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53. Coimbra

- Vejam só quem ele é... como foi a noite, maninho?

- António, eu estou atolado de coisas para fazer.- Respondi ao impertinente do meu irmão sem o encarar.- O reino não tem dias de folga.

- Olha, deve ter corrido bem, não é? Quando passei pelo teu quarto estava vazio.- Sentou-se entusiasmado no cadeirão de frente à minha secretária.

- Porque é que queres saber? Não és tu que vais virar padre? O celibato não te permite esposa.- Ri-me dele.

- Ah! Vais dizer-me que de repente o grande João deixa de falar das suas intimidades devassas como uma virgenzinha, é?!- Amuou.

- António, tem mais respeito.- Indignei-me.- Estás a falar da minha mulher, da rainha de Portugal e da tua cunhada, não é uma rameira para ser tratada nesses modos.

- E quanto a Francisca? Como é?- Aborreceu-se e mudou de assunto.

- Como é o quê?- Estranhei a conversa e parei de assinar os papeis.

- Oras... já sangra.- Apontou o óbvio.- Aproveita que Lisboa está apinhada de estrangeiros influentes.

- Nem pensar!- Falei calma e firmemente para que fixasse bem as minhas palavras.- Eu casei-me deste modo para que nenhum de vocês tivesse de o fazer, não vou entregar a minha irmã aos lobos, idiota!- Rosnei.- Além disso só tem 10 anos! É uma criança!

- Antes 10 anos que 25.- Encolheu os ombros com uma naturalidade repugnante.

- Sai daqui!- Ordenei-lhe enojado!

Pensar num príncipe ou rei velho enrugado e porco com as mãos em cima da minha irmãzinha dava-me náuseas forte.

⭐👑⭐

Quem diria, agora concubinas frequentam bibliotecas... onde é que já se viu?!

O meu marido atreveu-se a dar-lhe um colar de diamantes semelhante ao meu! Esta lusitana estava com imensa sorte por ainda não ter palitos nos olhos!

- Que fazeis?- Peguei num livro qualquer da prateleira e desfolhei com desinteresse. A morena lia um livro e tomava notas atentamente.

- Bem, eu vou casar-me com um inglês e pouco sei do seu país. Também não sei que conversas agradam aos meus futuros sogros... eu estou nervosa.- Continuou sem me encarar, concentrada.- Como foi para vós? Como soubestes de Portugal?

- Eu tinha um embaixador comigo, professores e educadores.- Ergui o queixo, deixando claro que não tínhamos nada em comum.

- Henry quer regressar a Inglaterra.- Murmurou.- Eu não estou pronta para deixar Portugal outra vez... como é que lidastes com a situação?

- Eu tinha um marido que me amava e me esperava no meu destino.- Ergui a sobrancelha.- Não havia nada a temer.

- Verdade.- Respirou fundo.

- A nossa situação não é sequer parecida.- Deixei claro.

- Bem... acaba por ser.- Sorriu.

- Não.- Firmei a voz, fechando o livro no mesmo instante.- Eu parti da minha terra natal para desposar um rei. Toda a minha vida me dediquei a ser perfeita. Eu sou uma santa imaculada aos olhos de Deus. Vós sois apenas a filha de um marquezinho que caiu de amores por um idiota estrangeiro.

- Perdão?- Balbuciou.

- Eu sou rainha de Portugal, dona de um império, ex- arquiduquesa da Áustria! Vós sois uma idiota que vai para uma terra estrangeira por um casamento vergonhoso com um conde qualquer.

A desavergonhada permanecia sem palavras.

- Vossa coroa tinha veneno ou sempre fostes maligna desse modo?- Deixou a pena na tinta.

- Tento na língua, que sou vossa rainha agora!

- Não, não sois não senhora!- Sorriu certa de si.- Sois uma simples rainha consorte, uma mera parideira. Só há uma pessoa que manda aqui e não merecia um destino como vós.- Fechou o livro e de sorriso jocoso ousou tentar sair.

Nojenta asquerosa!

- Esta conversa ainda não terminou! Ireis retirar as palavra que dissestes, nem que tenha de vos tirar a garganta para tal!

- Ou o quê? Vou para a fogueira? Forca talvez?

- Não me dês sugestões, rameira!- Sorri deliciada com a visão desta conspurcada a morrer queimada no fogo do inferno enquanto berra por clemência.

- É o quê?

Farta das suas lamurias arranquei o seu horrível colar de pérolas que se perdeu pelo chão.

- Quem manda aqui agora sou eu. É bom que vos lembreis.- Virei costas farta de aturar esta rata imunda.

⭐👑⭐

- O que é que o João foi fazer?

Maldita austríaca de uma figa! O Henry é que tinha razão, sempre teve!

Enquanto se ambientava e firmava o seu lugar era sempre gentil, agora que se casou pôs as presas para fora.

Mentirosa! Nojenta! Ainda tem a mania de dizer que é santa... já vi prostitutas mais puras!

- O colar da mamã...- Lamentei magoada enquanto procurava as pérolas pelo chão de mármore. Este colar era muito importante para mim, o que faria agora?

Apanhei os diamantes e as pérolas, no entanto não sabia se estavam todos, ou qual era a ordem. Nem um colar sou capaz de manter... Eu iria usá-lo no meu casamento, era como se a mamã estivesse lá comigo, no dia mais importante da minha vida.

- Sabia que te encontrava aqui! Helena, eu tenho de te dizer... ei, que foi?

- Nada.- Limpei as lágrimas, mas senti mais vontade de chorar por saber com quem passaria a vida daqui para a frente. João acabou por entrar neste casamento de mente aberta, como tanto lhe pedi e foi em vão.

Ele merecia alguém carinhoso, cuidador e apaixonado a seu lado, não aquela maníaca. Como é que eu o poderia deixar aqui assim, sozinho a lidar com aquela louca? Eu lamento tanto ter insistido para que a compreendesse.

Se estivesse ao meu alcance eu mesma arrancaria as camélias com as minhas próprias mãos e à força do ódio!!!

- Helena?- Afagou o meu braço.- Que foi?

- Rebentei o colar da mamã. Não sei se tenho tempo de o ter pronto antes do meu casamento.

- Claro que vais, sei de um bom ourives.- Sorriu-me.- Só preciso que me digas qual a ordem.

- Eu não sei de cor. Tenho um quadro em casa que...

Oh João...

- Que é que querias tanto dizer-me?- Guardei as peças na minha bolsinha.

- Oh sim.- Pôs as mãos nos bolsos da casaca de veludo azul.- Tinhas razão. Maria Ana não é assim tão má. Ela até é gentil e sabe de bons livros. É um pouco contida, no entanto acho que é algo que pode ir mudando...

- Ainda bem que estás feliz, de verdade.- Sorri. Talvez a rainha só fosse podre comigo. Se João estava feliz, quem era eu para o incomodar?

- Esperemos que dure.- Revirou o olhar.- Se depender do que se passa no quarto isto morre em menos de 15 dias.

- Agora estás a ser grosseiro. Eu sou uma dama.-  Lembrei.

- Ah cala-te, em menos de um mês estaremos no mesmo barco.- Sentou-se em cima da mesa.- Temos de te planear uma despedida de solteira bem louca!

- João, por amor de Deus. A minha despedida de solteira vai ser a relembrar os melhores momentos que vivi sozinha e sorrir porque a partir de agora estarei acompanhada.

- Hum... parece triste.- Brincou.

- Não é.- Garanti dando-lhe um pequeno encontrão.

- Eu quero muito saber como é que vai ser a tua reação quando conheceres os pais e os amigos. Mudas de ideias num instantinho!- Gargalhou.

- Não digas essas coisas!- Insisti.- Os amigos de Henry serão igualmente educados e cavalheiros.

- Minha cara, tu vais ver a verdadeira faceta do teu homem quando o vires conviver com eles. São as pessoas com quem tem mais à vontade. Só aí me confirmas a certeza de casarem.

- Henry não é nenhum idiota. É um homem integro e honesto.

- Mas usa palavrões.

- Como qualquer pessoa.- Encolhi os ombros.- Além disso palavrões em inglês têm mais classe.

- Que falta de patriotismo, Helena. Nada jamais ultrapassará a classe de gritar Filho da...

- Majestade, um pouco mais de educação e consideração, sim?- Ignorei-o.- Estou nervosa. E se os meus sogros não gostarem de mim? Caramba, Henry é primo direito da rainha de Inglaterra, devem ser pessoas de altos padrões e...

- Helena, sois filha do Marquês de Montemor o Novo, irmã do Governador de S. Paulo, amiga próxima do rei de Portugal e aia de companhia da infanta. Nada nem ninguém te podem rebaixar. Se quiseres que apareça "por acaso" num corredor ou assim quando vierem ao palácio já sabes...

- Eu não preciso dessas coisas, estás a deixar-me nervosa!

- Então cumpri a minha tarefa aqui, tem um bom dia.

- Ah seu...- Segurei os meus próprios punhos para não lhe bater com muita força enquanto saía todo contente da biblioteca.

Esta tarde havia tourada no Terreiro do Paço. O povo estava doido com a sangria, e João parecia não se divertir assim fazia algum tempo; mesmo a rainha estava animada... talvez o sangue do boi saciasse a sua sede pelo meu.

- Vem.- Ouvi murmurar no meu ouvido e recuei com um sorriso entusiasmado.- Aquilo não é de todo o meu entretenimento favorito.- Henry não era um fã de festa brava pelo que se vê.- Achei que podíamos aproveitar e ir para a capela, tu sabes...

- Henry, essas tuas manias vão fazer-nos queimar no Inferno. A capela não é lugar para as nossas coisas.- Impedi-o e imaginei a sala dos príncipes, onde João costumava ir fumar charuto e beber um copo de vinho depois de almoço com os irmãos ou amigos. Era magnifica.- Temos de aproveitar agora que no fim de semana vou para Coimbra.

- Coimbra?

- É. O rei quer construir uma biblioteca nova.

- A pedido do confessor, presumo?

- Sim, e não.- Tentei explicar-lhe.- A Universidade já precisava de uma nova fonte há algum tempo. Se as Universidades não estiverem equipadas, como é que o país anda para frente? Além disso, frei Gaspar é o reitor e também quem ensinou a João uma grande parte do que sabe: filosofia, direito, teologia, administração...

- O padre sabe de administração e finanças?

- Um pouco, houve outros professores com certeza. 

- Eu pagava para ver o rei numa universidade. Não durava uma semana em Oxford.

- Chegaste a terminar o seu curso?

- Sim, o meu bacharelado. Vim para cá antes de conseguir continuar para o grau de mestre.

- Eu gostava de ir para a universidade.- Lamentei ser mulher uma vez mais.

- Eu posso ensinar-te o que sei, mas antes temos de terminar as aulas de esgrima.

- Tenho andado a praticar.- Sorri entusiasmada.- Já consigo empunhar a espada com firmeza, já não tremo!

- Estou orgulhoso de ti.- Sorriu e beijou-me os lábios antes de correr pelos corredores fora até ao salão de jogos.

- Henry!- Zanguei-me.- Espera por mim!

⭐👑⭐

- Não Mila, tu ficas aqui.- Sentei-a quando me tentou seguir pela segunda vez e desta obedeceu.

Eu estava nervosa. Não queria apanhar um desgosto. Sei que não tínhamos combinado nada esta noite, porém precisava de falar com o rei, meu marido, que pouco tempo estivemos juntos hoje.

- Não é uma boa ideia, majestade. Vosso marido pode achar que, não sei...- Eliza tentou dissuadir-me.

- Eu sou sua esposa. Ele tem de ter tempo para mim.- Insisti e iluminou o caminho pela passagem que disseram ir dar aos seus aposentos.

Pareceu um caminho mais longo ainda que o corredor enorme entre os nossos quartos. Porque me queria tanta distância? Fiz-lhe algo de errado?

- Só há esta porta.- Murmurou hesitante e após mais uma palavra minha, bateu.

Não houve resposta, portanto pedi-lhe para esperar 10 minutos. Se não voltasse nesse período de tempo poderia ir descansar.

Quando saí da passagem reparei que estava na ante-sala do seu quarto. Inquieta, aproximei-me da porta que dava para o leito; não ouvi nada... deve ser um bom sinal, certo?

Ficaria zangado comigo? Talvez Eliza tenha razão... Oh bem, só saberei se entrar.

- Boa noite.- Abri a porta decidida e encontrei-o sentado a beber um cálice de vinho e a ler.

- Boa noite.- Franziu o cenho.- Tínhamos combinado alguma coisa?

- Não.- Fechei a porta atrás de mim.- Pensei que pudéssemos conversar.

- E sobre o que quereis conversar?- Fechou o livro e bebeu o resto do vinho.

- Não nos vimos todo o dia, havemos de ter o que dizer um ao outro.- Entrei no leito e sentei-me a seu lado.

- O meu dia não foi nada de especial.- Encolheu os ombros.- Reis e rainhas não têm lua de mel.

Sorri com as suas palavras.

- O povo estava animado com a tourada.- Deitámo-nos ao mesmo tempo e fomos falando debaixo das cobertas entre murmúrios.

- O povo não precisa de grandes artimanhas para se animar.- Sorriu.- E vós? Como foi vosso dia?

- Rezei e bordei um pouco e andei pela corte a ver quem seriam as minhas novas damas de companhia. Não sei quem escolher, vossa irmã tem as melhores senhoras.

- Oras, com certeza encontrareis alguém que vos agrade, posso pedir a um dos meus conselheiros de confiança para elaborar uma lista de candidatas.

- Eu gostei muito de Helena.- Sorri.- Ela sempre foi gentil comigo e também lê, é curiosa e gosta de música. Só fala demais.

- É. Às vezes.- D. João riu.- Helena, por muito que vos agrade não pode deixar a minha irmã. É a única dama de juízo que a encaminha. 

- Claro... no entanto há algo que me incomoda um pouco nela, receio que o transmita à infanta.

- O quê?- O meu marido apoquentou-se.

- A sua ligação a Deus. Parece sempre distraída nas missas e orações, às vezes a conversar, outras a olhar para o nada.

- Garanto-vos que a ligação de Helena a Deus é provavelmente mais forte que a minha e a vossa juntas.

Duvido!

- Quanto tempo ficaremos na Universidade? Ouvi falar imenso sobre ela.

- Todo o fim-de-semana.- Pouco tempo depois surgiu um sorriso travesso no seu rosto.- Quereis ir a Vila Viçosa?

- Perdão?- Não entendi o que significava.

- O marquesado da família. Sou duque de Bragança, marquês de Vila Viçosa e Conde de Arraiolos.

- Eu vou buscar um papel e vós, pela vossa gentileza ireis repetir.- Fiquei envergonhada por não saber toda a titularia do meu esposo.

Felizmente não se ofendeu, apenas riu e deu-me a mão.

- Eu gosto muito de Vila Viçosa, talvez vos agrade também.

- É perto de Coimbra?

- Não, no Alentejo; com certeza que nos podemos ausentar por uns dias.- Beijou o meu pescoço e afastei-o envergonhada.

- Dissestes que majestades não tinham lua de mel.

- Oras, não é uma lua de mel, é uma escapadinha com a esposa. Uns dias longe de Lisboa não farão mal a ninguém.

- Não sei... Logo se vê.

⭐👑⭐

- Tens mesmo de ir, amor? Fica. Fica aqui comigo, eu até faço arroz doce lá na embaixada...

- Henry, é só um fim de semana, havemos de sobreviver.- Sorri com o seu beicinho enquanto via os baús serem carregados para a carruagem.

- Duvido que consiga.- Amuou.

- Henry!- Sorri e dei-lhe a mão.

- Lisboa é um total aborrecimento sem ti.

- Ainda bem que estás em Cascais.

- E se precisares de ajuda lá? Universitários são selvagens! São homens jovens com os desejos e impulsos à flor da pele... devia ter-te ensinado melhor as artes da espada.

- A pistola nunca me falhou, amor.- Sorri para o tentar acalmar.

- Ai não?!

- Henry...

- Tudo bem.- Respirou fundo e encerrou o assunto, notando que eu não iria ceder.- Tem cuidado, peço-te.

- Terei.- O papá passou por nós e despediu-se do meu marido, que para ele era só noivo. Beatriz fez o mesmo.

- Sonha comigo, milady.- Sorriu e beijou-me depressa antes que alguém reparasse.

Oh Henry... eu vou sentir tantas saudades...

...

- O meu rabo!- A infanta endireitou-se e resmungou, ouvindo as costas estalarem quando parámos para esticar as pernas no Bombarral.- Maldito D. Dinis! Em vez de construir uma Universidade na capital, não! Vamos construir uma no meio do nada, perfeito!- Mastigou zangada uma sandes de compota que Díonisia lhe entregou.

O rei e a rainha ainda tinham cabedal para se sentarem à mesa montada pelos empregados ali à beira da estrada. A infanta comia até de pé!

- Eu acho uma cidade muito romântica...- Carolina suspirou.

Dou-lhe alguma razão. Palco da paixão de D. Pedro e de D. Inês... aquilo sim era um homem.

- Esse idiota traiu-a enquanto dizia que a amava. Coroou uma mulher morta. D. Pedro era um louco, isso sim!- A infanta resmungou

Eu não sabia que D. Pedro tinha traído D. Inês e analisando bem as palavras de Francisca, ela tinha razão. A aluna superou a mestra... estou tão orgulhosa!!

- Francisca, come qualquer coisa para ver se te tapa a boca.- D. João revirou os olhos com a maçada do mau humor da irmã.

- Porquê, também vais coroar uma mulher morta e não quereres que ninguém saiba?- Brincou e todos arregalamos os olhos.

A rainha estava parva e nunca vi João tão sério.

- Essas coisas não se dizem, Francisca!- Repreendeu fortemente.

- Eu estava a brincar. Peço desculpa.- Murmurou notando o seu erro.

- Volta para a carruagem.- João ordenou frente a toda a corte. Francisca estava vermelha de vergonha.

- Mas...

- Agora!

- Meu senhor, vossa irmã não tinha a intenção de...- A rainha tentou dissuadi-lo.

- Tendes razão: a minha irmã, obedece ao que eu digo.- João estava irredutível e Francisca obedeceu às ordens do irmão mais velho. Manuel foi com ela.

Oras... a infanta pediu desculpas, também não precisavam de levar a situação tão a peito!

Parámos mais umas quantas vezes e no dia seguinte chegámos a Coimbra.

- Que sitio pacato.- Sorri olhando pela janelinha.

O papá exibia um sorriso melancólico, absorvendo a cidade com saudade. A comitiva seguiu até ao palácio onde ficaria alojada pelo fim-de-semana e em seguida o rei dispensou-nos.

- Estou estafada.- Beatriz lamentou enquanto via os baús serem carregados pelos empregados.

- Eu vou dar uma volta.- O papá pegou no chapéu triangular com penas brancas e sorriu-me num convite para o acompanhar.

- Eu também.- Troquei apenas de sapatos para algo mais confortável. Esta cidade era adorável, não havia tanto barulho e confusão como em Lisboa, era mais limpa, silenciosa e humilde. Além disso parecia bem mais interessante, pois estamos na alta da cidade a algumas ruas dos palácios académicos, portanto presumo que seja aqui que os estudantes fiquem alojados, bem como os fidalgos e burgueses que aqui habitam com esta linda vista para os montes do outro lado do Mondego.

- Lembro-me que haviam aqui os melhores cafés e clubes, e daquele lado havia um edifico de estudos e mais uns quantos clubes secretos, parece que foi ontem...

- E no entanto vão quase trinta anos.- Sorri-lhe.

- Trinta e dois, que eu casei-me logo com a tua mãe e o teu irmão teve pressa em aparecer.

Aham... como se simplesmente tivesse caído do céu?!

- Foram os melhores anos da minha vida. Os mais loucos!

Mas os homens vêm para a Universidade vadiar e tirar o lugar às mulheres, ou para estudar e aprender?

Passamos os dias a visitar os seus antigos lugares, enquanto me contava histórias de como festejava noite dentro, estudava pelas madrugadas e foi iniciado e iniciou tantos outros colegas.

- Os que usam a capa preta são doutores, os que usam o emblema da universidade no chapéu com um caldeirão são veteranos.

- E aqueles que não usam nada?

- Caloiros.

- Novatos?

- Sim, são submetidos a atividades de integração.

- Atividades de integração?  

- Pontapés, touradas, pancada, bosta, jogos...

- Isso são atividades de integração?!

Homens não têm cérebro!!

- E a Universidade não faz nada?

- Claro que não, não ocorre nas suas instalações, não é problema deles.- Sorriu.- É importante, até saudável.

Saudável?

- Aqui foi onde estudei. É a de Direito, do outro lado a de Medicina.- Apontou.

Era um edifício bonito, imponente... notava-se a sua importância e valor.

- Eu gostava de estudar aqui.- Suspirei infeliz.

- Para quê Helena? Tens um noivo rico que te ama, um pai rico e um irmão rico que te adoram... tens dinheiro. O saber não é importante.

- Para mim é.- Desprezei as suas palavras.- Podeis deixar, que se é para estudar como tu aqui e chegar a conselheiro real ara ser um batolo é o mesmo.

Virei costas e vim-me embora. Se o papá era tão inteligente e instruído então poderia seguir o caminho sozinho.

⭐👑⭐ 

- Vossas majestades.- Frei Gaspar entrou nos meus aposentos e fez uma vénia.

Eu lia à janela enquanto Maria Ana bordava qualquer coisa. Eu estava a gostar do silêncio.

- Como reitor, agradeço a vossa vinda.

- Não tendes que agradecer, é uma visita a um bom amigo, Gaspar.

- Eu gostava muito que viésseis visitar as aulas. Ver como funcionam.

- Seria interessante.- Concordei. Sempre tive a curiosidade de ter aulas aqui; como príncipe herdeiro e depois rei nunca me deixaram.

- Amanhã?

- Há aulas ao sábado?

- Algumas. Principalmente avaliações nesta altura.

- Parece que estamos combinados.- Garanti.

Nessa noite mal dormi com o entusiasmo. Será possível que não faço a menor ideia de como é uma mera sala de ensino?!

...

- Francisca, tanto tempo!- Bufei com a demora da minha irmã.

- Desculpa, estava à espera de Helena. Desapareceu.

Encarei Eduardo furioso que corou embaraçado e exibiu um sorriso atrapalhado.

- Helena juntar-se-á a nós pela hora de almoço.

- Pois bem. Já perdemos tempo mais que suficiente.- Bati a bengala no chão e os guardas abriram as portas.

⭐👑⭐

- Já só falta andar de pernas afastadas e pareces um macho.- Sorri para o espelho.

Vesti umas roupas do papá e procurei por uma capa preta comprida, que chapéus havia com fartura.

No fundo de um baú, e meio amarrotada encontrei uma capa semelhante às que vi ontem nos doutores, ou lá o que era. Não queria ser confundida com o caloiro!

Saí de mansinho e escrevi um bilhete em como iria dar uma volta e não podia acompanhar a corte à sua visita.

Respirei fundo, imensamente nervosa. Iriam esfolar-me se soubessem que uma mulher ousou entrar numa faculdade.

Os frescos no teto, os azulejos nas paredes, as colunas gregas... maravilha!

A biblioteca era realmente deficiente. Ainda bem que João decidiu recuperá-la, até a do palácio é maior.

Grupos de rapazes passavam cá e lá de folhas na mão a conversar ou até a rir. Para um sábado até estava mexido.

- Vamos, vamos! Não temos o dia todo cavalheiros!- Um professor insistiu com dois pares de rapazes que pediam para entra na sala.

Aproveitei a porta aberta e espreitei: havia um anfiteatro enorme! Havia centenas de alunos lá dentro.

- Vá, não te demores.- O senhor insistiu ao ver-me e apressei-me a entrar.

Tecnicamente tinha sido convidada.

- Sem chapéu.- Lembrou enquanto corria as escadas até ao ultimo anel. Mal via o professor.

Já sentada, naquela atmosfera barulhenta de conversas e gargalhadas, tirei o chapéu e subi a gola da capa, talvez aqui atrás não me notassem.

- Silêncio!- O professor pousou os manuais na mesa e um silêncio religioso instalou-se.- Hoje o rei vem aqui à Universidade e eu não quero passar vergonhas com vocês, portanto comportem-se minimamente.

- Nós somos comportados.- Um rapaz levou a mão ao peito de nodo claramente irónico e os outros riram com ele.

- Ousai fazer isso na frente de sua majestade e ficareis a repetir esta cadeira para o ano que vem.- O professor ameaçou.

Não acredito que João vem a esta aula... não se pode estar sozinha neste país, caramba!

Havia alunos que apontavam depressa o que o senhor ditava e explicava entusiasmado. Eu ouvia com atenção, fascinada com o tom e utilidade da aula. Imaginava o que poderia fazer com tantas mais.

- Sr. Reitor.- O professor interrompeu a aula e todos se ergueram. Apressei-me a fazer o mesmo quando Frei Gaspar entrou.

Desde quando é que o confessor do rei merecia tantos respeitos?

- Professor.- Frei Gaspar sorriu-lhe com gentileza.- Podemos interromper a aula?

- Não estávamos a dar nada de importante.- Justificou-se o senhor.

- Por aqui majestade!- O reitor afastou-se para que toda a comitiva seguida pelo rei pudesse entrar.

Ora João, Manuel e António, a rainha e Francisca, cada uma com duas damas de companhia e cinco conselheiros. Com certeza não deram por minha falta esta manhã no meio de tanta gente.

- Vossa majestade.- Todo o anfiteatro se vergou perante o rei.- É uma honra tê-lo na minha aula.- O professor cumprimentou-o orgulhoso.

- A honra é minha. Não é todos os dias que aqui entramos.- Percorreu o olhar pela sala, e por isso tentei recuar mais e levantar a gola negra.- Que aula é esta?

- Direito penal, vossa majestade.

- E os alunos têm tido bons resultados?- João indagou vendo a reação da sala. Os rapazes sorriram travessos.

- Os que se empenham sim.- O professor provocou olhando para o grande anfiteatro.- Mas sim, são alunos empenhados, que demonstram estudo e interesse pela cadeira.

- Hum... merecem então uma nova biblioteca, pelo seu desempenho e futuros trabalhos, por serem bons estudantes.

Um burburinho preencheu a sala. Até os mais preguiçosos estavam entusiasmado com a nova obra.

- E este ano existirão, excecionalmente, três bolsas de estudo para continuarem o vosso ofício, aqui ou lá fora. Além disso ouvirei os cinco melhores alunos do último ano, um deles será membro do Conselho de Estado.

- Parece uma tarefa de grande responsabilidade majestade, no entanto esta aula é do segundo ano.

- Oh, então é bom que se esforcem pela bolsa.- Sorriu.- Não pretendo ocupar mais da vossa aula, tenham um bom dia!

⭐👑⭐

O confessor contava todos os pormenores da sua escola ao meu marido. D. João parecia ainda mais entusiasmado desde que deixou aquele anfiteatro e mesmo naquela multidão, o rosto dela não me escapou.

Fiz sinal a Vivien para informar que havia um novato trajado de doutor na sala ali atrás. Os estudantes ocupar-se-iam do resto.

E eu ia finalmente viver feliz para sempre com o meu marido lindo, culto, inteligente e carinhoso.

Helena levaria uma tareia das grandes por desrespeitar as tradições académicas!

⭐👑⭐

Saí atrás de todos, porém não depois de todos saírem, ou a minha demora seria suspeita. Aprendi imenso, não o suficiente e no entanto o suficiente para ser valioso e não ter como o usar.

Voltei a colocar o chapéu mal pus os pés  fora do anfiteatro e sorri para as notas que tirei durante a aula.

Falamos sobre penas de prisão e tortura, apesar da Inquisição não querer saber; esses maníacos fazem as suas próprias leis e regras. Aposto que se soubessem que estive numa aula iriam queimar-me viva.

Ignorantes.

Percorri os corredores e desci as escadas até ao terreiro de fronte à Universidade. A comitiva não estava aqui, para estranheza minha.

- Ei!- Voltei-me zangada quando alguém me tirou o chapéu.- Devolve isso idiota!

- Sabeis com quem falais?!- Riu um deles. Na verdade riu de uma maneira tão sarcástica que me deu um arrepio, isto por ter dois colegas ao lado.

Se há algo que aprendi é que homens sozinhos são minimamente normais e em grupo só dão problemas.

- Mulheres não entram aqui! Muito menos trajadas de doutor!- Puxou-me a capa e engasguei-me.

Os três riram com a sua indelicadeza. Estava claro que não seria tratada como uma dama aqui, e nem pistola ou espada trouxe. Não se luta num templo de conhecimento.

- Que é que te deu para arriscares tanto, princesa?- Um deles, doutor pelo que entendi, ousou passar o braço sobre o meu ombro.

- Não é da tua conta, seu porco!- Empurrei-o.- Não sabem com quem falam.

- Hum... ela acha que é inteligente...- Comentaram com escárnio uns com os outros.- Entregamo-la ao inquisidores?

- Seria um desperdício.- O de posto mais alto recusou enquanto pensava em algo melhor.

- Tudo o que é mulher não é um desperdício para ti.- Resmungou o que não viu a sua ideia concretizada.

- Desrespeitaste as nossas tradições e ousaste entrar numa aula. Universidades não são sítios para mulheres.- Falou de maneira séria como se me desse uma bronca.- Por isso, dama ou não, mereceis um castigo à altura.

- Então vocês têm medo que mulheres sejam melhores que vocês nas letras e ciências?- Desdenhei.- Olhai, nessa teoria de pegar na espada e barbaridades da guerra... eu sou forçada a engolir, agora... livros? É o quê? A pena é muito pesada? A tinta muito suja?

- Cala-te, puta!- E deu-me um estalo. Um estranho deu-me um estalo enquanto os amigos me seguravam.

- Isso não foi inteligente.- Ri.- Se o meu pai ou o rei sabem o que aconteceu matam-vos e acabam de vez essas atividades de integração.

Vendaram-me e agarraram-me, empurrando-me para algum lugar que não reconheci. Não sentia nenhum cheiro diferente, apenas achava que estava na rua pois sentia uma brisa e de vez em quando o sol.

Já me doíam as pernas de estar tanto tempo em pé.

- Tenho fome!

Não ouvi resposta nem ninguém mexer-se.

- Eu disse que tenho fome!

- Se não te calas enfio-te uma coisa pela garganta abaixo que te silenciará de vez.- Ouvi rosnar a meu lado, porém não pareciam os rapazes de antes.

A fé dos homens em algo tão pequeno como o cérebro ou até a sua masculinidade era incrível. Eles sim são ridículos, não nós.

- Trá-la daí.- Esta voz eu reconheci sim.

Ouvia gritos entusiasmados e salvas de palmas ao longe, até ficarem cada vez mais perto, até ficarem a meu lado.

Que fariam comigo?!

- Ah! Ught! Hum...

Parecia que batiam em alguém. Quem era? Está muito mal? Quantos seriam em cima do pobre rapaz? Esse, que para o ano fará o mesmo aos mais novos, em vez de lhes ensinar as artes de se escapulir desta tradição bárbara, ou não fosse ela criada por homens.

- Silêncio!- Alguém bramiu e todos obedeceram.- Hoje aconteceu algo inédito e que nos ofende a todos!

O silêncio manteve-se.

- Apesar de nos sentirmos honrados com a visita do rei, isso não mascara o facto de uma mulher, sim uma mulher ter ousado participar de uma das nossas aulas, trajada de doutor!

- Isso é um insulto!

- Fora!

- Inquisição!

Que fome de fogo estes palermas têm!

- Então, aproveitando o inicio deste ano e a chegada de sua majestade, iremos castigá-la como a nenhum outro. Se acha ser igual a um homem, será castigada como um!

Quem disse que eu era igual a um homem? Eu tenho tão melhores qualidades... por exemplo, sou um pouco menos ignorante e cabeça dura.

- Ei! Ponham-me no chão!- Gritei assustada quando me senti ser erguida no ar.

Iriam atirar-me ao chão? Espancar-me? Encher-me de pó, terra e outras coisas nojentas?

Comecei a ouvi os gritos histéricos atrás de mim e nada à minha frente, apenas o sol. Um sol intenso apesar de Novembro.

O meu coração palpitava aterrado, ainda mais depressa e eléctrico que ao lado de Henry.

Onde é que estava? Que acontecia?

Tiraram-me a venda e demorei algum tempo a ambientar-me à luz, pelo menos já sentia as minhas mãos soltas também.

Estavam todos atrás de um cerco de tábuas.

- Assim que eu vos puser as mãos em cima...

- Princesa, tens de pôr as mãos em cima de outro antes.- O engraçadinho que ousou bater-me apontou para trás de mim.

Olhei ao redor e só então reparei: eu estava numa arena. Numa arena de touros, uma praça improvisada.

Dois homens abriram a porta enorme de madeira, e então um touro preto enorme saiu.

- Minha Nossa Senhora...

Que é que eu faço? Que é que faço? Que é que eu faço!

- Corre!- Alguém gritou e então comecei a andar, como se as minhas pernas não obedecessem e só depois corri.

A besta devia pesar mais de 500Kg e tinha uma mancha branca no focinho.

Deu meia volta esbaforido à praça enquanto eu tentava colocar-me por trás dele. Talvez não me visse, não visto vermelho nem nada.

- Éh!- As dezenas de homens atrás de mim gritaram e o animal voltou-se para me perseguir. Estava em pontas, bastava um toque e eu sangraria. Além disso não conseguia fugir, pois as tábuas eram altas demais para as conseguir saltar.

- Eu tenho um casamento daqui a duas semanas. Henry não pode ficar viúvo já.- Choraminguei baixinho sentindo as pernas arderem.

⭐👑⭐

Um inicio de tarde maravilhoso, é o que vos digo.

Saí por aí a cavalo e encontrei uma lavadeira que cantava sozinha para se entreter nos seus afazeres e que não se fez de rogada quanto a amar um homem. Há noites que não me divertia assim...

- A tourada é por aqui, majestade.- Frei Gaspar encaminhou-nos para a tribuna improvisada.- Os alunos encolheram os melhores entre os seus para lhe proporcionar um espétaculo à moda estudantil.

- Parece já ter começado.- Intriguei-me com um sorriso enquanto tomava o meu lugar e via um rapaz de casaca verde escura correr de um lado para o outro. Assentava-lhe muito mal o que vestia.

Mais confortável, pedi uma bebida e engasguei-me quando ouvi o marquês gritar:

- Helena, sai daí!

- Se eu conseguisse já o teria feito!- Gritou furiosa e assustada ao mesmo tempo.

 Levantei-me preocupadíssimo e tentei lembrar-me de algo. Helena estava cansada, sem armas, cavalo ou capote. Como se defenderia?!

- Tirem-na de lá!!- Ordenei para os que me ouviam. Frei Gaspar estava branco sem saber que fazer.

- Helena!- Gritei e atirei-lhe a minha pistola.

- E eu consigo apanhá-la daqui?!- Revoltou-se fora de si.

Ela estava furiosa, assustada e envergonhada. Despiu a casaca e atou-a à cintura, apertado o laço que mantinha o cabeço preso. 

Ela tinha uma ideia, e isso era perigoso. Muito perigoso!

Os estudantes começaram a provocar o toiro e aproveitando a distração alcançou a minha arma caída na areia.

- Preciso de uma espada!- Gritou para nós.

- Helena...

- Agora!

Desembainhei a minha espada e atirei-a para uns passos de distância, tendo a certeza que não lhe acertaria.

Porque é que ainda ninguém a tirou de lá?

Que loucura faria?

⭐👑⭐

Quão grossa é a pele de um touro?

Terei força e coragem suficiente para o matar? Um de nós acabá assim. Ou eu ou ele, e ao meu casamento não faltarei!

Vá lá... Deus me ajude, que nunca pensei em fazer isto na minha vida. Eu nem gosto de touradas para acabar assim!

Quando o touro se voltou ao meio daquela gritaria animada ao redor, notou-me e correu na minha direção. A tremer, disparei a pistola, mas o animal não morreu, urrou enquanto o sangue escorria pelo buraco que a bala fez.

Que nojo! Que cruel!

A minha pontaria não é perfeita, quando estou nervosa muito menos.

- Ei...- Murmurei, não querendo terminar assim com a vida dele. Eu sei que como carne, mas isso não significa que seja adepta deste espetáculo de tortura.

- Ei!- Gritei mais alto e tentei firmar as mãos. Exibia a casaca do papá ao meio das gargalhadas e berros, na outra mão a espada que só tinha de furar e acabar com isto de uma vez.

Estava tão nervosa que podia desmaiar com um esgotamento a qualquer altura.

- Helena! Helena vem aqui!- Ouvi o papá gritar esbaforido nas tábuas.- Eu subo-te!

Suspirei enquanto via o touro contorcer-se com as dores. Sim, alguém podia ocupar-se dele, não quero ser eu a ser a causa da sua morte.

- Helena, tu não consegues fazer isso! Corre até aqui! É perigoso!

Não consigo?!

Quando me dizem isso há um gatilho que dispara dentro de mim e nada me para do fazer! Palavra errada papá: morta ou não, eu vou tentar fazê-lo!

- Toiro!- Gritei e afastei as madeixas de cabelo que caíam no meu rosto.

Correu esbaforido contra mim e espetei-lhe a espada desviando-me no ultimo minuto. Foi um corte superficial.

Apenas que causei mais dor em vez do fim dela. Os urros sofridos quebraram algo em mim. Desta vez, eu teria de terminar o seu sofrimento.

- Lamento.- Suspirei quando trotou coxo direito a mim. Num salto pus toda a minha força na ponta da espada que trespassava o seu pescoço.

Não se voltou a mexer.

Uns curtos minutos depois estava morto.

Sentei-me ali no chão. Temendo que se voltasse a erguer para se vingar. Estávamos os dois na mesma situação... Oras, se ele tivesse ficado quieto eu também ficaria. 

O meu silêncio mórbido e o silêncio doloroso da multidão, que tinha acabado de provar o pior dos venenos, era total. 

Era escusado pedir desculpa a um animal morto; primeiro não ouviria nem entenderia, e segundo não vale a pena, eu tive escolha, eu podia ter saltado com a ajuda do papá.

- Helena...- Senti a voz do papá afagar-me as costas e suspirei, tendo a mínima noção de segurança.

- Quem foram os responsáveis?!- João ergueu-se e bramiu lá de cima, na tribuna.

O silêncio não mudou.

Afastei-me da poça de sangue a meu lado e limpei o excesso de sangue da espada à casaca, antes verde, do papá.

- Quantos de vocês foram submetidos a isto?- Gritei bem alto no meio da arena para que todos ouvissem.- Eu fiz uma pergunta!

Negaram como eu previa. Faziam meras largadas, soltavam uma bezerrita e improvisavam umas pegas. Depois soltavam-nas no campo outra vez. Eu tive de enfrentar sozinha um touro de centenas de quilos.

- Enquanto não entenderem que somos iguais, não têm futuro. Chegará o dia em que mulheres aprenderão a vosso lado, se esforçarão e terão as mesmas oportunidades. Enquanto não entenderem isso, não são homens de verdade!

Os idiotas riram-se.

- Na verdade, não é preciso algo tão dificil para vós.- Foi a minha vez de rir com escárnio.- Basta que os três imbecis que me meteram aqui saltem para a arena, ou de repente ficaram intimidados por uma mulher?

Demorou um pouco até que os três saltassem cá para dentro, fingindo-se orgulhosos e irredutíveis.

- Peço perdão pelos meus...

- Toma lá o teu perdão!- Soquei com força o que me tinha batido. A minha mão doeu, mas o seu olho ficaria negro e com alguma sorte caía!

Arranquei o chapéu de outro, atirei-o ao chão e esfreguei-o com ódio na areia, frente a todos aqueles ignorantes:

- ISTO É O QUE EU PENSO DAS VOSSAS TRADIÇÕES PALERMAS!

Esfreguei com mais força e ódio na areia antes de virar costas e saltar as tábuas com a ajuda do papá.

O meu lábio, as minhas mãos e os meus joelhos tremiam com a quebra de adrenalina, ou o tanto de nervosa que estava.

- Estiveste muito bem.- João, de semblante carregado entregou a pistola e a espada que lhe estendi a um empregado para que as limpasse devidamente.

- Eu quero muito um chá.- Suspirei.

- Homens bebem vinho.- Riu.

- Atreve-te a rir assim outra vez e o próximo a ir para a arena és tu.- Suspirei.- Eu ia morrendo, meu Deus...

- Helena, sem dúvidas que tens uma estrelinha a olhar por ti.- O papá sorriu, ainda branco de susto.

- Eu não podia faltar ao meu casamento.- Lembrei séria.- Não é um trio de idiotas que me impediria.

João suspirou como se uma tonelada lhe tivesse saltado das costas.

- Agora se me dão licença, eu preciso de me deitar...- Dei uns passos estafada e apenas ouvi gritar o meu nome antes de adormecer.

⭐👑⭐

Olá, princesas!

Capitulo longo eu sei, mas espero que não tenha sido tedioso.

Que têm feito na quarentena? Têm-se mantido ativos?

Bom, de qualquer modo, espero que não se tenham sentido ofendidas ou algo do género com a cena da tourada de Helena, espero que me tenha feito clara quando ao assunto. Era algo cultural da época e dá para reparar que Helena não gostou nem um pouco. É ridículo eu estar a dizer-vos isso depois da nossa heroína ter morto mais de 5 personagens e ninguém comentar nada, só que nunca se sabe.

Espero que se consigam manter positivos em casa e porque não começar um novo livro, ou o primeiro?

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