclusão de curso.
Questionava-se, internamente, se as pessoas não lhe darão algum apelido e o que achavam da garota que sempre estava tirando fotos pelo campus. Se fosse o caso, certamente, Olivie diria alguma coisa.
A câmera de seu celular mirou em um grupo de estudantes que lanchavam sentados no gramado próximo a uma arvore, no casal de mãos dadas sentados num banco desgastado, nos membros do clube de dança e teatro e até mesmo nos membros do clube de basquete que estavam treinando para a competição de final do ano da faculdade.
Muitas roupas e contrastes diferentes. Jennie pensou se o minimalismo realmente era uma boa ideia. De certa forma, era uma liberdade de expressão para algumas pessoas, mas não se adequava a outras que reluziam com cores mais vivas e combinações intensas. Acrescentaria isso em seu trabalho.
A biblioteca não estava cheia, então ela pode encontrar um bom lugar próximo a janela que permitia uma linda vista da entrada do campus. Ficaria bem ali até dar o horário da próxima aula.
(...)
Suas mãos tremiam após o fim da sua apresentação. Todo o nervosismo que sentiu durante aquela semana, finalmente estava abandonando o seu corpo. Gaguejou algumas vezes como todos os seus colegas que se apresentaram antes dela, e conjugou errado o verbo e o plural de algumas palavras, mas, finalmente, ela estava ali, se curvando e agradecendo pela atenção.
A bancada dos professores e seus colegas a aplaudiram pela última vez, e sua professora acenou indicando que ela retirasse os manequins com as cinco peças da coleção que criou para a apresentação. Jongin e Olivie prontamente a ajudaria e asseguraram a amiga de que ela havia ido muito bem.
No final da apresentação e após uma curta discussão entre os jurados, os alunos foram liberados daquela sala, que mais parecia um cativeiro. Jennie, foi barrada pela professora que a pediu um minuto para conversarem a sós. Se sentiu ansiosa por algo que nem ao menos sabia o que era, mal conseguia pensar em coisas coerentes dentro de sua mente. Embora sua professora sorrisse amigavelmente, aquilo não acalmou seu coração.
— Jennie, você sabe que eu tenho um ateliê de alta costura, não sabe? — Jennie concordou, sentindo suas mãos suarem. — Gostaria que fosse estagiária em meu ateliê, será até o nosso próximo desfile, onde também será avaliada pelo meus companheiros.
Jennie, a primeiro momento, pensou que aquilo fosse uma pegadinha, mas dentre todos os anos que passou na faculdade, a professora Lee nunca havia feito uma piada de mal gosto. Era seu sonho, ser reconhecida pelo seu trabalho e ver suas criações sendo apreciadas pelas mais diversas pessoas. Estava tudo bem aceitar?
— O que me diz? — A professora Lee, questionou, trazendo sua mente de volta para a situação.
— Eu... Eu aceito, obrigada.
Jennie flutuava quando chegou no refeitório ao meio dia, Olivie e Jongin perceberam isso e trocaram olhares curiosos com a garota, que se fosse a protagonista de desenho animado, estaria, agora, voando de felicidade.
Jongin foi o primeiro a questioná-la após engolir mais um pedaço de seu pão de banana, enquanto Olivie se manteve atenta na conversa.
— A professora quis falar comigo, e a primeiro momento, eu não pude acreditar no que ela disse. — Disse, relembrando do que acabara de acontecer, arrancando olhares curiosos dos amigos por causa da sua pausa súbita.
Sorriu antes de questionar e cruzou os dedos em frente aos seus lábios, escondendo o largo sorriso em seu rosto.
— Ela me convidou para ser uma estagiária em seu ateliê até o próximo desfile. — Contou animada.
Olivie ficou surpresa com a noticia. Para os olhares curiosos das pessoas a sua volta, sua feição não era uma das melhores. Jongin não reagiu da mesma maneira, ficou feliz, embora um pouco decepcionado por não ter conseguido a mesma oportunidade. Precisaria trabalhar ainda mais e lutar um pouco mais pelo seu sonho.
Jongin tentou não comentou além de "Parabéns!" e se manteve quieto, forçando um sorriso, ao ver a expressão de Olivie, que continuou calada.
Jennie poderia ter abordado o assunto de outra maneira, sua felicidade era fofa, entretanto, até mesmo para os próprios amigos, era um pouco desconfortável. De fato, ela não havia pensado neles e nem em ninguém que também esperava obter a mesma oportunidade. Não havia pensado nem naquele momento e nem depois, e isso, aos poucos, conforme se manteve ocupada com o novo trabalho, foi tornando a relação do trio um pouco mais fria.
Olivie ainda tentou se manter presente na vidade Jongin e de Jennie, apesar de a tratar de foma diferente. Mas quando percebeu que Jennie não fazia nenhum esforço para se encontrar com os amigos, criou rancor da garota e de quem ela estava se tornando. Os dois amigos sabiam que Jennie deixava ir aos encontros para ficar no ateliê pensando em ideias novas que agradariam, não mais a professora Lee, e sim a chefe Lee.
Até mesmo para Jongin, a situação estava ficando exaustante e desanimadora. Convencer Olivie a sair e remediar entre o humor da garota ao não comparecimento de Jennie nas saídas tarde da noite. Tudo ficou pior, quando Jennie passou a frequentar o refeitório da faculdade com novas pessoas, que também estagiavam no ateliê da chefe Lee.
Seus olhares muitas vezes se encontravam, era perceptível o quanto Jennie estava desconfortável naquele grupo de pessoas ao qual ela tentava se encaixar. Uma obrigação que ela precisava aceitar se quisesse ter um bom relacionamento com seus amigos de trabalho. Isso a manteve ainda mais longe das suas vontade e, principalmente, dos seus amigos.
Em uma quarta-feira quente e abafada, Jongin encontrou Jennie almoçando em um restaurante simples e aconchegante, onde ele sempre almoçava quando não tinha tempo de preparar sua marmita. Jennie ergueu seu olhar ao notar a presença de alguém ao seu lado, cuja pessoa que não se importou em perguntar se poderia sentar a sua frente.
Jongin, a principio não disse nada. A garota a sua frente não parecia ser a Jennie que ele e Olivie conheciam. Estava visivelmente cansada, com olheiras abaixo dos olhos, sem maquiagem e unhas livres de esmaltes. Jennie nunca deixava de pintar suas unhas!
— Olivie, está magoada com você e eu também. — Disse, por fim, quebrando o silêncio sem se importar em como a garota se sentiria.
— Eu sei. — Jennie abaixou a cabeça e fitou sem prato inacabado. Havia perdido o pouco apetite que sentia.
— Não faz nada por quê? — Questionou, irritado.
— Estou ocupada trabalhando e me concentrando em entregar peças mais apresentáveis.
— E prefere fazer isso sentando-se com gente que não liga para você? Ignorando seus amigos? Se transformando em outra pessoa?
— Eles não são pessoas ruins, sempre me ajudam e me dão conselhos a respeito dos gostos da professora Lee.
— Então você resolveu perder sua essência Jennie? Preferiu fazer algo que não é a sua cara? Você não era assim!
— Eu ainda sou uma completa desconhecida nesse ramo, Jongin, se você estivesse no meu lugar, também estaria fazendo a mesma coisa. É inevitável, ter que mudar seus conceitos para viver no mundo da moda.
— Eu não acho que abandonar seus amigos seja necessário para se manter no mundo da moda. Você precisa rever os seus conceitos. — Levantou-se, sem se importar com o tom rude e por suas palavras sinceras, nem mesmo com o fato de estar com fome. Jennie também não havia se importado com ele, nem com ninguém. Não permaneceria ali, próximo a alguém que não fazia questão de ter sua presença por perto.
Jennie voltou para o ateliê, minutos depois, abandonando o restante da comida em seu prato e com diversos pensamentos em sua mente, nenhum deles envolviam criações e ideias para um conjunto de roupas que precisava desenvolver até o final da tarde.
Um simples vestido preto posto por baixo de um sobretudo de mangas longas também preto e rendado. O decote deixava um dos ombros a mostra, o que traria um equilíbrio para o visual. Os pontos invisíveis estavam bem feitos, assim como o recorte dos tecidos, o caimento foi certeiro sobre o corpo de uma das modelos. Entretanto, aquilo não correspondia a Jennie, pois se tratava de uma criação que até os novatos do curso de Design conseguiriam criar. Não gritava inspiração, trabalho duro, suor, amor. Não gritava, principalmente, Kim Jennie. E a professora Lee detestou. A garota acabou não sendo aprovada pelos estilistas e nem por si mesma, o que a levou a não ser requisitada para o projeto do desfile que aconteceriam em breve.
A Kim voltou para casa, cabisbaixa, com os olhos marejados. Não jantou e nem se importou quando seu estômago roncou, ficou pensando nas palavras ditas por Jongin, por sua chefe, pensou nos olhares que lhe foram lançados durante a apresentação e no tom decepcionado de cada voz que ouviu. Estaria, realmente, perdendo toda a essência da Jennie ousada e criativa?
Seus olhos desviaram para o álbum aberto sobre a sua escrivaninha, haviam desenhos, fotografias coladas e inúmeras anotações. Não se recordava da última vez que andou pelo campus tirando fotografias, nem mesmo quando desfez um de seus vestidos novos. Chorou ao virar as páginas, não havia mais fotos das crianças que ficavam extremamente felizes quando aparecia com roupas novas e bonitas.
Seu pai havia lhe ensinado a ser uma garota forte, sincera e de bom coração. Então porque, de repente, se sentia suja e usada? Não era seu desejo trabalhar com a professora Lee? Não ansiava pelo dia em que estaria rodeada de lindos tecidos e roupas confeccionadas?
O que deveria fazer?
Agora entendia as palavras de Jongin. Havia perdido a sua essência da forma mais estúpida possível. Estava se tornando uma profissional padrão de um único lugar, sem criatividade, sem inspiração, sem espaço para suas próprias ideias. Era triste pensar que esteve cega e surda em relação ao seu coração, sua mente e seus amigos.
Durante a noite, com o celular em mãos e olhos avermelhados, cogitou em falar com Jongin, nem que fosse para mandar uma mensagem de boa noite e agradecer por suas palavras. Mas seu plano mudou quando recebeu uma notificação de Olivie no Facebook. Uma foto postada e uma mensagem significante tocaram o coração de Jennie, e isso a encorajou a se encontrar com Olivie no dia seguinte.
As duas estavam sentadas em um dos bancos do campus, protegidas pela sombra das árvores e desconfortáveis por situações diferentes. Olivie estava desconfortável pela insistência de Jennie em se encontrarem e Jennie por não saber como pedir desculpas a amiga.
— Me encontrei com Jongin, e ele me contou que você está chateada comigo. — Comentou, fazendo Olivie revirar os olhos.
— Ele precisou dizer para você perceber? — Jennie suspirou, brincando com os dedos.
— Não fui uma amiga presente nos últimos meses, peço desculpas por ter falhado com vocês e por não ter estado lá quando precisaram de mim.
— Você sabe que apenas pedir desculpas nem sempre resolve tudo.
— Eu posso te dar aquele lindo vestido vermelho que você tanto gosta, se isso fizer você me perdoar. — Brincou, tentando amenizar o clima pesado.
— Olha, não tente me comprar. — Olivie, enfureceu-se, se recusando a entrar na brincadeira. — O ponto de tudo isso se dá pelo fato de que você não pensou em ninguém quando aceitou a proposta da professora Lee. Estava feliz demais para se lembrar do quanto Jongin e eu trabalhamos duro!
— Tanto eu, como vocês e qualquer outro dos nossos colegas mereciam essa proposta, também trabalhei duro e você sabe disso! Não fui compassiva com a situação, admito, e me arrependi por causa disso. Você não percebe o quão sincera estou sendo com você?
— É um pouco tarde para se arrepender, não acha? — Jennie negou, agarrando a mão da amiga.
— Enquanto eu estiver aqui e você também, nunca será tarde demais.
Olivie abandonou o local sem murmurar nenhuma resposta ou tentar debochar das palavras de Jennie. Estava chateada com toda a situação e ainda continuava enciumada. Ver Jennie com os mesmo olhos novamente seria um pouco difícil, mas deixar de sentir inveja da amiga era um trabalho duro que ela precisava resolver sozinha.
"As coisas vão se resolver", Jennie pensou consigo mesma. Havia dado o primeiro passo para reestruturar sua amizade com Olivie, ainda dependia dela fazer com que a garota a perdoasse, mas, para isso, ela precisava insistir um pouco mais, o quanto fosse preciso. Também pensou em procurar por Jongin, contudo, se não fosse embora agora, perderia o ônibus e chegaria atrasada no ateliê.
(...)
Os dias no ateliê se tornaram mais corridos, agora, várias pessoas circulavam pra lá e pra cá totalmente atarefadas, enquanto Jennie trabalhava com pedrarias no último vestido que trabalharia dentro daquele espaço que um dia foi sua inspiração.
Não estava desanimada, ao contrário do que imaginou, seu corpo estava bem e sua mente consegui pensar em paz, o que trouxe um bom resultado para as suas ações. As pedrarias estavam perfeitamente colocadas no corpet branco de renda.
Jennie se sentiu bem por terminar o seu último trabalho de forma impecável, acabou se recordando da sensação gostosa em seu estomago quando olhava para uma de suas peças totalmente pronta.
Precisava voltar para casa e se concentrar em terminar de costurar algumas peças que havia criado após sua conversa com Olivie. Não era a sua melhor inspiração, mas as cores vibrantes e ousadas pareciam contar a história de Jennie.
As cores são capazes de dizer palavras belas e tristes, são capazes de contar o passado e o presente e o quão sonhadora cada pessoa pode ser. Mas, verdadeiramente, não importa qual cor seja, quem faz o dia ser bonito é você. E Jennie resolveu reviver as cores belas de sua vida.
Durante o jantar daquele dia, a mãe resolveu questionar Jennie sobre sua quietude durante o jantar e sua falta de apetite repentina. Não cozinha tão mal assim, apenas preferia comer algo mais saudável durante as refeições, ao contrário da filha, que não negaria um hambúrguer de praça se tivesse.
Jennie lhe contou tudo que estava acontecendo, até mesmo a breve discussão com Olivie e o fato de que não participaria mais do desfile do ateliê, comentou sobre tudo como se fosse algo fácil de dizer. Sua mãe também estranhou o seu comportamento, não estava triste pelo fato de ter sido rejeitada, mas sim pelo fato de ter se afastado de Olivie e Jongin, que sempre estiveram ao seu lado desde o inicio do curso.
— Bom, se não está triste por causa do ateliê, então é um bom momento para que você volte a se trancafiar naquele quarto como se não existisse vida fora dele. Faça seu próprio desfile! — Encorajou, espetando Jennie pelo tom bravio em sua voz.
— Meu próprio desfile? — Jennie indagou, repetindo as palavras em seu mente novamente.
— Sim, um projeto beneficente com os seus colegas. Tenho certeza de que se conversar com seus professores, eles irão concordar.
— Mas não falta muito para o curso terminar. O TCC já foi apresentado e falta apenas algumas provas. Não dá tempo de desenvolver nada!
— Eu sei que você tem linda roupas lá no seu quarto e sei que Olivie e Jongin se interessarão por isso. Você só precisa parar de dizer que não vai dar certo e passar a dizer que vai tentar fazer com que dê certo.
- E se eles não aceitarem? - Sim, Jennie possuía medo, não havia feito as pazes totalmente com seus amigos.
- Minha querida Jennie, isso é um risco a se correr. – Concordou e logo subiu as escadas correndo, pela primeira vez em muito tempo ela sentia-se livre e novamente era ela. Desbloquou a tela de seu celular e logo abriu o aplicativo de mensagens, sem pensar muito digitou rapidamente e não demorou segundos para enviar a mensagem. Olhou para o quadro de seu pai e sorriu.
- Eu vou realizar meu sonho, eu vou ser corajosa! – Sorriu e sentou-se em sua mesa de desenho, abriu o caderno de desenhos e deixou que sua criatividade fluísse como o curso do rio. Jennie sabia que passaria a noite em claro desenhando, mas não seria nenhum problema para ela, já que desenhar era sua paixão.
O toque do celular da garota, fez com que ela se assustasse, mas se acalmou ao ver um "sim" de ambos, o trio talvez voltaria. Ouviu gritos do lado de fora, e ao olhar pela janela, viu seus dois amigos esperando-a abrir a porta e todos criarem lindas roupas, juntos.
Correu as escadas abaixo, sem se preocupar se sua mãe estaria dormindo ou não, abriu a porta e sorriu para ambos, que devolveram sorrisos aconchegantes.
- Entrem! – Disse a garota eufórica e bem animada, parecia que tinha ganhado na loteria e não que havia recebido apenas dois amigos. – Eu vou apenas buscar minhas coisas lá em cima e vamos desenhar! – Esperou eles concordarem e subiu novamente aquelas escadas, pegou todo o necessário, então desceu de novo.
- Vai mesmo fazer seu próprio desfile? – Questionou Olivie que parecia duvidar, mas Jennie assentiu concordando. – Mas como?
- Eu não sei, mas eu quero fazer um desfile beneficente.
- Vai doar o dinheiro para quem? – Jongin parecia desconfiado e muito interessado em saber sobre isso.
- Não sei ainda, talvez para alguns lugares de caridade, mas antes eu preciso que tenho gente, não quero que todo nosso trabalho tenha sido em vão. Somos talentosos demais para ver nosso trabalho ser jogado fora! – Olivie agora parecia mais interessada e não parecia lhe restar tantas dúvidas. Jongin estava satisfeito, e assim os três começaram a criar suas belas obras de arte. Jennie colocou toda sua alma nas roupas, Jongin parecia estar apaixonado, pois suas roupas refletiam em designs mais românticos, e Olivie tinha dado tudo de si para criar o que ela havia criado.
A sra. Kim disse que estaria ajudando na divulgação e com o que pudesse, o trio aos poucos voltava a ficar mais unido do que nunca. O desfile em breve seria e todos estavam animados. Em meio desse processo todo, Jennie achou finalmente um nome para sua marca de roupas tão sonhada. Ruby Jane em breve seria uma das maiores marcas mundias, assim como Gucci, Louis Vuitton e tantas outras mais.
O grande dia finalmente tinha chegado, Olivie e Jennie davam pulinhos, estavam animadas por verem suas criações em modelos, que na verdade eram seus colegas que havia aceitado ajudar. Não era tão glamuroso como o desfile que muitos viam, mas era o primeiro de muitos dos três futuros grandes estilistas.
Talvez sejam os próximos a criarem várias tendências mundiais que todo mundo quer e tenta dar uma plagiada disfarçada. O desfile foi um sucesso, e haviam lotado o espaço que a mãe de Jennie havia conseguido.
- Nós conseguimos! – Disse Jennie abraçando os dois amigos, Olivie parecia que ia chorar a qualquer momento, e Jongin segurava-se para não beijar Jennie, sua amiga que por muito tempo sempre gostou.
- É nós conseguimos! Estou tão orgulhosa da gente. Foi em menos de duas semanas tudo isso, somos incríveis.
- No meio disso tudo, surgiu Ruby Jane. É o nome da marca que eu vou construir e que será um império, assim como todas nossas futuras marcas! – Jennie deu uma piscadela, e foi a gota da água para Jongin beijar sua amiga. O desfile não havia trazido só a amizade do trio de novo, uma marca, mas também um futuro relacionamento.
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