05 - Batata frita.
[27 de Abril de 1985]
Celine havia dormido no quarto, já Dandara havia encontrado um lugar confortável no sofá da sala. Tinha pensado em sair dali na noite anterior, mas não tinha lugar para ir, então se contentou em não dormir no mesmo cômodo que Celine.
Acordou pela manhã, sem muito ânimo de se levantar. O teto acima dela foi seu melhor amigo por um tempo, até tomar coragem de sair dali e procurar por algo na geladeira.
Não havia muito, mas Dandara se satisfez em comer uma maçã e beber um suco gelado. Prendeu seus cachos num coque rápido e ficou encarando a bancada sem saber ao certo o que fazer, bebericando de seu suco. Geralmente quando se sentia assim na atualidade, ela pegava seu celular e ouvia músicas, mas desde que Celine simplesmente quebrou seu aparelho e ela não sabia como mexer na vitrola que a loira usava, ouvir músicas deixou de ser uma opção.
Então deu-se conta da televisão antiga quadrada e pequena sobre um pequeno armário de madeira. A ligou e sentou-se no sofá. A qualidade não se comparava a da que tinha em sua casa, mas aquilo não importava para Dandara, apenas o fato de poder rir um pouco com Os Trapalhões já era motivo de comemoração.
Celine apareceu um pouco depois, arrumada demais para passar o dia em casa. Estava com um vestido branco que ia até os joelhos e seus cabelos loiros estavam amarrados perfeitamente no lugar.
— Eu irei trabalhar. – Celine avisou. Era a primeira palavra que proferia desde o desentendimento do dia anterior.
— E você trabalha? Do quê? – Dandara indagou.
— De garçonete.
Dandara soltou uma curta risada, não uma risada de felicidade, talvez mais para uma risada de surpresa ou talvez ironia.
— O que foi?
— Sei lá, não achei que você fosse garçonete, não é sua cara.
— Eu preciso pagar minhas pesquisas de alguma forma, certo? – Celine respondeu guardando suas coisas em sua bolsa que carregava no ombro. – Enfim, sei que está descontente comigo, eu só queria te avisar. Já estou indo.
— Eu vou também. – Dandara afirmou desligando a televisão e se levantando do sofá. Por mais que conhecesse Dandara o suficiente para saber que ações como aquela eram típicas dela, Celine havia se surpreendido com a afirmação.
— Eu não entendi.
— Eu não tenho absolutamente nada para fazer, e sair um pouco, mesmo que tendo você como companhia, é a minha melhor opção.
Celine respirou fundo e apenas assentiu, saindo da casa acompanhada da garota.
***
Vermelho e turquesa eram as cores predominantes da lanchonete que Celine trabalhava, sendo apresentadas nos assentos e paredes, respectivamente.
O local todo era bonito e aconchegante. Celine entrou em uma área reservada para funcionários e Dandara apenas a seguiu, atenta e admirada aos pequenos detalhes. A jovem cientista – e garçonete – abriu um armário que lembrava Dandara dos armários de escolas americanas. Ela tirou de lá um avental e uma caderneta, mas o que mais chamou a atenção da garota futurista foi o par de patins brancos escondidos no fundo do armário.
— São seus? – Dandara apontou para eles.
— Sim, costumávamos atender as pessoas usando patins, mas logo isso saiu de moda e voltamos ao comum. Ainda ando com eles de vez em quando.
Celine fechou o armário e vestiu seu avental, saiu daquela área e caminhou-se para detrás do balcão. Já Dandara sentou-se em um dos assentos vermelhos enquanto lia o cardápio.
— Celine, uma cliente! – Beatrice, gerente do local avisou com seu tom de voz fino e mesquinho de superioridade que gostava de usar. Celine seguiu o olhar da chefe até ver Dandara sentada no canto, com o cardápio muito próximo de seu rosto. Era uma míope de carteirinha, mas teimosa o suficiente para usar seus óculos com uma frequência baixíssima.
— Dandara, – Celine se aproximou. – Minha chefe acha que você é uma cliente e...
— Eu quero uma Coca-Cola. – Dandara a interrompeu. – Por conta da casa. – Concluiu com um sorriso.
Celine reclamaria, mas sabia que a garota em sua frente não possuía uma bufunfa sequer, então apenas assentiu fazendo uma nota mental de descontar o preço em seu salário depois.
— Aqui está. – Ela a entregou o vidro de um litro de Coca-Cola. – Deseja mais alguma coisa, senhorita? – Celine perguntou irônica.
— Não, isso está bom, obrigada.
A loira revirou os olhos e girou o calcanhar, voltando para o balcão para começar a trabalhar de verdade.
***
Assim como na ida, o trajeto no carro foi coberto por um silêncio desconfortável. Ambas estavam se sentindo frustradas por seus próprios motivos e cansadas demais.
O chevette vermelho foi parado e Dandara estranhou o local onde estavam. Celine saiu do carro e sem entender muito, Dandara fez o mesmo.
— Onde estamos?
— Na minha casa. – Celine respondeu buscando as chaves em sua bolsa.
— Mas, então que lugar é aquele que estávamos? – Ela perguntou confusa.
— Lá é a minha casa de praia. Eu moro mesmo é nesse apartamento. – Celine contou abrindo o portão e entrando.
As duas subiram uma porção de escadas até finalmente entrarem no não tão grande apartamento de Celine. Assim que abriram a porta, foram recebidas com chamegos pelo gato malhado da garota.
Dandara abriu um sorriso ao ver o bichano, sempre havia gostado de animais e não era um segredo de que ela preferia eles do que os humanos. Pegou o gatinho no colo o dando carinho.
— Qual o nome dele?
— Beatles.
Dandara sorriu.
— Eu posso te levar para casa da praia se quiser. Talvez prefira ficar sozinha.
A garota futurista ficou calada por um tempo. Caminhou até a pequena cozinha do apartamento e abriu a geladeira vermelha pequena e retrô.
— Quer saber, aqui tem mais comida que lá, então prefiro ficar aqui por hoje.
Celine segurou o sorriso e pegou a ração de Beatles, colocando na tigela. O gatinho assim que viu, pulou do colo de Dandara e seguiu rumo a comida.
— Logo pela manhã, voltamos para a casa de praia, tudo bem? – Celine perguntou e Dandara assentiu comendo um queijo com goiabada que havia encontrado na geladeira.
— Você fica mais aqui ou lá? – Dandara perguntou curiosa.
— Eu acabo sempre nos dois. Lá tem o laboratório então sempre que estou fazendo algo vou para lá, mas todos os dias eu passo aqui, para alimentar meu gato e organizar minhas coisas.
— Não quero ser intrometida, mas com o dinheiro que você ganha da lanchonete você consegue manter as duas casas e suas invenções? – Dandara perguntou de boca cheia.
— A casa da praia é da minha família, então eu a pago com o dinheiro que meus pais me deram. E em relação as minhas invenções eu sempre tenho ajuda do ferro velho e de algumas pessoas.
— Entendi.
— Bom... – Celine desamarrou seus cabelos. – Deve estar passando um filme nesse horário. – Ela contou enquanto caminhava em direção a sala.
Dandara se encantou pela forma com que aquele apartamento era totalmente diferente da casa. A casa tinha um estilo praiano, com muitas janelas, iluminação e cores quentes, já aquele apartamento era escuro, composto por posters e quadros de bandas de rock por todo o local, tinha um clima harmonioso e frio.
Celine ligou o aparelho de tv e estava certa, um filme passava naquele momento. Ela se sentou no sofá e Dandara fez o mesmo, sentando-se numa distância considerável da menina loira.
O frio entrava pelas gretas das janelas, e Celine apanhou um cobertor que estava por ali. As duas se cobriram, mas permaneceram em seus lugares.
O filme que passava não importava muito, visto que nenhuma delas parecia estar prestando atenção. Estavam perdidas em seus próprios devaneios e pensamentos que mal sobrava tempo para assistirem ao filme.
— Posso te fazer uma pergunta? – Dandara começou virando o rosto para ver Celine.
— Vai fazer de qualquer maneira.
— Por que eu?
A pergunta de Dandara havia saído aberta para interpretações. Estava ela falando de quê exatamente? Por que ela foi trazida aos anos oitenta? Por que Celine havia conhecido ela? Por que Celine havia se apaixonado por ela? Celine não sabia ao certo qual desses questionamentos a garota fazia, e talvez nem Dandara soubesse de fato, mas mesmo assim a loira a respondeu.
— Chame do que preferir, tempo, destino, universo, eu chamo de batata frita.
🎠🎠🎠
Oie gente linda. Como vcs estão?? O que acharam do capítulo?
Esse capítulo atrasou um pouquinho devido a minha falta de memória KSKSK mas saiu!
Não se esqueçam de comentar para eu interagir com vocês e saber o que estão achando.
Um beijão e nos vemos na próxima!
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