26) assombro
hoje é meu aniversário, e o presente é todinho de vocês! E é claro, vocês são meu presente 💙
não quero colocar medo em vocês, mas preciso colocar os avisos de gatilho...
⚠️ assédio; menção a abuso sexual.
não esqueçam da tag #PaletasePoesiasTK! quero ver vocês usando, vai ser um presentão pra mim 🥺
boa leitura! 💙
Jeongguk piscou seus olhos como se estivesse querendo acordar de um pesadelo. Imaginou que o álcool lhe pregaria alguma peça, mas a imagem da sua mãe parada bem diante dele era real demais para ser só mais um de seus pesadelos.
Cambaleou para trás, deixando a porta aberta, e por ter dito "Mãe" tão alto, seus amigos não demoraram para ficar ao seu lado.
— Não precisa se assustar… não sou nenhum monstro. – A fala de Jeon Sohye era mansa, quase preocupada.
— Como me achou? – Jeongguk estava com Jihoon, Jongho e Hoseok ao seu lado. Os demais ficaram mais afastados, mas alertas.
— Eu conheço todos os seus amigos, Jeongguk. Você não deve se lembrar, mas me disse quando o Jihoon comprou essa casa, e já que Hoseok e Jongho ainda moram com os pais… imaginei que você estaria aqui.
— Do nada?! Tinha que vir aqui? – Seu corpo todo reagia com raiva.
— Eu liguei, você não me atendeu! – Elevou a voz. — Venho tentando ligar para avisar, e você não me atende. E hoje é seu aniversário… – Disse num fiapo de voz.
— Ah, e é uma data importante? – Riu, sarcástico.
— Você não é assim… por que está me tratando dessa forma?
Então, Jeongguk gargalhou. Muito alto. Estava desacreditado, completamente abismado. Seu riso era cheio de dor e mágoa, seus olhos ficaram inundados por lágrimas. O seu corpo pendeu para trás, fazendo Jihoon o segurar.
— Você é inacreditável… inacreditável. – Sua voz soou quebrada, rouca. — Saia daqui! – Gritou.
Taehyung estava arrepiado. Tomado pelo medo. Nunca viu Jeongguk tão transtornado, só quando ele experimentou LSD pela primeira vez. E mesmo assim, era diferente. Naquele momento, ele estava consciente, e isso era pior. Estava sentindo tudo, porque era real. Muito real.
Jimin foi o primeiro a querer intervir, sendo segurado por Yoongi. Jimin reconhecia aqueles sinais, Jeongguk não falava como estava se sentindo, mas Jimin via. Um ataque de pânico acontecia.
Seokjin não tardou em segurar Taehyung, mesmo que ele não estivesse tentando sair do lugar, era melhor prevenir.
Eunbi estava perdida. Não entendia o que estava acontecendo, porém sua preocupação não era menor.
— Pare de fingir que nada aconteceu! – Jeongguk gritou ainda mais alto. — Você só consegue ignorar tudo porque não se importa, você não tem a porra de um coração! Vive nesse estado entre esquecer que eu existo e depois demonstrar algum resquício de preocupação, como se fosse anular tudo de ruim. Não vai!
— Você nunca me disse nada! – Gritou de volta.
— E eu preciso dizer? – Sua voz baixou pela falta de ar. Seu corpo tremia, suava, estava pálido. Jihoon o segurou ainda mais forte, sentindo que o amigo desabaria a qualquer instante. — Você nunca notou?
A última pergunta tinha tanta dor que fez Taehyung chorar. Entendeu o que Jeongguk disse, e isso o fez olhar automaticamente para Yoongi. Ele estava com os olhos marejados também.
Antes mesmo de sua mãe responder, Jeongguk voltou a falar.
— Eu não vou deixar você estragar meu aniversário. Você e aquele seu marido já estragaram minha vida, não é o suficiente? Precisa vir aqui e me lembrar de toda essa merda que eu me esforço tanto pra esquecer? Você é egoísta! Se eu ignorei suas ligações por todo esse tempo, é porque eu não queria contato! Suma aqui! – Não foi uma fala firme, sua voz estava baixa, fraca. Mas seus olhos estavam tão carregados, que sua mãe recuou.
Com as palpitações de seu coração aumentando, Jeongguk sentiu a vista escurecer e essa foi a deixa para Jihoon, que o segurou mais firmemente e o levou para o sofá.
— Não cansa de magoar ele, não é? – Hoseok perguntou retoricamente. — Não cansa de o destruir. Eu só vou avisar uma vez: não vamos mais deixar a senhora fazer isso com ele.
Jongho não sabia o que falar, então só bateu forte a porta, deixando Sohye sozinha.
Jimin se soltou de Yoongi e foi apressado até Jeongguk.
— Ei, Guk, olha pra mim. – Segurou o rosto em suas mãos. — Está tudo bem, ok? Ninguém vai machucar você. Você está seguro! – Pediu em um sussurro para ninguém se aproximar muito, e todos concordaram. — Feche os olhos e respire bem fundo, por favor.
Jeongguk estava deitado no sofá, e Jimin agachado ao lado, ainda segurando sua cabeça.
— Você está me escutando, Guk? – Perguntou preocupado pela falta de resposta.
Ele acenou positivamente.
— Ok, vamos, respire.
Inspirou e expirou lentamente, puxando o ar pelo nariz, e soltando pela boca. Fez isso repetidas vezes, e o tempo todo Jimin ficou com sua mão sobre o peito dele, para notar quando os batimentos iriam normalizar.
Por um bom tempo, ficaram naquela posição. Ninguém ao redor dizia nada, estavam todos tensos.
Jimin percebeu que ele parou de suar e os batimentos cardíacos se encontravam mais calmos. Suspirou aliviado, fazendo carinho no cabelo dele.
— Vai ficar tudo bem… está me ouvindo?
— Tô, Jimin-hyung.
Isso arrancou um sorriso de Jimin.
— Vou pegar água para você, está bem?
— Uhum… eu quero o Taehyung.
Pelo silêncio, todos escutaram o que ele disse. Jimin encarou Taehyung, que entendeu o que o olhar dizia, e foi até o encontro de Jeongguk, agachando ao lado dele. Jimin levantou indo buscar água.
— Ei, blue… – Chamou baixinho.
— Você tá chorando? – Seu olhar era confuso.
— Fiquei emocionado vendo Jimin ser tão profissional. – Riu com a desculpa usada, fazendo Jeongguk rir também.
— Me abraça?
Lá estavam aqueles olhos. Os olhos que Taehyung notou nas primeiras aulas, os olhos desenhados, os olhos que viu em sua casa quando Jeongguk acordou de uma noite péssima.
Não conseguia encontrar uma tradução para a expressão no olhar, mas finalmente encontrou.
Me abraça.
Jeongguk sentou e estendeu os braços, ainda pedindo o abraço. Taehyung sentou ao lado dele o abraçando forte, torcendo para estar passando segurança.
O rosto de Jeongguk ficou na curvatura de seu pescoço, e Taehyung pôde sentir ele respirando fundo. Estava cheirando.
O cheiro de Taehyung acalmava Jeongguk.
Não querendo interromper, Jimin entregou o corpo d'água para Taehyung e se afastou. Depois de um tempo, Jeongguk tomou todo o líquido, e parecia ter voltado com a cor em sua pele, perdendo a palidez.
Foi o primeiro ataque de pânico mais grave de Jeongguk, e teve sorte de estar com seus amigos, de estar com Jimin ao seu lado, que sabia exatamente o que fazer para o ajudar.
Se sentiu assim, sortudo. Por isso, abraçou cada um presente ali, e estava certo quando disse que seu aniversário não seria arruinado porque sua mãe apareceu.
Eles não beberam mais, porém conversaram, ficaram próximos, todos passando confiança para Jeongguk, o fazendo rir.
Era isso que ele merecia: ser amado.
•
Para Taehyung, a pior coisa foi deixá-lo depois que a festa acabou.
Jongho foi levar Eunbi até em casa, e a garota estava triste, quase deprimida. Queria poder fazer mais por Jeongguk do que só conversar, sabia que ele não estava bem. Jongho quem a acalmou depois de um tempo.
Jimin continuava atento, mas também precisou ir embora, dando algumas dicas para Jihoon caso outra crise acontecesse. Ele e Hoseok foram embora juntos, e Hoseok deixou um abraço apertado em Jeongguk.
Yoongi, que já era mais calado, ficou pior. Jeongguk detestava falar de sua vida, notou isso quando namoraram, mas quando percebia um comportamento diferente nele, perguntava pequenos detalhes para confirmar o que tanto temia. Antes de sair, também abraçou Jeongguk mais forte, prometendo aparecer depois para conversarem.
Seokjin não falou muito, porém desde que conheceu Jeongguk, notou algo errado, e já tinha comentado isso com Taehyung. Ele deve ter um trauma. Não era sua área, mas os sinais eram óbvios demais. Conversou rapidamente com Jeongguk e deixou Taehyung sozinho com ele para se despedir.
— Eu queria ficar, ou levá-lo comigo, mas Jiminie disse que você precisa descansar…
— Eu descanso melhor com você. – Jeongguk disse de olhos fechados, abraçando Taehyung.
— Meu amor… – Taehyung sussurrou baixo para Jeongguk não ouvir. — Eu sei que você precisa de um tempo sozinho.
— Eu não gosto de ficar sozinho, Tae. – O abraço se intensificou.
— Você ficará sozinho só para pensar, mas sabe que não está sem ninguém, não é? Estamos todos aqui por você. Eu… estarei aqui quando você quiser conversar.
— Vai me ouvir?
— Sempre…
— Eu vou dizer… só espera um pouquinho. – Encarou Taehyung. — Algumas coisas são difíceis de falar.
— Esperarei seu tempo, blue. Só prometa se cuidar, não quero imaginar você passando por aquilo novamente, é muito doloroso.
— Pode deixar… Jihoon-hyung também vai cuidar de mim. – Olhou para o amigo que estava mais afastado conversando com Seokjin. — Vou ficar bem.
Jeongguk não parecia frágil, e Taehyung sabia que ele não era. Na verdade, era um dos homens mais fortes que já conheceu. Era nítido que ele passou pelas coisas mais terríveis e aprendeu a lidar com isso sozinho, mesmo que não tenha sido da melhor forma, que era guardando para si. Percebeu a evolução dele por querer contar, percebeu a coragem dele ao enfrentar a mãe, apesar do estado em que se encontrava na hora. Um homem muito forte. Sentia tanto orgulho dele que não conseguia pôr em palavras, queria dizer o quanto o admirava, queria sempre dizer que ele não precisava enfrentar nada daquilo sozinho, e que pedir ajuda não é sinal de fraqueza.
Mas Jeongguk aprendeu aquilo também. Pediu por ajuda quando precisou, constantemente era ajudado pelos amigos. O choro, que condenava por achar ser um sinal de fraqueza, permitiu que acontecesse. Chorar era um dos sinais da libertação, um sinal de que você está sentindo e precisa sentir.
Tudo o que Taehyung não disse, Jeongguk leu em seu olhar. Ele o encarava tão profundamente, que Jeongguk quase não sustentou. Foi assim que deram um beijo, breve, sem aprofundar, mas profundo o suficiente para colarem os lábios e sentirem os corações acelerados.
Se fosse descrever aquele beijo, Jeongguk não daria cor, daria vida. Era além da cor e do gosto, era além do contato. Não havia definição, porque não tinha. Não havia descrição lógica, porque não cabia em palavras. Era amor, sem dizer que era amor.
Após o beijo, teve que vê-lo indo embora. Taehyung estava certo em dizer que Jeongguk precisava ficar sozinho. Jihoon ainda se ofereceu para dormirem juntos no quarto dele, mas Jeongguk negou. Sabia o que viria naquela noite, e precisava enfrentar.
Tem sido atormentado por anos, e não era por sua mente, não era pelos seus pesadelos. Era por suas memórias. Memórias que decidiu apagar da sua mente, porém não há como apagar completamente, elas ficam ali, em um canto, e não somem. O erro de Jeongguk foi ter ignorado isso, precisava encarar suas memórias, precisava encarar seus pesadelos.
Pelo cansaço que sentiu depois de sua crise, adormeceu rápido.
O pesadelo era diferente. Não estava no corpo do Jeongguk mais novo, estava ao lado dele, o observando. Era um espectador dessa vez.
Acompanhou a agonia dele, os sons, a visão. E quando ele correu, Jeongguk correu também. O menino se trancou no banheiro, e ao fundo, as batidas na porta e os gritos eram ouvidos.
Parecia com outros pesadelos seus, onde seu eu mais jovem encarava o espelho do banheiro, perdido. Ele não encarou o espelho, encarou Jeongguk.
— Quando eu vou poder abrir a porta? – Sua versão mais jovem perguntou, chorando.
— Agora. – Pegou na mão dele. — Iremos abrir a porta agora.
Essa foi a última lembrança de seu pesadelo quando Jeongguk despertou no meio da noite, suado. Parecia um bom presságio, iria abrir a porta, iria enfrentar. Mas estranhamente, não sentia paz.
A porta tinha que ser aberta em seu próprio mundo também. E esse era o maior medo de Jeongguk: ver o que estava bem na sua frente. Queria muito que fosse um monstro, uma fantasia, algo inventado de sua mente. Por um bom tempo encarou dessa forma, como algo irreal, criado. Sua própria mente bloqueou o que aconteceu para se proteger.
Porque o monstro atrás da porta era real.
•
Taehyung precisava conversar com alguém. Se ficasse muito tempo sozinho, só com seus pensamentos, ficaria sufocado. Conversou o quanto pôde com Seokjin, mas ele precisou ir trabalhar, e foi então que chamou Seojoon e Hyungsik para sua casa.
Lembrou da época que o trio compartilhava seus segredos, pedia conselhos, precisava daquilo novamente.
— Olha, Seojoon, ele nos convidou mesmo! – Hyungsik comentou quando já estavam sentados na sala.
— Eu disse que iria manter contato. – Sorriu pequeno. — Como vocês estão?
— Eu estou surpreso. – Hyungsik continuou. — Brincadeira… o trabalho tem sido difícil esses dias, mas estou bem.
Hyungsik estava no ramo da administração há anos, cuidava da empresa de seu pai, e não era um papel fácil. Por estar sempre conversando com diversas pessoas, conhecendo novos rostos, em um evento aleatório conheceu Taehyung, desde então ficaram amigos.
— Eu também estou meio cansado… e feliz porque você nos chamou, Taehyung. – Seojoon se pronunciou.
Seojoon era muito reservado, Taehyung adorava isso nele. Podia o definir como uma pessoa calma, o tipo de pessoa que você gosta de estar perto. Seojoon também ensinava inglês, e foi assim que Taehyung o conheceu.
— Eu queria a opinião de vocês sobre uma coisa. – Taehyung foi direto. — Irei falar uma situação, e vocês me dizem como iriam agir diante dela, ok?
Seojoon e Hyungsik disseram que entenderam.
— Tem uma pessoa, muito ruim, que você ainda não conhece pessoalmente. Essa pessoa fez coisas horríveis para um certo alguém que é importante para você. O encontro talvez esteja próximo, há a possibilidade de você esbarrar com essa pessoa ruim, então o que você faria?
— O quão ruim? – Seojoon perguntou.
— Ele… – Engoliu em seco. — Ele pode ser um abusador.
— Alguém abusou daquele garoto? – Hyungsik questionou sem rodeios.
— Hipoteticamente, Hyungsik. – Reforçou.
— Você está aí pálido, suas pernas não param quietas, não preciso de muito para deduzir. – Não tinha tom de brincadeira na voz de Hyungsik.
— Você quer se envolver nisso, Tae? – Seojoon questionou preocupado. — É uma situação difícil… eu não sei o que faria, provavelmente perderia a razão.
— Esse é meu medo. – Taehyung os encarou. — Perder a razão.
— Não deve ser um medo, é uma reação. – Hyungsik voltou a falar. — Se fosse comigo, eu não pensaria demais, Taehyung. Gente desse tipo merece o pior possível, eu perderia fácil toda a razão. Eu não sei o que ele fez com o garoto, e sinto muito por isso e por ele, mas você acha mesmo que precisa se envolver?
— Eu estou com raiva, Hyungsik! Qualquer um ficaria no meu lugar.
— Denunciar seria uma boa opção… – Seojoon começou a divagar. — Mas há alguma prova? Isso foi recente?
— Eu não sei detalhes, mas acho que não é recente… – Fechou os olhos com força ao imaginar Jeongguk adolescente passando por isso.
— Não é para bancar o justiceiro! – Seojoon disse firme. — Mas levando isso em consideração… essa pessoa sair impune é fora de cogitação.
— Quer que a gente dê um susto na pessoa? – Hyungsik sugeriu animado, recebendo olhares reprovadores. — Ah, vão me dizer que não pensaram nisso?
— Vai atrás de um criminoso cometendo outro crime? Fala sério. – Seojoon revirou os olhos. — Tae, eu acho que mesmo que você esteja com raiva, isso deve ficar em outro plano. Você não negou que é sobre aquele rapaz, então… tenha como prioridade cuidar dele, e depois converse com ele sobre isso.
— Você está envolvido demais. – Hyungsik acusou implicitamente. — E sabe disso… está envolvido em tudo, e eu já avisei no que isso pode resultar. Já que não quer me ouvir, faça o que Seojoon está dizendo.
— E no que isso pode resultar? – Taehyung perguntou sério.
— Tudo isso vai se juntar, todas as situações, todos os detalhes que vocês estão ignorando, então tudo irá desmoronar. Você sabe, não é? Eu sei que está tão tenso por isso também, você também sente esse mau presságio.
Taehyung sentia mesmo. Todas as questões da faculdade, tudo sobre o relacionamento deles, Taehyung sentia um aperto no peito. Sabia que algo estava por vir, e não estava preparado para isso.
Pela primeira vez se sentiu imprudente. Parecia que Jeongguk o tornava outra pessoa, Taehyung seguia mais seus instintos, não controlava seus pensamentos ou suas vontades. Isso era paixão. Isso era mais.
— Eu vou cuidar dele. – Olhou para Seojoon. — Acho que o principal a se fazer é não deixar isso acontecer novamente, protegê-lo disso.
— Nem sempre é preciso ter uma vingança direta, Tae. – Seojoon o encarou com seus olhos gentis. — Eu não acredito muito nisso de que a vida devolve o que você fez de ruim, mas talvez exista algo bom lá em cima…
— Não acredito nisso. – Taehyung respondeu. — Não acredito que há algo além de nós.
— Está parecendo o Taehyung meio rebelde de anos atrás. – Hyungsik sorriu.
Taehyung não sorriu de volta. Sabia do que ele estava lembrando. Constantemente tentava esquecer que já teve um caso com Hyungsik. Culpava sua carência e desespero por querer sentir algo diferente, independente da pessoa. Hyungsik parecia ter se envolvido muito, o que assustou Taehyung, decidindo assim se afastar. Ambos não tocaram no assunto desde então.
— Você deveria apresentar esse garoto para nós. – Seojoon percebeu o clima e mudou de assunto. — Sua primeira paixão e não conhecemos ele!
— Ele é bonito. – Hyungsik disse. — Bem bonitinho… não imaginava que esse era seu tipo, ele parece ser bem diferente de você.
— Imaginou que meu tipo era você? – Deu um riso soprado, desdenhando. — Pare de querer lembrar do tempo em que eu não tinha a mínima noção e fiquei com você. Não me atraí pela aparência dele, se é o que quer saber. Ele é diferente de todas as pessoas que já conheci, totalmente diferente de você, por isso me apaixonei.
Hyungsik não ficava envergonhado, mas daquela vez ficou. Taehyung foi curto e grosso, o desarmando. Seojoon percebeu que ninguém falaria nada, e voltou a dizer que estava ansioso para ver Jeongguk.
A conversa, como Taehyung imaginou, foi esclarecedora. Estava focando no assunto errado, sua prioridade era cuidar de Jeongguk, nada mais.
Os problemas internos, que ignorava, continuaria ignorando.
•
Jeongguk foi liberado do trabalho e da faculdade por três dias. Jihoon o acompanhou até o hospital, e um psicólogo o atendeu posteriormente, informando que ele precisava de descanso, era visível a ansiedade elevada.
Jihoon agia como um pai preocupado, não saindo de perto de Jeongguk por muito tempo. Ele parecia fisicamente bem, estava agindo normalmente, mas sentia que precisava manter-se próximo.
O último pesadelo serviu como combustível para Jeongguk, o motivou a sair do lugar, a não ficar estagnado, sentindo o mundo desmoronar ao seu redor sem fazer nada a respeito. O psicólogo que o atendeu na emergência foi muito gentil, e isso o fez querer começar a se consultar com um regularmente.
Ligou para Jimin e pediu uma indicação, não conhecia muitos consultórios perto de sua casa. Jimin, primeiro, ficou feliz com a iniciativa, e em seguida indicou um amigo seu, dizendo que era um excelente profissional, e as consultas estavam dentro do orçamento. Isso, em especial, aliviou Jeongguk, pois não tinha muita condição de gastar muito, e percebendo isso, Jimin se ofereceu para pagar o primeiro mês, simples assim.
Jeongguk negou e continuou a negar, mas Park Jimin era uma criatura muito obstinada, e acabou convencendo Jeongguk. A única coisa que pediu para Jimin foi para ele não contar para Taehyung, queria contar depois que saísse do consultório. A consulta também foi marcada com certa urgência, e na quarta-feira Jeongguk já se dirigia até o local.
Ficou nervoso, muito, aliás. Estava positivo, mas ao chegar no lugar, hesitou. Preferiu chegar alguns minutos mais cedo para se familiarizar com o ambiente, e após informar seus dados na recepção, se sentou, e não estava sozinho, tinha um homem ao seu lado.
Permaneceu em silêncio, porém, por conta de sua agonia, começou a bater o pé no chão e roer suas unhas.
— Nervoso? – O homem questionou baixo, olhando para os pés de Jeongguk.
— Estou. – Riu sem graça.
— É a primeira vez aqui?
— Sim… você também? – Não gostava de puxar assunto com estranhos, mas parecia ser uma boa distração.
— Não, me consulto há um tempo. – Deixou a revista que estava lendo de lado e deu atenção a Jeongguk. — Não precisa ter medo, todos precisamos de terapia.
— Você não se incomoda? – Perguntou inseguro. — Em ter… alguns problemas?
— Mas todos temos problemas, pelo menos nós reconhecemos e procuramos ajuda. – Sorriu, o confortando. — Muitos julgam as consultas com psicólogos e psiquiatras, nos chamam de loucos, doentes… mas você não deve escutar essas pessoas, elas que são loucas.
Jeongguk sorriu de volta, concordando.
— Eu não sei se consigo falar tudo, sabe? Não tenho muito costume de falar, é ruim.
— Você fala que nem percebe. – Deu uma breve gargalhada. — Precisamos conversar com alguém, e o psicólogo é a melhor opção, olha só: ele não te conhece, vai falar algumas verdades duras na sua cara e ainda vai te ajudar a superar seus problemas. Tem algo melhor?
Foi a vez de Jeongguk dar uma gargalhada.
— Muito obrigado… eu tava com medo de não ficar confortável, mas tô bem melhor. Qual o seu nome?
— Wooyoung, e o seu?
— Jeongguk… – Na mesma hora que falou, foi chamado para entrar na sala.
— Boa sorte, Jeongguk. Você vai se sair bem!
Se sentiu grato e motivado por Wooyoung. Era tão bom conversar com alguém que o entendia, mesmo que superficialmente.
Conheceu o psicólogo Kim SeungMin e o achou muito simpático e adorável.
Ele não pressionou Jeongguk em nenhum momento para falar, só fez perguntas aleatórias que o estimulava a contar mais de sua vida. Como Wooyoung disse, contou que nem notou.
Não conseguiu falar tudo, tanto pelo tempo, quanto pela carga emotiva. Mesmo não chegando nas piores partes que ainda se lembrava, Jeongguk chorou. SeungMin não o olhou com pena, somente ofereceu um lenço gentilmente e aguardou Jeongguk se recompor para voltar a falar. Ele não dizia muito, na maior parte do tempo anotava algo em algumas folhas, e Jeongguk ficou curioso em saber o que era.
Na medida que falava, parecia que desbloqueava novas memórias. Se recusava tanto a falar de sua infância e adolescência, que mal lembrava de como agia nessa época.
Assim que tocou no nome de seu padrasto, voltou a chorar. Dessa vez, chorou por mais tempo. Tentou ainda dizer mais coisas, tentou se lembrar mais, e não conseguiu. SeungMin compreendeu e pediu para que ele parasse de se esforçar tanto.
— Muitas coisas levam tempo, Jeongguk. Tempo para aceitarmos, e tempo para lidarmos com isso. Respeite seu próprio tempo, e cuide dessas memórias perdidas, não podemos esquecer nenhuma parte nossa, nem as piores.
Escutar aquilo foi um alívio para Jeongguk. Voltou para a casa mais leve, apesar de estar com o rosto inchado de tanto chorar. Nunca pensou que uma conversa poderia ser tão intensa, apesar de que não foi uma conversa em si, e mais um monólogo.
Se entristeceu em não encontrar Wooyoung na saída, queria agradecer novamente o apoio que teve. Estava mais confiante, mais certo de que não havia problema algum em procurar ajuda. Lembrava de como sua mãe odiou a ideia de seu pai começar a tomar remédios, que Jeongguk não sabia para o que era, mas sabia que seu pai precisava, ele dizia que era para "ajudar a sorrir", uma pena Jeongguk ser tão novo e não entender o peso daquelas palavras.
Mas não havia problema, não queria ser como sua mãe, não julgaria ninguém e nem se julgaria. Também precisava de ajuda para sorrir.
•
Como já estava em seus planos, chamou Taehyung para o visitar na quinta, depois da aula. Se entristeceu por não ter ido ajudá-lo na monitoria, porém o próprio Taehyung insistiu, mesmo que o atestado de Jeongguk tivesse acabado. Queria que ele descansasse o máximo possível.
Jihoon os deixou sozinhos novamente, indo encontrar Seokjin.
Jeongguk sentia a ansiedade em cada parte sua. Desejava contar sobre sua consulta, desejava beija-lo, desejava esquecer cada problema enquanto recebia um carinho de Taehyung.
Após as 22h, Taehyung apareceu. Jeongguk o aguardava na sala e abriu rapidamente a porta, o puxando para dentro. Fazia quatro dias que não se viam, e era o suficiente para a saudade ter crescido consideravelmente.
Sem esperar por um cumprimento propriamente dito, Jeongguk o agarrou para um beijo. Estava com saudade dos lábios dele, do cheiro, da textura, do calor. A sensação de parar no tempo enquanto o beijava daquela forma nunca mudava, não existia mais nada ao redor, sua mente ficava em branco.
Embevecido, entregue, extasiado.
O tempo era somente deles, a sensação os pertencia, eles pertenciam.
Um conjunto perfeito, como a lua e o mar. Taehyung era a lua, Jeongguk, o mar. Eles combinavam. Um agia, e o outro respondia em seguida. Causa e efeito.
Taehyung devolveu o beijo na mesma intensidade, porém com mais cuidado.
Flashes do momento que compartilharam no sábado invadiram a mente de ambos, não podiam negar ou esconder o desejo que sentiam, principalmente depois de se provarem totalmente.
— Ei, Sweetie… – Taehyung precisou segurar o rosto de Jeongguk em suas mãos para ele parar. — Não quer fazer isso depois? Eu queria muito conversar primeiro.
Jeongguk se deixava levar tão facilmente. Esqueceu em um piscar de olhos que o chamou para conversar e contar sobre sua vida.
— Desculpa. – Corou, envergonhado.
— Eu também senti saudade de você… quero compensar depois. – Acariciou o cabelo dele, sorrindo ao ver os brincos azuis brilhando. — Como você está?
— Bem melhor! Tenho uma coisa pra te contar. – Disse com um sorriso contido.
— E o que é? – Perguntou em expectativa.
— Depois de pegar o atestado, fiquei com mais vontade de fazer terapia… o Jimin-hyung me ajudou e eu fui ontem pra consulta!
Taehyung abriu um grande sorriso orgulhoso, o abraçando em seguida.
— Como foi?
— Ah, eu fiquei nervoso… mas encontrei um homem lá, ele faz terapia também, e me deu uns conselhos ótimos! E o psicólogo é bem legal, eu pensei que não ia conseguir falar nadinha, mas ele me ajudou com isso, fui me soltando.
— Você está tão radiante falando disso que não tem como eu não ficar feliz. – Continuou a sorrir. — Estou muito orgulhoso! Eu queria tocar nesse assunto com você, mas não sabia como… procurar um psicólogo é uma das melhores coisas que podemos fazer por nós mesmos, acredite.
— Você já fez? – Perguntou, curioso.
— Por um tempo, sim. Foi quando aprendi a ser mais calmo, mas faz muitos anos.
— Eu espero que me ajude também… – Suspirou. — Ir até lá me deu mais coragem pra te contar minha história.
No mesmo segundo, o celular de Jeongguk começou a tocar. Não identificou o número, mas imaginou que seria sua mãe, já que ela teve coragem de ligar durante a semana também. Mais uma vez, silenciou e guardou o aparelho.
— Enfim… eu acho que não posso te contar tudo, porque foge do meu próprio limite do que sei e lembro, mas vou contar o suficiente.
— Você quer mesmo fazer isso? – O encarou preocupado. — Se te deixa mal, não me conte…
— Meu psicólogo disse que seria bom contar! – Exclamou confiante. — Vem, senta comigo.
Os dois se aconchegaram no sofá, e Jeongguk escolheu deitar no peito dele, sem o olhar, seria mais fácil assim. Parou um tempo para respirar fundo, e iniciou.
— Eu te falei que meu pai cometeu suicídio, não é? Eu era um pré-adolescente, muito novo… tudo foi confuso na época, demorou um tempo para eu entender e assimilar o que aconteceu, e quando consegui, foi um inferno. Eu fiquei ainda mais fechado, minha relação que já não era boa com minha mãe, ficou pior. Eu não contava mais nada pra ela, e nem sentia vontade, eu só queria ficar sozinho.
O coração de Jeongguk começou a apertar, mas decidiu continuar.
— E então, quando eu tava com uns 15 anos, minha mãe botou meu padrasto pra dentro de casa. Eu não me importei muito, não tinha tempo pra isso, preferia só ficar quieto, sem dizer nada. A gente não se esbarrava muito pela casa, não falava muito, eu mal o conhecia, na verdade. E nas poucas vezes que eu saía do quarto, eu… – Engoliu em seco. — Notava ele me olhando. Pensei que eu tava ficando louco, mas ele me encarava muito, toda vez.
Foi a vez de Taehyung sentir o famoso gosto amargo na boca, e em reação, apertou o corpo de Jeongguk em seus braços.
— Era uma época confusa, sabe? Eu saía pouco, mesmo já tendo feito amigos, que são os que você conhece… e por ficar tanto tempo em casa, acabei ficando mais tempo com ele. Minha mãe arrumou um trabalho na época, e eles ficaram noivos, ou seja, ele tava lá em casa o tempo todo, mesmo quando minha mãe não tava. Antes da reforma que teve lá, só tinha um banheiro, e ficava no andar de baixo. Além disso, eu precisava comer, né? – Riu sem graça. — Então, só quando eu descia, era que eu esbarrava com ele. Nos primeiros dias foi normal, até que eu comecei a escutar uns barulhos estranhos…
Se remexeu, inquieto. Aquela parte lhe doía mais.
— Eu desci uma vez, meio preocupado, e ele tava… sabe? Se tocando. Eu vi tudo. Ele era barulhento, com certeza pra eu escutar, e me notou no meio da escada. Eu fiquei sem reação… sem sair do lugar, e ele também mandou não sair. E eu continuei vendo tudo…
Taehyung fervilhava em ódio e nojo. Não aguentou e abraçou Jeongguk, desesperado.
— Depois disso, eu não lembro mais de nada, Tae… – Não chorava, contava em um estado de choque. — Tudo é um borrão na minha mente.
E como aquilo preocupou ainda mais Taehyung.
Continuou o abraço, tentando passar algum conforto. Não conseguia dizer nada, Taehyung não conseguia pôr em palavras o que estava pensando.
Tentou se forçar a dizer algo, nem que fosse as frases clichês para passar segurança, mas escutaram batidas na porta.
Primeiro, Jeongguk pensou que Jihoon tinha esquecido a chave, porém sabia que era difícil isso acontecer.
Levantou do sofá com um certo medo, não estava com uma sensação boa. Seu corpo sempre sabia, sempre sentia.
Abriu a porta e viu seu padrasto.
Paralisou, sentiu o medo percorrer por cada um de seus poros.
— Por que não atende a porra do celular? – Dakho perguntou, rude. — Sua mãe tá ligando direto pra você, me abusou esses dias inteiros pra vir aqui pra resolver não sei o quê.
Jeongguk não conseguiu responder.
Diferente da outra vez, Taehyung não ficou distante, foi para o lado de Jeongguk.
— Quem é você? – Taehyung perguntou áspero.
— Dakho, o pai de Jeongguk. – Respondeu simples, com um pouco de divertimento em sua voz.
— Padrasto. – Jeongguk falou baixo. — Padrasto! Não ouse dizer que é meu pai! Você não é nada meu! – Não gritou, mas encarava o homem com ódio.
— Ora, que falta de educação! – Gargalhou. — E você, quem é?
Taehyung também não respondeu.
— Eu venho aqui pra conversar, e sou tratado assim? Cadê a educação desses jovens de hoje em dia? – Suspirou de forma dramática. — Sua mãe disse que precisamos conversar, Jeongguk. E então?
Silêncio.
— Você continua esse covardezinho que não fala nada, não é? – Dakho debochou, afastando um alguns passos. — Vamos, Jeongguk, age.
Agir. Jeongguk precisava agir. Por muito tempo ficou parado, apenas olhando, em silêncio. Não podia mais ser assim.
Taehyung não sabia como ainda não tinha avançado para cima do homem, o fazendo calar a boca. Precisava saber o que Jeongguk achava daquilo, queria saber o que ele queria fazer.
Apertou a cintura dele, firme. Jeongguk o olhou, sem falar nada ainda.
— Ah… então é isso? – Dakho parecia se divertir com o que via. — Ele é seu namoradinho, Jeongguk? Eu já desconfiava que você gostava disso…
Como se soubesse o que ele iria falar em seguida, o corpo de Jeongguk estremeceu.
— … Afinal, você aprendeu comigo.
Aconteceu tudo rápido demais. Taehyung avançou, mas Jeongguk agiu rápido e o segurou. Dakho recuou, porém continuou perto o suficiente.
— Não, Taehyung! – Jeongguk gritou.
Taehyung não deu ouvidos e continuou a se debater, completamente tomado pela raiva.
— Você não vai bater nele, porra! – Jeongguk gritou novamente.
Com essa fala, Taehyung parou. Não faria nada que Jeongguk não quisesse, mas ainda não entendia. Com a expressão confusa, esperou uma resposta ou ação de Jeongguk.
— Eu que vou.
Como um vulto, Jeongguk passou rápido por Taehyung, erguendo seu punho.
Taehyung mal conseguiu acompanhar a cena, tudo que viu foi Dakho caído no chão, com uma expressão incrédula no rosto.
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