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Mudanças

— Você poderia ao menos facilitar para mim, não é? — resmunguei quando a encontrei na frente da sua casa na manhã do sábado da semana seguinte.

Seu vestido bege mal cobria suas coxas e eu sabia que qualquer vento levantaria o tecido leve.

Me recostei ao carro e puxei-a pela cintura, quase desequilibrando-me em um salto agulha, abraçando seu corpo pequeno contra o meu, protetora. Obviamente o movimento fez seu vestido subir um pouco e ela riu enquanto tentava puxar o tecido para baixo.

— Para de ser tarada, Ludmilla— ela reclamou embora ainda risse. — Até parece que você nunca viu o que tem debaixo desse vestido.

— Merda, Bru! Agora eu vou ficar te imaginando nua pelo resto do dia.

Bru riu com um som ainda mais gosto, se desvencilhando dos meus braços, e entrou correndo no carro antes que eu conseguisse lhe alcançar de novo. Respirei fundo, levando as mãos aos meus cabelos que pareciam seguir o vento para disfarçar a tensão que havia no momento e acenei com a cabeça para duas senhoras que passavam por ali, me olhando com o semblante levemente ultrajado.

Ótimo! Agora ficaria conhecida pela vizinhança de Bru como a namorada depravada que fica exalando tesão no meio da rua apenas por ver uma adolescente com um vestido curto demais.

Dei a volta ao carro, sentando ao volante em seguida.

— Pronta para visitar meu futuro lar? — perguntei animada, colocando meu bêbe em movimento.

O sorriso imediatamente deixou seu rosto e Bru apenas assentiu enquanto ajustava o cinto de segurança, parecendo evitar meu olhar de propósito. Levei uma mão à sua coxa e apertei aquele ponto, atraindo sua atenção.

— O que foi, pequena?

— Eu só... Não gosto de você ter que sair de casa por minha causa — ela murmurou, colocando a mão sobre a minha, deslizando seus dedos sobre a minha pele numa carícia despretensiosa.

— Não é por sua causa. Estou fazendo isso porque não posso mais ficar naquela casa aturando o comportamento dos meus filhos. Se tem alguém culpado por isso, são eles.

— Mas se não fosse por mim–

— Se não fosse por você, meu amor, eu nunca teria descoberto o que é amar assim tão intensamente — falei com firmeza, vendo-a corar de leve, mas um sorriso voltou a aparecer nos seus lábios. — Nunca esqueça disso, ok? É graças a você que eu estou conseguindo encarar toda a minha vida com tanta facilidade. Se não fosse por você, eu provavelmente estaria a ponto de me divorciar agora e sendo uma mulher infeliz, indo morar no apartamento dos meus pais. As coisas não teriam mudado muito. A diferença agora é que eu tenho alguém do meu lado. Alguém que eu amo tanto que torna todos os meus problemas insignificantes.

Seus dedos entrelaçaram nos meus enquanto seu rosto se tingia de um lindo tom vermelho. Conhecia aquela sua forma de corar. Não era Bru com vergonha de mim. Ela apenas não se acostumava com o fato de que eu a amava tanto e conseguia demonstrar esse amor com facilidade. Podia contar nos dedos das mãos a quantidade de vezes que Bru tinha falado com todas as letras que me amava. É claro que ela sempre dava um jeito de demonstrar isso de outras formas, mas era sempre bom ouvir.

Estacionei o carro no subsolo do edifício localizado na Quinta Avenida e andamos lado a lado de mãos dadas como casal de namoradas, que querem deixar totalmente explícito, o sentimento de ambas até o elevador que nos levaria ao vigésimo terceiro andar.

— Não se assuste com o apartamento, ok? — alertei. — Minha mãe tem um gosto um tanto... excêntrico para decoração. É tudo um tanto exagerado demais.

— Excêntrico como? Do tipo de tapetes de zebra ou tecidos de leopardos? — Bru perguntou rindo.

— Do tipo com tetos decorados e camas com dossel.

— Acho bonito cama com dossel — ela retrucou. — É tão lindo. Lembra os contos de fadas que assistia.

— Como as camas das princesas?

— Uhum.

— Se você quiser — comecei num murmúrio, me aproximando dela até que seu corpo estivesse preso entre o meu e a parede do elevador, falando contra seu ouvido —, eu deixo a cama de princesa para quando você vier morar comigo.

— Não vem com esse papo de novo, Ludmilla— Bru reclamou embora agora falasse num tom baixo, seu corpo estremecendo quando deslizei minha mão pelo seu corpo, passando propositalmente pelos seus seios.

Eu vinha pedindo para Bru vir morar comigo desde que decidi sair de casa. Já queria que isso acontecesse quando ainda estava na casa, torcendo para ela aceitar morar sob o mesmo teto que o meu, mas a resposta era sempre a mesma: "ainda é muito cedo." Eu só não entendia o motivo de precisarmos esperar quando aquilo aconteceria mais cedo ou mais tarde. Ninguém podia me culpar por querer que fosse mais cedo, certo?

— Não custa tentar — falei ainda contra o seu ouvido, beijando seu pescoço em seguida.

— Minha mãe me mataria se eu sequer cogitasse a hipótese de sair de casa aos dezesseis anos.

— Dentro de duas semanas você faz dezessete. Alguma chance depois disso? — perguntei, encarando-a esperançosamente.

— Me pergunta de novo quando eu fizer vinte e um, ok?

Um ruído frustrado brotou da minha garganta e eu me deixei ser levada para fora do elevador por uma Bru que ria divertida.

Mostrei o apartamento para ela sem pressa, contando algumas histórias bobas que lembrava da época que morara ali, como o quanto odiava aquelas quantidades de quadro espalhados e sem sentido na sala, e como já tentara jogá-lo na lareira um par de vezes. Ou a quantidade de jogos que já presenciara na sala ao lado, chegando até a jogar algumas vezes e ganhar um bom dinheiro dos amigos do meu pai. A cozinha tinha sido reformada recentemente, mas eu ainda lembrei de lhe contar do dia que ficara sozinha quando tinha dez anos e tentara cozinhar, resultando numa panela explodindo, deixando uma mancha enorme no teto.

A biblioteca era uma das minhas partes favoritas naquele apartamento e a única coisa que eu mudaria nele seria os quadros.

— Minha mãe nunca teve um gosto muito bom para comprar quadros. Ela sempre foi mais de comprar qualquer coisa para ajudar algum artista que podia ter talento.

— Gosto é muito relativo. Sei que tem pessoas que achariam isso bonito.

— Mas não você — concluí, vendo-a franzir o cenho numa careta. — E esse é o meu quarto — anunciei ao entrar num dos últimos cômodos que faltava lhe mostrar, depois de passar pelo quarto e banheiro dos meus pais.

— Esse parece mais com você — Bru comentou, entrando mais no quarto. Um sorriso surgiu nos seus lábios quando ela viu um porta retrato com minha foto da formatura da escola, há pouco menos de vinte anos. — Imagina se nós tivéssemos nos conhecido aqui.

— Gosto das coisas como estão — retruquei, me aproximando mais até envolver sua cintura com um braço, levando a outra mão para a sua nuca. — Gosto de você ser a minha pequena.

Almoçamos ali mesmo no apartamento, depois que eu pedi comida pelo delivery de um restaurante que ficava ao final da Quinta Avenida, já que a despensa ainda não estava abastecida. Na verdade, eu só poderia me mudar de fato na semana que vem, provavelmente sexta ou sábado, depois de fazer algumas mudanças que gostaria. Meus pais não tinham nenhum plano próximo de vir à Manhattan, então ficaria ali ao menos pelos dois meses seguintes. Aqueles quadros da sala, por exemplo, ficariam num depósito enquanto isso. Eu ficaria no quarto deles também, por ser mais espaçoso e confortável, e precisava trocar o carpete que estava um tanto gasto e manchado pelo tempo. Além de trocar as cortinas do apartamento todo pelo mesmo motivo. Minha mãe só faltou chorar de emoção quando dei essa ideia, implorando para que eu colocasse algo mais leve no lugar. A escolha das cortinas do apartamento tinha sido motivo de briga com o meu pai, porque ele queria algo que bloqueasse totalmente a vista da cidade e ainda impedisse a luz de entrar. Minha mãe odiou a escolha, mas não falou nada, porque ele também não gostava dos seus quadros.

Ao começo da noite, deixei Bru em casa novamente, voltando para a minha para começar a separar algumas coisas que levaria para o apartamento. É claro que não levaria tudo agora, porque não tinha muito espaço para coisas novas, mas deixaria ao menos uma boa parte já organizada para levar quando tivesse um lugar definitivo para ficar.

À noite mesmo separei algumas coisas do meu quarto – portas retratos, álbuns de fotos, além de alguns CDs e DVDs que eu gostaria de levar –, deixando para colocar as roupas nas malas quando chegasse mais perto do dia de ir embora.

No dia seguinte, me ocupei no meu escritório, começando a encaixotar meus livros e documentos. Estava ainda na metade, com seis caixas já cheias, lacradas e devidamente identificadas, quando alguém bateu à porta. Estava sentada no chão confortável separando alguns documentos antigos e sem importância que iam para o lixo e não me dei ao trabalho de levantar quando Renatinho e Marcos entraram.

Os dois olharam ao redor para o escritório que agora começava a ficar vazio, mas eu mal reparei no olhar que eles trocaram, já voltando ao que estava fazendo.

— Mãe, nós... podemos conversar? — Marcos perguntou, fechando a porta atrás de si.

— Claro — concordei olhando rapidamente para os dois por sobre o ombro, mas logo voltei a atenção para os documentos em minhas mãos. — Algum problema?

Os dois se aproximaram mais, sentando no chão perto de onde eu estava e por um instante não falaram nada, ficando apenas observando enquanto eu separava os papeis que iam para o lixo, dos papeis que iam para a caixa.

— A senhora vai mesmo embora? — Renatinho perguntou num tom baixo.

— Achei que já tinha deixado isso claro.

— Por causa dela?

Respirei fundo uma, duas, três... antes de responder. Não estava com a mínima vontade de discutir com os meus filhos novamente.

— Por minha causa, Renatinho— falei. — É melhor eu ir embora antes que essas brigas cheguem num ponto sem volta, porque a última coisa que eu quero é perder vocês.

— Nós não queremos que a senhora vá.

Me voltei ao ouvir Marcos falando aquilo. Logo ele que tinha sido o que mais me criticara desde o começo.

— Vocês não entendem, não é? Vocês não estão magoando apenas a mim com esse comportamento, mas a Bru também. A mulher que eu amo. — Soltei os papéis no chão, respirando fundo mais uma vez enquanto levava uma mão aos cabelos os prendendo, sentido novamente um pouco sufocante. — Não importa o quanto vocês nos critiquem sobre a nossa diferença de idade, nada vai mudar a forma como me sinto com ela. E eu cansei de continuar brigando com vocês por causa disso.

— Nós não vamos mais brigar — Renatinho se apressou a falar.

— Claro que vão, filho. Você pode falar isso agora, mas eu sei que nenhum dos dois aprovam meu relacionamento e isso não muda de uma hora para outra.

— Mas nós vamos mudar! Nós prometemos isso, mãe. Por favor, não vai embora.

— Eu ir embora não vai afetar nada entre nós — assegurei olhando para os dois. — Apenas não vou estar aqui o tempo todo. Mas nós vamos continuar nos vendo. Se vocês quiserem, podemos jantar juntos alguns dias e nos ver nos finais de semana. Mas só se vocês quiserem e aceitarem o fato de que Bru estará comigo em alguns desses encontros.

— Se a senhora quiser, ela pode até vir morar aqui — Marcos falou rápido, seu tom nervoso me fazendo franzir o cenho. — Só não vai embora, mãe. Nós nunca quisemos que as coisas chegassem a esse ponto.

— Não? Tem certeza disso, Marcos? — perguntei com a ironia evidente na minha voz. — Então quando você falou que eu estava no meio de uma crise de meia idade por me envolver com alguém como Bru, ou quando os dois a chamaram inúmeras vezes de pirralha interesseira, isso foi totalmente sem intenção de causar algum desconforto para mim ou para ela? Ou quando você, Marcos, ligou para Julia e falou aquelas coisas para ela, dizendo que ia apenas esperar as coisas desenrolarem para me ver quebrando a cara, também não era para me magoar, certo? Tudo isso foi apenas uma brincadeira então?

Marcos baixou o olhar, evitando o meu, enquanto Renatinho continuou me encarando com a expressão culpada.

— Me desculpe por isso, mãe. Eu não deveria ter ligado para a mamãe.

— Não, Marcos, você não deveria, mas ainda assim o fez.

— Nós só... ficamos surpresos — Renatinho murmurou. — Nunca esperávamos que a senhora pudesse se interessar por alguém como Brunna.

— Você chama a sua reação de "ficar surpreso"? Porque para mim, ficar surpreso com algo é não conseguir reagir, e não me atacar e a Bru como vocês fizeram.

— Eu... sinto muito — Marcos pediu, baixando o olhar novamente.

— Eu também, mãe. De verdade. Sinto muito pelo que fiz e falei. Foi errado.

— Mas nós prometemos que não vamos fazer mais isso. Vamos pedir desculpas a Brunna também — Renatinho falou, recebendo o apoio de Marcos com um assentir de cabeça. — No fundo nós sabíamos que ela não fez nada disso de propósito. Brunna nunca foi do tipo interesseira e só falamos aquilo porque estávamos com raiva, eu acho.

— Ter raiva não te dá o direito de machucar as pessoas, Marcos. Nem a você, Renatinho. — Respirei fundo mais uma vez, fechando os olhos por um instante antes de voltar a falar. — Sim, vocês dois devem desculpas a Bru e eu agradeço por fazerem isso. Mas eu ainda vou embora.

— Mas mãe...

— Não dá para mim, Marcos. Vocês não podem esperar mesmo que eu acredite que vocês mudaram de comportamento assim de um hora para outra. Até uma semana atrás os dois falaram mal de Bru na minha frente. Humilharam não só a mim, mas a ela também.

— Foi mais ou menos naquele dia que começamos a perceber o quanto estávamos errando, mãe— Marcos falou.

— Era o seu aniversário e nós nem mesmo te demos os parabéns, só porque estávamos com raiva. E ainda estragamos o seu dia com o que falamos.

— É. Nós sentimos muito por isso. Acho que, como a senhora tentou nos castigar com o carro e o dinheiro, nós estávamos tentando fazer a sua cabeça mudar e largar Brunna. Mas não percebemos que estávamos apenas ferrando tudo para todo mundo. Principalmente para a senhora,mãe. Nunca tivemos a intenção de te afastar de nós.

— Muito menos te fazer ir embora da sua própria casa por conta do nosso comportamento infantil.

— Agora vocês perceberam o quanto estavam sendo infantis? — perguntei com ironia, arqueando uma sobrancelha.

— Nós já sabíamos disso — Renatinho respondeu com uma pequena careta. — Só achamos que era a coisa certa a fazer.

— Mas agora vimos que não era. Só fizemos merda.

— E pedimos desculpas por isso. Por tudo. Só não vai embora. Nós prometemos que vamos nos comportar melhor daqui para frente e vamos falar com Brunna.

— É,mãe. Por favor, não vai embora. A senhora não precisa se mudar para ir morar com Brunna. Ela pode vir para cá.

— Vocês acham que eu estou saindo de casa para ir morar com ela? — perguntei de imediato, franzindo o cenho. Marcos lançou um olhar para Renatinho que apenas assentiu. — Eu não vou morar com Bru. Estou indo para a casa dos seus avós sozinha e depois vou para um apartamento. Sozinha. Eu disse que não estava fazendo isso por ela, mas por mim.

Um silêncio se seguiu em que Marcos e Renatinho trocaram olhares, aqueles que eu nunca entendia o significado ou que tipo de conversa eles tinham nesses momentos.

— Isso não muda nada, mãe— Renatinho falou por fim. — Nós ainda sentimos muito por tudo que causamos e vamos pedir desculpas a Brunna.

— E também prometemos que vamos agir como a senhora merece, com respeito — Marcos completou.

— Mas só se eu ficar em casa — deduzi.

— Independente da sua decisão — Renatinho retrucou firme.

É claro que eu queria acreditar naquilo, mas ainda era tudo súbito demais para que eu aceitasse aquele pedido assim de uma hora para outra. Dessa forma, falei apenas que ia pensar e ver o comportamento deles ao decorrer da semana. Dependendo de como as coisas andassem, eu ficaria ou não.

Mas é claro que isso trouxe um pouco de esperança para aquela situação que não parecia mais ter solução. Uma esperança que eu fiquei feliz em acolher.

E qual não foi a minha surpresa ao descobrir naquele mesmo dia, que meus filhos estavam mesmo falando a verdade quanto a pedir desculpas a Bru.

— Eles apareceram aqui em casa. Acabaram de sair, na verdade — Bru falou com a voz empolgada. — Eu nem mesmo sabia que eles tinham meu endereço. Você deu para eles amor?

— Não. Eu também não sabia que eles iriam aí hoje.

— Bem, mas eles vieram.

Bru tinha ligado para mim falando tão rápido que não consegui entender tudo que ela dizia. Depois de pedir para que ela respirasse fundo e repetisse, foi que ela falou, calmamente agora, que Marcos e Renatinho tinham estado na sua casa pela última hora, não apenas pedindo desculpas, como tentando consertar a amizade dos três.

— E você acreditou no que eles falaram? — perguntei desconfiada.

— No começo não. Quer dizer, eu queria acreditar, mas estava com o pé atrás com eles depois de tudo. — Ouvi um suspiro seu do outro lado da linha e me recostei na poltrona do meu escritório quase vazio agora.

Mesmo falando que ia pensar a respeito sobre a minha mudança, não tinha parado de encaixotar minhas coisas.

— Mas no fim você acreditou.

— Você também teria acreditado se ouvisse os que eles falaram. Eles pediram desculpas, amor. E eu acho que já conheço aqueles dois o suficiente para saber quando estão mentindo. Além do mais, eles reconheceram que estavam fazendo tudo aquilo por ciúmes e para chamar a sua atenção.

— Eles falaram isso? — perguntei surpresa.

— Sim. Achavam que, fazendo isso, iria nos separar e assim você ficaria só para eles. Eu acho que consigo entender um pouco esse sentimento, sabe? Afinal, eu também a queria só para mim quando você ainda estava casada.

— A diferença é que você não traçou nenhum plano para conseguir isso.

— Não, mas se for contar que você só resolveu se divorciar depois que ficamos separadas, acho que posso até dizer que fiz algo.

— Fez sim. Me deu um susto absurdo por me fazer achar que tinha te perdido para sempre.

Era segunda feira, cinco de setembro. Aquele dia sem dúvida ficaria na minha mente por muito tempo, não apenas porque era o primeiro dia de aula do novo ano escolar. Mas também porque foi naquele dia que nós fizemos a aparição mais pública possível como oficialmente namoradas.

Eu tinha feito questão de levar Bru para a escola naquela manhã.

Não vou dizer que foi fácil, porque não foi. De início, quando saíra do carro com Bru, ninguém fez nada mais que olhar duas vezes. Quem me conhecia, sabia que Bru não era minha filha e franziam o cenho ao me ver com ela. É claro que alguns já sabiam do nosso envolvimento e ficaram cochichando entre si. Mas no instante em que a puxei para um beijo de despedida, quase pude perceber o silêncio tomando conta do estacionamento da escola.

O silêncio, é claro, durou apenas poucos segundos, antes que novos cochichos começassem, mais espalhados e menos discretos dessa vez.

Eu conhecia ao menos metade dos pais dos alunos daquela escola. A maior parte deles faziam parte do mesmo círculo social que eu e esporadicamente nos encontrávamos em festas ou até mesmo em reuniões escolares. E muitos deles estavam ali, trazendo seus filhos para o primeiro dia de aula, mesmo os próprios filhos odiando esse gesto "paternais".

Mas eu entendia o porquê deles fazerem aquilo. A coluna social de alguns dos principais jornais da cidade sempre enviavam alguns fotógrafos e jornalistas para cobrir o primeiro dia de aula dos alunos de uma das escolas mais ilustres do país. E é claro que os pais não perdiam a oportunidade de posar de família perfeita para a imprensa sempre que tinham oportunidade.

Numa estranha inversão de papéis, Marcos era quem estava assumindo essa postura de mostrar que estava tudo bem entre nós. Enquanto eu me despedia de Bru, ele se manteve ao nosso lado sorrindo e até mesmo cutucou meu ombro murmurando um "procurem um quarto" "isso é tão coisa de coroa" antes de puxar Bru dos meus braços.

Não posso dizer que nosso relacionamento estava perfeito – o meu com meus filhos, eu digo –, mas as coisas estava se encaminhando nessa direção. Tanto Marcos quanto Renatinho estavam se esforçando para agir naturalmente quanto ao meu relacionamento. No começo é claro que os comentários pareciam um pouco forçados, mas com o passar dos dias, eles pareciam ter aceitado de fato o meu relacionamento com Bru. No dia anterior mesmo, enquanto almoçava com os três na minha casa – sim, eu tinha desistido da mudança –, Renatinho sugerira fazer a festa de aniversário de Bru ali mesmo, convidando os amigos da escola e quem mais nós duas quiséssemos.

Bru obviamente ficou constrangida com aquela oferta, nunca mudando seu jeito tímido que corava ao mínimo agrado, mas no fim aceitou, depois que eu insisti um pouco. Fazer aquela festa ali seria perfeito para nós duas. E para meus filhos também, que continuavam provando a cada dia que podiam lidar com aquela situação atípica.

Abri um sorriso enquanto observava Marcos se afastando com Bru, passando uma mão sobre seus ombros pequenos numa nítida postura de proteção.

Tinha sido algo que eu observara nos últimos dias, principalmente quando saímos para jantar certa noite, os quatro juntos, e um casal na mesa ao lado soltou um comentário afiado e desprezível sobre eu estar com Bru. Mais especificamente sobre essas "menininhas interesseiras que circulavam por aí". Não sei se por eles terem feito esse mesmo comentário um dia, mas ao ouvirem isso, Marcos e Renatinho imediatamente se voltaram para o casal e os mandaram cuidar da vida deles ao invés de se meterem no que não lhes dizia respeito. Depois disso, passaram o resto da noite tentando animar Bru com piadas ou apenas desviando sua mente daquele assunto ao ver que ela ficara abalada com o comentário.

E Marcos sabia bem que aquilo poderia acontecer novamente na escola. Muitas pessoas sabiam que Bru era bolsista e acabariam chegando à mesma errônea conclusão.

Na noite anterior eu tinha conversado com ele sobre isso, pedindo para que ele fizesse algo, se fosse possível. Que tentasse impedir Bru de ouvir algo do tipo ou pedir para seus amigos cuidarem dela durante as aulas. Marcos prontamente me prometeu que cuidaria dela por mim e que eu não precisava me preocupar.

Agora ali estava ele cumprindo a promessa, levando Bru para longe de qualquer pessoa que pudesse soltar algum comentário idiota. Não sei como seria durante as aulas, mas sabia também que Marcos e seus amigos eram influentes o suficiente nessa escola para alterar a mente dos demais alunos, ou ao menos impedir que falassem algo na frente de Bru.

Então, quando voltei para o meu carro, ignorando os cochichos e olhares na minha direção, consegui suspirar aliviada finalmente. É claro que eu sabia que ainda enfrentaríamos alguns problemas no caminho, mas no momento eu não poderia estar mais feliz com o rumo que a minha vida tinha tomado. Talvez um dia a convencesse a morar comigo e quem sabe futuramente até nos casaríamos, mas não era algo que ocupasse muito minha mente. Não quando eu já me sentia tão feliz apenas por Bru fazer parte da minha vida.


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Penúltimo capítulo e as lágrimas já caem sem parar..... aaaaa Eu só posso agradecer à todos que vieram a fazer a diferença e aguardaram e não desistiram mesmo com toda demora. Tudooooo dando certo para brumilla 🥺🥰

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