59. Nova casa, nova vida
- Esquerda, direita, para frente e para trás. Esquerda, direita, para a frente e para trás. Esquerda, direita...
- Henry, isto é chato. Já sei e já fiz tudo isto.- Aborreci-me com as simples manobras que me dava. Acho que num verdadeiro duelo não é só direita e esquerda, trás e frente!
- Helena, tu ainda não sabes isso.- Afirmou com um suspiro olhando para as estrelas e só depois para mim.
- Sei sim.
- Tudo bem, milady.- Sorriu posicionando-se na minha frente.
Ele ia enfrentar-me? Ficaria feita em picadinho!
- Então, sabes ou não sabes?- Apoiou-se na espada certo de que tinha recuado.
- En gard, monsieur!- Aguentei firme sobre o navio vacilante.
Eu não ia lá. Iria arriscar demasiado:
- Parece que como cavalheiro terei de ser eu a fazer as honras.- Avançou e desviei-me.
- Só te fica bem.- Sorri nervosa. Certo, ele tinha razão, eu ainda não estava totalmente pronta, mas pelo menos dá para o assustar. Avancei e defendi pela esquerda e pela direita e recuei, defendendo pela direita e pela esquerda, sem maneira de atacar.
Sentia-me já cansada e frustrada com tantas voltas de costas pelo mastro central do navio.
- Eu posso passar a noite toda nisto.- Sorriu com braço esquerdo atrás das costas direitas.
Tentei avançar uma vez mais mas o maldito do meu marido não dava brecha!!!
- Querem parar com isso de uma vez?!- O William arrombou a porta do camarote dos rapazes.- Estamos a tentar dormir!
O susto e a surpresa de Henry foram o suficiente para o distrair e aí sim, pude avançar à vontade:
- Esquerda, direita, avança. Esquerda, direita, avança!- Repeti alto e em bom som as suas palavras aborrecidas.
- Ei, espera, espera aí!- Recuava enquanto se tentava recompor.- Isso não conta, estava distraído.
- Essa desculpa funciona enquanto estão num duelo?
- Não, mas devia funcionar com a minha esposa.- Sorriu tão atrapalhado que tropeçou nos próprios pés e caiu de costas no convés imundo.- Obrigado William!- Rosnou zangado e sorri.
- Sempre teve dois pés esquerdos e a culpa é minha.- O coitado voltou para dentro ao perceber que a nossa noite tinha acabado.
- Tudo bem, amor. Tu danças bem.- Estendi-lhe a mão para o ajudar a levantar.
- Ótimo.- Sacudiu-se e endireitou-se.- Eu só não disse que me rendia.- Sorriu travesso e voltou a apontar-me a espada.
⭐👑⭐
- Inglaterra!!!- Edward quase que se atirou ao mar ao ver terra.
Acorreram todos à proa do navio, os olhos de Henry brilhavam ao ver terra, os campos lavrados, as vilas, que pouco depois se misturavam com as cidades.
Era tão verde e húmido... grandes rebanhos de ovelhas pastavam nas margens largas e afastadas.
Henry estava boqueaberto, radiante por estar de volta à sua terra natal. O seu sorriso era enorme e os seus olhos brilhavam como cristais sobre a água turva do rio.
- Estás de volta a casa.- Sorri dando-lhe a mão e sentindo a brisa fria de Novembro. O céu negro anunciava que a chuva não tardaria.
- Estamos. Estamos de volta, Helena.- Beijou-me e abraçou-me com força.
- Poupem-me as lamechices! Eu estive para me atirar ao mar por mais de dois meses!!! Vocês são insuportáveis, dias e dias a fio convosco levam qualquer santo à loucura!- O William fez um drama.
- Eu fumei mais que a lareira de casa dos meus avós. Estás a chorar o quê?- O Richard cruzou os braços com o maior aborrecimento. Sim, todos fumámos. Dez charutos para o Will devia ser... um para nós, pelo fumo perdido no ar.
- Eu gostei. Gostava de ter mais privacidade, mas não foi mau.- O David encolheu os ombros ao declarar.
- Eu só sei que estou doido para chegar a casa, tomar um bom banho e cair a dormir até 1897!!- O meu marido suspirou desesperado.
- Dormir, aham, dormir.- O James olhou para o William e caíram os dois a rir como se soubessem de algo e eu não.
- Não sejam idiotas.- Henry rosnou.
- A sua tia, Henry. Não se esqueça de comparecer perante a rainha.
É... aí o meu marido engoliu em seco e pareceu lembrar-se.
- Não é algo que se esqueça com facilidade.
Dei-lhe duas pancadinhas no peito onde estava aconchegada. Ia correr bem.
- Ancoraremos dentro de em breve.- O primeiro imediato informou-nos sempre muito sério.- Preparem-se.
- Sem piratas...
- Sem franceses...
- Sem corsários...
- Sem portugueses... Demo-nos muito bem cavalheiros!- James, Edward, Henry e Anthony enumeraram.
Sem portugueses. A hostilidade era bem clara e compreensiva.
Já sinto saudades do meu pai e ainda não atraquei em solo inglês.
- Não temas, milady. Não há maneira de dar errado.- Henry murmurou no meu ouvido.- Eu amo-te.
⭐👑⭐
- EU AMO-TE HELENA BROTAS LENCASTRE!!!
- Henry!- Gargalhei quando rebolou pelo jardim de sua casa assim que chegámos ao palácio em Londres.
Os meus sogros ficariam no Paço da Rainha, de momento St. James's Palace.
- Eu estou tão...- Não conseguiu acabar o que ia dizer antes de desatar a rir.- Não vens?
- O verde não vai muito bem com o meu vestido...
Deitou-se de bruços sobre a relva e encarou-me em desafio:
- Desde quando é que és tão pieguinhas?
Desde nunca, apenas parecia um pouco infantil. Oh bem... só chegamos a Inglaterra após termos a pátria roubada uma vez na vida, não é?!
- EU AMO-TE HENRY HYDE!!!- Rebolei pela relva molhada sob o céu negro da noite e achei muito divertido! Sentia-me uma menina outra vez.
- Oh Helena...- Suspirou depois de beijar as minhas mãos, olhando profundamente nos meus olhos.
Sabia o que queria dizer e isso fez-me sorrir. Estava igual, sem palavras.
É um recomeço para nós dois.
- Tu vais ser o melhor ministro, testa de ferro... não sei, que este país já teve.- Garanti atrapalhada com termos que me eram totalmente estranhos.
Ao meio de uma gargalhada agradeceu o meu apoio.
- E tu vais ser a melhor autora e pensadora da nossa era.
Ri incrédula com as suas crenças.
- Henry eu não posso nem escrever algo publico.
- Arranjaremos uma maneira.- Garantiu antes de me beijar e abraçar contra a relva.
⭐👑⭐
- Fresco outra vez.- Suspirei após o banho sentindo-me molenga demais para jantar. Devia ser já muito tarde.
Ainda assim fiz um esforço para vestir qualquer coisa elegante com a ajuda do empregado. Devia uma visita guiada a Helena, não quero que se sinta uma estranha em nossa casa.
Quando passei pelo seu quarto, a senhora que ainda arrumava os seus baús disse-me que não estava ali. Sorri ao lembrar a minha esposa curiosa. Encontrei Helena no salão de baile. Acho que não era usado há anos... Inglaterra já precisa da lufada de ar fresco dos novos Hyde.
- É tão bonito.- Sorriu entusiasmada quando reparou que a observava. Deslumbrava-se com a vista sobre o jardim, os enormes candelabros dourados que libertavam pequenos arco-íris pelos cristais.
Pareceu ligeiramente desgostosa ao tocar na cortina verde escura pesada.
- Também nunca suportei essa cor, mas a minha mãe dizia que era uma prenda de casamento da avó dela.- Revirei os olhos aborrecido com aquela falta de gosto.- Quando estivermos no nosso palácio será diferente. Podes mudar o que quiseres, confio no teu bom gosto.
Iria mostrar-lhe o restante depois de jantar. Tinha fome, e com certeza que Helena também.
- Carne.- Suspirou tão faminta quanto eu por algo que não fosse peixe.
Carneiro assado com batatas. Saudades da boa comida assim!
- Bom apetite.- Desejei e sorrindo retribuiu.
Não houve muita conversa, apenas aproveitamos a refeição. No navio não havia tanta comida disponível e era racionada para cada um. Apenas quando os pudins e os bolos foram postos na mesa trocamos as primeiras palavras realmente importantes desde que nos sentámos àquela mesa:
- Amanhã temos de nos apresentar perante a rainha.- Decidi. Não valia a pena adiar mais tempo.
- Sim. Estás nervoso?- Sorriu.
- Assustado.- Confessei.- E tu?
- Aterrada.
- Não tens nada a temer.
Os olhos de Helena quase saltaram do rosto:
- Por minha culpa o sobrinho dela ia morrendo e causando uma crise diplomática internacional. Todo o teu trabalho foi em vão.- Suspirou lembrando-se de todos os meses que passei em Portugal.
- O rei é profissional, e essa é a única qualidade que me lembro que tenha. Há interesses maiores para ele, se me matou ou não, é menos uma gargalhada que dá no fim de semana.
Chovia torrencialmente lá fora. O teto parecia querer cair em cima de nós.
- Ainda assim.
- Da diplomacia as coisas estão controladas.- Garanti-lhe. Não queria que se preocupassem por mim em vão.- Só te estava a dizer para te preparares. Não queria que fosses apanhada desprevenida.- Provei o pudim e depois mostrei-lhe o resto do palácio: o meu gabinete, onde fazia os trabalhos na altura da faculdade, a biblioteca, o gabinete do meu pai, os salões de retratos, as salas de chá...
- Este sitio é pelo menos duas vezes maior que a minha casa.
- Milady...
- Sim, eu sei. Nossa casa.- Corrigiu-se a si mesma e rimos.- Boa noite, Henry.
- Boa noite, milady.- Beijámo-nos antes de fechar a porta um pouco hesitante dos seus aposentos e eu caminhar até aos meus.
Estava em casa ao lado da minha vida... há melhor?
- Uma cama.- Aconcheguei-me entre as almofadas, suspirando satisfeito pelo conforto. As minhas costas andavam a pedir tréguas há semanas!!
Uma cama feita de lavado, lençóis de linho bordados e muitas almofadas fofas... isto é o céu!
Apesar de tudo isto não conseguia dormir por conta da chuva a bater com força nos vidros. E havia trovoada, fazia imenso barulho.
Farto de dar voltas na camas, e após reconsiderar umas mil vezes, enrolei-me no robe e fui bater à porta do outro lado do corredor. Tenho de pedir para mudarem os aposentos de Helena, já pareço João com a austríaca. Que horror!
- Sim?- Abriu a porta de robe vestido.
O seu cabelo encaracolado, e solto parecia reluzir como ouro à luz da candeia na sua mão, apesar do tom caramelo que tinha.
- Vim ver se estavas bem. Achei que o tempo não estava muito convidativo para uma primeira noite num quarto estranho.
- Oh... obrigada.- Sorriu mais tranquila.- É um pouco frio, apenas.
- Vou pedir que tragam mais uns cobertores.
- E é meio vazio.- Estreitou o olhar.
- Só precisa de umas decorações mais calorosas.- Tentei apaziguar a sua estranheza.
- E tem uma cama demasiado grande para uma pessoa só.
- Devias ver a minha então.- Ri e redimi-me imediatamente.- Não foi isso que quis dizer! Digo, de um modo... é só realmente grande.- Terminei o assunto para não ir buscar uma pá e cavar um buraco ali mesmo no chão.
- É assim tão espaçosa?- Indagou.
- É.- Sorri.
- Tem lugar para mais um?
Ow! Então era isso que ela me estava a tentar dizer! Tudo bem. Erro teu, Hyde!
- Tem sim, para uma vida inteira.- Garanti e recebi-a nos meus braços aos beijos enquanto cambaleávamos até ao outro lado do extenso corredor para não mais voltar aqui a esta ponta.
⭐👑⭐
OS TESTES ACABARAM!!! ESTOU DE FÉRIAS!!!
Sei que vos é indiferente, mas ainda não caibo em mim de contente! Isso significa que também receberão capítulos com mais frequência e não apenas uma vez ao ano (pelo menos era o que me parecia).
Até ao próximo e protejam-se, princesas!
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